Tequila Branca escrita por Van Vet


Capítulo 7
Esperando Você me Ligar


Notas iniciais do capítulo

Oi meus queridos!
Mais um capítulo fresquinho pra vocês! :D

Me desculpem possíveis erros ortográficos. Não tive tempo de revisar :/



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— Queria ter visto ele. — lamentou Padma comendo uma barra de chocolate, os dois cotovelos preguiçosamente sobre a mesa de trabalho.

Hermione tapou a boca com a mão e bocejou. Cansada. Não conseguiu pregar o olho durante duas noites, apesar da embriaguez de uma delas. Ronald ou Rony (ou ainda seu Arquirrival) martelou sua cabeça com um prego pontudo e intrometido. Ela continuava achando aquele plano descabido e a cada hora se imaginava pegando o telefone e jogando a toalha para Dorah. Olha, não dá! Não vou conseguir entrar no papel de princesa neurótica e apaixonada! Ela se via dizendo as palavras. Então se lembrava de toda a presunção (fazendo um esforço para ignorar a incrível gostosura dele!) e queria ultrapassá-la, arrancar aquele ar “jogo ganho” e “passe fácil” do rostinho dele.

— Ele é ruivo, alto e prepotente. — respondeu para a amiga depois do bocejo.

— Ruivo e alto não combinam com prepotente.

— Como assim? — Hermione ergueu a sobrancelha, olhando-a de esguelha.

— Você disse: ruivo e alto. Deveria ter mencionado outro atributo físico, não emendado em uma qualidade. — respondeu, os dentes escuros de chocolate.

— Prepotência não é qualidade — Hermione apoiou-se sobre a mesa voltando a encarar a tela do seu computador e analisando um manuscrito que chegara aquela manhã na sua caixa de mensagens. Seus olhos treinados de editora reconheceram rapidamente do que se tratava — Meu Deus! As pessoas não param mais de escrever sobre vampiros sensíveis?

— Outro original sobre sanguessugas adolescentes? — Padma impulsionou as pernas e as rodinhas de sua cadeira deslizaram para perto da mesa da outra, rangendo.

— Eu não chamo isso de original. — a morena torceu o nariz, contrariada pelo que lhe era apresentado — Veja isso: Marybelle se apaixona por Kevin, que entra no último ano da faculdade de Ciências Agrárias. Os animais da fazenda do campus começam a sumir de modo suspeito e a estudante vai investigar. Então se depara com Kevin como principal suspeito e descobre que ele não é um humano comum. — quando terminou a sinopse revirou os olhos, exclamando — Olha, desisto! Está cada vez mais difícil exercer nosso ofício nos dias de hoje.

— Qual o título da história?

— “Sobre Vampiros e Moças”.

Padma riu. Finalmente terminou seu doce, jogou o papel em cima da própria estação de trabalho e bateu as mãos. Então sugeriu:

— Eu filtrei todos os “assuntos” do meu e-mail que comecem com “adolescente” “vampiros” “sangue” “lua” e por aí vai. Dá uma triagem no que chegara para nós...

— Como fez isso? — Hermione ficou interessada, abominava questões como programações e configurações. Numa escala de zero a dez seu entendimento de informática ficava em menos um e ela não se importava muito com isso. Obviamente sabia que se tivesse nascido dez anos depois não ter o mínimo de intuição digital a deixaria na pré-história. Entretanto, possuía outros talentos que conseguiram se sobressair numa era em que os computadores só começavam a ser essenciais. Também haviam amigos mais integrados para ajudá-la, como Padma.

— Chega pra lá que eu arrumo pra você — a amiga ofereceu-se toda solícita.

— Legal. — agradeceu a editora, enviando “Sobre Vampiros e Moças” para a caixa de lixo (com muito gosto!) e pulando para a cadeira do lado. Padma assumiu o mouse e seu espaço na mesa.

— Vai me contando aí sobre o encontro de ontem. — Ah, claro que você não me ajudaria de graça — Prepotente, ruivo e alto não é lá algo que minha imaginação possa trabalhar nas noites chuvosas de solidão.

— Ok... — ela pensou nos pormenores, balançando-se no assento — Para descrição completa eu posso dizer que ele tem uma marca autêntica para chegar até uma mulher. Ele sorri de um modo envergonhado e coça a cabeça, fazendo uma expressão do tipo “me adote agora”. Provavelmente é uma jogada corporal dele. Deve ter visto em algum site de inutilidade masculina, algo como “Testosterona.com” em algum artigo que começasse com “Trace uma gatinha bancando o rapaz órfão”. Um mentiroso... um farrista.

— Às vezes é só um tique nervoso. Os homens não são tão inteligentes assim. Digo, esse negócio de jogada de sedução é tão algo feminino.

— Pode ser. — Hermione considerou encarando os próprios sapatos. Seus novos scarpins brancos que adquiriu com seu falecido cartão de crédito, agora estourado e baleado até o último cent.

— O que exatamente está no contrato de Dorah Vyrlant sobre conquistá-lo?

— Eu tenho de fazer com que ele se apaixone por mim, ou, ao menos que se encante, e depois, claro, ele vai me largar quando começar a interpretar a megera grudenta e feminista.

— Já tenho pena dele! — exclamou Padma. A seta do mouse agilmente pulava nas configurações do e-mail da amiga.

— Ei! Quer saber? Ele merece! —resmungou Hermione impaciente — É meu concorrente direto para esse contrato.

— Não muda o fato de eu ficar com pena do que você vai fazer com ele. Oh... o Choquito chegou!

O office-boy, um atrapalhado estagiário adolescente, entrou no escritório e começou a distribuir as refeições de quem não saía para almoçar naquele dia. Seu nome era Brian, mas Hermione e Padma o apelidaram secretamente de Choquito pelo fato do rosto dele ser um mar de acnes amarelas. Ele aproximou-se da mesa das mulheres e depositou duas sacolas sobre as mãos da morena.

— Obrigada, Brian. — agradeceu sorridente. Depois voltou-se para as sacolas, fuçando-as — Você pediu o que?

— Lasanha. — Padma respondeu ansiosa.

— Você não está de dieta? — franziu o cenho.

A outra abandonou o computador e puxou sua marmita das mãos dela.

— Hoje é segunda.

— Eu sei que é segunda. Por isso mesmo.

— Eu estou numa dieta nova. — justificou-se sem nem ficar ruborizada — Posso comer o que quiser de segunda e terça, mas nos outros dias tenho de fechar a boca.

— Qual a vantagem disso?

— A vantagem é que o último estudo da revisão “Shape and Diet” desse mês descobriu que os programas que estimulam a alimentação livre de fim de semana estão fadando as pessoas a comerem mais, porque nesses dois dias todos a sua volta, amigos e parentes, comem de tudo, logo, vamos acompanhá-los na comilança, diferente dos primeiros dias da semana que todos ficam com refeições menos calóricas!

— Hã? — Hermione ficou chocada com a lógica.

— Ahh... Não enche! — ela abriu sua comida, dando de ombros.

Balançando a cabeça negativamente, Hermione encostou-se a mesa e abriu sua refeição. Pegou os palitinhos de madeira, passou molhou shoyo por cima do macarrão e comeu seu yakissoba com rolinhos primavera.

— Mas e aí... Em que pé vocês estão? — Padma perguntou, a boca cheia de molho a bolonhesa. Quando comia massa ficava com as pupilas dilatadas e uma acentuada queda pós-prandial na produtividade.

— Eu fiquei de ligar pra ele.

— Desde sábado?

— Humrum. — engoliu um brócolis suculento.

— Tá esperando o que pra ligar?

— Ele ficar desesperado, preocupado, se achando fracassado. Eu não ia ligar já no dia seguinte para dar o gostinho do “Eu sou fantástico!” para ele.

— Não estamos mais no Domingo. Depois de vinte e quatro horas e mais uma manhã inteira, ele já deve estar pensando em outra mulher e riscando você da lista. Isso é, se você beija bem. Senão, ele desligou o celular ontem o dia inteiro só pra não ter de falar de novo contigo — esclareceu ela, vingando-se de Hermione por causa da lasanha.

— Claro que eu beijo bem. — Hermione retorquiu mastigando um broto de bambu. Contrariada, pousou a embalagem do almoço na mesa e sacou seu celular — Acho que já tá na hora de ligar pra ele mesmo!

***

— É brincadeira! Onde Stuart estava com a cabeça para escalar o Mkcoy para o time?! — Simas exasperou-se.

Rony também não entendia porque aquele técnico de quinta do Buffalos Bills conseguia ser tão estúpido quando a mídia declarava. James Mkcoy, a antiga estrela do time, vinha de uma severa contusão da temporada passada, e rumores diziam que ele estava com o espírito abalado por ter terminado um relacionamento de dez anos. Uma modelo de Ohio, uma mulher, ou seja, alguém com o poder de destruir o sexo oposto apenas com palavras, era a principal responsável pelo fim dos dias de glória do quarterback. Agora o homem era apenas um mosquito anestesiado por um inseticida poderoso, dando voltas errantes pelo campo.

— Eles vão demitir Stuart até o fim dessa temporada. — Dino resmungou, enquanto Rony os encarava irremediavelmente alheio ao jogo.

Era estranho porque ele normalmente amava futebol*. A coisa toda com aquele esporte iniciou-se na infância. Seu pai o levava aos estádios, comprava as camisetas oficiais e autografadas, o ajudava a preencher figurinhas de álbuns adesivos dos principais times do país. Fez com ele tudo que um típico pai americano, aficionado por um dos maiores esportes norte-americanos, faria com seu filho único. Quem sabe, se não tivesse optado mais pela competitividade em campo e menos pela intelectual, Rony não poderia estar jogando por um time profissional como fora o desejo inicial do patriarca Weasley... Ao invés disso, vivia uma luta diária por contratos milionários, mas de livros, não de cachês.

Dino e Simas praguejavam e xingavam nos replays do noticiário esportivo da tarde, durante o almoço na área de descanso do escritório. Um lugarzinho bem espartano criado para os “rapazes do Bússola de Ouro”. Entretanto, a cabeça de Ronald estava longe, pensando por que Hermione não ligara para ele. Se sua intuição estava certa, (e ela infalivelmente, costumeiramente, certeiramente, estava) ela deveria ter telefonado ontem. Era a regra básica das mulheres que saiam com ele. Sempre ansiavam por mais um momento. Antes do almoço, talvez até antes do café da manhã ela deveria ter ligado! Ele ficou grudado ao celular o dia inteiro só pra garantir. Conferindo se o sinal não sumia, se a bateria estava fraca, qualquer coisa que justificasse a demora dela para o segundo contato. Então veio a noite, depois a madrugada, e pela primeira vez na sua vida adulta (e sexualmente ativa) não tinha mais certeza se agradara o suficiente para aquela morena. E se não, perderia, perderia sua chance de comprar a cobertura que tanto almejava próximo ao edifício da editora.

Estava sendo um pouco vexatório, pensando bem. Ligou para o corretor de imóveis assim que deixou sua “aposta” no apartamento, naquela sábado mesmo, e disse com sua voz embriagada para que marcassem a visita a sua nova, futura (talvez não mais) morada. Teve de cumprir a promessa naquela manhã, admirando a linda cobertura com vista plena para o Central Park, mas com uma enorme cara de tacho, como dizia seu avô, sem ter a mínima certeza de que um dia poderia comprar o imóvel.

Deveria ter insistido para pedir o telefone dela. Talvez seja daquelas mulheres que sofram de amnésia alcoólica e não se lembrava mais do meu rosto na manhã de Domingo. Deve ter olhado meu número e pensando que era o telefone do taxista ou algo do gênero.

Ele foi voltando do seu surto psicótico de pessimismo porque Simas estava o cutucando no ombro:

— Não vai atender seu celular, não?

O toque do celular, o hino do Bufallo Bills, tocava enlouquecido no seu bolso. Pigarreou, retirou os pés da mesa, sentando-se ereto na cadeira e atendeu sem muita vontade de falar:

— Ronald Weasley.

Oi. Sou eu!

A surpresa de ouvir a voz dela o fez arregalar os olhos. Seus amigos perceberam a chegada de boas novas e ficaram a postos, o fitando estáticos. Rony tapou o fone por alguns segundos e disse aos murmúrios.

— É ela! — exclamou vitorioso e voltou-se para a conversa — E aí... Hermione?

Isso. Nossa, reconheceu minha voz mesmo, hein?

— Digamos que esperava por essa ligação.

Sério? Achei que vocês homens detestassem essa segunda etapa.

— Eu não sou um homem qualquer, supus que tinha percebido no nosso primeiro e único encontro. — retorquiu sentencioso. Simas fez uma mímica alá John Rambo metralhando vietcongues.

Eu já sou bem acostumada com esses também. — a voz dela parecia tensa.

— Por isso tá ligando só hoje? Imaginei que poderíamos nos encontrar ontem, mas como não ligou...

Ah, ontem eu estava ocupada. Hoje também, pra falar a verdade. Mas agora estou na minha hora de almoço e pensei “Tô aqui de bobeira! Vou conversar com alguém novo pra variar”.

Rony teve a impressão, e essa impressão era do tamanho de um caminhão cegonha levando retroescavadoras, de que ela debochava dele. Poderia assumir o papel de amante ressentido, entretanto pensou que talvez ela não fosse o tipo de garota que se importava com ressentimento masculino. Escolheu então um modo mais jovial de abordá-la.

— Estará de bobeira hoje à noite também? Eu tenho ingressos para o cinema. Um novo filme de Almodóvar, quem ir comigo? — Ele detestava Pedro Almodóvar e seus filmes cabeças, cheios de pessoas que eram homens e viravam mulheres, querendo ser homens de novo**. Feria masculinidades e paradigmas. Mas, como a maioria das mulheres gostava exatamente disso, sugeriu.

Um longo silêncio do outro lado da linha. Ela vai dizer não. Eu não acredito que ela vai dizer NÃO!

— Tudo bem. Hoje à noite? Que horas você me pega?

O alívio inundou-o como uma represa reativada. Ele vibrou muito internamente, pensando na vista para o Central Park enquanto tomava seus cafés da manhã.


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Notas finais do capítulo

* Para os norte-americanos, Futebol é o termo que eles usam para o que conhecemos aqui no Brasil como "Futebol Americano". Já o nosso famoso futebol eles chamam de Soccer.

**Só quem conhece os filmes do Pedro Almódovar (principalmente um deles, que não vou citar pra não virar spoiler) entende o que Rony quis dizer kkkk