O anjo tentou voar, mas algo o puxava para baixo, não era a força da gravidade, era algo muito mais profundo: pendências. Ele sabia o que tinha que fazer, mas lhe faltava coragem. Depois de muito tentar, desistiu de voar e sentou-se às margens de um lago, viu seu reflexo e não reconheceu a si mesmo, no lago refletia-se o interior do anjo: sombrio, vazio, um profundo poço de solidão. Um aperto no peito o fez desabar em lágrima, eram negras, assim como suas asas e seu coração.

Ele amava muito a anjinha, quando acordava, era nela que ele pensava e também na mesma antes de dormir. Seu coração parecia que iria saltar do peito só de vê-la voar ao horizonte.

Certo dia, o anjo estava sentado a beira do lago, tocava uma harpa e cantava alegremente uma canção, seu coração estava cheio de alegria, tudo a sua volta se iluminou e pela primeira em muito tempo... ele sorriu.

O anjo continuava a tocar sua harpa e com sua voz melodiosa vários outros anjos se aproximaram e começaram a dançar. Enquanto cantava, ele procurava em meio a multidão a sua amada. Ao longe avistou-a e então correu atrás dela, ela não parou, pelo contrário,começou a fugir dele.

Por que...? - ele se perguntava.

Quando chegaram perto de um penhasco, ela se virou, sorriu, aquele sorriso era repleto de mágoa e então voou para as montanhas. O anjo não conseguiu voar, apenas ficou observando-a até estar longe do seu campo de visão. Pouco tempo depois, uma tempestade começou, aquela chuva pesada era como o coração o anjo, cheio de mágoa, escuro e frio.

A chuva ficava cada vez mais forte, o anjo estava desolado, com o coração partido, despedaçado, havia sido deixado para trás. Ele foi para debaixo de uma árvore, para se abrigar da chuva. E caiu de joelhos, sem forças, derrotado. "Por que?" o anjo novamente se perguntava.

Suas asas perderam o brilho e algumas penas começaram a cair, sendo arrastadas pelo vento e voando para longe. Pouco tempo depois a chuva parou e o sol surgiu, aquecendo o coração do pobre anjo, que ainda possuía a esperança de ser feliz.

O sol havia surgido, o anjo apreciava as nuvens cinzas desaparecerem e o sol surgir, o céu ficar de um azul bem claro e os pássaros voltarem a cantar. Ele se levantou e saiu caminhando até perto do rio, onde a água estava tão clara que chegava a brilhar, os anjos começaram a dançar e se alegrar.

O anjo procurava a sua amada na multidão, mas não conseguia encontrá-la, queria poder beijá-la, reconquistá-la, não sabia ao certo como... só sabia que o faria. Pegou a sua harpa e começou a compor um nova melodia para aquecer o coração dela e também o dele.

Ele passou horas compondo a melodia perfeita para a sua amada, a lua já reinava sobre as estrelas quando ele finalmente terminou. As estrelas brilhavam como nunca, não havia uma única nuvem no horizonte ou nevoeiro. Era uma noite abafada e a floresta a sua volta parecia bem acordada, os animais cantavam suas melodias e vaga-lumes dançavam ao fundo. A leve brisa fazia as folhas das árvores balançarem harmoniosamente, criando uma bela melodia junto o canto dos animais.

O anjo respirou profundamente, conseguia sentir o cheiro das flores que haviam desabrochado recentemente na primavera, ele se sentou embaixo de uma árvore e adormeceu ao lado de sua harpa dourada.

Quando acordou, o sol havia acabado de surgir e os pássaros já haviam começado a cantar. Era uma bela manhã de primavera, os anjos voavam livremente, todos riam, felizes. Ele sabia que não poderia juntar-se aos outros até reconquistar sua amada. O anjo saiu andando em direção ao Jardim, lembrou-se de quando a levou pela primeira vez, o seu sorriso, como aquele ambiente combinava com ela.

Ao chegar lá teve uma surpresa, ela estava sentada no mesmo lugar que eles haviam conversado dias antes. Quando a anjinha o viu, tentou fugir, mas ele tomou coragem e a impediu. Pois sabia que se não tentasse expressar agora todos os seus sentimentos, talvez não houvesse outra oportunidade ou... simplesmente não teria novamente a coragem necessária para o feito.

Pegou em sua mão e conduziu-a de volta ao banco, pegou a sua harpa e começou a tocar, cantou com todo o coração e quando terminou ela abraçou-o. Havia o perdoado, ele sorriu como nunca havia sorrido. Então levantaram voo. Dançaram junto ao vento, o sol refletia o rosto de sua amada, de belos olhos verdes.

Como nunca, as asas do anjo tomaram um brilho dourado espetacular, que combinava perfeitamente com os raios de sol. O sorriso em seu rosto era o mais puro e belo. Se pudessem, permaneceriam ali, voando por toda a eternidade. Ele estava tão feliz que não haviam palavras suficientes para descrever tamanha a alegria, tudo o que ele mais desejava era passar o resto de sua vida ao lado dela.