The Amazing Spider-Man escrita por Leinad Ineger


Capítulo 34
Capitulo 34 - Mysteriis


Notas iniciais do capítulo

Outro vilão do passado do Homem-Aranha retorna para tornar a vida de Peter Parker ainda mais complicada! Mas o que ele não sabe é que, dessa vez, o herói aracnídeo está sendo observado...



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Entre a Rua 34 e a Quinta Avenida, ergue-se um dos maiores monumentos à capacidade de superar limites da humanidade. Um colosso de quatrocentos metros de altura e trezentas mil toneladas, reinando absoluto sobre Manhattan: o edifício Empire State.

Desde a queda das Torres Gêmeas, em 11 de setembro de 2001, o Empire State voltara a ser o maior arranha-céu de Nova York. Seus números impressionam. Desenhado de cima para baixo pelo engenheiro Gregory Johnson em apenas duas semanas, foi construído em 14 meses por um exército de três mil homens. Até sua inauguração, em 1° de maio de 1931, viu 14 de seus operários morrerem, despencando do alto de seus 102 andares. Seus 10 milhões de tijolos, 73 elevadores, 6,5 mil janelas e 58 mil toneladas de aço, sustentados sobre pilares escavados a 10 metros de profundidade no leito de granito de Manhattan, recebem 2,5 milhões de visitantes por ano, que chegam a pagar 30 dólares para ir até o mirante no 102° andar, de onde se vê a uma distância de 125 km. Os transformadores no porão e no 84° andar são suficientes para alimentar uma cidade de 11 mil habitantes por um ano. O ar é renovado a cada seis horas e um poderoso equipamento bombeia água gelada para os aparelhos de ar condicionado desde o porão até o último andar. Sede de 14 redes de TV e 20 estações de rádio, conta com, além do mirante no 102° andar, com outro no 86°. O projeto de um atracadouro para dirigíveis, contudo, não se mostrou funcional após uma série de testes devido às fortes correntes de ar de baixo para cima que o próprio edifício causa. As estruturas foram mantidas, mas o projeto deu lugar à instalação de uma antena difusora em 1952.

Ao longo dos anos, mais de trinta pessoas cometeram suicídio pulando do alto do edifício. O primeiro ocorreu antes mesmo do final das obras e o último em 2007.

– Hoje é a minha vez – pensou Thomas Davies.

Após anos trabalhando em um escritório de auditoria, sentiu sua vida entrando numa espiral que o levara àquele momento, no mirante do 102° andar. Eram quase oito da manhã, ainda não havia turistas e ele conhecia cada funcionário do lugar. Cada um de seus segredos, suas mentiras. Sabia até o que diziam dele pelas costas. “Corno”, eles diziam. “Burro, incompentente”.

“Fracassado”.

Aspirou o ar matutino de Nova York uma última vez, enquanto o sol tocava suas lágrimas gentilmente. Seria uma longa queda. Pensaria em tudo no... caminho. Daria adeus a tudo que conhecia. Lá embaixo, não haveria dor. Tudo acabaria. O coração parecia querer explodir dentro do peito, nunca transpirou tanto em toda sua vida. A sensação de dor e vazio era ainda maior diante da morte. Suas mãos tremiam, incertas do que deveriam fazer. Resolveu não pensar mais e pulou a grade. Pensou em dizer suas últimas palavras, mas ninguém as ouviria. Era tudo em vão.

Por breves segundos, sentiu como se voasse. Foi uma sensação maravilhosa, a última coisa boa que sentira. Quando deu por si, estava no chão de um escritório, que não era o seu local de trabalho.

– Onde... Onde estou!?
– Imbecil! Você quase arruinou meu plano! O que pensou que estava fazendo, seu idiota!?
– Eu... Eu só queria...
– Se matar, não é mesmo!? Seu verme inútil! Por sua causa, quase tive que desistir de meu maior plano! Meses de pesquisa, de planejamento... Mais alguns segundos e você teria arruinado tudo! TUDO!
– Quem... Quem é você?
– Você não queria morrer, seu idiota? Não foi por isso que você pulou? Pra conhecer a morte?!
– Não... Por favor...

O tiro desmanchou o crânio de Thomas. A dor acabou. Todo o sofrimento acabou.
– Odeio sujar as mãos – disse seu assassino, enquanto se retirava da sala.

Nas ruas, as pessoas paravam maravilhadas, se perguntando o que estava acontecendo. Talvez fosse a gravação de um filme, ou uma peça publicitária diferente de tudo que já tinham visto.

Mas desde o 11 de setembro, a população de Nova York estava acostumada a não esperar coisa boa quando seus monumentos eram atacados. Aquilo era apenas... surreal demais.

O Empire State continuava lá, mas o 4°, 8°, 15°, 16°, 23°, 42°, 52°, 68° 72°, 84°, 86°, 90° e 94° andares tinham desaparecido. O edifício continuava de pé, inabalável, com enormes vãos onde deveriam estarescritórios comerciais de algumas das maiores empresas do mundo. No 52°, uma reunião de cúpula da prefeitura acontecia. No 72°, o corpo sem vida de Thomas Davies era a única testemunha da identidade do homem que roubou 13 andares do maior edifício de Manhattan – deixando o restante do prédio intacto. Mas ele não fazia questão de se esconder.

O homem chamado Mysterio tinha um pronunciamento a fazer.

Enquanto isso:

Peter chegou alguns minutos atrasado para o trabalho. Não que isso fosse problema, sabia que o salário não seria descontado. Apenas se achava novo demais na polícia para já chegar atrasado. As noites que passava combatendo o crime como o Homem-Aranha sempre lhe traziam problemas em seus empregos. Houve uma época em que, ao menos, poderia tirar fotos e vendê-las como freelance ao Clarim. Mas esse tempo tinha passado. Agora precisava se concentrar ao máximo em seu novo emprego. Queria impressionar os colegas, mostrar dedicação e afinco como nunca tivera a oportunidade antes. Sentia-se mal ultimamente. Era a sensação de não estar conseguindo se fazer entender quando vestia o uniforme negro do herói aracnídeo. Mas ali, dentro de um laboratório, podia mostrar valor. Podia recuperar cada pedaço perdido de sua vida, recomeçar e reconstruir.

Mas, mesmo ali, seu passado o assombrava. Mesmo quando seguia em frente, os fantasmas se interpunham em seu caminho. Não havia uma só noite em que não pensasse nela, não havia um momento de sua vida em que fosse capaz de esquecer o brilho nos olhos dela toda vez que ela dizia eu te amo.

Gwen Stacy.

Tinha passado por muita coisa desde a morte de sua alma-gêmea, muitas mulheres, muitos amores. Mas nenhum foi tão doce quanto o dela, nenhum beijo foi tão apaixonado, nenhuma noite foi tão mágica. E mesmo ali, anos depois, com um novo emprego e tentando levar uma nova vida, algo parecia lhe dizer que a lembrança de Gwen jamais se afastaria dele.

Um de seus novos colegas de trabalho era Samuel Stacy. Seu pai era primo do Capitão Stacy, o pai de Gwen. Uma vida dedicada à polícia parece não ser o bastante para a família Stacy, afinal. Peter tentou se aproximar de Sam Stacy algumas vezes, mas o especialista em impressões digitais do laboratório da polícia não partilhava do entusiasmo de seu colega, ou fingia não se importar. E, claro, havia Marianne Potter.

Os cabelos negros pendiam dos ombros de maneira provocante. Ela nunca soltava o cabelo dentro do laboratório, mas ela parecia especialmente encantadora naquela manhã. Ela parecia encantadora em todas as manhãs, mas Peter estava com a cabeça sempre voltada para o passado.

– Mari, eu soube que amanhã é aniversário do Sam. Que tal se a gente preparasse alguma coisa?
– Bom, a equipe do laboratório é pequena, mas a gente sempre compra um presente ou faz uma happy hour. O que você tem em mente?
– Sei lá, talvez aparecer de surpresa no apartamento dele.
– Oxi!
– É, a gente passa o dia ignorando o fato de que é aniversário dele e, à noite, a gente aparece lá com uma festa surpresa.
– Parece bacana. Esse tipo de surpresa deve ser bastante comum na sua comunidade, não?
– No Queens? Bom, eu vejo esse tipo de festa surpresa em todo lugar.
– Não, eu quis dizer na comunidade gay.
– ...
– ...
– ...
– Deixe-me adivinhar: você não é gay.
– Nem de longe.
– Ai, meu Deus, que vergonha!
– Ei, tudo bem...
– Não, não está tudo bem, é que você só fala em “Sam Stacy pra cá”, “Sam Stacy pra lá”, “Sam fez isso”, “Sam estava não-sei-onde” e o Sam é gay, não sei se você sabe, daí eu pensei que era um azar danado me interessar por um colega de trabalho que não só é gay como também se interessou por outro colega de trabalho e...
– Como é?
– Ai, meu Deus!

Mari saiu quase correndo de dentro do laboratório, deixando Peter para trás com uma expressão do tipo que a gente faz quando houve uma notícia muito boa no meio de um velório e não pode comemorar pra não ofender o luto dos presentes. Então, ela “se interessou”? Como pôde ser tão cego a ponto de não perceber isso?

Precisava aprender de uma vez por todas que a vida só pode ser compreendida olhando para trás. Mas deve ser vivida olhando para frente.

Antes que tivesse a chance de ir atrás dela, porém, seu outro colega de laboratório, Michael Moran, chegou afobado e ligou a TV:

– Gente, deu merda! Deu merda!
– Michael, do que você...
– Vê isso!

O noticiário estava sendo transmitido ao vivo, direto do Empire State. A polícia já tinha feito barricadas isolando o prédio. A cena era surreal:

... A polícia ainda não tem pistas sobre o responsável pelo desaparecimento de 13 andares inteiros do Edifício Empire State. Repetindo: treze andares do Edifício Empire State simplesmente desapareceramessa manhã. A assessoria de imprensa do edifício descartou a hipótese de alguma estratégia de marketing estar em andamento no local, e a polícia não acredita que terroristas estejam envolvidos. Até o momento, a única informação confiável é de que o prefeito Michael Bloomberg e uma grande equipe de membros do Partido Republicano estavam reunidos no 52°, quando...

– O prefeito Bloomberg? Mas não foi nessa reunião que...
– Sim... O Dr Eisner está lá!

A Quinta Avenida:

As equipes da polícia e da SWAT já estavam posicionadas ao redor do Empire State, tentando manter repórteres e curiosos afastados, quando Michael Moran, Sam Stacy, Mari Potter e Peter Parker chegaram. Agora que era um detetive da polícia, Peter surpreendia-se com a facilidade que tinha para acessar os lugares em que de fato precisava estar.

O olho do furacão.

Para quem já tinha visto desde invasões alienígenas até mortos que voltaram do túmulo, Peter ficou surpreso com a cena. Para não dizer fascinado. Vários andares do edifício simplesmente estavam suspensos no ar, com grandes espaços vazios entre eles, onde deveriam estar os andares “roubados”. Era como se o Empire State não tivesse dado ainda pela falta de alguns de seus andares. Os vãos que se formaram criavam correntes de ar violentíssimas, que mantinham os helicópteros longe, mas da rua tinha-se a impressão de que um helicóptero poderia voar pelo meio do prédio tranqüilamente.

Peter precisava descobrir se a teoria condizia com a prática.

– O que vamos fazer?
– Nosso trabalho, Parker. Procurar pistas.

“Esse é o seu trabalho, Stacy”, pensou Peter. “O meu é resolver o que a polícia não consegue.”

Dito assim, parecia fácil, apesar de bastante impactante. Mas ele ainda precisava encontrar um lugar para trocar de roupas e subir por conta própria até o topo do edifício. Resolveu conversar com um dos membros da SWAT que estava ali, monitorando a situação com um laptop.

– Alguma notícia do prefeito Bloomberg?
– Nada – respondeu ele, sem se virar. - Não conseguimos entrar em contato com os telefones dos andares que estão faltando, nem com os celulares das pessoas que estavam neles. Conseguimos falar com todo mundo até o terceiro andar. Mas o quarto é um dos que sumiram e, daí pra cima, as comunicações estão cortadas. Quem está lá em cima não está conseguindo descer pelas escadas, muito menos pelos elevadores.
– Eles têm eletricidade?
– Não, a refrigeração não funciona e o ar não está sendo renovado. Deve estar um inferno praquelas pessoas lá em cima. Mas o pior é não fazer idéia do que aconteceu com quem estava nos outros treze andares.
– Algum suspeito?
– Você é o detetive, amigo. Que tal me dizer?
– Extra-oficialmente? Eu tenho um palpite.
– Sério? E quem...?

Quando o policial se virou, o “detetive” não estava mais lá.

– Tem gente que se acha muito esperto – resmungou ele, enquanto continuava verificando a planta do edifício em seu laptop.

Peter já tinha se esgueirado para dentro do prédio, procurando algum lugar no saguão de onde pudesse entrar e sair sem ser visto. Seu Sentido de Aranha o avisava da presença de câmeras que pudessem denunciá-lo. Resolveu seguir um corredor até a sala da segurança do prédio. Vários policiais olhavam para os monitores do prédio, tentando descobrir como apenas alguns andares poderiam estar faltando. As imagens dos monitores eram apenas estática e barulho branco nesses andares. Peter começou a verificar um terminal de computador enquanto todos trabalhavam. Foi até uma porta dos fundos e descobriu um grande almoxarifado ligado diretamente ao terminal de carga e descarga no subsolo. Era exatamente o que precisava.

O uniforme negro do Homem-Aranha parecia uma sombra criando vida.

Começou a escalar o prédio pela parte externa do terminal, aos gritos de “vejam, é o Homem-Aranha!”

Ao redor de Nova York:

Dois velhos amigos:

– Sou eu. Ele está com problemas.
– Acha uma boa idéia intervirmos?
– Ele pode lidar com a situação. Mas precisamos lidar com ele.

Dois homens tentando descobrir a coisa certa a fazer:

– Mitch! MITCH!
– O que...?
– Mitch, liga a TV!
– Bradbury, o que você pensa que...
– Liga a TV, caralho! Liga a TV, caralho!
– Tá bom, tá bom... Mas você devia...
– Cala essa boca e assiste!

Os dois ficaram por alguns segundos diante da TV, absorvendo cada informação.

– O que você acha?
– Se for algum equipamento eletrônico, eu posso descobrir e desligar.
– Tá esperando o quê, então!?

– Essa é a minha chance... Ele certamente vai estar lá... Talvez eu possa...

De volta ao Empire State:

O Homem-Aranha rapidamente escalou o terceiro andar, chegando ao vão livre onde deveria estar o quarto. Ele podia enxergar do outro lado, sem dúvida não era um truque feito com espelhos e fumaça. Se era realmente seu velho inimigo, aquele era um truque novo – e muito bom.

Lentamente, aproximou a mão direita do local onde deveria continuar a parede do edifício.

Ela não estava lá.

Podia andar livremente pelo vão livre, o edifício continuava suspenso sobre sua cabeça mas o Sentido de Aranha não identificava nenhum perigo. Estava de pé, com milhões de toneladas de aço e concreto sobre sua cabeça.

Resolveu continuar escalando.

Era um longo caminho rumo ao topo. Começou a usar as teias para ir mais rápido. Passou pelo 8° andar, o vão maior onde deveriam estar o 15° e o 16°. Tubulações cortadas, os poços dos elevadores, fiações interrompidas. O 23°, o 42° e, finalmente, o 52°, onde o Dr Eisner deveria estar reunido com o prefeito. Não havia nada ali.

Nenhuma pista, nada que pudesse indicar o paradeiro daquelas pessoas. Quanto tempo levaria até que ele se mostrasse? O que queria dessa vez?

Foi quando seu Sentido de Aranha finalmente começou a dar sinais de perigo. Não uma ameaça de morte, mas de confronto iminente contra um agressor. Alguém estava oculto nas sombras do vão livre, alguém que já esperava a chegada do Homem-Aranha. No instante seguinte, viu-se sendo arremessado para fora do vão livre, de encontro ao chão, 51 andares abaixo!

Não teve dificuldades em usar suas novas teias orgânicas para tentar se fixar no prédio novamente. Contudo, com a velocidade da queda, elas foram em direção ao vão livre do 42° andar. Novamente, sentiu um tranco e continuou sua queda livre.

Inconsciente.

Em direção ao solo.

Nos recônditos de sua mente, a risada de Mysterio ecoava, maliciosa, vingativa.

E assim por diante...

Era uma visão espetacular. Digam o que for, mas era espetacular. Não havia palavras para descrever. Treze andares inteiros do edifício Empire State simplesmente desapareceram, deixando vãos livres enquanto a estrutura insistia em se manter ereta.

Como se nada faltasse.

Como se tudo aquilo fosse natural.

E a ordem natural das coisas continuava sendo alterada, enquanto o Homem-Aranha voava em direção ao solo, inconsciente. Seu Sentido de Aranha não identificara o menor sinal de perigo. Tinha andado pelos vãos livres entre os andares e tudo parecia normal – exceto, claro, pelo fato de os andares terem desaparecido. A polícia tentava conter a aglomeração de curiosos nas ruas, enquanto tentava o contato com as pessoas nos andares mais altos, impossibilitadas de usarem escadas ou elevadores.

E ele caía, rapidamente.

Abriu os olhos lentamente, tentando entender o que estava acontecendo. Como por reflexo, as teias saíram de seus pulsos, finas a princípio, estourando assim que tocavam a parede. Mas isso era apenas para retardar sua velocidade, impedindo que a parada brusca arrancasse seus braços. Aos poucos, mais e mais fios de teia foram sendo lançados, até que ele tivesse o suficiente para deter a queda e se balançar entre os edifícios da Quinta Avenida. Parou num prédio próximo e ficou observando, tentando entender como aquilo podia ser possível. Como alguém poderia roubar treze andares aleatórios de um edifício e ainda mantê-lo de pé.

Claro, fora Mysterio. Isso, ele sabia muito bem. Mesmo com seu Sentido de Aranha não dando o alerta, ele reconheceria aquela capa, a ridícula roupa verde com o aquário na cabeça e a gargalhada de Quentin Beck. Mas isso superava de longe todos os feitos do vilão em anos anteriores. Como todos os outros malucos da “galeria de vilões” do Aranha, Mysterio podia passar anos sem dar as caras, tempo suficiente para Peter julgá-lo aposentado ou morto, até que ele voltava com um plano megalomaníaco qualquer. Era sempre assim com os vilões.

Eles nunca morriam de verdade, nunca se aposentavam de verdade.

Sempre voltavam pra mais.

Foi quando as luzes começaram a se dobrar sobre as sombras nos vãos livres, os andares que faltavam. A visão do prédio parecia turva, como se estivesse saindo de foco. A imagem de Mysterio apareceu nos vãos de cada um dos treze andares, nos quatro lados do edifício, falando em alto e bom som para toda Manhattan:

Boa tarde, Nova York. Boa tarde. É um prazer revê-la. Devo admitir, contudo, que não tenho intenção de tornar esta nossa pequena soirée o tipo de ocasião que vocês gostariam de se lembrar. Como podem, ou não, ter notado, treze andares de seu maior edifício estão em meu poder. Com eles, alguns dos políticos, empresários e mais proeminentes cidadãos da cidade e da América. Vocês têm meia hora para me dar um bilhão de dólares, ou jamais os verão novamente. Eu não vou avisar novamente, eu não vou renegociar. Meia hora. É tudo que vocês têm para conseguir o dinheiro. Obrigado.

As imagens voltaram a desvanecer. A cidade atônita ficou entre o espetáculo e a ameaça, tentando decidir qual deveria ser o foco de sua atenção.

Ninguém saiu de frente do Empire State. Já próximo ao chão, o Homem-Aranha começou a avaliar suas opções.

Enquanto isso:

– Vocês viram o Peter?

Sam Stacy e Mike Moran não se deram ao trabalho de virar a cabeça para responder. Apenas disseram “não”, de maneira contida, deixando claro que tinham coisas mais importantes para se preocupar do que o paradeiro de seu novo colega. Mari Potter se afastou, tentando não pensar em Peter ou no fora que tinha dado, momentos antes, ainda no laboratório da polícia. Achou que Peter fosse gay. Pior que isso, disse a ele com a maior naturalidade possível. A única coisa pior do que se apaixonar por um colega da polícia era pensar que ele era gay e estar enganada.

Não, eu não quis dizer “me apaixonar”. Eu apenas acho Peter...

Não conseguia definir. Estava interessada, é verdade. Mas, justamente quando estava começando a aceitar a idéia de que Peter ia acabar tendo um caso com Sam Stacy, ele...

Bom, era muita sorte. Afastou-se dos colegas com um meio-sorriso e foi em direção à rua, tentando conseguir um ângulo melhor para ouvir o “pronunciamento” de Mysterio. Foi quando uma ruiva alta bateu em seu ombro:

– Com licença... Você é da polícia, não é?
– Sim, eu... Eu conheço você...
– Você conhece Peter Parker? Ele está com vocês?
– Você... Você é Mary Jane Watson, a modelo... A atriz, não é mesmo?
– Sim, eu... Você viu Peter?
– Ele está conosco sim, mas não sei onde ele está agora. Talvez esteja dentro do prédio. Como... De onde vocês se conhecem?
– Eu costumava ser a mulher dele.

Mary Jane inclinou a cabeça para o alto, para ouvir o discurso de Mysterio. Mari Potter ficou encarando aquela bela ruiva, mais bonita do que qualquer outra mulher podia aspirar ser. E Peter fora casado com ela. Claro! Por algum tempo, ela assinou como Mary Jane Watson-Parker. Por algum tempo, Peter foi casado com uma das modelos... Com a atriz mais... Com...

É muito azar, pensou Mari. Quem já foi casado com Mary Jane Watson nunca vai querer algo comigo. Ela é linda e se preocupa com ele. Quem, afinal, é Peter Parker?

O que ela não sabia é que, naquele instante, Mary Jane mal podia ouvir o que Mysterio estava dizendo. Tudo que importava para ela era o pensamento em sua cabeça: Ela o chamou de “Peter”. Talvez estejam saindo. Ela é linda...

Peter continuava olhando para os vãos do edifício. Tinha andado por eles, podia ver o que tinha do outro lado, as escadas, tubulações, fossos e paredes entrecortadas. Mas havia algo, uma sensação estranha. Tentou escalar o edifício vizinho, onde estava, e sentiu uma vertigem. Isso não era muito comum. Foi quando viu o Grande Máquina se aproximar voando no horizonte, em alta velocidade, e dar a volta no edifício, próximo a um dos vãos. Pensou em chamar sua atenção de alguma forma, retomou o foco e disparou uma teia em direção ao Empire State, indo se fixar entre o qüinquagésimo-segundo e o sexagésimo-oitavo andar. Grande Máquina o viu ali e interrompeu a trajetória do seu jato, planando próximo ao Aracnídeo:

– Homem-Aranha... Um pouco cedo pra você, não?
– Um pouco cedo para roubarem prédios... Viu o discurso do seqüestrador?
– Sim, um velho conhecido seu, eu presumo. Sempre curti o aquário na cabeça.
– Poizé, não consigo me livrar dos meus karmas. Ele exigiu um resgate de um bilhão de dólares pra devolver o que roubou, além das pessoas que estavam no prédio.
– Acha que ele pode cumprir a ameaça?
– Considerando o que ele fez com o prédio... O que você acha?
– Bom, eu acabei de voar por dentro do vão e... É impressionante. Não sei o que dizer. Meu poder pode localizar equipamentos eletrônicos que estejam fazendo isso, mas não tem nada parecido, pelo menos nada que esteja causando isso.
– Você não passou pelo vão.
– Como é?
– Você não passou pelo vão. Eu vi você chegando. Você deu a volta ao redor do prédio, e não passou por dentro dele. Eu estava naquele prédio – disse, apontando para o outro lado da Quinta Avenida – e usei minha teia pra chegar até aqui, cobrindo duas faces do Empire State. Você continuou vindo numa trajetória parecida com a minha, dando a volta.
– Aranha, sem querer ser chato... Mas eu vi os...
– Os pisos, tetos, tudo que está faltando. Eu sei. Mas tem algo errado. Eu estava do outro lado e vi você chegar, circulando o prédio. Quando eu estava lá, o Mysterio me chutou pra fora, mas eu não o vi direito. Depois senti uma vertigem estranha, perdi a noção de direção por alguns instantes. Acho que ele está fazendo algo com nossa percepção. Ele não roubou nada!
– Isso explicaria muita coisa. Mas, se não podemos confiar em nossos sentidos, o que vamos fazer?
– Precisamos de uma planta do prédio.
– Eu tenho.
– Como assim, “eu tenho”?
– Quando não estou... fazendo isso... Eu sou engenheiro, sabe? Conheço um pouco do Empire State. O que você precisa saber?
– Os andares que ele roubou... O que tinha neles?
– Bom... Escritórios, o mirante no 102°... Os transformadores no 84°...
– É isso! Ele deu um jeito nos transformadores, por isso o prédio não tem energia pros elevadores, nem comunicação! Mas isso não explica os celulares...
– Talvez um pulso eletro-magnético esteja interferindo nas comunicações.
– Isso é possível?
– Difícil, mas é possível sim. Todo mundo está tentando ligar para quem está dentro do prédio, mas as comunicações na rua continuam funcionando. Então acredito que o problema esteja só dentro do prédio. Quem estava do terceiro andar pra baixo conseguiu sair. Mas isso não explica como o tal Mysterio está mantendo todo o resto dessas pessoas dentro do prédio.
– O que quer que esteja nos mantendo fora, está mantendo essas pessoas dentro, então. Alguma idéia de como ele pode ter conseguido isso?
– Várias. Interferência eletromagnética. Curto-circuito. Mas isso não explica como ele “sumiu” com andares inteiros do prédio.
– É possível que ele tenha usado o mesmo processo tanto pras pessoas que estão dentro como pras que estão fora do prédio. O que mais está faltando? O que tem nos outros andares?
– Estações de TV, de rádio... Todas estão fora do ar. Eu chequei no caminho pra cá. Ei, Aranha... Notou como as paredes do prédio estão molhadas?

De fato, uma fina garoa se formava ao redor do edifício. Do tipo que, olhando contra a luz, formava arco-íris e ilusões de ótica. O Homem-Aranha passou a ponta dos dedos pela parede do prédio e notou que o líquido tinha coloração alaranjada e um leve odor cítrico.

– Isso não é água. É mescalina! Isso afeta o cérebro, talvez alguém a quilômetros daqui consiga enxergar o prédio normalmente. Por isso ele nos deu pouco tempo para conseguir o dinheiro! Grande Máquina... Você disse que não localizou nenhum aparelho capaz de fazer os andares sumirem, e agora sabemos o por quê. Mas precisamos saber como ele fez pra “sumir” com esses andares, especificamente. Bloomberg e boa parte de sua assessoria estão com ele agora, e nós precisamos descobrir um jeito de virar o jogo. Você conseguiria “ouvir” se Mysterio estivesse emitindo alguma sugestão hipnótica repetidamente?
– Vou tentar.

Grande Máquina fechou os olhos e começou a prestar atenção, filtrando os sons e informações, tentando entender cada pequeno componente de tudo que se passava dentro do prédio. A mescalina causava uma estranha sensação entorpecente e sinestesia, além das alucinações. Isso podia interferir em seus poderes. A sensação de “ver sons” e “ouvir cores”. Tudo parecia nublado e, por um momento, teve a impressão de ter visto os andares que faltavam no edifício.

Mas continuava de olhos fechados.

Foi quando notou um som ininterrupto, se propagando em todas as direções. Mysterio estava transmitindo diretamente de uma das estações de rádio do Empire State.

– Ondas de rádio. Há pelo menos vinte estações, como vamos encontrar a correta?
– Deixe isso comigo. Como funciona o sistema de ar condicionado do prédio?
– A água. As bombas ficam no porão.
– Então é de lá que ele está espalhando a mescalina. Acha que consegue ouvir e localizar a rádio correta?
– Claro, mas pode demorar um pouco.
– Temos doze minutos. Eu fico com o porão.

A Quinta Avenida:

Do ponto de vista de quem estava na rua, era um espetáculo. Todos apontavam suas câmeras e celulares para o prédio, mas desistiam no instante seguinte de registrar o evento surreal de Mysterio. O crime mais bizarro da história de Nova York podia estar acontecendo diante de seus olhos, mas estranhamente ninguém queria saber como era feito. Estavam ali apenas para apreciar.

Quem olhava para o Empire State notava apenas uma distorção, como as miragens causadas pelo calor no asfalto, como se houvesse água entre os andares. O prédio continuava com suas paredes úmidas. Talvez Mysterio fizesse outro pronunciamento, por isso continuariam olhando. Todos queriam ver um pouco mais, ou quase todos.

Mary Jane continuava se perguntando onde Peter podia estar, quando viu o Grande Máquina voando em um dos lados do edifício. Saiu do meio da aglomeração o mais rápido que pôde até a Rua 34 e teve tempo de ver o Aranha descendo o prédio com suas teias. Tentou gritar, tentou dizer alguma coisa, mas não tinha como se aproximar dele. Sentiu um gigantesco abismo entre eles, do tipo que você não transpõe com um simples “oi, vamos continuar de onde paramos?” Era algo maior, como se o tempo tivesse passado e eles tivessem esquecido do que significavam um para o outro. Indiferentes ao drama de Peter e Mary Jane, o mundo continuava girando e o tempo ainda corria.

Um velho conhecido queria saber quanto tempo levaria para chegar. Não tinha certeza de estar fazendo a coisa certa, queria apenas chegar lá e fazer alguma coisa. Qualquer coisa. Devia isso a ele. Ou seria o contrário? Quem estava em débito nessa história?

– Vamos interferir?
– Vamos esperar. Sermos vistos aqui não seria nada bom, e precisamos ter certeza de que ele vai nos ouvir e não dizer algo estúpido como “saiam da minha cidade”.
– Isso, vindo de você...
– Eu sei, soa hipócrita. Mas eu não sou o Homem-Aranha. Não preciso de ajuda.
– Mas me chamou.
– Ele vai te ouvir. Todo mundo te ouve.
– Espero que você tenha razão.
– Eu sempre tenho.

Marianne Potter estava analisando conversando com alguns agentes de segurança do prédio, quando notou um vulto se esgueirando pela rua lateral. Pediu licença e foi até lá, verificar se aquilo era realmente o que parecia. O Homem-Aranha estava descendo até o estacionamento, mas não foi aquilo que chamou sua atenção.

Mary Jane Watson, a ex-mulher de Peter Parker, estava lá. Acompanhando cada movimento do herói aracnídeo.

E ela furou o cerco policial.

E se aproximou dele.

E ele falou com ela antes de entrar no prédio pela entrada de serviço.

Incerta quanto ao que fazer, Mari correu em direção à entrada de serviço e tentou seguir o herói. Mas ele havia selado a entrada com teia. Procurou Mary Jane, mas ela havia desaparecido no meio da multidão.

A ex-mulher de Peter Parker. E o Homem-Aranha.

Alguma coisa que ela se recusava a ver parecia, finalmente, fazer algum sentido.

O Homem-Aranha chegou ao chão e ouviu passos atrás de si. Alguém se aproximava correndo. Não tinha certeza de como isso funcionava, mas o Sentido de Aranha não funcionava apenas para avisá-lo do perigo. Talvez fosse efeito da mescalina, mas soube imediatamente que era alguém que queria ver.

Mas estava enganado. Era Mary Jane.

Não que não quisesse vê-la, mas não estava esperando. Pensou que fosse outra pessoa. Não sabia o que pensar. Não sabia se queria vê-la. Era como sentir muita fome durante muito tempo. Chega uma hora que você não sente mais fome.

Apenas o vazio no estômago.

– Homem-Aranha... Eu... Estou esperando... fotos novas suas...
– Ele vai tirar pra você. Não se preocupe.

Era um código. O código que os dois usavam quando não podiam conversar. Ela queria saber se ele estava bem. Se ele tivesse dito que não tinha tempo para fotos, é porque não estava nada bem.

Mas ele nunca respondia isso.

Ela sabia que algo não estava bem. E não era com ele. Era entre eles.

Peter viu Mari Potter se aproximando e perdeu o fôlego. Uma corrente fria subiu por sua espinha, algo que ele não poderia explicar. Mas tinha um trabalho a fazer. Passou por uma das portas de serviço do Empire State e a selou com teia.

Não queria ser seguido, nem por Mari ou quem quer que fosse.

Desceu pelas escadas que levavam até o porão, se perguntando que outros efeitos a mescalina podia ter no seu organismo. Não queria ser pego de surpresa novamente, e precisava ter certeza de que podia confiar nos seus sentidos. O lugar estava escuro e o barulho de máquinas preenchia o ambiente. Eram as bombas de água. Se Mysterio estava espalhando alucinógeno líquido pelo prédio, aquela era a melhor maneira. Precisava encontrar algum galão com mescalina, ou qualquer coisa que lhe desse uma pista. O tempo estava acabando.

Vários andares acima, Grande Máquina tentava encontrar a freqüência certa, a estação de rádio que estava espalhando a sugestão hipnótica de Mysterio. Não era difícil localizá-la, mas não tinha certeza se era seguro. Estava enxergando coisas que não estavam lá, quem garantia que seus poderes ainda funcionariam corretamente?

Precisava tentar. Não conhecia o Empire State tão bem quanto a Ponte do Brooklyn, mas ao menos sabia por onde começar. Subiu rapidamente usando seus jatos, até o 72° andar.

Nada.

Apenas interferência, um andar vazio. Talvez devesse experimentar algum alucinógeno se quisesse “silenciar” os sons das máquinas em sua cabeça, mas isso ficava pra depois. No momento, precisava ouví-las. Passou pelo 84° andar, o 86°, o 90°... Nada. O sinal finalmente ficou mais intenso no 94°, o último dos andares desaparecidos. Estava claro e perfeitamente audível. Podia confiar na sua audição, sem dúvida, mas e quanto a sua visão? Como ia entrar num andar que... Não estava lá?

Resolveu confiar nos seus instintos. Alinhou-se com as janelas e disparou em direção aonde deveria estar uma vidraça. Ouviu o vidro quebrando, sentiu os estilhaços rasgando sua roupa e sua pele, caiu no chão de olhos fechados e percebeu que o plano tinha dado certo. Como as pessoas o estariam enxergando agora? O Homem-Aranha tinha razão. As percepções estavam alteradas, mas o prédio ainda estava lá. Abriu os olhos lentamente e não viu nada, apenas mais um vão. Precisava silenciar o sinal e, para isso, gritou em alto e bom som:

– Cale a boca! Cale essa boca AGORA!

Ouviu um zumbido, mas o equipamento da rádio tinha obedecido. Era apenas seu cérebro tentando se ajustar à “nova realidade”. Começou a enxergar o chão acarpetado do escritório de uma das muitas rádios locadas no Empire State.

– Vejam! É o ajudante do Homem-Aranha!
– Pega ele!

“Ajudante do Homem-Aranha” era muita sacanagem. Mas Grande Máquina não era exatamente um especialista no combate corpo-a-corpo, e ainda não estava plenamente recuperado dos efeitos da droga de Mysterio.

Enquanto seu “ajudante” lutava com os capangas de Mysterio, o Homem-Aranha encontrava uma bomba de água próxima a uma série de equipamentos eletrônicos. Tudo ali parecia estar funcionando perfeitamente. Perfeitamente demais. Provavelmente, foi a partir dali que Mysterio conseguiu espalhar seu alucinógeno por todo o prédio. Começou a ouvir um estranho zumbido, irritante, e teve a sensação de que Grande Máquina tinha algo a ver com aquilo. Teria descoberto a rádio? Se sim, as alucinações iam parar em poucos instantes. Restava agora cuidar da mescalina e encontrar Mysterio.

Mas não teria problemas quanto a essa segunda parte.

Mysterio o encontrou primeiro.

– Ainda interferindo em meus negócios, desgraçado?
– Não leve a mal, Mysterio... Mas os seus negócios são os meus negócios.
– Dessa vez, ninguém sobreviverá. E você será responsabilizado pelo que acontecer hoje!
– Olha, por mais que eu adore esse seu jeito fanfarrão, não vim aqui pra te ouvir. Vim aqui pra te deter.
– Pense duas vezes, herói.

A atitude confiante de Mysterio só podia querer dizer uma coisa.

O vilão encontrou um meio de espalhar a mescalina no ambiente úmido do porão.

Dessa vez, ele tinha tomado todas as garantias para que nenhum herói, em particular o Homem-Aranha, pudesse estragar seus planos. Era uma investida audaciosa. Provavelmente, a maior de sua vida.

– Abra as “portas da percepção”, Homem-Aranha... Além das alucinações, a droga que eu usei pode alterar sua percepção espacial. Você não vai me alcançar. Não vai conseguir acertar um golpe em mim! A cidade está em minhas mãos agora e você, indefeso como uma criança, está à minha mercê!
– Eu conheço... os efeitos... da mescalina...
– Então, já sabe o que eu usei, hein? Muito bom, herói! Muito bom! Isso torna sua condição ainda mais patética, porque agora você sabe que não há nada que possa fazer!
– Realmente... A sensação de serenidade... de tranqüilidade... vasodilatação... dilatação das pupilas... a redução dos movimentos respiratórios... Sinestesia... Eu poderia até morrer... se...
– Se...?
– Se não tivesse descoberto seu truque meia hora atrás... e feito filtros de teia por baixo da minha máscara.

Dois segundos de vazio. Foi o que Mysterio sentiu quando o Homem-Aranha mencionou os filtros. Pequenas bolas de teia nas narinas, impedindo a passagem de toxinas, venenos e alucinógenos. Dois segundos em que o herói ficou imaginando a expressão de Mysterio, o plano caindo por terra mais uma vez.

Dois segundos antes de atacar.

Precisava deter os capangas primeiro. Eles estavam armados. Saltou sobre o peito do primeiro com os dois pés e caiu com um soco na cabeça do segundo, pulando por cima de Mysterio. O que o Aranha não sabia é que Mysterio estava armado. Já tinha matado um homem a tiros naquela manhã. Sacou rapidamente a automática e apontou para seu antigo inimigo.

– Não se aproxime!

Mas o Homem-Aranha tinha cansado de conversar já há muito tempo. Agarrou o pulso do vilão e o partiu com a mão direita, enquanto a esquerda golpeou seu elmo violentamente. Os estilhaços feriram o rosto de Quentin Beck, que caiu no chão.

– Não! Me largue! Não faça isso! Não!

O Homem-Aranha continuou golpeando e golpeando e golpeando...

– Você... Você está fora de si! Você não é o Homem-Aranha!

Golpeando e golpeando e golpeando...

Foi quando sentiu alguém segurando seu braço. O Sentido de Aranha disparou, mas não alertando-o contra um agressor, e sim dizendo para não revidar. Era Grande Máquina:
– Aranha... Já chega... Terminamos aqui...

Não se deu ao trabalho de responder. Não tinham terminado nada. Nada! Aquilo era só o começo. Vilões com planos insanos, mortes, quantas mortes seriam necessárias? Do que o “Grande Máquina” tinha medo?

– Eu ouvi o plano deles... Eles... colocaram algumas bombas no prédio, mas eu já as desativei. Precisamos pegar o resto do bando antes que eles fujam, não espancar alguém que não oferece mais perigo... O que está acontecendo com você?

A pergunta calou fundo. Procurou correr, fugir dali, fugir das perguntas, das dúvidas, de seus medos. Fugir de meses de ódio, ressentimento e dor, como se fosse possível correr tanto. Queria ir pra casa, queria tirar a máscara, queria sentir a luz do sol em seu rosto, queria morrer. Escalou as galerias do porão até o estacionamento, onde alcançou os capangas de Mysterio que ainda tentavam fugir em um furgão.

Deixou as dúvidas para trás e se lançou no teto do veículo.

Arrancou a porta do lado do motorista, agarrou o volante e o arrancou, arremessando-o longe. Os dois ocupantes do veículo, em seu desespero, não sabiam se deviam pular ou atacar o Aranha. Mas ele estava, obviamente, contando com uma luta num veículo em alta velocidade sem uma das portas. Diferente do Aranha, não tinham poderes. Tiveram medo de morrer.

De repente, o veículo desacelerou e o Aranha não estava mais lá. Tudo que viram foi um enorme “S” à frente, um borrão azul e vermelho e uma voz dizendo: Fiquem aqui, senhores. A polícia está a caminho.

Segundos antes, o Homem-Aranha sentiu um tranco. Um vulto negro envolto em uma capa o arrancou do veículo e voou com ele pela Quinta Avenida até um beco. Ao se debater, conseguiu se livrar do misterioso atacante, mas caiu se arrastando em meio ao lixo. Quando se levantou, deu de cara com dois velhos conhecidos.

Superman e Batman... em Nova York!

– O que vocês estão fazendo?
– Viemos ter uma palavrinha com você, Aranha. Mas resolvemos intervir antes que alguém se machucasse.
– Eu não pedi ajuda!
– Você viu o que acaba de fazer? – disse Batman, adiantando-se. – Aqueles dois podiam ter morrido. Você tem agido de maneira inconseqüente, ferindo criminosos que podia deter com sua teia. Está... “fora de suas características”, digamos assim.
– Ah, o maldito Batman está dizendo pra eu pegar leve com a bandidagem? Vá te catar!
– Você não está entendendo...
– E você está sendo hipócrita!
– Ninguém culpa você pelo que aconteceu na Lua, Aranha... (*)

O Homem-Morcego nem viu o golpe que o atingiu. Caiu aos pés do Superman e viu o Homem-Aranha em posição de ataque, pronto para enfrentar os Melhores do Mundo.

– Eu já estou cheio de sua condescendência!


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Notas finais do capítulo

A seguir: Equinócio



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