Faltavam cerca de algumas horas para irmos até o aeroporto. Minhas últimas semanas haviam sido tediosas demais, e também ansiosas demais. É como se tudo tivesse resolvido parar e as coisas começassem a acontecer devagar, sem dar a mínima importância com minha semana esperada. Após um longo tempo tentando encontrar algo para fazer, as semanas finalmente passaram e minha ansiedade estava grande, obviamente.

Jade me ajudou a arrumar as malas. Fiquei agradecida por sua ajuda inesperada. Conversamos um pouco. Pude perceber que ela era uma boa pessoa, e que, na verdade, o problema todo sempre tinha sido eu. Era sempre assim: eu era sempre o grande problema da situação.

– Sei que Leon gosta de garotas cheirosas – disse ela, dando-me conselhos sobre o tipo de garota certa para Leon. – Uma vez, ele namorou uma garota que cheirava a chocolate. Foi engraçado – ela riu da própria piada. – Sei também que ele gosta de beijos na bochecha. Muitos beijos na bochecha. E talvez alguns selinhos de surpresa. Mas tente não exagerar. Quando conheci seu pai, foi meio... – ela parou por um momento, temendo falar algo desagradável para mim. – Repentino, podemos dizer.

Eu queria muito conversar com ela a respeito da relação dos dois. De Jade e meu pai, quero dizer. Nunca conversei com minha mãe sobre isso. Nunca achei necessário, e imaginei que seria doloroso para ela conversarmos a respeito disso. Para ela, a separação ainda era algo recente. Para mim também, na verdade. Mas eu queria desabafar com alguém sobre tudo isso. Queria desabafar sobre a raiva que sentia de Jade. E eu estava ali, temendo em desabafar da raiva que eu sentia de Jade com a própria Jade Estranho, não é?

– Olha, Jade – comecei, olhando para meus próprios pés a fim de não ter que encara-la. – Você parece ser uma pessoa legal e tudo mais, mas acontece que eu ainda não me sinto cem por cento segura em relação a você, entende?

Ela me olhou por um momento, resolvendo se era ou não seguro conversar comigo sobre isso.

– Entendo, é claro que sim. Sinto muito por tudo, mas... Todos merecemos uma segunda chance, e isso não vale apenas para o perdão. Isso vale para a vida toda.

Ela sorriu para mim e saiu do quarto, deixando uma pilha de camisetas dobradas ao lado da minha mala. Ela queria dizer que todos deveríamos ter pelo menos uma segunda chance de ser feliz? Bem, meu pai já era feliz. Como ele iria querer ser feliz com outra pessoa se já era feliz com minha mãe e comigo? Será que isso não estava sendo o suficiente para ele? Ele queria ainda mais?

Soquei o resto das roupas dentro da mala e marchei em direção ao carro. Ainda faltavam duas horas para a saída do vôo. Leon não sabia que iríamos até lá. Seria uma surpresa para ele.

Alguns minutos depois, meu pai abriu a porta do carro e se sentou no carona, de frente para mim, que estava no banco de trás. Ele não disse nada. Apenas colocou as mãos no volante e ficou em silêncio.

– Você não era feliz antigamente? – perguntei, abordando logo de inicio o assunto. – Você tinha absolutamente, tudo, pai. Uma casa legal, uma esposa incrível, uma filha que o amava muito...

– Amava? – ele perguntou, com um tom triste na voz.

– Eu ainda amo você, e sabe disso, mas não é a mesma coisa. É meio que um amor misturado com ódio, não sei – suspirei. – Eu só queria entender porque você foi embora.

Ele virou para trás e pulou o banco, sentando-se ao meu lado. Ele me encarou, mas não fiz o mesmo. Eu não queria olhar para ele, mesmo não entendo o porque de tanta raiva repentinamente.

– Porque eu me apaixonei novamente, e não estava dando certo.

Eu não esperava por essa resposta. Esperava que ele dissesse algo como ‘porque eu queria conhecer o mundo e afim’ ou ‘porque eu estava afim, ponto final’. Mas ele havia se apaixonado, e havia algo por trás disso que eu precisava saber.

– Como assim não estava dando certo? Você e mamãe eram o casal mais feliz da face da terra! – respondi, praticamente gritando.

– Não éramos há muito tempo, Violetta. Brigávamos com freqüência, não falávamos mais um com o outro. Apenas éramos normais na sua presença. As coisas se tornaram insuportáveis por um tempo. Tive que ir embora.

– Teve que ir embora? É claro, porque as coisas se resolvem assim, apenas – falei, um tom irônico tomando minha voz. – Você nunca nos amos, não é?

– Como não? Eu amo vocês, e sabe disso. Amei sua mãe por uma parte muito grande da minha vida, e não deu certo. Mas continuo amando você, e sempre amarei, não importa o que aconteça.

Ele me abraçou, e pude perceber ali o meu principal problema: eu me deixava levar pelas palavras muito facilmente.

Eu finalmente havia entendido o motivo pela qual meus pais se divorciaram. Talvez tivesse sido melhor desse jeito. Talvez não. Mas nunca imaginei que eles brigassem tanto. Eram bons atores, não havia como discordar disso.