Descendants of the Future escrita por Feltrin


Capítulo 5
V — Pendências




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/513856/chapter/5

Quando meus olhos se abrem, sinto-me presa dentro da sala de Contenção outra vez. Uma dor imaginária aflora pela minha mão, e evito fazer uma careta no momento em que vejo não ser a única presente. Outros beliches se estendem ao meu lado esquerdo e direito, e um faladeiro agudo substitui o silêncio.

Minhas forças parecem ter se esvaído do meu corpo, mas foi uma questão de segundos até que as portas se abram em um estrondo, o silêncio, e que eu consiga me sentar da forma mais rápida e desajeitada possível. Uma onda de olhares me cerca, mas tornam para um homem com uma altura mediana e os cabelos grisalhos, ajustando um óculos no rosto o tempo inteiro.

– Bem, jovenzinhos – uma voz irritante e fina faz com que eu feche os olhos por alguns instantes, e o escuto bater palmas. Quando reabro os olhos, ele me fuzila com um olhar distante e mal humorado. – Queria, antes de tudo, desejar as boas vindas à todos nossos novatos. Entendo perfeitamente que podem estar estranhando essa resistência, assim como perguntando quem somos... e querendo decifrar quem é o inimigo. Mas uma coisa eu posso afirmar: não somos nós. Vocês vieram para cá com um único propósito.

Uma garota com os cabelos esverdeados engole em seco e dá um passo à frente, trocando olhares com outro homem que estava mais atrás. Ela carrega uma vasilha cheia de frascos que variavam do laranja ao azul, e uma rápida lembrança de quando injetaram o chip no meu ombro passa pelos meus olhos, sem deixar vestígios.

– Os... novatos que estão com o rastreador... – ela começa a falar, transparecendo timidez – um passo à frente, por favor.

Meu corpo treme por um momento, e levanto-me, assim como cinco outros novatos. Eles parecem tentar fazer a mesma coisa que eu: disfarçar o nervosismo, o medo, e a desconfiança.

– A propósito, sou Zartach, um dos muitos coordenadores da resistência – interrompe o homem dos cabelos grisalhos, abrindo um sorriso amarelo. Ele indica a menina com a cabeça, prosseguindo. – E essa, Darlila, a mais avançada entre todos vocês. Quando possível, ela estará disposta a ensiná-los algumas coisas básicas para que vocês se tornem bons no que... agora são.

Darlila revira os olhos, e indica para que acompanhemos ela. Um garoto alto passa na frente, seguido de uma menina um pouco menor que ele, banhada de um amontoado de cabelos castanhos e um forçado ar de superioridade. Enfio-me no meio, e evito olhar para quem estava atrás.

[...]

– Para onde estamos indo? – Escuto alguém gritar enquanto passávamos por um corredor escuro e aparentemente sem fim. Aos poucos, os passos de Darlila param em frente a uma porta metálica, entreaberta, e sinto outra tremedeira passageira correr pelo meu corpo da cabeça aos pés.
Alguém me cutuca, e viro a cabeça para trás a tempo de dar de cara com um garoto loiro e alto, sorridente.

– Por que treme tanto? Eles vão tirar o chip de você, não colocar outro.

– Não é isso. – Respondo, calmamente. Fico em silêncio por alguns instantes, refletindo se deveria realmente falar meus motivos para ele. – Ainda estou tentando descobrir contra quem nós estamos lutando, e...

– Ah, sim. Entendi. Mas... relaxa. – Ele ergueu os olhos para a porta metálica e tornou para sua expressão imparcial, corri os olhos para um amontoado de cabelos encaracolados, completando o vazio que ficaria naquele rosto inexpressivo de uma mulher alta.

Era impossível não reconhecê-la novamente. Quase impossível conseguir se conter a matá-la ali mesmo. Trocamos olhares apressados, ela abriu um sorriso torto e se adiantou em um discurso improvisado.

– Eu sou Agatha, uma das coordenadoras da resistência. Darlila é minha... filha. – Suas palavras soaram secas, quase como se não tivesse orgulho em chamá-la assim. – Agora, sejam rápidos. Esse é só o primeiro passo das futuras tarefas que vocês terão de completar.

Aos poucos, a fila se desfez. E nos aglomeramos ao redor da porta enquanto Agatha e Darlila pareciam trocar mensagens labiais discretamente. Corri os olhos para a garota de cabelos castanhos por um momento, tentando loucamente espremer-se entre dois garotos grandes que davam cotoveladas um no outro e quase nem percebiam que tinham trancado a entrada. Até que, então, sou empurrada de mil maneiras e trombo por cima de um degrau. Consigo me equilibrar a tempo de dar de cara com uma sala extensa e com um cheiro de mofo exagerado, bem diferente da Contenção.

– Você vai quebrar a cadeira, baleia! Tire seu bundão daí! – Ordenava um dos garotos que havia trancado a entrada para o outro, que estava sentado relaxadamente em um banquinho de madeira, aflito.

Agatha batucava o pé no chão e quase consegui enxergar um sorrisinho curvar seus lábios, como se tivesse todo o tempo do mundo – e, principalmente, para assistir uma briga de bad-boys que disputavam o banquinho como se fosse uma líder de torcida super gostosa.

– Acomodem-se como quiserem, mas permaneçam em silêncio, fazendo o favor – Darlila se pôs em frente da mãe, como se percebesse que ela quem teria de tomar a iniciativa. Deu as costas para nós apressadamente e afundou as mãos em uma caixa de papel enquanto os outros três novatos aproximaram qualquer coisa para que pudessem se sentar perto dos outros.

Quando tornou para nós, firmava os dedos em torno de uma máquina um pouco maior que o necessário, imaginei. Parecia ter bastante dificuldade para sustentá-la nas mãos, mas pouco quis me candidatar para ajudá-la e tentei manter a atenção em seu rosto. Mesmo por trás de todos aqueles traços cansados e cicatrizes marcando toda a região de suas bochechas, Darlila era bonita. Poderia ser o sonho que o mais indomável garoto gostaria de ter.

– Não, não vou cortar a pele de vocês e deixar que essa coisa faça o trabalho. Ela só irá desativar os rastreadores, mas não garantir que não sejam ativados novamente. E... apresentem-se, claro.

Todos encararam uns aos outros, esperando que alguém se manifestasse. Agatha deu um passo à frente e apontou o dedo indicador diretamente para o meu nariz, com um sorrisinho satisfeito no rosto.

– Você pode começar, querida. – Darlila revirou os olhos e fiquei de pé no mesmo instante, tentando não parece desconfortável e muito menos transparecer a raiva que eu estava sentindo de Agatha naquele mesmo momento. Não apenas por sua tentativa bem sucedida de me irritar, mas por tudo.

Meus lábios se movem imediatamente, e, em silêncio, desenham Audrey. Antes que Agatha pudesse dizer algo, é interceptada por um bando de sirenes sinalizando para que todos saíssem dos cômodos que estavam. Nos aglomeramos em frente à portinha metálica novamente e Agatha passa apressadamente na frente enquanto tentamos nos combinar de sair um por vez, mesmo ainda com a discórdia entre os dois novatos.

– O portão! – Zartach e Darlila gritam em uníssono para alguém bem atrás de nós que não consigo encontrar. Mais pessoas começam a se aglomerar no corredor e tentarem olhar disfarçadamente pelas janelas, e faço o mesmo, bem a tempo de ver grupos de homens armados se posicionarem bem em frente do portão.

O céu cinzento é dominado por fogos e pequenos pontinhos escuros surgem em meio à eles, quase despercebidos. Antes que eu pudesse decifrar para onde estavam indo, uma placa desliza lentamente até bloquear a visão pela janela, e o corredor todo começa a ficar negro.

Um silêncio desconfortável prevalece. E um estrondo agudo faz o chão tremer.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Descendants of the Future" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.