Setores de Sangue escrita por Carlos Junior


Capítulo 19
Capítulo 19: Morros de Determinação


Notas iniciais do capítulo

O capítulo está grande, mas a ação retornou. A partir de agora, podem dar adeus aos dias de calmaria.



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Cordon conduzia sua motocicleta com voracidade, não pensava em solucionar irregularidades, apenas utilizava aquele exercício como terapia. Seu irmão, Garbon, havia conquistado o mais alto patamar que um oficial poderia alcançar, enquanto ele contentava-se com sua existência meramente convencional. Cordon desejava apresentar alguma utilidade, mas sua personalidade justa o condenou, levando-o a uma realidade onde apenas ambiciosos se destacavam, e a injustiça prevalecia. Estava na hora de iniciar uma contagem regressiva para uma revolução.

Conhecia Zack desde que possuía 10 anos de idade, seus pais eram colegas de trabalho em uma instituição financeira do Primeiro Setor, e quando o sujeito o convidou para o pequeno grupo visionário que estava formando, sentiu que sua vida encontrava-se prestes a mudar.

Cordon pisou fundo no acelerador que encontrava-se no pedal, e disparou. Seu destino era certo, deveria encontrar Zack em Mustard antes que ele decidisse agir por conta própria. Cordon esperava, pelo menos, que não fosse tarde demais.
Não demorou muita para que a moto alcançasse o edifício de concreto que, supostamente, abrigava Zack desde a tarde do dia anterior, porém, a inquietação proveniente do estômago de Cordon atrapalhava seu raciocínio, e, consequentemente, sua sanidade. Aquilo que sentia não poderia ser denominado de desespero, pois encontrava-se em um grau reduzido de ansiedade, mas também não poderia afirmar-se que aquilo não o consumia.

Cordon não era frio como seu irmão, mas possuía o mesmo intelecto, apesar da ausência de firmeza às vezes interferir negativamente em seus planejamentos. Ele posicionou a motocicleta em um velho poste de metal, iluminado por conjuntores de LED acima, forjou um semblante raivoso, guardou a chave eletrônica do veículo no bolso, e caminhou lentamente até o local determinado.

Para sua surpresa, Zack encontrava-se a vista antes mesmo de Cordon entrar no prédio, ele havia se estabelecido em uma das evaginações da arquitetura sinuosa, mas não estava sozinho. Junto dele, havia um grupo de crianças, e uma mulher de mais ou menos 40 anos, a mesma faixa etária que Zack e Cordon possuíam.

Cordon evitou emitir qualquer som antes de se aproximar o suficiente do local, afinal, haviam outros indivíduos na região, e muitos deles estavam dormindo, mas Zack o notou antes mesmo que o oficial chegasse mais perto, e deixou o ambiente escuro em que se encontrava.

– Cordon - proferiu Zack, em um som relativamente baixo. Ele desenvolveu um meio sorriso, demonstrando a satisfação na presença de Cordon. - Finalmente.
Cordon devolveu o sorriso, mantendo a postura frígida, para exacerbar uma questão de poder em relação aos outros presentes.

– Fico feliz que você não tenha saído daqui - disse Cordon.

– Para onde eu iria? - ironizou Zack, voltando-se rapidamente para a família que encontrava-se junto a ele na saliência sombria. - Cordon - o nome adquiriu uma expressão dramática ao sair de sua boca, evidenciando que uma nova ideia surgira em sua mente.

Cordon deslocou-se um pouco para o lado, a fim de obter uma melhor visão do rosto de Zack.

– Eu gostaria de adicionar um novo objetivo em nossos planos - com "nossos", Zack deixou claro que se tratava do grupo.
Como Cordon suspeitava.

– Pretendo salvá-los. Salvar os mustards - respondeu Zack.

– Salvá-los do que? - Cordon ergueu as sombrancelhas, adquiriu um certo medo da resposta.

– Disso, da exclusão - Zack abriu os braços, na intenção de exibir todo o cenário a sua volta. - Salvá-los de Marshall Lawng.
Cordon lançou-lhe um olhar severo de desaprovação.

– Nas suas condições, você deveria mesmo é estar pensando em se salvar - repreendeu ele.

Zack não respondeu, apenas permaneceu estático, sua respiração sendo a principal responsável pelo movimento corporal.

– Zack - Cordon iniciou a explicação, desvencilhando-se do assunto anterior. - Sobre o plano. Eu não estou mais encarregado do controle dos portões. Na verdade, nesse exato momento, eu estou em turno.

Zack olhou ao redor, e Cordon compreendeu perfeitamente o que aquilo significava, a possibilidade de uma troca de turno poderia ter sido uma estratégia para que o oficial fôsse pego em flagrante em um período de tempo onde a maioria dos membros daquela sociedade encontravam-se desocupados.

– Eu não acho que esteja sendo seguido - defendeu-se Cordon. - Além do mais, acredito eu, que Garbon esteja confiando em mim.
Zack balançou a cabeça.

– Garbon é uma pessoa de aparências. Ele é uma pessoa que manipula através do comportamento. Eva também é assim - prosseguiu Zack. - Por que você acha que ele confia em você?

Cordon demorou uns segundos para articular a frase que seguiria a abordagem, então exprimiu:

– Ele me pediu para largar o grupo.

Zack arregalou os olhos.

– Como ele sabe do grupo? - perguntou, com certa desconfiança na voz.

– Ele não falou exatamente assim. Ele disse que eu deveria mudar de lado, e eu acabei consentindo.

Zack suspirou aliviado, direcionando seu olhar para o alto.

– Cordon, você sabe que não é lá um bom ator - revelou ele. - Seu irmão provavelmente sabe que você está mentindo.

– Tudo bem - Cordon encontrou-se incomodado pelo fato de Zack ser a segunda pessoa a avisar-lhe a respeito daquilo. - deixemos essa questão de lado. O motivo de eu ter vindo aqui, na verdade, tem a ver com a possibilidade de eu não desenvolver mais nenhum contato com alguém do grupo até o grande dia. - Antes que Zack dissesse alguma coisa, Cordon antecipou-se. - Sim, eu sei quando é o grande dia. Por sorte, Eva me revelou o plano antes de toda essa confusão.

– Fico feliz em saber disso - Zack assentiu com a cabeça. - Então você não vai poder informar a Eva sobre o meu paradeiro?

– Infelizmente não - negou Cordon.

– Sem problemas - exprimiu Zack, mudando o rumo da conversa. - Para onde você pretende ir agora?

– Trabalhar - a velocidade com que o verbo deixara a boca de Cordon fora impressionante, até mesmo para ele. Talvez fosse aquilo que desejava fazer, ou talvez fosse aquilo que desejavam que ele fizesse.

Cordon já se preparava para afastar-se do amigo, quando Zack o puxou pelo braço.

– É melhor não confiar em ninguém - recomendou ele.

》》》

A noite passou como uma faísca. Ao abrir os olhos, Robert notou que havia dormido no chão sujo e empoeirado do compartimento de Eva. Ele puxou uma das mãos, mas as correntes negaram o movimento até sua testa para eliminar o suor que se concentrava ali.

– Bom dia - Eva abriu a porta de maneira cautelosa. Parecia contente - Tiveram uma boa noite?

Wilbur ainda estava dormindo, sua saliva escorrendo explicitamente de seus lábios abertos. Pelo jeito, as correntes não o incomodavam da mesma forma que incomodavam Robert, e ele obtivera uma bela noite de sono.

– Eva - Robert dirigiu-se para a mulher, estacionada em frente a porta. Ele abaixou a cabeça na hora do pedido, visando aparentar vulnerabilidade e educação.

– Poderia me soltar agora?

Eva sorriu ironicamente, como se o poder que possuía naquele momento a satisfizesse, então respondeu:

– Estou apenas aguardando um convidado para que finalmente vocês possam ser soltos.

Robert respirou fundo, deitando-se novamente sobre suas mãos acorrentadas. Quanto mais tempo aquilo iria durar?

– Mas não se preocupe, ele vai chegar logo logo - tranquilizou Eva, ainda com a mesma expressão que entrara no quarto. - Espero encontrar alguma coisa para vocês comerem enquanto isso - então, ela deixou o quarto.

》》》

– Clarice - ela escutou seu pai chamar.

Ele iria repetir, provavelmente, se ela não houvesse saltado da poltrona giratória em que havia adormecido acidentalmente na noite anterior e caminhasse, cambaleando, em direção à sala de estar.

– Seu professor está aqui - anunciou Marshall, enquanto estudava seu visual elegante em um dos demasiados espelhos da sala, iria apresentar-se na tv em instantes, portanto, deveria encontrar-se apresentável.

Outro homem, de cabelos desgrenhados e barba mal feita aparentando ter cerca de 25 anos, a aguardava pacientemente ao lado da mesa central, o professor particular que o poderoso presidente do estado havia contratado para dar aula semanalmente à sua filha, que não poderia frequentar escolas usuais por dividir laços de sangue com o principal representante político do país.

O professor sorriu, como sempre fazia ao aproximar-se da garota. Era assim que demonstrava sua gratidão por estar ali, Clarice sabia disso.

– Se comporte - exprimiu Marshall, cuspindo as palavras em um tom frio, talvez fosse a pressão envolvida no pronunciamento que haveria dali a alguns instantes que o deixara daquela maneira. Ele se dirigiu para a saída do aposento em que residia, e o deixou, apressado.

Após alguns segundos, o professor se pronunciou.

– Tudo bem? - perguntou ele, apresentando certa ingenuidade em sua voz.

Clarice esfregou os olhos e exibiu um sorriso, sem graça.

》》》

Intensas horas depois, a adolescente imergira em uma série de conceitos e filosofias relacionadas a organização política e econômica dos setores componentes do país em que se encontrava, oriundo de uma antiga civilização, oficializada como Canadá. No momento, conhecido por um código, C1P2.

– O blefe foi utilizado como estratégia para o estabelecimento de diversas entidades políticas que governaram o nosso país. Já que os presidentes só passaram a ser eleitos por um parlamento continental em 3054, seu pai... - o professor permanecia seguindo a explicação.

Clarice mantinha-se com os olhos focados no movimento que realizava a boca do homem desajeitado a sua frente, desatenta, até que aquele termo a despertara.

Blefe.

Era isso. Aquela era uma excelente estratégia, e estava disposta a colocá-la em prática.

– Alguns conflitos internos ainda assolam a nossa realidade, porém, é necessário, para superar as desavenças econômicas... - Clarice não fazia a menor ideia de o por que tudo aquilo interessava. Detestava política.

– Com licença - pediu ela. - Tenho que ir ao banheiro.

O professor pausou o discurso, surpreso, e fez que sim com a cabeça.
Clarice apressou-se para chegar em seu quarto, alerta. Ligou o monitor de seu computador, e com agilidade, escreveu as palavras "Eu topo" na zona de comentários de seu blog. Lá, agora jaziam apenas suas mensagens soltas da noite anterior. Os comentários do sujeito anônimo haviam sido deletados pelo próprio autor.

Ela cerrou os punhos.

》》》

A campainha soou, despertando a ansiedade de Eva. Ele chegou, pensou.
A mulher caminhou em direção à porta, e a abriu, recebendo o alto e robusto homem que aguardava do lado de fora.

– Martin - cumprimentou ela.

Ele devolveu a expressão com um sorriso malicioso.

– Como vai, Beccynha? - Martin abriu os braços, exibindo sua larga envergadura. Referia-se a Eva como Beccyinha devido ao nome de sua mãe, Rebecca, uma mulher audaciosa e questionadora, de personalidade bem semelhante a da filha.

Eva o abraçou, demonstrando o quanto estava feliz em tê-lo ali. Era um velho conhecido da família.

– Será que estou ouvindo coisas? - indagou uma voz vinda do corredor, em um tom brincalhão. Smith, pai de Eva, e amigo íntimo de Martin, aproximava-se, com entusiasmo.

– Velho Smith! - exclamou Martin, abandonando Eva e movendo-se em direção ao varão que o recebia.

Seguido de severas introduções, Martin finalmente fora informado sobre o real motivo de ter sido chamado, e, em suma, guiado para um dos preciosos depósitos da Eva no fim do corredor, onde a mulher usualmente escondia armas, munições e equipamentos de guerra que receptava clandestinamente de fontes secretas e internas a ala presidencial. Lá, haviam dois rapazes, algemados a alças metálicas presentes no chão do quarto.

– O que é isso? - Martin tornou para Eva, franzindo a testa. De início, parecia sério, mas, em seguida, seu senso de humor aflorou. - Qual vai ser o preço de resgate? - brincou, e Eva percebeu que a piada arrancara um sorriso de Wilbur.

– Eles foram enviados por Zack para participar de nossa missão - explicou ela. - Talvez apresentem alguma utilidade para nós.

– Pergunte para eles - sugeriu Martin, e, sem mais consultas, prosseguiu, dirigindo-se aos rapazes. - Vocês dois, no que são bons?

Um breve silêncio assolou o ambiente, antes que Wilbur pudesse responder por ambos.

– Armas, Robert é bom com armas - revelou ele, e Robert virou rapidamente a cabeça para reprimí-lo com o olhar, provavelmente sentindo-se exposto. Era um homem de interesses particulares e sigilosos.

Martin volveu a cabeça para Eva e a balançou afirmativamente, sinalizando que aquela era uma excelente habilidade.

– E você, Wilbur? - continuou Eva, antes que o próprio Martin realizasse a questão oral.

– Eu... posso ser bom com cálculos - informou Wilbur, com certo descontentamento.

Eva pendeu a cabeça de um lado para o outro, verificando a utilidade daquela competência. Não era exatamente o que precisava, ou desejava, mas poderia acabar representando certa vantagem em seu plano.

– Vai servir - confirmou ela.
Ela não estava certa de que estavam falando a verdade, ou se haviam exagerado em um fato, mas nas circunstâncias hodiernas, era melhor não questionar. Imprevistos poderiam ser evitados com certo cuidado.

– Podem nos soltar agora? - pronunciou-se Robert.

– Tudo bem - consentiu Eva, mais confiante devido a presença de Martin em seu apartamento. O homem, com toda a certeza, não permitiria que nada acontecesse aos moradores.

De repente, um celular toca. Martin puxou seu dispositivo telefônico do bolso, examinou o contato remetente em sua tela, e anunciou:

– É minha mãe. Essa aí não consegue passar dois segundos sem me ligar - disse ele, e antes que pudesse deixar a sala, pôs a mão no ombro de Eva. - Ah, e não se esqueça do anunciado daqui a uma hora.

– Não se preocupe - garantiu ela, compreendese tratar do anunciado de Marshall Lawng.

》》》

– Alô? - atendeu Martin, adentrando o pequeno banheiro localizado no início do corredor de Eva.

– Ela aceitou - respondeu o sujeito do outro lado da linha.

Martin arregalou os olhos.

– Aceitou? - indagou ele, como se não acreditasse na informação. - Clarice Lawng aceitou?

– Ela acabou de dar uma resposta - revelou o contato.

– Essa garota não tem a mínima noção no que está se metendo, provavelmente a voz do seu primo falou mais alto - disse Martin, com certa ansiedade.

– Key não é exatamente meu primo - corrigiu o outro lado.

– Tanto faz - exprimiu Martin. - O que importa é que agora temos ela na mão. Só precisamos ter cuidado.

– Exatamente - concordou.

– Cour?

– Diga - atendeu o sujeito.

– Estou no apartamento de Eva, é provável que ainda hoje eu descubra a data do grande plano. Assim que isso acontecer, você contata o grupo e nos mobilizamos para inserir Clarice nele - explicou Martin.

– É exatamente isso que pretendo fazer - concluiu Cour.

– Ótimo.

》》》

Era hora. A equipe de desenvolvimento midiático, os responsáveis pela programação da popular e única emissora das redes de televisão do país, a Conar, preparava o presidente para que ele pudesse se pronunciar às massas através da transmissão de sua apresentação na emissora Conar e nos telões espalhados ao longo do setor. Os setores que não contavam com a disponibilização de telões, como o Setor 7, poderiam ter acesso a apresentação, também, por altos falantes, instalados com o intuíto de estabelecer ao mínimo uma forma de comunicação com o povo.

– Senhor presidente, venha - chamou um dos funcionários, para o homem de postura rígida que se encontrava no canto da saleta de cor branca, para realçar a visibilidade dos ali presentes.

Marshall caminhou até o centro do salão. Para ele, estavam direcionadas cinco câmeras, cada uma estabelecendo uma função diferente, já que a transmissão aconteceria ao vivo. Uma câmera seria responsável pela masterização instantânea, outra pela adição de cores claras à imagem gerada, e assim por diante, até que enfim as imagens das cinco câmeras fossem mixadas em um processador. Todo o processo contava com uma velocidade impressionante para ocorrer.

– Vamos começar a contagem regressiva - informou um dos funcionários por trás da câmera central. - 10, 9...

》》》

Robert e Wilbur acomodaram-se no sofá, aliviados por, finalmente, recuperarem suas liberdades individuais, mesmo que seus pulsos ainda ardessem, em protesto. Aquela havia sido uma noite de extremo desconforto, mas era reconfortante saber que todo aquele incômodo havia passado.

Smith alojara-se ao lado deles, enquanto Eva buscava o controle remoto para ligar o televisor. Seu principal inimigo estava prestes a se pronunciar em rede pública, o causador de todos os seus problemas, viria comunicar à população, como sempre fazia, que estava tudo bem.

》》》

– 8, 7...

》》》

Clarice aguardava impacientemente, enquanto seu professor coçava o queixo, com naturalidade, logo ao lado. Ambos estavam sentados a mesa com os olhos vidrados no gigantesco televisor de 103 polegadas.

– O que será que ele vai dizer? - perguntou o professor.

– Eu não faço a menor ideia - respondeu ela, francamente.

》》》

– 6, 5...

》》》

Zack, seu rosto novamente coberto por fuligem de maneira descentralizada, aproximou-se do grupo de mustards concentrados em frente a um telão de LED nas proximidades de seu refúgio, e pôs-se a inferir atenção ao que seria anunciado.

– Ouvi dizer que ele vai declarar guerra - disse um mustard para outro, ao alcance da audição de Zack. Boatos.

– Parece que ele vai contruir mais um shopping center - dizia mais um. Mais boatos.

》》》

– 4, 3...

》》》

O turno de Scadrish deveria iniciar dali a alguns minutos. Enquanto isso, outro oficial controlava o monitoramento das chaves do quartel de polícia vespertina, o qual ocupava o período da noite, permitindo a Scadrish uma boa noite de sono durante a madrugada.

Ele havia acabado de acordar, dormira bastante. Então, pressionou o interruptor da televisão de metal arredondada que encontrava-se presente em um dos quartos coletivos do quartel. A notícia, oferecida pela emissora, de que o presidente estava prestes a se pronunciar, o lembrou que aquele seria um dia especial.

Scadrish ajeitou-se na cama em que estava, e aumentou o volume.

》》》

– 2...

》》》

Em uma das principais avenidas do Setor, indivíduos das mais diversas classes sociais se reuniam. O comunicado do presidente direcionado à nação havia sido estipulado desde o dia anterior, e muitos ali encontravam-se ansiosos desde então. Não havia palavras para descrever o impacto causado por aquele momento para uma sociedade relativamente má administrada.

Cordon permaneceu montado em sua motocicleta, estacionada ao longo da avenida, não pretendia chegar muito perto, inclusive, devido às circunstâncias. Conhecia muito bem a realidade do país em que residia, e a instabilidade e fragilidade que apresentavam as questões sociais.

Aquele momento determinaria o início de uma guerra civil, uma guerra civil entre os que apoiavam e os que abominavam seu presidente. Aquele momento determinaria o início do fim.

》》》

– 1...

》》》

– Caros cidadãos, não desejo atear fogo em uma substância possivelmente inflamável, portanto, serei breve - iniciou o presidente, em metáforas. O fundo da cena havia sido alterado digitalmente para assemelhar-se a um painel de controle, como se o local tratado fosse uma fábrica ou outra instituição de alto potencial tecnológico. Aquilo também serviria para disfarçar sua real localização. - Um grave incidente assolou elevada parcela setorial devido à sua dimensão: encontramos um cidadão infectado nas redondezas da ala presidencial, precisamente em um bar. Apesar de toda a confusão, não houve danos irremediáveis - Marshall falava com determinação, era possível sentir a confiança em sua voz. Um verdadeiro orador. - Ainda estamos estudando a situação, mas desconhecemos até onde isso pode chegar, portanto... todos vocês serão submetidos a testes obrigatórios para verificar suas saúdes.

》》》

– O quê? Ele está cavando a própria cova - avaliou Eva, atraindo os olhares curiosos dos outros presentes na sala.

》》》

– Serão enviados para todos os postos de saúde, médicos especializados para que todos vocês possam ter acesso a esse programa de controle à saúde - continuou Marshall. - Os que não se apresentarem nos postos de saúde amanhã, a partir das nove horas da manhã, serão propriamente visitados em suas residências para a avaliação, e caso haja relutância, não esqueçam de que resultará em punição. Severa.

Após o toque de seriedade, Marshall aliviou a tensão:

– A administração do país só quer o melhor para vocês - finalizou ele, encerrando a transmissão.

》》》

Eva levou a mão até a boca. O aviso de última hora havia desestruturado todo o planejamento proveniente de semanas de pesquisa, era como se Marshall houvesse previsto que rebeliões surgiriam e decidisse lutar contra elas com seus próprios punhos, que, pelo jeito, eram extremamente resistentes e danosos.

As ruas do Setor encontrariam-se congestionadas e com intensa concentração de oficiais, principalmente as próximas à estação de trem, ponto de partida de seu plano secreto. Mas não era assim que permitiria ser derrotada, aquele era apenas mais um desafio.

Ela levantou-se do sofá, e determinou:

– Martin, ligue para quem você conseguir. O plano foi adiantado.


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