Se as pessoas fossem chuva, eu seria garoa e ela, um furacão.

Deixei-a com as amigas e fui até o bar. Minha cabeça estava cheia. Eu sabia do que eu teria que abrir mão: Festas, mulheres, saídas. Qualquer vacilo custaria a imagem do meu pai no jornal. A Malu não faz a mínima idéia de como ser um empresário conhecido é, até então eu nunca estive nem aí com o que eu faço ou deixo de fazer, mas um casamento em jogo é muita coisa. É ter em mãos uma mulher e uma empresa inteira. Maldita a hora em que meu pai decidiu fazer sociedade com o Mauro, é desnecessário já que ele vai se aposentar. Eu sei que ele só quer fazer um favor, mas acabou fodendo tudo pro meu lado. A Maria Luiza é a garota mais insuportável que eu conheço. Mas quando meu pai me fez a proposta e me deu a escolha de quem poderia ser eu não consegui recusar.

Eu não soube dizer não.

Ela sempre mexeu comigo. Esse jeito marrento de ser, de não dar o braço a torcer por nada sempre me fez ter vontade de conhecê-la melhor, mas isso acaba, é claro, quando ela abre a boca. E porra, que boca.

Eu sempre fui um idiota com as mulheres, aqueles otários de marca maior mesmo. Talvez seja porque nunca me apaixonei e todas as garotas que eu fiquei e levei pra cama foi por pura diversão. A idéia de casar e ter responsabilidades não me agradou, mas eu sei que vai ser bom pra mim e pra ela. Ela não gosta de mim por causa de um erro meu do passado que nem foi tão erro assim, só que mulher é foda, cara. Elas remoem o que tu fez há 20 anos e na primeira oportunidade jogam tudo na tua cara. E agora ela ta lá, toda sorrisos para as amigas dela. Que bom que alguém ta conseguindo achar graça em algo hoje. Senti-me meio tonto me dando conta de que já era o décimo copo de whisky que tomara. Levantei a cabeça olhando pro céu e respirei fundo, ao baixar o olhar encontrei aqueles olhos negros me encarando.

É quase como se fosse um imã. Ela me olhou ternamente e aquele olhar me trouxe dúvida.

Quando nossos olhares se encontram desse jeito é quase impossível desviar. É uma conexão intensa e transparente que nos une de uma forma desconhecida. É como se fossemos feitos um para o outro, mas não para ficarmos juntos. Algo chamou a atenção dela para a direita e eu olhei junto, vendo nossos pais juntos batendo uma colher na taça de champanhe que seguravam.

Começou a festa.

SoundTrack - Clica

Meu pai chamou a atenção de todos e os convidados direcionaram seus olhares para o pequeno palco montado ali na grama. Acima tinha um telão onde nesse momento passava as fotos que tirei com ela no nosso ensaio. Naquele dia ela parecia tão neutra. Foi tudo tão natural. Os sorrisos nas fotos eram todos sinceros. Ela estava achando aquilo tão ridículo como eu, e fizemos piadas que nos renderam fotos distraídas e...

– Atenção, Atenção - Disse Mauro rodando os olhos pelo espaço - Malu e Miguel, venham até aqui, por favor. - Disse e esperou. Olhei pra Malu e a vi abaixar a cabeça e caminhar até o palco. Segui atrás e parei ao lado da mesma de frente para todos. Eu consegui sentir a tensão dela de longe. Por um motivo desconhecido peguei na mão dela entrelaçando nossos dedos e não pude deixar de sorrir quando ela me olhou desconcertada, mas soltou um sorriso frouxo após. Olhamos pra frente e percebi que pessoas nos observavam e nossos pais estavam sorrindo, a mãe dela tava faltando ter um treco e cair dura pra trás.

– O motivo que nos une aqui nessa noite de quarta-feira é a união desse querido casal. No início não queríamos aceitar, sabem como é, ainda são novos, mas me digam: Quem são nossos preconceitos quando o amor está em jogo? - Meu pai disse e senti o olhar de incrédula da Malu para ele. O peso da mentira Apertei levemente a mão dela que abaixou a cabeça parecendo pensar e do nada levantou o olhar pro meu pai com um sorriso no rosto. Essa garota é louca. - Decidimos não nos opor mais contra isso e chegamos à conclusão de que o melhor para eles são ficarem juntos. - Ele continha um sorriso no rosto. - Estou feliz demais pelo meu filho, tenho certeza de que ele fez a escolha certa. - Levantou a taça sem deixar de sorrir, o garçom serviu uma taça para mim e para a Maria luiza - Por isso meus caros amigos, um brinde aos noivos. - Todos levantaram suas taças brindando e bebendo em seguida, forcei um sorriso escutando a voz de uma mulher. A mãe da Malu.

– Estou tão feliz - Ela disse com uma mão no coração sem esconder um largo sorriso - Eu gostaria que os noivos dessem uma palavra. - Gelei. A Malu olhou para mim nervosa e eu passei gentilmente minha mão no seu rosto assentindo, puxei-a pela mão e subi no palco deixando-a do meu lado, coloquei minha taça em cima da mesa ao lado e sorri para todos.

– Boa noite a todos. - Primeiramente gostaria de agradecer a todos pela presença. - Malu estava estática forçando um sorriso, virei de frente para a mesma que mesmo em cima de um salto, subiu o olhar para me encarar. - Eu gostaria também de te agradecer, Malu. Agradecer por estar abrindo mão da sua melhor idade se juntando a mim. A estar abrindo mão da sua vida, da sua casa, da sua família, por nós. - Os olhos dela brilhavam. Eu não consegui mentir em uma sequer palavra. - Obrigado por encarar isso comigo, obrigado por estar disposta a tentar, obrigado por ser essa garota incrível e apaixonante que é, e obrigado por me escolher a partilhar disso todos os dias. - Eu não sabia mais o que falar. Olhei para as nossas mãos e foi como se todo o resto sumisse. - Eu sei que ta sendo difícil pra você, pra mim também está, mas eu sei que vamos conseguir se ficarmos juntos. - Disse sendo sincero com a realidade que estávamos vivendo e vi um traço brilhante em seu rosto. Era uma lágrima. Ela estava chorando.

Passei meu dedo indicador levemente em seu rosto limpando as lágrimas que ousavam em cair, soltei sua mão e levei a mesma até seu queixo, encarei aqueles olhos uma última vez antes de vê-los se fechar e colei levemente meus lábios nos seus tão macios. Nossas línguas com uma discreta urgência pediu passagem ao abrirmos a boca movendo-nos com sintonia. Era incrível o modo como aqueles lábios se encaixavam nos meus. É como se tivessem sido moldados para mim. Ao fundo pude ouvir gritos, palmas e uma seqüência de fogos de artifício explodindo naquele céu infinito que nos cobria, dando como convidados especiais a lua e as estrelas, que de cima, presenciavam uma noite perfeita.