Coletando estrelas cadentes. escrita por mending4


Capítulo 5
Capitulo 3 - zona escolar.


Notas iniciais do capítulo

Eu sou Cassie Armistead, tenho dezesseis anos e acabei de sair de um hospital psiquiátrico, onde fiquei internada durante seis meses. Após a minha saída do hospital, eu esperava me estabilizar e recomeçar a minha vida. No entanto, recebi a pior notícia que eu poderia receber: Minha família e eu estávamos de mudança para a Inglaterra. Que droga! Eu esperava recomeçar a minha vida na América e não partir, subitamente, para outro continente. Agora terei que me adaptar a um lugar frio, uma casa pequena e a pessoas tão frias quanto o próprio ambiente. Sorte que eles tem um sotaque maravilhoso! Mas isso não muda o fato de que vai ser difícil me adaptar, fazer amigos e principalmente, ser normal. Eu não sou muito boa nisso.



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Primeira aula de volta às — minhas — aulas: Aula de Inglês.

Bati três vezes na porta da sala de aula. O vidro da porta estava coberto por uma persiana horizontal, então não pude ver se o professor abriria ou não a porta para mim. Quando eu estava nos Estados Unidos, se você chegasse atrasado à aula, geralmente, você era mandado à diretoria e lá o diretor decidia se lhe dava ou não um passe para que você pudesse entrar na aula.

A porta foi aberta.

— Sim? — o homem que supus ser o professor disse.

Honestamente, eu nunca estive na presença de um professor tão lindo em toda a minha vida. Ele era mesmo o professor? Talvez ele fosse um aluno gentil que resolveu abrir a porta…

— Hm, com licença… Eu sou aluna nova e eu estava na diretoria — eu falei, tentando não gaguejar — Eles me mandaram para cá.

Era difícil falar enquanto uma beldade daquelas está parado em sua frente. Nem nos sete infernos eu poderia imaginar que um dia eu teria o prazer de ter aulas com um homem tão lindo.

— Ah, claro — ele abriu um pouco mais a porta — Você pode entrar.

Quando entrei, ele me estendeu sua mão.

— Eu sou o Professor Thomas Peterson — e eu apertei sua mão rosada e macia — Mas, meus alunos podem me chamar de Tom.

Eu gostaria de poder toca-lo mais vezes. Por que ele tinha que ser professor de Inglês? Por que não Educação Física? Eu não sou uma grande fã de Educação Física, mas eu poderia fingir ser uma droga praticando esportes só para que ele pudesse me ensinar direitinho, tocando meus quadris e tudo mais. Seria ótimo!

— Eu sou Cassie — eu disse, mas logo me corrigi — Quero dizer, Cassandra Armistead.

— Seja Bem Vinda, Senhorita Armistead — ele sorriu.

O Professor Thomas Peterson — Tom — era o deus da ilha da Grã-Bretanha. Ele tinha covinhas. Covinhas adoráveis e tão profundas que se você cavasse, talvez fosse capaz de encontrar um tesouro nelas. Seus olhos eram azuis esverdeados e seu queixo era furado. Seus cabelos eram negros e desgrenhados. “Por que você tem que ser professor?!”, eu gritei em meu pensamento. “Mas, mesmo se você não fosse eu jamais teria alguma chance com você”, lembrei a mim mesma deste pequeno grande detalhe.

— Há uma carteira vazia ali atrás — ele apontou para o meio da sala de aula. Ah, é, há pessoas na sala de aula. Alunos… Adolescentes… Ugh. Eu odeio alunos adolescentes. Eles me apavoram, pois esses são a pior espécie de seres humanos. Cobras são mais amáveis do que adolescentes.

Todos na sala me olhavam sem grande interesse. Mesmo assim, eu estava nervosa. E sempre que eu ficava nervosa, eu fazia algo estúpido. Fui até a carteira vazia no meio da sala, mas, ao invés de andar normalmente, eu andei correndo. Durante o percurso da frente da sala ao meio da sala levei um tropeção no pé de um aluno. Alguns alunos riram, obviamente. E minha cara ficou tão rubra quanto uma pimenta.

A aula de Inglês era mais prática do que teórica. Não havia nada na lousa para ser copiado, dependia de nós fazermos anotações do que o professor explicava. Ele nos perguntava algo e se soubéssemos, devíamos responder. Ele nos explicava através de demonstrações interessantes e engraçadas. O Professor Tom me fez lembrar-me do Sr. Keating (Oh Captain! My Captain!), o protagonista do meu filme preferido “Sociedade dos Poetas Mortos”.

Primeira aula: Ótima. Um ótimo professor em todos os aspectos: Físicos e Intelectuais. Antes de ir para a minha próxima aula, fui até o banheiro. Lembrando que: Demorei quase cinco minutos para encontrar o banheiro. Quando entrei no banheiro havia algumas garotas se olhando no espelho e outras lavando as mãos. Fui direto para uma das cabines, sem se importar com alguns olhares voltados a mim e alguns sussurros como “Quem é essa?” e “Eu nunca a vi por aqui antes”.

Quando saí do banheiro ele já estava vazio, pois o sinal para a próxima aula já havia tocado. Lavei as mãos sem me olhar no espelho e corri para a minha próxima aula: Cálculos. Argh! Uma das desvantagens de voltar à escola: qualquer coisa relacionada à matemática.

Minha professora de matemática era uma irlandesa de sessenta anos. Seus cabelos eram curtos e seu rosto era flácido e repleto de rugas. Ela falava muito calmamente e preguiçosamente, a cada palavra dita você levava uma bofetada do sono e dormia ali mesmo.

O resto das minhas aulas foi normal. Eu não fiz amigos, para falar a verdade, ninguém se quer olhou em minha cara. Houve aquelas pessoas que me olharam de relance e perceberam que nunca haviam me visto por ali antes ou aquelas pessoas que perceberam que eu não tenho cara de garota inglesa. Eu não fiz qualquer coisa para chamar atenção e muito menos qualquer esforço para fazer amizade. Não que eu não quisesse fazer amigos, mas eu simplesmente não sei fazer amigos.

No entanto, pensei que meu primeiro dia fosse ser mais difícil. Eu sei que vai ser difícil me adaptar a toda essa bagunça outra vez, mas o que eu posso fazer além de tentar?

***

Na hora do almoço eu encontrei o lugar mais agradável da escola. A biblioteca.

A biblioteca era toda em mogno. No momento em que entrei, o cheiro dos livros grudou em minhas narinas como perfume forte masculino. Era bom sentir aquele cheiro novamente. No hospital não havia uma biblioteca, apenas revistas de moda encima da mesinha de centro na sala de televisão. Em minha casa, eu não tinha uma biblioteca. Além do mais, se eu tivesse uma, meu irmão provavelmente destruiria meus livros só para me provocar. Então me restam apenas as bibliotecas e livrarias.

— O que está fazendo aqui? — ouvi uma voz me perguntar.

Eu já estava dentro da biblioteca, passeando meus dedos sobre os livros nas prateleiras quando ouvi essa voz. Quando me virei para ver quem era, deparei-me com uma garota ruiva magra e atarracada de cabelos curtos estilo Joãozinho.

— Desculpe — eu pedi — Eu não posso ficar aqui?

A garota franzia a testa, parecia confusa. Mas eu estava ainda mais confusa do que ela.

— Na verdade… — ela finalmente começou a falar algo. Sua voz era empoeirada, um ruído ofegante como se ela tivesse dificuldade em respirar — Na verdade, sim, você pode.

Assenti, aliviada. Eu deveria estar no refeitório, comprando algo com o dinheiro do lanche que minha mãe me deu. No entanto, ficar quieta e no silêncio da biblioteca é muito mais agradável.

— É só que… — a garota ruiva voltou a falar — É estranho ver alguém aqui há esta hora. Quero dizer, na hora do almoço. Os alunos não vêm aqui nem durante os outros períodos, quanto mais na hora do almoço, quando estão livres.

— Mas está não deveria ser a hora dos alunos virem aqui? — franzi o cenho.

A garota deu de ombros e ficou calada, apenas me observando.

— Você trabalha aqui? — eu perguntei, curiosa — É a bibliotecária?

— Quase — ela respondeu — Eu só gosto de ficar aqui, sabe? A bibliotecária viu que eu estou sempre aqui, então quando tenho períodos livres e às vezes durante a hora do almoço, eu fico por aqui. Enquanto isso ela dorme em uma salinha ali atrás.

Dei um meio sorriso e assenti.

— Aliás, eu sou Michelle — ela deu um passo à frente e estendeu-me sua mão.

Espere aí. Espere um pouco. Isto realmente está acontecendo? Vamos congelar este momento só por alguns segundos.

Durante toda a minha vida eu nunca fui uma garota sociável. Quando eu tinha cinco anos de idade, meus pais foram chamados às pressas ao jardim de infância porque eu estava tentando enforcar uma coleguinha. Quando minha mãe me perguntou por que eu fiz aquilo, eu lhe respondi “porque eu não gosto de nada que respira”. E a partir daí foi que notei que não tenho nenhuma inclinação para fazer amigos.

Eu tinha alguns coleguinhas — alguns só eram meus coleguinhas porque tinham medo de mim —, mas nunca criei laços com eles. Eu não tinha amigos na vizinhança, a única amiga que eu tive só ia a minha casa por puro interesse. “Você tem brinquedos legais!”, ela dizia e às vezes roubava meus brinquedos. Quando minha mãe descobriu, me proibiu de levar qualquer amiguinha lá para casa.

Na adolescência as coisas não foram — não são — diferentes. Eu tinha algumas colegas e elas eram legais comigo, contudo, nunca criei laços fortes com elas. O meu tipo de amizade sempre foi no modo “desapegue”. Se o ano letivo terminasse e no ano seguinte elas não falassem mais comigo, eu agia como se nunca tivéssemos nos conhecido. Não é de propósito, é só que, eu não sei como lidar com essas coisas. E no hospital, conheci pessoas loucas que eram muito mais legais do que qualquer pessoa sã que jamais conheci. Pena que talvez nossos caminhos não se cruzem em um futuro próximo.

Em suma, eu nunca tive uma amiga de verdade, uma melhor amiga. O máximo que tive foram colegas de um ano, um ano e meio… Dois anos no máximo. Mas essas colegas nunca passaram para o nível amiga.

— Eu sou Cassie — apertei sua mão.

Eu queria recomeçar a minha vida. O meu grande intuito, a minha maior meta após sair do hospital psiquiátrico sempre foi: recomeçar. Não importa o lugar, eu só queria recomeçar. E isso requer fazer amigos. Eu não posso desperdiçar esta chance. Eu não posso estragar tudo!

— Você é nova aqui, não é? — Michelle perguntou.

— Sim — eu respondi — Entrei aqui hoje.

— Você é americana? — ela apertou os olhos, analisando-me como se minha nacionalidade fosse algo visível. Na verdade é algo mais auditivo. Ela escuta meu sotaque, ela sabe que sou americana.

— Carolina do Norte — assenti e sorri.

— Quando chegou a Londres?

— Há três dias.

E assim começamos a conversar. Eu tentei parecer o mais normal possível, mas Michelle parecia mais anormal do que eu jamais poderia ser. Ela estava vestindo roupas masculinas e um suspensório de couro que a fazia parecer muito engraçada. Seus cabelos ruivos cortados em estilo Joãozinho eram penteados de lado, como o cabelo de um garotinho que a mãe penteia os cabelos. Michelle era bonita. Seus olhos eram verdes e seu rosto era pintado de sardas como o meu — exceto que meu rosto tem um pouquinho menos de sardas.

Nós começamos a conversa com o tópico: minha súbita mudança. Eu falei para ela que não me agradou nem um pouco me mudar de uma hora para a outra. “Eu também não ficaria feliz se minha mãe anunciasse que nos mudaríamos para Nova York amanhã”, Michelle disse. Eu não mencionei que estava internada em um hospital psiquiátrico. E provavelmente jamais mencionarei! Não é algo que as pessoas precisam saber. Mas para todos os efeitos, eu estava passando uma temporada na Pensilvânia com uma madrinha.

Depois começamos a falar sobre as coisas boas que Londres tem a oferecer: Museus de graça, pessoas elegantes, queijos, vinhos, salmão, bansky, castelos, barcos, ser parte da Europa… E claro, os homens bonitos.

— Você gosta dos Beatles? — Michelle me perguntou.

— Sim — respondi com certo entusiasmo — Qual é o seu Beatle favorito?

— Paul. E o seu?

— Ringo — eu respondi.

Poucas pessoas tinham Ringo como seu Beatle favorito. Minha mãe dizia que isso era o que me tornava ainda mais estranha, mas o Doutor Barnes me disse que isso é o que me torna diferente. E talvez o diferente seja bom…

Nós conversamos também sobre livros, bandas e cantores britânicos e nossas musicas preferidas. Então o sinal tocou. Hora de ir embora.

Michelle e eu saímos da biblioteca juntas. Eu não sabia se dizia tchau e seguia para o meu caminho. Mas se eu fizesse isso, talvez no dia seguinte nós não nos falássemos. Então seria melhor se saíssemos juntas e eu dissesse “até amanhã”, porque talvez nós nos falássemos no dia seguinte. No entanto, enquanto eu a acompanhava pelo corredor, ela parou perto de um garoto que estava encostado em um dos armários.

— E aí, aggro! — Michelle deu um soco no ombro do garoto.

Ele olhou. “Aggro?” O que diabo isto significa?

— E aí, weirdo! — ele respondeu.

Pelo menos “weirdo” eu já havia ouvido falar antes. Fiquei tentada a saber o porquê de chama-lo de “aggro”. Eu duvido que este seja o seu sobrenome.

— Esta é Cassie. Ela é nova aqui e veio da América — Michelle me apresentou ao garoto.

O garoto desencostou do armário e se aproximou um pouco de mim.

— América, uh? — ele falou — Daqui uns dias os americanos irão tomar conta da Grã-Bretanha. Espero estar morto até lá.

Fiz uma careta.

— Por quê? O que tem de errado com os americanos? — arqueei as sobrancelhas. Eu gostava de ser americana. Muito Obrigada! E sim, sou patriota como noventa e oito por cento dos americanos.

— Nada. Eles só são americanos — ele deu de ombros — Os três P. Prepotentes, Palhaços e Plagiadores.

A indiferença com que o garoto falou sobre os americanos me irritou. Quem ele pensa que é para falar do meu país? Mas, acalme-se… Não estrague tudo, Cassie. Finja que você não se importou. Finja que você é uma garota normal.

— Cale a boca, aggro! — Michelle deu um empurrão em seu ombro.

— Está tudo bem — eu falei — Eu não me importo. Afinal, agora eu estou vivendo aqui, não? E tenho que dançar conforme a música.

Olhei cautelosamente para o garoto que falou mal do meu país. Ele estava vestindo a camiseta de alguma banda que eu não conhecia. Ele parecia tão desleixado, folgado e tirano. Sua essência estava me irritando…

— É isso aí — ele sorriu. Um sorriso largo e meio sarcástico — Eu sou aggro — ele estendeu sua mão.

Observei sua mão por alguns segundos. Hesitei na hora de aperta-la.

— O que significa aggro? — eu perguntei, finalmente.

— Agressivo ou Agressividade. Geralmente o que acontece nas torcidas de futebol e, às vezes, no campo de futebol. — ele explicou.

Continuei confusa.

— Ele joga no time de futebol aqui do colégio. E ele é bem agressivo tanto no campo quanto na arquibancada, portanto, nós o chamamos de aggro. É uma gíria. — Michelle explicou melhor.

Compreendi. Notei que a mão de “aggro” ainda estava estendida.

— Prazer, aggro. Eu sou Cassie — apertei a sua mão.

— Pode me chamar de Ian se quiser — ele sorriu.

E em poucos segundos outras pessoas foram se aproximando. Um garoto alto de óculos vestindo camiseta xadrez que bateu na mão de aggro (Ian) e bagunçou os cabelos de Michelle. E uma garota, que supus ser a namorada do garoto de óculos, pois ela estava agarrada a sua cintura.

— O que ainda estão fazendo aqui? — o garoto alto de óculos perguntou, e deu uma olhada ao redor da rodinha que se formava entre nós. Olhou para mim por uma fração de segundos e depois desviou o olhar.

Blud, eu quero que você conheça Cassie — Michelle me introduziu ao garoto alto, deixando a garota ao seu lado totalmente de fora — Ela é nova por aqui… Quero dizer, na escola e no país.

— Sério? — o garoto franziu o cenho e olhou para mim. Ele tinha olhos legais… Pena que eram escondidos pelos óculos — De onde você veio?

— Se eu falar, você promete não esculachar o meu país? — disse.

— Por que eu faria isso? — o garoto perguntou, confuso.

— Porque alguém já fez — olhei para Ian que revirou os olhos, meio indiferente — Eu sou dos Estados Unidos.

Felizmente o garoto não falou nada sobre o fato de eu vir da América ou ser americana.

— Eu sou Billy Elliot. Muito Prazer, Cassie — ele disse e deu um meio sorriso — Esta é a minha namorada, Olivia — ele olhou para a garota que estava grudada em sua cintura como um macaco em um galho.

Ela deu um sorriso rápido e forçado.

— Cassie, nós vamos a um pub perto daqui — Michelle falou — Você gostaria de vir com a gente?

Por dentro eu estava radiante, gritando e pulando de tanta alegria. Eu estava mesmo sendo convidada para sair com eles? Tudo bem que eles são estranhos e dão apelidos toscos um para os outros, mas eles parecem ser legais. Porém…

— Hoje eu não posso — respondi — Eu tenho umas coisas para fazer.

E de fato eu tinha: minha mãe me recrutou para fazer a limpeza da casa com ela para tirar o pó e a sujeira da mudança.

— Tudo bem. Então gostaria de almoçar com a gente amanhã aqui no colégio? — ela perguntou.

E sem pensar duas vezes eu respondi:

— Claro.

E em seguida me despedi deles.

— Até amanhã. — e saí.

Eu estava feliz. Será que desta vez farei amigos e não colegas? Bom, já é um bom começo. Eu só preciso não estragar tudo.


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