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– O que você tem na cabeça, Finn? – Lhe dei um tapa.

Já haviamos chegado em casa. Finalmente o primeiro dia de aula tinha acabado e eu podia simplesmente deitar no sofá. Mas eu não o fiz, estava chocado demais com a atitude de Finn. Sei que não parece nada demais, mas é um assunto delicado.

– Vovô sempre quis que você aprendesse piano, Kurt. – Finn sentou no sofá com duas latas de refrigerante, ele me alcançou uma Coca Diet.

– Eu sei. Os homens da família tem que aprender piano, é o instrumento da sabedoria. Eu sei disso. Mas, isso vai me aproximar tanto do passado... – Eu parei olhando para o chão.

– Kurt, não acha que está na hora de parar de se preocupar tanto? Papai tem controle do reino, o exército inimigo está em desvantagem. Não há nada que eles possam fazer contra nós, não aqui. – Eu lhe encarei.

– Eu só tenho medo. Você sabe que toda vez que escuto algum acorde, seja qual for, até brilha brilha estrelinha, - Ele riu. – eu choro.

– Eu sei disso, maninho, mas tenho certeza que isso vai te fazer bem. Acredite. – Respirei fundo. – É preciso enfrentar os medos para conseguir finalmente derrota-los.

– Não acredito que estou seguindo conselhos de uma criança. – Disse sorrindo.

– Sou apenas um ano e dez meses mais novo que você. – Ele me deu um beijo na bochecha e subiu as escadas.

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– Mãe? – A mulher no jardim com a blusa repleta de cristais se virou para mim.

– Petit Prince, tudo bem? – Ela se aproximou e me deu um abraço.

– Sim. – Respondi acariciando uma rosa vermelha.

– Como foi o primeiro dia? – Ela estava regando as flores. Rosas. De todas as cores.

– Razoalvelmente bom. – Pensei em mencionar minha aula de história, ou até mesmo que Rachel e Blaine conheciam a história por sua mãe lhes contar. – Fiz dois amigos.

– Isso é incrível, Kurt. – Por mais que sua blusa brilhasse ao Sol, não havia nada mais radiante que seu sorriso. Era o tipo de sorriso que te transmitia paz, alegria e tudo o que havia de melhor no mundo.

Aquele sorriso foi a última coisa que eu via antes de dormir por quase dez anos. Todos os dias ela ia até a minha cama, me deseja boa noite, me dava um pequeno beijo na testa e então dizia “Durma com os anjos, Petit Prince.”. Ela sorria e logo eu adormecia. Nunca tive pesadelos enquanto pensava no brilho de seus olhos e no branco de seu sorriso.

– Finn me convenceu a aprender a tocar piano. – Ela me olhou espantada e desviei o olhar para o chão.

– Isso... – Ela colocou a mão em minha bochecha. – Olhe-me nos olhos, filho. – Eu o fiz e a vi sorrindo. – Acho isso maravilhoso. Seu avô teria orgulho de você.

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Então depois do jantar resolvi ir para o meu quarto e pensar em algumas músicas que eu gostaria de tocar. Achei a perfeita para a minha primeira aula, liguei para Blaine e disse que podíamos nos encontrar no quarto tempo, que era para ambos ter educação física, porém nenhum gostava dessa matéria. Nos encontraríamos no auditório.

Eu peguei no sono sem perceber, acordei com o notebook ao meu lado, ainda ligado, ainda com os sapatos e partituras a minha volta. Levantei e fui direto para o banheiro, tomei uma ducha de cinco minutos e vesti qualquer roupa. Desci, peguei uma maçã e fui até o carro.

– Bom dia, maninho. – Finn sorriu.

– Bom dia, maninho que é maior do que eu. – Ele riu.

O motorista nos largou uma quadra antes como haviamos combinado. Foi por muito pouco que Rachel não nos viu saindo do carro. Eu acelerei o passo e consegui estar bem longe do veículo quando ela correu na minha direção.

– Kurt! – Ela correu e me deu um abraço.

– Bom dia. – Eu sorri. – Cade o Blaine?

– Acordou atrasado, como sempre ficou até tarde tocando piano. – Eu sorri.

– Deve ser bom dormir ao som dos acordes. – Ela riu.

– É, mas o quarto dele é a prova de som. – Arqueei as sobrancelhas. – Calma, não somos ricos, ele mesmo deu um jeito de fazer isso... alguma coisa com caixas.. sei lá.

– Interessante. – Ela pegou minha mão e me puxou em direção a escola. Olhei para trás e vi Finn rindo.

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Eu tive dois períodos de cálculo e depois um de inglês. Eu estava com dor de cabeça, enjoado e com, por incrível que pareça, sono. Estava esperando ansiosamente pelo sinal, para que eu pudesse correr até o auditório e ter o meu momento de paz.

– Bem, alunos, próxima aula quero essas dez páginas de exercícios feitas. Podem sair. – Eu me levantei em um pulo e corri.

Estava chegando próximo a porta do auditório quando eu o vi. Ele estava escorado em um armário, olhando algumas partituras. Parei ao seu lado e os olhos castanhos esverdeados me fitaram. Pequenas rugas surgiram no canto dos olhos e então eu percebi que ele estava sorrindo.

– Oi. – Eu sorri.

– Preparado para matar sua primeira aula? – Eu franzi o cenho.

– Quem disse que é a primeira vez que mato alguma aula? – Ele ficou sério.

– Você não tem cara de quem faz esse tipo de coisa. – Eu sorri.

– Matar uma aula para estudar para uma prova conta? – Ele gargalhou e começou a caminhar até o auditório.

– Tecnicamente conta, mas os descolados aqui não vão concordar com isso. – Ele largou a bolsa em cima do piano, sim ele usava um tipo de bolsa masculina, o que era um pouco estranho. – Então vamos dizer que essa é a sua primeira vez.

– Tudo bem. – Eu larguei minha mochila ao lado da sua. – Posso fazer uma pergunta?

– Nem começamos as aulas e já tem dúvidas? – Ele arqueou uma sobrancelha.

– Na verdade não é disso. – Ele sentou no banco em frente ao piano. – Você tem um piano no seu quarto?

– Sim, por quê? – Ele apontou para o pequeno espaço ao seu lado.

– Rachel disse que ficou até tarde tocando, e que seu quarto é a prova de som. – Ele sorriu.

– Sim, ganhei de uma senhora quando ela foi embora. – Ele tocou notas aleatórias. – Eu tocava para ela todas as noites, ela dizia que se lembrava do marido. Quando ela morreu ela deixou em seu testamento o piano para mim.

– Ah... – Eu não sabia o que dizer, ele começou a mostrar as notas básicas e ali ficamos por quase uma hora.

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– Você aprende rápido. – Eu sorri tocando a pequena sequência que ele havia me ensinado.

– Isso é brilha brilha estrelinha, não é? – Ele gargalhou e eu o acompanhei.

– Peguei no livro “Piano para iniciantes”. – Eu terminei e ele sorriu. – Muito bem.

– Mas, que tal uma música de verdade agora? – Tirei a partitura da minha mochila.

– Não acho que tenhamos tempo pra isso. – Ele olhou a música. – Próxima aula.

– Não, não quero aprender. – Ele arqueou uma sobrancelha. – Bem, eu quero, mas hoje quero apenas ouvir.

Ele assentiu, parou por um minuto e então começou a tocar.

Se os anjos fizessem algum som, com toda a certeza do mundo seria algo similiar aos acordes de um piano. Sei que sou o mais suspeito para falar sobre a tamanha perfeição que é uma combinação simples de notas. Por isso lhes digo: Aprendam piano. Se você tiver qualquer oportunidade de aprender um instrumento, aprenda piano.

Meu avô sempre elogiava os pianistas, dizia que eles eram confiáveis e extremamente inteligentes.

“Pianistas são os mais inteligentes, se precisar de alguma ajuda, vá até um deles.”

Para a minha sorte eu tenho um bem ao meu lado, tocando uma música completamente melódica. Breakaway. Não deixo de lembrar da letra e pensar se deveria seguir a risca esse roteiro. Voar para longe, fugir e rezar para que tudo de certo ao final. Porém não tem como fugir de si próprio, não posso fugir de meu sangue real.

Buildings with a hundred floors

Swinging round revolving doors

Ouço uma voz doce atrás de mim e Rachel aparece. Ela sorri e senta no banco ao lado do piano.

Maybe I don't know where they'll take me

But, gotta keep moving on, moving on

Fly away, break away

Eu sorrio para ela e então olho Blaine. Ele está olhando para a sua irmã, porém continua tocando, ele também está sorrindo. Quando a música termina ficamos em um silêncio completo até ouvirmos o sinal da escola. Hora de ir para a aula, mais uma vez.