Envolvida num abraço quente e em sentimentos que irradiavam de Ulquiorra para ela, Orihime sentia, pela primeira vez naquela semana, a certeza. Estivera tão encoberta em duvidas e questões sobre como deveria se sentir, e mesmo, como de fato se sentia. Mas isso já não mais parecia importar. Estava tudo tão claro agora. Os sentimentos que tinha por Ichigo eram verdadeiros e poderosos, mas mesmo assim, não se comparavam de forma alguma à como se sentia por Ulquiorra. Era algo único, novo e tão misterioso que a cada instante lhe deixava cada vez mais empolgada para explorá-lo.

Nunca sentira algo parecido em toda sua vida. E agora ele era seu, tanto quanto ela era dele. E numa entrega mutua, e partilhando tantos sentimentos e emoções, ela mal podia conter a felicidade que crescia tão selvagemente dentro dela. Queria estar perdida naqueles braços para sempre, e ao levantar o olhar poder sempre encontrar aqueles insondáveis olhos esmeralda, e toda vez que sentisse a necessidade, encontrar aqueles lábios para levar tudo ao seu redor para longe, fosse com sua voz, fosse com seus beijos.

Mas de repente, como se fosse abruptamente puxada de volta à realidade, por aquela voz indignada, ela já não mais sabia o que deveria fazer a seguir.

–Só pode tá de brincadeira! - Orihime não precisava sequer olhar para saber a cara que Tatsuki estaria fazendo naquele momento. Ao invés disso ela queria apenas enterrar seu rosto no peito de Ulquiorra ou fugir.

Não era medo o que sentia, mas sim uma coisa que soava tão pior, como a culpa e o embaraço pela situação em que estava. Sentia como se tivesse mentido para sua amiga e agora estava sendo exposta como uma mulher terrível e indigna de ser perdoada.

Ela sabia que apesar de demonstrar irritação em sua voz, e com toda certeza em sua aparência também, Tatsuki deveria se sentir magoada e traída. E só esse pensamento já lhe causava uma angustia dolorosa no peito. Como podia magoar a única pessoa que esteve ao seu lado nos momentos mais difíceis que vivera até então?

Orihime fora tirada de seus pensamentos ao sentir um suspiro irritado vindo de Ulquiorra. Ah era verdade que duas pessoas tão importantes para ela, não se suportavam, mesmo tendo trocado apenas algumas palavras. Eles começariam a discutir bem ali? O que ela deveria fazer? Não podia permitir isso!

–Ah, mas você tem mesmo um pessimo timing, não é? - Ele provocou. Seu abraço tinha se afrouxado e Orihime tinha finalmente juntado coragem suficiente para olhar na direção de Tatsuki. Ela estava mesmo tão irritada! Tanto que já não parecia notar sua figura encolhida, somente fuzilava Ulquiorra com o olhar mais mortal que Orihime já vira.

–Solta ela!- Ela sibilou firme e friamente. Orihime podia sentir um riso abafado e também não precisava olhar para Ulquiorra para saber que ele agora exibia aquele meio sorriso cinico.

–Ela não está presa. - Ele disse tranquilamente afagando os cabelos alaranjados, o que instintivamente lhe fez querer envolvê-lo em seus braços outra vez. Mas ela não podia fazer isso, e não podia continuar sendo a forma dele de provocar sua melhor amiga. Afastou-se lentamente e olhou nos olhos dele, como se tentasse lhe dizer que não estava escolhendo lados e que não estava fugindo dele. E então voltou-se para sua amiga.

–Tatsuki-chan...- Mas o que deveria dizer? “Não é o que você está pensando?” Por que era exatamente isso. Deveria se desculpar? Mas ela não havia lhe prometido que se afastaria dele. Deveria ser sincera em como se sentia? Mas isso provavelmente só pioraria as coisas. Deveria pedir que não brigassem? Mas sabia que não teria efeito. E então antes que ela pudesse dizer qualquer palavra, Tatsuki que agora olhava em seus olhos, virou-se e partiu.

Aquilo era pior do que ela podia imaginar. Parecia que seus laços tinham sido cortados e quanto mais Tatsuki se afastava, mais irremediável se tornava a situação. O que devia fazer? Não podia mais ficar parada. Ela olhou mais uma vez nos olhos esmeralda e ele nos dela.

–Eu... Eu preciso ir até ela.- Orihime lhe disse finalmente. Ulquiorra parecia um pouco confuso, mas não a impediria de ir. E ela foi, o mais rapido que pôde, rezando para que ainda pudesse fazer algo.

***

Ulquiorra observou por mais alguns minutos a direção onde Orihime tinha ido. Ela fora atrás da garota irritante. Mas será que ele deveria seguí-la? Provavelmente não. E também, era pouco provável que ela viesse a escolhê-la ao invés dele. E ainda que o fizesse, ele só precisaria ir até ela e a convencer outra vez. Ela estava claramente entregue à ele, não seria tão difícil.

Mas se fosse, e ele a perdesse por causa daquela garota... O que ele faria? A mataria? Sim, parecia apropriado. E Orihime não precisaria saber disso. Seria apenas um trágico evento, e ele estaria lá para reconfortá-la e ela logo seria sua outra vez. E se não fosse assim, se ela descobrisse... ele já ouvira histórias de vampiros que podiam manipular as emoções e pensamentos humanos, ele só teria que aprender a fazê-lo. Parecia um perfeito plano de estepe.

–Ulquirra-kun! - A voz soave e os braços que agora o envolviam num abraço apertado, o tiraram de repente de seus devaneios. - Há quanto tempo!- A jovem de cabelos verdes, quase azuis, e brilhantes olhos castanho-acinzentados, falava empolgada.

–Neliel. - Ele disse simplesmente, e com um pequeno sorriso ela afastou-se.

–Ah, sempre tão frio! - Ela comentou de forma composta e aparência madura.

–Porque resolveu nos reunir? - Ele perguntou sem sequer mudar sua expressão.

–Ora, desde quando se precisa de uma razão para reunir velhos amigos?- Ela disse em tom divertido. Ele continuou sério, esperando que ela fosse direto ao assunto. - Bom, vamos esperar o Grimmjow aparecer.- Ela estava séria outra vez. - Temos assuntos sérios à discutir.

***

Tatsuki mal podia acreditar, tão pouco entender o que se passava diante de seus olhos. Ela sabia que devia sempre confiar em seus instintos, e uma outra vez eles se provaram certos, aquela definitivamente não era uma boa noite. Ela tentara se convencer de que não era bem assim, mas lá estava Orihime, junto àquele cretino. Só de olhar em sua direção ela podia sentir um arrepio na espinha, ela podia sentir suas defesas se erguerem, era mais forte do que ela podia explicar, tudo nele exalava perigo e ela só sabia que devia senão acabar com ele, ficar o mais longe possível. Mas Tatsuki Arisawa não era do tipo que foge.

–Só pode tá de brincadeira! - Ela vociferou chamando a atenção dos dois de repente. Orihime sequer olhou em sua direção... estava mesmo a deixando de lado. Mas Ulquiorra... Ele a estava olhando com desgosto por um instante. A reciproca era mesmo verdadeira.

–Ah, mas você tem mesmo um pessimo timing, não é? - Ele disse exibindo um sorriso cinico, com aqueles olhos de predador, enquanto Orihime ainda se encolhia em seus braços, como sua presa.

–Solta ela. - Tatsuki dizia enquanto tentava manter o controle. Ela o viu exibir o mesmo sorriso de antes.

–Ela não está presa. - Ele afirmou acariciando Orihime que enfim olhou em sua direção. Não era possível que ela não sentisse a vibração ruim vinda dele. Estava claro de que ela não o fazia, mesmo quando finalmente afastou-se de seu abraço, e parecia pronta para dizer algo. Ainda assim, quando Tatsuki olhou em seus olhos, estava óbvio ela não parecia ter a intenção de deixá-lo.

–Tatsuki-chan...- Mesmo sua voz, quando dirigiu-se a ela, o olhar que trocou com ele, estava cada vez mais nitido que estava apaixonada. Não podia mais ficar lá vendo aquela cena, e não podia tampouco pegar Orihime pelo braço e levá-la para longe, não se ela estava apaixonada, por que mesmo que o fizesse, não haviam duvidas de que ela voltaria ao encontro dele e ao invés de aproximá-las, iria apenas aumentar a distancia entre elas. Fez então a única coisa em seu alcance, deu-lhe as costas e partiu.

Já ao lado de fora, como se para piorar a situação, a chuva fria e pesada tocava sua pele e fazia o senario ao seu redor ainda mais dramático. Se sentia no meio de uma novela mexicana, só faltava alguém vir com uma revelação absurda e alguém para estapear.

–Tatsuki-chan! Espera!- Ouviu Orihime lhe chamar. Parou seu passo e olhou em sua direção. Quando não estava perto daquele desgraçado, Tatsuki podia olhá-la, agir como melhores amigas. Mas ela sabia que cedo ou tarde ela estaria outra vez nos braços dele, então elas precisariam falar sério sobre isso.

–Olha, Orihime...

–Eu sinto muito! - Orihime pediu com sinceridade, com um olhar suplicante. Em todos esses anos, uma das coisas das quais Tatsuki mais detestava era ver sua melhor amiga chorar, ou fazer aquela cara triste que exibia agora.

–Você o ama?- Perguntou séria e observou em silencio quando Orihime abaixou o olhar.- Se você o ama, então não tem por que se desculpar. - Disse a contragosto, mas sinceramente. - Eu não gosto dele, e não gosto da idéia de vocês dois juntos... - respirou fundo, como se buscasse forças para continuar. - Mas odeio mais ainda te ver fazendo essa cara.- Orihime a olhava agora com uma surpresa evidente. - Então não precisa se preocupar comigo, eu não vou ficar no seu caminho.

–Mas, eu não quero te perder! - A expressão em seu rosto ainda parecia triste e desesperada.

–Não vai!- Lhe disse abraçando-a. - Só diz a ele...- Ela afastou-se para olhar em seus olhos com uma expressão séria. - Diz a ele que se te machucar de alguma forma, eu vou acabar com ele.- Orihime assentiu e sorriu.

–Pode deixar! - Ela respondeu claramente feliz.

–Bom, vamos sair dessa maldita chuva! - Era sua vez de sorrir enquanto corriam para longe dali.

Era impossível não sorrir perto de Orihime. E apesar de ter dito aquelas coisas, ainda não gostava da idéia de sua melhor amiga com alguém suspeito como ele. Naquele momento prometeu a si mesma três coisas: não deixaria que ele as afastasse, estaria sempre atenta e pronta para proteger Orihime de qualquer perigo que ele pudesse oferecer, e mais ainda, ela definitivamente descobriria o que havia de errado com ele.