Te amar não estava nos meus planos escrita por Ana Bobbio


Capítulo 33
Antônia Carvalho.




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Eu ri ao ler aquele pequeno bilhete, não só por ter certeza que a cena era repugnante e nojenta, mas porque eu estava tão nervosa que só rindo conseguia me aliviar de uma possível tensão.

Eu sabia que apesar de tudo, tinha feito à decisão certa. Não poderia sacrificá-lo, se Eduardo ficasse comigo, minha presença sempre o lembraria de um passado que ele deseja esquecer completamente. E é justo somente eu levar esse passado comigo nas costas, porque eu fui a culpada. Os fantasmas da culpa, do arrependimento, entre outros, deveriam andar apenas comigo. Eu errei. Eu prejudiquei um futuro bom ao seu lado, e eu não podia voltar para mudar as coisas.

Continuei a caminhar, desejando chegar a minha casa rapidamente, desejando achar uma explicação plausível e racional para isso tudo. Quando cheguei, encontrei a porta encostada. Estranhei, porque meus pais nunca a deixavam assim. Nunca se esqueciam de fechá-la completamente, e trancá-la com a chave.

Fui até a cozinha, procurando alguma coisa para pôr o buquê. Encontrei escondido no canto, um pequeno vaso de vidro, onde coloquei as flores junto com um pouco de água para sobreviverem.

Quase maquinalmente, subi às escadas, de modo que meus pais não conseguissem chegar a tempo caso quisessem me fazer alguma pergunta ou simplesmente me dar bom dia. Estava tão confusa, a ponto de querer ficar sozinha por um bom tempo.

Cheguei ao meu quarto, tranquei a porta e joguei o meu corpo contra a cama, permitindo que ele relaxasse e aproveitasse a maciez do colchão. Fitei o teto branco, deixando minhas mãos pousadas sobre minha barriga. Uma das minhas pernas entortou-se um pouco, enquanto a outra continuava esticada.

Eu não conseguia explicar direito como me sentia durante esses dias, acho que era um misto de fragilidade com insegurança. Eu sei que é natural nos sentirmos assim hoje em dia, sendo que as taxas de violência, de assaltos, de roubos, de assassinatos sobem a cada segundo. Principalmente em cidades grandes, como a minha. Onde não é possível dizer ao certo onde você está segura, ou quem é confiável. Vivendo num mundo onde as pesquisas apontam que você está sujeita a tudo isso, porque você está simplesmente viva e é uma cidadã de bem.

Bem, no meu caso, a Antônia é.

O problema é que mesmo estando em casa, no lugar onde eu deveria me sentir um pouco mais segura ou à vontade, permanece me fornecendo a mesma segurança que tenho enquanto estou na rua ou no colégio, ou em qualquer outro lugar. E saber que não importa onde eu esteja, mesmo trancafiada numa casa blindada que dificilmente alguém conseguiria vencê-la, mesmo se eu estivesse rodeada de agentes capazes, cujas palavras me diria que tudo ficaria bem, eu não teria nenhuma certeza ou mudança de sentimento. Eu continuaria insegurança, e totalmente frágil.

Porque não é medir as forças, onde você sabe qual vencerá porque o resultado está ali, à sua frente. Onde a resposta é tão óbvia e exata. Não tem nada a ver com física ou matemática.

É algo bem mais complexo que isso. O pior é quando você já sentiu a sensação que tanto almeja, que tanto procura, e que não precisou de estratégias diferentes ou equipamentos revolucionários para tê-la e senti-la um dia.

Não, muito pelo contrário. Só precisou que específicos braços fortes e firmes permanecessem ali, te resguardando e fazendo com que nada os ultrapassasse. Nada te atingisse. Como se fosse um escudo capaz de blindar qualquer coisa, capaz de te deixar tão guardada e protegida, que poderia ficar ali eternamente, tornando aquele lugar uma espécie de porto seguro e casa.

Principalmente, quando esses braços pertencem a certo garoto de olhos verdes profundos e boca convidativa. Com os olhos capazes de te hipnotizar e cabelos tão macios, que a vontade de afundar seus dedos nos fios claros vem instantaneamente. E você faz, e não tem coragem de tirar seus dedos dali. Pois a sensação dupla de segurança e desejo te torna totalmente dependente daquele lugar, daquela pessoa. Sente-se tão capaz, tão inatingível, que poderia ocorrer um terremoto naquela hora, você continuaria em pé, firme e forte, sem nenhum arranhão ou expressão de medo.

Poderia acontecer um tsunami, você não se sentiria afogado. Você sobreviveria.

Porque você está totalmente segura, e nada será capaz de te abalar.

Talvez essa seja a explicação de eu não ter morrido quando alguém me empurrou na água durante as minhas férias.

Fechei os olhos, suspirando em meio aos pensamentos. Como pude viajar tão longe?

Talvez a explicação seja óbvia. Mas eu não quero pensar nisso. Pensar nisso me deixa sensível, e infelizmente eu não tenho mais essa arma indestrutível para me proteger. Permaneço de olhos fechados, sem me mover. Como se eu estivesse dormindo, mesmo sem sono algum.

Depois que algumas horas que se passam, ouço uma respiração se juntar a minha naquele quarto vazio. E eu estou sozinha, então não é possível haver outra respiração ali. Apesar de ter certeza que eu escutei outra respiração, que com toda certeza não era a minha, permaneço de olhos fechados.

Ao sentir um toque em minha pele, percebo que de fato há outro alguém na minha casa, no meu quarto. Eu sei que deveria me sentir aterrorizada com isso, e até gritar. Mas não grito, e nem sinto medo. Apenas quero sentir o toque de novo, para ter certeza que de fato há outro alguém no meu quarto. Sinto mãos deslizarem deliberadamente sobre a pele do meu braço e isso me arrepia, de um modo estranhamente conhecido.

Não crio coragem para abrir os olhos, e muito menos grito. Porque não tenho mesmo nenhum medo, e quero sentir mais uma vez o toque. Não posso nem me mover um pouco, para não assustar quem quer que seja. Simplesmente sinto falta daqueles arrepios, e preciso urgentemente daquele contato de novo, e a cada segundo que não sinto, meu coração se agita reclamando disso.

Tenho urgência, e por isso, abro os olhos no mesmo instante e agarro a pessoa que está à minha frente.

E, inexplicavelmente, me sinto segura, protegida.

Então eu acordo assustada, sento-me e percebo que foi apenas um pesadelo. Ou um sonho, o que quer que tenha sido, não faz parte da realidade. Passo a mão pelo meu cabelo, ainda conturbada com o pequeno delírio que tive. Percebendo que sem querer eu havia cochilado. Levanto-me da cama e arrasto meus pés até o banheiro, paro de frente à pia e pego minha escova de dente. Passo um pouco de pasta nela, a molhando posteriormente, e quando vou colocá-la na boca, erguendo a cabeça, pelo espelho consigo ver alguém atrás de mim. Um reflexo lindo, pra ser sincera. Não movo as minhas mãos, pois é como se eu estivesse de repente paralisada.

— Teve algum pesadelo, Tônia? — Pergunta de maneira tão natural, presenteando-me com sua voz. Com o olhar tão fixo no meu, quase esqueço o meu nome. Pra minha sorte, eu tenho dois. Só não consigo raciocinar direito para saber se estou falando da quantidade de olhos ou dos nomes que tenho.

— Cla-claro. — Murmuro rapidamente, gaguejando um pouco. Não me assusto com a minha resposta, pois foi tão involuntária que nem se fosse mentira eu diria alguma coisa contrária. Pois estou nervosa demais, e não consigo pensar em outra coisa a não ser na pessoa que está à minha frente.

O estranho é que a suavidade do seu rosto se transforma, como se eu estivesse de frente ao Eduardo que me beijou pela primeira vez no corredor na escola.

— Talvez devesse dormir menos. — Sugeriu com um duplo sentido totalmente explícito. — Eu poderia te acompanhar com todo o prazer.

— O que você está fazendo aqui? — Perguntei, encostando-me à pia como se aquele fosse o ponto máximo de distância que poderíamos manter. Eu não queria me afastar, e ao mesmo tempo, eu não queria me aproximar. Eduardo não me respondeu, apenas sorriu para mim e deu um passo em minha direção, apesar de perceber o meu tremor. Eu tremo porque estou assustada em vê-lo, porque não quero ceder. — O que você está fazendo aqui? — Insisto, notando minha voz se alterar e soar como um grito desesperado.

A iluminação é baixa, pois eu não acendi a luz quando entrei. E mesmo ele estando mais perto do interruptor, não se move para acabar com a pequena escuridão. A única coisa que garante uma pequena iluminação é a janela basculante, abastecendo o lugar com um pouco de luz solar. Sinto o arrepio que ele geralmente causa em mim quando pega o meu braço, e me puxa contra si. Fazendo meu corpo chocar contra o dele, e meu rosto imediatamente abaixa, pois não posso olhar dentro de seus olhos. Se eu fizesse isso, estaria perdida.

— Você me perguntou o que estou fazendo aqui, e eu vou te responder. — Sussurrou com a voz meio rouca, fazendo meus ouvidos degustarem aquele som à vontade. Implorando, sutilmente, por mais. — Eu vim buscar o que eu quero.

Um pouco mais grosseiramente do que o comum, mas sem deixar sua delicadeza de lado, Edu encostou seu dedo no meu queixo e ergueu meu rosto para fitá-lo. Meu coração se aqueceu como sempre, e minhas mãos foram parar sobre seu peito, tentando inutilmente — porque ele era muito mais forte —, empurrá-lo para longe de mim. Mesmo minha vontade sendo agarrar sua camisa e...

Parei de pensar, vendo que eu enlouqueceria se continuasse.

— O que vo-você quer? — Indaguei inquieta, tentando mostrar segurança em minha voz. O que não adiantou muito, acabei falando de modo falhado e tímido. Demonstrando meu estado de derrota e submissão. Demonstrando que, no final das contas, eu ainda estava terrivelmente apaixonada por ele.

Nos silenciamos, um silêncio capaz de provocar em nós dois sensações torturantes, pois nossas bocas estavam tão próximas e ao mesmo tempo tão longes uma da outra que resistir à tentação se tornava cada vez mais impossível e insuportável.

— Você. — Sussurra. Meu coração para, assim como a minha respiração. Consigo reparar a sinceridade e a voracidade que coloca nessa palavra, capaz de fazer o mundo parar também.

Minhas mãos que estavam sobre seu peito, se movem até sua nuca, meus dedos não resistem e mergulham entre os fios de seu cabelo, como consequência, seu rosto vai para frente, aproximando-se mais do meu.

— Eu... Eu te fiz mal, Eduardo. Eu brinquei com você... Até como Antônia, uma vez que me aproximei de você por causa do Bruno. Tudo o que tem que fazer é ir embora e nunca mais... — Não continuo, pois ele me cala com seus lábios. Pressionando-os contra os meus, entretanto, não me beija. E nem dá sinal que vai fazer isso, apenas me faz calar a boca.

E consegue. Eu não quero dizer mais nada. Eu não consigo. Ter essa sensação de novo é... Avassaladora.

— Tentar me livrar de você para me afastar de um possível motivo que pode me ferir, foi a maior prova que você poderia me dar, provando que, mesmo tendo sido a Maggie, mesmo descobrindo isso, continua sendo a minha Tônia. — Eduardo suspira, e tudo o que eu faço, é me segurar em seu corpo. Porque minhas pernas enfraquecem, e eu não consigo ficar de pé sozinha. — Antônia, apenas ela. A garota que me encantou, que eu amei desde o segundo que pus meus olhos em você. Porque eu a vi, eu te vi. Eu continuo vendo, e nenhuma descoberta ou passado mudará isso. Porque você está aqui, porque de um jeito ou de outro, a Maggie morreu. E eu estou terrivelmente apaixonado e admirado pela nova pessoa que nasceu: Você, Antônia. E é ela quem eu quero. Ninguém mais.

— Eduardo...

— Deixe-me terminar, Tônia. Por favor, deixe-me te mostrar que você jamais poderá me machucar. — Assenti, sentindo meus olhos se encherem de lágrimas. — A Maggie jamais agiria dessa forma, ela tinha certa obsessão por mim, e isso conclui que, se você fosse como ela, jamais me deixaria partir por puro egoísmo. Já a Antônia... A Antônia não, você pensou em mim, achando que eu seria mais feliz dessa forma, e isso de egoísmo não tem nada. E prova que você é totalmente merecedora do meu amor e da minha vida. Pois é isso o que você tem em suas mãos. E a partir de agora, eu não vou desistir da minha Antônia, mesmo que você insista em me afastar. Sabe por quê? — Sinto ele me encarar, e retribuo. Porque não consigo afastar meu olhar do dele, e admirar sua pele, seu rosto, é tudo o que eu mais desejo. Nego com a cabeça, querendo que ele continue.

Suavemente ele desliza seu dedo sobre o meu rosto, percorrendo caminhos precisos e o formigamento que começo a sentir é imediato. Identifico alguns caminhos, como a pequena trajetória que faz dos meus lábios até a minha sobrancelha.

É como se capturasse cada detalhe, cada parte para simplesmente admirar.

— Porque eu nunca vou deixar de te amar, Antônia Carvalho. E tudo o que eu quero, a partir de agora, é que você não pense em sair do meu lado por porra nenhuma.

Sorrio, tenho tanta coisa para falar, para dizer, mas parece que tudo fica preso dentro de mim. A única coisa que consigo pronunciar é:

— Não xingue.


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Notas finais do capítulo

me desculpem a demora, sério. É que eu sou muito lerda para preparar um capítulo msm!! ): kkk
E sinto muito em informá-los, mas acredito que esse já seja um dos últimos capítulos, pelas minhas contas, haverá acho que mais uns 2. :$
Espero de coração que estejam gostando!! (:
Então, até a prox
bjsss!! (: