Certa vez eu estava no centro de treinamento, e então eu tentei escalar pela primeira vez e eu caí. O ar saiu de meus pulmões, eu via as pessoas gritando por mim, falando ao meu redor, mas não conseguia respirar, não conseguia falar... Eu ouvia a voz de Brutus pedindo se estava tudo bem... Eu me sinto assim agora de novo, mas levo comigo a certeza de que não ouvirei novamente a voz de Brutus, nunca mais.

Sinto minhas pernas cederem, e então Gale me segura.

Quando o ar entra em meus pulmões novamente, é no momento que começo a soluçar. Eu me agarro ao peito de Gale e me encolho, ele lentamente vai até o chão e senta-se. Afaga meus cabelos e diz palavras de conforto. Eu não consigo parar de soluçar, me sinto uma criança novamente.

Flashes de momentos com Brutus passam em minha mente. O primeiro dia que estive no CT, quando ele me contou sobre seus jogos, falando que se eu quisesse ser uma campeã, precisava de dedicação. Quando acertei meus primeiros alvos consecutivos... Quando eu implicava com ele, dizendo que ele gostava de Enobaria mas não admitia. Quando ele começou a falar para mim pegar mais leve nos treinamentos: “Não se pode ser um vencedor com os músculos dilacerados Clove”. As vezes que ele me levou comida e me obrigou a comer tudo...

Nem se eu vivesse mil anos pagaria tudo o que ele fez por mim.

E agora, ele está morto.

Quando foi a ultima vez que eu o vi? Antes da segunda arena?

“– Você vai conseguir. Faremos tudo para manter você e Ethan vivos. - Diz Brutus e eu o abraço. - Agora vai, o aerobarco está esperando.”

E foi isso. Esse foi o nosso adeus.

Eu não tive a oportunidade nem de agradecê-lo.

Meu peito dói. E uma nova onda de soluço me invade.

– Vem Clove. – Gale sussurra em meu ouvido. – Precisamos sair daqui.

Gale tem razão, ficar assim, aqui no hospital com todos vendo não é bom.

Vamos até meu compartimento, assim que passo pela porta, só consigo ter forças para me jogar na cama e chorar, soluçar, lamentar.

Gale fica o tempo todo ali. Eu não sei que horas peguei no sono exatamente, mas quando acordo, ele está no chão dormindo. Deve ter saído enquanto eu dormia, pois agora já está com o macacão cinza e limpo.

– Gale? – O chamo e ele desperta no mesmo instante, se levanta e senta-se na beirada da cama.

– Clove... Como está se sentindo?

– Eu não sei. – Comento me sentando na cama. – Me sinto em êxtase. Eu ainda não aceitei.

– Perder alguém que você ama é difícil.

– Como aconteceu? Enobaria já sabe?

– Foi muito confuso, nós os retiramos, Enobaria estava machucada. Ela e Brutus estavam indo mais a frente e ele estava a apoiando. Então um pelotão de pacificadores apareceu e começou a disparar, todos conseguiram se proteger a tempo, como Enobaria já estava ferida ela não iria conseguir se proteger a tempo. Brutus a empurrou para onde estava Boggs e recebeu a maior parte dos disparos. Ainda assim dois deles atingiram Enobaria. – Coloco as mãos sobre o rosto, aperto os olhos com força e massageio as têmporas, tentando impedir as lagrimas de descer.

– Isso é horrível! Enobaria jamais vai se perdoar.

– Você precisa falar com ela, quando ela acordar, ela vai precisar de um apoio. – Eu respiro profundamente. – Você terá que ser mais forte que nunca Clove.

– E de onde tirarei mais forças Gale? – Meus olhos já começam a marejar. – Eu estou tentando ser forte, mas não está dando mais! Não está! – Eu mexo meus braços freneticamente e novamente ele me abraça. - Brutus era tudo que eu tinha, ele era um pai para mim, ele me ajudou quando eu precisei e agora ele morreu por algo que foi eu que provoquei! – Começo a chorar novamente. – Eu não sei como posso ser forte sabendo que fui a assassina indireta de uma das pessoas que mais amei na vida!

– Clove, Brutus foi só mais uma vitima da capital. Está entendendo agora por que precisamos lutar? Não podemos mais deixar que eles matem quem a gente ama.

Eu deito novamente, e permito que Gale continue acariciando meus cabelos até eu pegar no sono.

Meus pesadelos essa noite, giram em torno de um corpo totalmente em farrapos, perfurado por balas. O sangue verte dos ferimentos, de sua boca... Ele se engasga ao tentar falar comigo. Mais atrás, está Snow, observando tudo enquanto toma uma taça de vinho, quando ele sorri, seus dentes estão manchados de sangue. O corpo perfurado de Brutus se remexe e sua mão estica alcançando minha perna, eu grito.

– Clove? Clove? – Eu abro meus olhos. Meu compartimento está sendo iluminado por uma luminária, sentado ao meu lado está Ethan e não Gale. Sinto-me confusa. – Pesadelos?

– Deu para perceber?

– Seria difícil não perceber com seus gritos. – Ele diz e acaricia minha bochecha. – Gale não podia ficar aqui, ele tinha coisas a resolver no comando e pediu para eu vir até aqui. – Assinto. – Você ficou sabendo de Brutus não é? – Assinto novamente.

– Enobaria já acordou? – Ethan nega.

– Deram sedativos muito fortes a ela. Todos sabem o que iremos enfrentar quando ela acordar.

– Tenho medo dela virar uma dependente novamente, você sabe, quando ela surtava apenas Brutus a parava. – Ao mencionar o nome de Brutos, as lagrimas voltam. Ethan me abraça e me faz voltar a deitar, ele deita ao meu lado e afaga meus cabelos.

– Não vamos pensar nisso hoje, não é o momento, nem para você e nem para mim. – Eu me encolho em seus braços. Depois de tanto tempo eu volto a me sentir protegida. Ainda não tocamos no assunto “Capital” ou “Cato”.

Agora temos um assunto mais importante para resolver: Enobaria.