A Dama da Névoa escrita por Karina Saori


Capítulo 22
Penúltimo capítulo: Perdão, Beatriz


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo está pronto há uns dois dias, mas não tive tempo de revisá-lo D: Nem agora to com tempo, mas já faz 10 dias, po ahahuahuah

Enfim, boa leitura c:



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— Que pena que o seu namoradinho morreu... Será que Bia teria um namorado na sua idade? Como eu vou saber, não é? A culpa é sua por eu não poder ter visto minha bebê crescida.

Não preguei o olho a noite toda. A voz de Elizabeth me importunou a cada segundo, até o sol bater em minha janela. Levantei, lavei o rosto e desci. Pelo cheiro de café e pão torrado, minha tia já estava acordada.

— Bom dia, Lina. Dormiu bem? — olhou para mim — Pela sua cara, vejo que não. Está tudo bem? Teve algum pesadelo?

— É... Quase isso — ri ironicamente, sentando-me na cadeira.

E assim terminamos de comer, em total silêncio.

— Já são oito horas... Arrume-se, já está quase na hora.

Quase na hora de enterrar Rafael. Subi, troquei de roupa e eu e minha tia fomos comprar algumas flores. No caminho, encontrei com Olivia; não nos víamos desde o começo das férias.

— Lina! — correu até mim e me abraçou, chorando — Como isso pôde acontecer?! Justo com Rafael...

Abracei-a forte, segurando para não chorar junto. Não consegui dizer nada. Não havia nada a ser dito.

Em um silêncio fúnebre, fomos juntas ao enterro. Havia muita gente em frente ao cemitério. Avistei dona Virgínia e, rasgando a multidão, tentei chegar até ela, que me abraçou como cumprimento. Seu Osmar, ao lado dela, estava com o braço ainda imobilizado e com uma expressão tão cansada que eu mal o reconheci.

Percebendo que eu olhava seu namorado com preocupação, dona Virgínia cochichou:

— Ele sente como se sua vida tivesse sido salva por Rafael, já que só teve um braço deslocado...

Das seis tulipas roxas que comprei, dei uma para seu Osmar e outra para dona Virgínia.

— A tulipa roxa significa paz e tranquilidade. Por favor, as aceitem...

Os dois agradeceram, sorrindo e com os olhos marejados.

Com o mesmo padre que fez o funeral de dona Mercedes, meu tio e seu Lorenzo, a reza foi breve. O caixão de papelão foi lentamente descido para o buraco de terra que o esperava; meu coração parecia estar sendo enterrado juntamente com ele.  Por ser muito querido, muitas flores foram jogadas para seu local de descanso eterno e, antes de o cobrirem com terra, joguei as quatro tulipas restantes, dizendo mentalmente em cada uma:

"Por favor, Rafael, descanse."

Ao ir embora, encontrei Camila, que me deu seus sentimentos. Segurou meu ombro e me disse para não desistir. Agradeci e voltei para casa com a mesma mente vazia de quando fui.

Quando cheguei, tomei um banho para tirar o ar fúnebre que estava impregnado na pele e fui direto para a cama. Por ter passado a noite em claro, adormeci rapidamente.

"Acordei naquela mesma casa, mas dessa vez, nada estava pegando fogo.

— Psiu!

Veio do andar de cima. Subi lentamente as escadas; haviam quatro quartos e um segundo "psiu", vindo do quarto da esquerda. Entrei e encontrei aquele mesmo quarto rosa.

Mais um "psiu" que parecia ter vindo debaixo da cama. Agachei e nada. Então, abri o armário e algo me empurrou para dentro dele, fechando a porta.

— Ei, me tira daqui! Ei!

A porta parecia trancada, apesar de não haver fechadura. Estava escuro e abafado. A sensação de que algo sairia de entre as roupas me causava frio na espinha. O calor começou a piorar e senti um cheiro de queimado, logo ouvi os estalos da madeira sofrendo com o calor de uma combustão. De repente, um barulho estrondou na porta, como se algo tivesse caído sobre ela.

— Tem alguém aí?!

Tentei abrir a porta e ela parecia emperrada, não mais trancada. O calor começou a aumentar e muita fumaça começou a entrar dentro do armário. E apesar de não sentir dor, minha pele começou a borbulhar, posteriormente derretendo e escorrendo entre os ossos."

Assustada e ensopada de suor, acordei provavelmente por causa da música -que mais parecia barulho- vindo do outro lado da rua. Quando levantei para olhar pela janela, percebi que aquela casa não era a minha. Olhei ao redor e me encontrei ainda naquele quarto rosa.

"Será mais um sonho?". Diferente da outra vez, o lugar estava arrumado, sem brinquedos espalhados pelo chão e sem coelho de pelúcia.

Voltei o olhar pra janela e olhei para a casa da frente, onde parecia estar acontecendo uma festa infantil.

"Então provavelmente é lá está acontecendo o aniversário de Beatriz e eu estou 10 anos no passado..." Antes de descer, explorei os outros quartos; nunca os reparei com cautela. O quarto ao lado parecia de uma adolescente; havia pôsteres de bandas, roupas jogadas na cama de solteiro, mas não havia nada demais. Continuei para o primeiro quarto da direita e tinha uma cama de casal com um porta-retrato na cabeceira; aproximei-me e vi que eram meus tios e a minha prima.

— Essa casa era deles?!

Unindo os fatos, o quarto da adolescente era o quarto da Geovanna, filha deles. É verdade... 10 anos atrás ela tinha uns 15 anos. Mas e o quarto rosa?

Continuei para o quarto do lado e havia outro porta-retrato com uma foto... minha.

— Então, há 10 anos, eu e meus pais morávamos junto com os meus tios... Por isso essa casa me era tão familiar e nostálgica nos sonhos. Com seis anos não tinha como eu me lembrar, mesmo... — descendo as escadas, comecei a pôr as coisas no lugar — Então o incêndio ocorreu aqui e o meu sonho anterior representou alguma coisa que aconteceu nesse dia...

Saí da casa e me dirigi à da frente, cheio de pessoas rindo e crianças correndo. Vi supostamente meus pais conversando com pessoas que eu desconhecia. Parei na frente deles, como se estivessem falando comigo e chorei por não ter podido desfrutar uma conversa assim com eles. Minha mãe era linda e meu pai parecia um galã. Sorri por revê-los, já que eu quase não lembrava mais de suas feições.

Entrei na casa toda enfeitada com bexigas e desenhos colados na parede. Assustei-me ao ver Rafael com uns 30 anos, ainda mais charmoso. Aproximei-me e encarei esse homem, obviamente seu pai. A semelhança era impressionante, mas os olhos esverdeados tinham vindo da mãe, supostamente a mulher ao seu lado.

E então, vi Elizabeth. Totalmente diferente de como eu a vejo, tinha uma cor saudável de pele e seus olhos eram de um castanho escuro. E sorria. Sorria muito, conversava com todos enquanto distribuía pequenos lanches. Uma pessoa gentil e idílica... A morte de sua filha a afetou tão profundamente que tornou-se aquele espírito rancoroso...

Andei pela casa e, na sala, vi um garotinho de cabelos enrolados dormindo tranquilamente no sofá. Sorri ao ver Rafael em miniatura e logo fui interrompida com duas meninas correndo para fora. Acompanhei-as.

— Mamãe! Mamãe! Bia pode brincar em casa? Queria mostrar minha boneca nova pra ela!

A menininha de cabelos emaranhados e castanhos puxava a saia da mãe. Da minha mãe.

— Claro que pode! Mas Bia tem que pedir pra mãe dela primeiro.

A outra menina saiu correndo para chamar a mãe. Trouxe Elizabeth, puxando-a pela mão.

— Manhê, posso brincar na casa da Li? A tia Joana já deixou! — vendo a mãe pensativa, a menina chacoalhou sua mão — Deixa, manhê!

— Tudo bem, Beth... Ela pode dormir em casa — minha mãe sorriu.

— Hum, então tá bom... Comporte-se na casa de sua tia, tá? — beijou a testa da filha.

"Tia...?"

Antes de correrem atropeladamente para a casa da frente, a menininha de cabelos negros e lisos voltou para a casa e pegou um coelho branco de pelúcia. Corri junto, seguindo-as. Entraram e foram diretamente para o quarto rosa. Brincaram com as bonecas, espalhando-as no chão.

— Ei, Bia, vamos brincar de cozinha?

Concordando, as duas foram para a cozinha e brincaram com o fogão, fingindo fazer comidinha. Beatriz fingia mexer em algo na mesa enquanto cantarolava e a pequena Lina pegava uma panela vazia e mexia no fogão, girando todos os botões. Vendo que nada acontecia igual via suas mães cozinhando, achou chato e disse à amiga que queria voltar pro quarto e pras bonecas.

Continuei acompanhando-as. Depois de brincarem mais um pouco com suas bonecas, as duas resolveram brincar de esconde-esconde; uma ia contar enquanto cobria o rosto na parede do corredor, e a outra, Beatriz, procurava um lugar para se esconder. Como estava já chegando na contagem oito e ainda não tinha achado nenhum lugar para se esconder, resolveu entrar no armário. A menina chegou na contagem dez, gritou "lá vou eu" e resolveu procurar no andar de baixo primeiro. Desceu as escadas lentamente para não fazer barulho e procurou em cada cantinho, com atenção.

— Éca, que cheiro estranho. Vou subir.

Fiquei na sala. Apesar de não sentir o peso do meu corpo, eu já estava cansada. Pela claridade reduzida, supus que já estava no final da tarde; ainda ouvia a pequena Lina correndo para lá e para cá, até que a fechadura fez barulho com chave e os meus pais e os do Rafa abriram a porta.

— Nossa, que cheiro de-

A primeira coisa que fizeram foi acender a luz. Só vi um clarão e o desespero de ver meus pais sendo jogados para longe. Com os meus próprios olhos, os vi desaparecerem perante à onda de calor.

A explosão incendiou rapidamente o andar de baixo, pegando as cortinas e o piso de madeira. Corri para o andar de cima, onde estava 'Lina', que se assustou com o barulho, mas ignorou como toda criança de seis anos faria. A fumaça começou a subir e impregnar o ar. A menina começou a tossir, sentiu um cheiro estranho e resolveu descer e encontrar seus pais na casa da frente porque estava com medo Ao se aproximar da escada, a fumaça já havia crescido muito; tossindo ininterruptamente, desmaiou. Beatriz permanecia quieta, esperando sua amiguinha encontrá-la dentro do armário no quarto rosa.

No corredor do andar de cima, consegui ver os meus pais e os do Rafa, caídos no chão em meio ao fogo que já havia tomado praticamente todo o andar de baixo e não demorou muito para começar a devorar as paredes de madeira do segundo andar. Ao ouvir um barulho, voltei para o quarto rosa; o teto estava despencando. Uma grande parte dele havia caído sobre o armário. O desespero de não poder fazer nada... Beatriz gritava, tentando abri-la.

— Li! Que barulho foi esse?! Me deixa sair! Eeei!

As chamas do pedaço do teto passou para o armário. Ouvi a voz da menina se aquietando aos poucos; ao inalar tanta fumaça, sua capacidade respiratória diminuiu. Totalmente quieta, temi sua morte. Havia muita fumaça, ainda mais que ela estava em um local fechado e pequeno.

"Meu Deus, que coisa horrível..."

Um homem coberto por uma toalha encharcada apareceu repentinamente. Pegou no colo a menina desmaiada no começo da escada e ficou procurando algo. Procurou nos outros cômodos, mas com o fogo aumentando, envolveu a menina debaixo da toalha e saiu apressadamente, chorando, passando entre os corpos dos meus pais e do Rafa na sala.

Acompanhei-o. Havia muitas pessoas do lado de fora, observando horrorizadas as chamas devorarem a casa. Assim que o homem saiu, Elizabeth foi ao seu encontro, desesperada. Olhou para a menina em seu colo e sua expressão mudou para a que eu conhecia.

— Leonard, cadê a Beatriz?! Cadê a Beatriz?! Por que você só trouxe a Lina?!

"Leonard? Então aquele túmulo é do marido de Elizabeth."

— Ela não estava em nenhuma lugar! Eu procurei, juro que procurei!

— Você preferiu salvar sua sobrinha ao invés de nossa filha?! Que tipo de pai é você?!

"Sobrinha?!"

— Mas eu procur-

Minha tia e meu tio vieram correndo, abraçando a pequena menina desacordada nos braços do tal Leonard.

— Leonard! — minha tia gritava, desesperada — E a minha irmã? E o Conrado, a Júlia e o Mike?!

Leonard só balançou negativamente a cabeça. Bastou isso para minha tia desabar ao chorar, abraçando a pequena menina em seus braços.

— Você só está preocupada com a nossa irmã e um casal de amigos, Dirce?! Você não se importa que Beatriz não esteja aqui?!


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Notas finais do capítulo

Espero ter atingindo a expectativa de vocês e não ter sido uma coisa que vocês falariam "af, era isso?" Ç____Ç

Enfim, o próximo é o último D: Até *3*