Seu último amor - 2ª temporada escrita por Jeniffer


Capítulo 4
Travesseiro




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“O traumático nem sempre é aquilo que faz ruído, e sim o que fica mudo, e lá do silêncio, faz ruídos.”

Carmen García Mallo.


Lágrimas, risos, esperanças, decepções... Tudo estava passando diante de mim como um filme que eu já me cansara de ver.

Eu estava parada no meio do caminho entre a casa e o portão. Elijah estava a dois passos atrás de mim, quase tão imóvel quanto eu, apenas se balançando ocasionalmente para ninar Henry toda vez que ele se agitava e ameaçava acordar. As malas estavam em três carros estacionados na rua, com os motores ligados e os faróis iluminando o caminho, como se mostrassem para onde iríamos, e que iríamos sem demora.

Já não chovia mais. A noite chegou e manteve o frescor da profunda renovação que a chuva promoveu. Na verdade, as estrelas brilhavam no céu, e não havia nenhuma nuvem à vista. Mas mesmo que isso me desse a certeza de que teríamos um novo e brilhante dia de sol, a escuridão da noite me oprimia.

Um a um, alguns poucos híbridos saíram da casa e foram em direção a um dos carros. Quando eles passaram por mim, eu pude ouvir o crepitar do fogo que começara a se espalhar rapidamente pela casa. Alguns minutos depois, Klaus também saiu. Tudo o que eu via atrás dele era fogo, destruição e morte. As labaredas não demoraram a alcançar cada cômodo, o que me fez acreditar que eles não incendiaram apenas uma parte da casa, mas sim deram inícios a diversos focos.

Klaus caminhou com passos decididos, cada vez mais distante da casa em chamas e mais próximo de mim. Eu ainda não havia movido um único músculo. Ele interrompeu seus passos quando chegou ao meu lado.

E assim ficamos por alguns segundos. Ele, virado em direção aos carros, pronto para seguir em frente e deixar tudo aquilo para trás. Eu, virada em direção a casa, contemplando tudo o que eu perdera em tão pouco tempo e sentindo aquele vórtice de medo e insegurança dragar meu coração em direção às profundezas.

Ele suspirou e eu me virei também, lançando um último olhar a casa. Sem olhar para mim, ele pegou minha mão, entrelaçando nossos dedos e de repente o mundo todo era silêncio. Com apenas um toque, Klaus calou meus medos e interrompeu minha queda no vazio de minha mente. Assim, juntos partimos. Enquanto nos afastávamos, Henry ficava inquieto nos braços de Elijah. Concluí que todas essas mudanças drásticas em um curto espaço de tempo não estavam fazendo bem para ele. Mas ao olhar rapidamente para Klaus, eu conclui que não estava fazendo bem para ninguém.

Klaus abriu a porta do primeiro carro para que eu entrasse, e então assumiu o volante. Alexia não conseguira chegar tão longe, pois seu carro quebrara não muito longe da casa. Ela esperava no banco de trás do segundo carro, já hipnotizada para esquecer tudo aquilo, já que ela estava completamente apavorada quando eu liguei. Elijah entregara Henry a ela e também assumira o volante, com um híbrido no banco do carona, deixando o terceiro carro para os poucos híbridos que permaneceram para ajudar a queimar a casa.

Todos esperaram que Klaus começasse a dirigir e nos guiasse a algum lugar seguro, mas ele apenas colocou suas mãos no volante e recostou a cabeça no banco, de olhos fechados. Ele estava exausto.

Passei a mão por seus cabelos, depois acariciando seu rosto. Ele inclinou sua cabeça em minha direção, e então olhou para mim.

— Vamos ficar bem. – eu disse baixinho. Pois apesar de uma das partes mais lindas de minha vida ter sido destruída em tão pouco tempo, mesmo aquele pilar tão importante da minha sanidade ter sido transformada em cinzas, ele estava ao meu lado.

Um pequeno sorriso surgiu em seus lábios, por alguns segundos iluminando sua face, mas morrendo logo em seguida, como uma pequena chama contra um vento forte, fadada a morrer antes mesmo de conseguir prover alguma luz. Ele deu a partida no carro e o colocou em movimento. Pelo retrovisor eu vi quando os outros carros fizeram o mesmo.

Entramos na rua principal perturbando o estranho silêncio da cidade. Eu nunca vira New Orleans tão tranquila. Mas no fundo eu sabia que esta tranquilidade tinha um motivo sombrio, e que ela logo se transformaria em confusão.

Klaus estendeu sua mão e alcançou a minha. Assim, de mãos dadas, tão quietos quanto a noite que nos cercava, seguimos para um novo lugar, uma nova promessa, uma nova chance.

Desejei que Klaus acelerasse o carro e então diminuísse o tempo de viagem. Eu nunca me sentira tão exposta, tão vulnerável. Eu sentia como se a cada esquina que cruzávamos mais olhos observassem nossa trajetória. Acho que ninguém em New Orleans dormiu nesta noite.

*********

Eu acordei com o movimento brusco do carro.

— Estamos chegando. – disse Klaus, calmo.

Nós havíamos abandonado a estrada principal e agora seguíamos por uma estrada de chão, cercada por uma densa floresta. Eu não sabia por quanto tempo eu havia dormido, nem oquão afastados do centro da cidade estávamos agora.

A estrada de chão nos levou até um portão de madeira, simples e rústico. Um homem muito alto, exibindo uma raiva velada talvez por ter sido acordado no meio da noite, abriu o portão assim que avistou o carro. Klaus o cumprimentou com um breve aceno de cabeça e seguiu dirigindo.

A casa no final da estrada não era tão majestosa quanto a que costumávamos morar. Era grande, construída em um estilo que me lembrava uma fazenda. Algumas janelas estavam iluminadas por uma luz bruxuleante, o que em fez pensar que esta casa não possuía energia elétrica.

Klaus estacionou ao lado da casa, e logo em seguida os outros carros fizeram o mesmo. Klaus saiu do carro assim que o estacionou.

— Que lugar é esse? – perguntei, quando saí do carro.

— O plano B. – disse Klaus, sem olhar para mim.

Elijah se aproximou em silêncio, carregando uma mala. Alexia vinha ao seu lado, embalando Henry, que parecia finalmente estar descansando. Os híbridos apenas saíram do carro e foram em direção à floresta. Apesar de eu achar tudo aquilo muito estranho, estava cansada demais para levantar este questionamento. O homem que nos recebeu no portão também saiu do carro, com a aparência cansada.

Subimos uma pequena escada e paramos à porta, seguindo aquele homem que eu presumi ser o dono. Como Klaus não fez menção de entrar na casa, todos nós esperamos. O homem entrou e pegou um lampião que estava em uma mesinha próxima. Minha teoria estava confirmada.

― Você sabe o que fazer, Victor. – disse Klaus.

— Entre, por favor. – Victor tinha uma voz muito mansa, baixa. Quase incoerente com toda aquela altura e semblante fechado iluminado pelo lampião que garantiam uma imagem um tanto assustadora a ele.

Klaus entrou na casa, e então eu fui convidada a entrar, e então Elijah e por último, Alexia. Mesmo que ela não precisasse do convite, ela o esperou mesmo assim, como uma mera convenção social.

— Há comida na cozinha. – disse Victor.

— Eu assumo daqui. Você pode se retirar. – disse Klaus, usando um tom de ordem implícita, ao qual Victor obedeceu prontamente.

— Eu acho melhor levar Alexia até a cozinha. – disse Elijah, já procurando uma direção para seguir.

— Prepare algo para Henry também. Quando ele acordar, vai estar faminto. – eu disse. Alexia ofereceu-me um pequeno sorriso em resposta.

— Depois procurem um quarto no andar superior. Algum deles deve ter um lugar apropriado para meu filho. – disse Klaus.

— Eu vou ficar no mesmo quarto que ele, caso ele acorde precisando de alguma coisa.

— Obrigada Alexia. – eu disse, e então ela seguiu com Elijah para a cozinha.

— Vamos. – Klaus pegou minha mão e me levou para o andar superior, onde ficavam os quartos.

Alguns dos degraus da escada rangiam sob nosso peso, e isso somado a escuridão e ao aspecto antigo da casa, transformavam aquele ambiente em algo digno de cenário em filme de terror, como uma casa assombrada. Mas nós somos vampiros, então tecnicamente, nós a estamos assombrando.

Klaus abriu a primeira porta à direita do corredor, e saímos da escuridão lúgubre do corredor para mergulhar na cálida luz do quarto. Velas estavam posicionadas de maneira que não criassem nenhum canto escuro no cômodo, fazendo com o que ambiente parecesse uma réplica exata de uma foto antiga.

— Quem preparou tudo isso em tão pouco tempo? – perguntei.

— Victor sempre manteve a casa pronta para me receber a qualquer hora, caso eu precisasse. Eu só não sabia quando eu precisaria usar o plano B, e nem que você estaria comigo. – ele disse, como que se desculpa. – Isso foi o máximo que consegui.

Eu ri baixinho. O quarto era extremamente simples, mas muito acolhedor. Eu me aproximei dele e o beijei.

Eu me deitei na cama e Klaus soprou, uma a uma, as chamas das velas, pouco a pouco condenando o quarto à escuridão total. Naquela noite fizemos amor lentamente, apaixonadamente. Quase como se aquela fosse a última vez.

Quando Klaus adormeceu, eu fiquei mais alguns minutos lutando contra o cansaço, apenas para ouvir sua respiração tranquila acalmando o meu coração. E então decidi descansar e me preparar para o que for que o dia de amanhã me reservasse.

Naquelas curtas horas de sono, eu descansei minha cabeça em um travesseiro feito de medos e incertezas.

*********

Acordei lentamente, demorando a reconhecer o lugar onde eu me encontrava. Quando lembrei, virei à procura de Klaus, apenas para encontrar lençóis e cobertores vazios. A luz do sol que entrava pelas frestas da janela o iluminava de maneira quase irreconhecível, em comparação com as velas da noite passada. Pensei em voltar a dormir, esquecer toda a avalanche de memórias que bailavam em minha mente, mas meus pensamentos já surgiam de maneira descoordenada, quase que em ebulição. Eu não iria conseguir adormecer novamente.

Depois me vestir e arrumar o cabelo da melhor maneira possível desci as escadas com degraus barulhentos.

— Que bom que acordou, sweetheart. – disse Klaus, assim que me ouviu no primeiro degrau.

Ele estava de pé, no meio da sala, com vários híbridos ao seu redor. Todos pareciam muito animados com alguma coisa, e um tanto irritados serem interrompidos.

Klaus se aproximou de mim quando alcancei o último degrau e pegou minha mão.

— Acompanha-me em uma caminhada?

Eu sorri em resposta e o segui para fora da casa, mesmo sentindo o peso do olhar de todos os híbridos em mim, mesmo que cada nervo em meu corpo gritasse que algo estava errado, eu o segui segurando sua mão como se ela fosse meu bote salva-vidas no meio do mar revolto.

Caminhamos em silêncio até chegar ao limiar do gramado, perto da vastidão de árvores que cercava a propriedade.

— Está ouvindo isso, Caroline?

Apurei os ouvidos, tentando captar algo fora do comum. Nada.

— Não estou ouvindo nada. – disse eu, depois de alguns segundos.

— Aproveite este silêncio enquanto pode, Love. Ele não durará muito. – disse Klaus, olhando rapidamente ao nosso redor e então descansando seus olhos nos meus.

— Não?

— Não. New Orleans amanheceu diferente e, no final do dia, será ainda mais diferente. – ele apertou minha mão, como se precisasse me lembrar que ela continuava enlaçada na minha. – O ataque foi apenas um aviso de que algo grande está acontecendo. Esta cidade é o centro de muitas coisas diferentes, até mesmo divergentes, e precisa ser controlada.

— O que vai acontecer agora?

— Vou instaurar ordem no caos. – Klaus soltou minha mão e começou a andar vagarosamente de um lado para o outro, como sempre fazia quando planejava algo. – Esse ataque não foi aleatório, e o número de vampiros que participaram da ação é realmente preocupante. Preciso controlar New Orleans antes que mais alguém tenha a audácia de nos atacar.

— E como você pretende fazer isso?

— A repercussão do ataque já deve ter alcançado as mais longínquas fronteiras de New Orleans e varrido cada rua no meio do caminho. Contudo são poucos os vampiros nesta cidade que tem o privilégio de andar sob a luz do sol, o que me dá tempo suficiente para pegá-los de surpresa.

— Klaus! – um dos híbridos, na janela da fazenda, o chamava.

Klaus entendeu o chamado, e então pegou minha mão, e olhando em meus olhos disse:

— Preciso que fique segura, Love. Preciso que cuide de Henry.

Eu não conseguia respirar. Ele estava partindo, e eu nem mesmo entendia direito por que. Não tivemos tempo de conversar, de compreender, e ele já estava se despedindo. Um medo irracional começou a se formar em meu peito e eu senti o ar ficando cada vez mais rarefeito. Pronunciei aquelas palavras antes que elas me sufocassem.

— Você vai voltar, não vai?

— Eu sempre volto, Caroline. Eu sempre volto.

Eu fiquei ali, no exato local onde ele me deixara, enquanto observava ele entrar no carro e partir, com vários híbridos o seguindo. Quando já não conseguia mais ouvir o som do carro na estrada, voltei para o meu quarto.

Deitei em minha cama, sentindo como se eu não tivesse acordado, esperando que a qualquer momento eu acabasse percebendo que tudo fora só um sonho e que Klaus ainda estava deitado ao meu lado.

Mas ele não estava. Eu abracei meu travesseiro e ele pareceu diferente. Não mais confortável e macio, mas sim feito da mais pura e dolorosa solidão. Ele pesava como uma pedra em meu coração.

**********

Nos primeiros dias me mantive ocupada com Henry, tentado ignorar o clima nada agradável que havia se instalado na casa. Victor não passava de uma sombra que eu só via esporadicamente e por poucos segundos. Ele parecia ter abdicado da casa para que ela pudesse nos acomodar mais confortavelmente.

Alexia parecia estar de férias. Eu ficava com Henry a maior parte do tempo, tentando me manter distraída, mas também tentando deixá-lo mais confortável. Ele não se adaptara muito bem ao novo ambiente, e um rosto conhecido parecia acalmá-lo. Klaus havia transformado nossa antiga casa em uma perfeita bolha de calma, amor e segurança para Henry. De repente, ele se viu em um novo ambiente, com mais pessoas o cercando, e apenas alguns de seus brinquedos favoritos estavam com ele. A energia conturbada daquela casa estava afetando seu sono, deixando-o irritadiço, o que consequentemente tem afetado sua alimentação.

A presença dos híbridos se tornou algo constante, e por mais que eu tentasse, nunca passou despercebida. Cada passo meu era vigiado, cada suspiro era analisado e cada intenção de sair era proibida. Com um pouco de persuasão eu os convenci de que o jardim era perfeitamente seguro, e que Henry precisava de um pouco de sol. Contudo, logo no primeiro passeio ele ficara muito irritado e chorou sem parar, acalmando-se imediatamente após voltarmos para dentro da casa. Logo, passei a fazer esses pequenos passeios “sozinha”. Havia híbridos patrulhando até mesmo o telhado. Sozinha era uma palavra impossível de ser aplicada em qualquer sentença deste contexto.

Seis dias haviam se passado. Seis dias em que dormi e acordei sozinha. Seis dias que mantive meu celular em meus bolsos o tempo todo, esperando por alguma notícia, algo que pudesse me dizer que Klaus estava bem. Seis dias de um completo isolamento silencioso.

No meio da tarde Henry adormeceu, e eu aproveitei para caminhar pelo jardim. Fui até um pequeno declive próximo ao canteiro de margaridas, e sentei-me na grama, observando a floresta ao redor, certa de ela escondia vários híbridos.

­­— Um paraíso de silêncio no meio de um inferno de confusão. – disse Elijah, caminhando em minha direção.

— O que? – virei em sua direção, mas ele foi ofuscado pelo sol, obrigando-me a proteger meus olhos.

— É assim que vejo esse lugar. – disse ele, sentando-se ao meu lado. – Algo a incomoda, Caroline?

— Este silêncio. Klaus partiu há tanto tempo e não deu notícias desde então. – confessei.

— No news is good news, right? – ele sorriu. – Acredite, não há nenhum motive para você se preocupar. Eu tenho certeza que ele conseguirá lidar com esta situação.

— Como você pode ter certeza?

— Bem, se eu não tivesse certeza disso certamente eu não estaria aqui falando com você agora, mas sim lutando ao lado dele. Aliás, eu não acredito que ele esteja realmente lutando, no sentido violento da palavra.

— New Orleans não é necessariamente pequena, Elijah. Dominá-la em alguns dias? Você não acha isso um tanto pretensioso, talvez até impossível?

Essa dúvida dançava em minha mente desde que Klaus partira. Eu temia que ele se lançasse em uma guerra perdida, em uma batalha desnecessária. No fundo eu não entendia a obsessão que ele tinha com essa cidade, e não sabia o quão longe ele estava disposto a ir para dominá-la.

— Não. – disse Elijah arrancando-me de meus devaneios. – Poder não significa dominar todos os seres que chamam New Orleans de lar. Poder significa dominar as pessoas certas. Klaus não está lutando, Caroline. Ele está jogando xadrez. Tudo se trata de saber qual peça descartar e qual peça conquistar.

— O que me preocupa Elijah, é que uma peça conquistada nunca muda de cor.

Ele me olhou, intrigado.

— E por que você vê isso como um problema?

— Você acha que Klaus sabe quais peças descartar e quais conquistar? – minha voz saiu mais baixa e apreensiva do que eu gostaria.

Elijah sorriu e deixou de olhar para mim, para então fitar o horizonte, como eu fazia.

— Eu conheço meu irmão por tempo suficiente para garantir que, se ele não soubesse, ele não estaria jogando. E mesmo que ele não soubesse, Caroline, eu lhe garanto que ele sabe quais peças ele não quer perder.

Deixei que as palavras de Elijah flutuassem no silêncio entre nós dois, aterrissando suavemente na grama, esperando que eu as aceitasse.

— Eu vou sair por algumas horas. Você estará segura aqui. – disse ele.

— Vai visitar Katherine? – perguntei.

— Sim.

Nos últimos dias Elijah tem visitado Katherine com frequência, sempre tendo o cuidado de transitar pela cidade sem ser notado, evitando atrair olhares curiosos para esse local afastado.

—Ela está segura, eu mesmo garanti isso. Ninguém sabe que ela está em New Orleans e ninguém conseguiria chegar perto dela. Mas ainda assim, ela não está protegida de si mesma. – ele disse, parecendo cabisbaixo.

­— Como ela está lidando com essa humanidade recém adquirida? – perguntei, genuinamente curiosa.

— Não tão bem quanto eu esperava, mas de maneira compreensível. – Elijah assumiu aquele ar teatral, levemente superior, que ele sempre assumia quando se prepara para explicar algo complexo. – Katerina não sabe como lidar com a humanidade, afinal, ela nunca precisou fazer isso em quinhentos anos. Sua autoconfiança foi construída baseada em suas vantagens, seus dons como vampira. Ela não sabe lidar com as dificuldades mundanas, e muito menos com o conceito de mortalidade.

­— Ela se sente vulnerável. – resumi. Realmente, era compreensível. Mas eu não consegui fazer com que Katherine ocupasse minha mente por mais de alguns segundos.

— Eu voltarei logo. – disse Elijah, levantando-se. – Tentarei descobrir alguma coisa na cidade sobre progresso de Klaus.

— Não se apresse, Katherine precisa de você. Nós ficaremos bem. – eu disse, incluindo Henry na afirmação.

Observei Elijah se afastar, um tanto comovida pela preocupação dele para com alguém que era considerada persona non grata por tantas pessoas. Katherine destruíra muitas vidas e manipulava qualquer pessoa se fosse uma mera marionete. Ela deixara raiva e mágoa em muitos corações, mas não no de Elijah. O coração dele parecia incapaz de guardar emoções tão corrosivas.

Deixei que meus pensamentos vagassem por aí, tentando imaginar o que estava acontecendo com Klaus neste exato momento, desejando que ele estivesse ao meu redor. Desejando que nossa vida tivesse seguido um rumo diferente, mais tranqüilo e sem tantas ameaças.

Quando o sol começou seu lento declínio no horizonte, ouvi o choro de Henry e voltei para dentro. De nada adiantava imaginar como tudo poderia ter sido. O passado é tão implacável quanto o presente.


**********

A noite sempre era a pior parte. A escuridão se infiltrava pelas frestas das portas e janelas e tomava conta da casa toda, e nem todos os lampiões e velas de Victor conseguiam combater os cantos escuros e ameaçadores que se formavam em minha mente.

Hoje Henry se alimentara melhor, apesar de eu ter insistido que ela aceitasse a comida, o que me deixou muito preocupada. Eu nunca precisei insistir. Comentei com Alexia que deveríamos consultar um médico, mas ela disse ter certeza que ele só precisava se adaptar à nova situação, e que quando isso acontecesse, tudo voltaria ao normal.

Agora ele dormia profundamente em meus braços, como não dormia desde que chegamos aqui. Eu o mantive próximo à lareira, que fora acessa devido ao frio que a noite trouxe consigo.

— Caroline. – sussurrou Alexia, entrando na sala.

— Sim?

— Eu estou indo dormir. Você quer que eu leve Henry para o berço? – ela falava baixinho e pisava cadenciadamente.

— Sim, por favor. Use um cobertor extra esta noite, Alexia. - instrui.

­ — É claro. – disse ela, tomando Henry de meus braços. – Boa noite, Caroline.

— Boa noite, Alexia.

Quando ela alcançou o alto da escada, um híbrido entrou na sala de maneira intempestiva. Eu não o tinha visto até então. Eles se revezavam para proteger a casa, então os rostos mudavam constantemente, mas algo me dizia que eu o reconheceria se já o tivesse visto.

— Fogo. Ótima ideia. – disse ele, se deixando cair pesadamente na outra poltrona, próxima à minha.

— E você é...? – indaguei.

— Tony, mas pode me chamar de macho alfa. – ele tirou os tênis surrados que usava, chutando-os para longe, e deixando os pés mais próximos à lareira.

­— Eu sou ...

— Caroline. Namorada do vampiro original, donzela em perigo e mãe nas horas vagas. – ele disse, interrompendo-me. – Sei quem você é.

— Então você está em vantagem. – eu respondi, um tanto aborrecida com o tom de voz dele.

— Não me surpreende que você não saiba quem sou. Mas eu sei tudo sobre você, afinal, meu bando não está aqui à toa. – ele abriu os braços, gesticulando para o vazio, como um rei exibindo a extensão do seu reino. – E além disso, Tyler não consegue calar a boca quando bebe.

Congelei. A menção do nome de Tyler me pegou de surpresa. Eu havia esquecido que ele havia ajudado todos esses híbridos a quebrar o vínculo de ligação com Klaus.

— Você passou muito tempo com ele? – perguntei, tentando parecer casual.

— O suficiente. Não foram exatamente férias no Caribe, se é que você me entende. – ele deu uma risada sombria.

Sim, eu entendia. Lembrei-me de quando fiquei ao lado de Tyler em sua primeira transformação, e vira de perto o quão doloroso fora tal experiência. Eu nem conseguia imaginar aquilo se repetindo inúmeras vezes em sequência.

— Pelo menos a dor tinha um propósito. – falei, mais para mim mesma do que para Tony.

­ — Isso não facilita as coisas, loira. – ele disse, não rindo mais.

— Onde estão os outros?

— Vigiando. Por quê?

Parei por alguns segundos. Esses híbridos nem mesmo me conheciam, e estava ali, vigiando e protegendo a mim e Henry dia e noite. Por que eles se arriscariam para nos ajudar?

— Por quê? – perguntei, genuinamente curiosa.

­— Sério? Uma semana de exílio e você ainda não entendeu? – ele zombou.

— Não foi isso que eu quis dizer. Eu quero saber por que você está aqui me protegendo? Protegendo o bebê? O que você ganha com isso?

Não me importei se o estava ofendendo ou não. Tony parecia o tipo de pessoa que faz boas ações simplesmente pela bondade em seu coração.

— Eu não faço isso por você, loira. Faço isso pela cidade. – ele ficou taciturno.

Bem, New Orleans com certeza sabia como ser encantadora.

— Há muito tempo, nós comandávamos esta cidade. Ela já foi nosso lar. – Tony olhava fixamente para o fogo crepitante como se visse as imagens se desenvolvendo nele, todo e qualquer traço de humor desaparecera. – Até que fomos expulsos, marginalizados. Eu não me importo se você vai viver para ver outro dia nascer, ou se a criança vai ser um advogado ou um drogado. Eu me importo com New Orleans.

— Então porque está ajudando Klaus? – perguntei, nem um pouco surpresa com a agressividade de suas palavras.

— Ele é o lado vencedor. Ninguém vence uma guerra sem aliados.

Ele era tão obcecado quanto Klaus, eu via isso agora. Então como eles acabaram se tornando aliados?

—Mas quando isso acabar, o que você irá ganhar?

Tony olhou para mim e permaneceu em silêncio por alguns segundos, como se precisasse elaborar a resposta em diferentes línguas e escolher qual soava melhor antes de pronunciá-la. Mas antes que ele tivesse a chance de responder, Elijah abriu a porta, retornando de sua visita à Katherine.

— Elijah! – eu o saudei. Ele olhou intrigado para Tony e então para mim, e acabou decidindo ignorar o híbrido descalço e disse:

— Boas notícias, Caroline. Este jogo está chegando ao final.

Eu sorri abertamente, incapaz de formular qualquer resposta. Elijah parou ao lado de Tony, com um chamado implícito para que ele o seguisse. Tony, relutante, calçou seus tênis e seguiu Elijah em direção à cozinha, enquanto eu seguia para o meu quarto.

Naquela noite meu sono foi muito tranquilo, perfeitamente descansado em um travesseiro preenchido com esperança.


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Notas finais do capítulo

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