A Herdeira de Hécate escrita por Rocker


Capítulo 46
Capítulo 45 - Wipe Your Eyes




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A Herdeira de Hécate

Why do we let the pressure get into our heads

Your broken heart requires all of my attention

Capítulo 45 - Wipe Your Eyes (Maroon 5)

– Melhor irmos de uma vez. – disse Paige depois do café-da-manhã e eu concordei, ajeitando meu gorro nos cabelos ruivos.

O dia amanheceu frio e depois de vestirmos algumas peças quentes, todos decidimos que o melhor era seguirmos viagem.

– É, não podemos nos demorar, daqui a pouco o sol nasce. – Travis disse, zipando sua mochila e pendurando nas costas.

Pendurei a minha também, um pouco mais pesada que o comum pelos suprimentos. Nico ao meu lado me olhou torto quando fiz uma careta com o peso.

– Eu carrego sua mochila, Anjo. – ele começou a dizer, mas logo eu o interrompi.

– Não, Nico, está tudo bem. – eu insisti. – Vamos, não queremos que os vizinhos nos peguem.

~*~

– Só pode ser brincadeira. – resmunguei, sentindo toda a pressão daquela missão me assolando novamente.

Depois de andar durante horas até o centro de Louisville e ainda sairmos à caça de alguma rodoviária, nos deparamos com uma estação de trem. Não era nossa primeira opção, mas depois que pedimos informações sobre os ônibus e descobrimos que a rodoviária ficava dali quilômetros para os outros limites da cidade, mudamos de ideia. Mas fiquei me perguntando se o universo cósmico não estava contra ou os deuses não estavam nos fazendo de bestas quando a atendente parecida com a que encontramos em Hagerstown disse que o próximo trem com vagas só sairia à uma hora da manhã.

– Calma, Cristal. – pediu Travis, com a voz mansa como se estivesse falando com um cachorro raivoso.

No mesmo instante meus olhos tomaram um tom alaranjado e dourado, expressando toda a minha fúria. A loira platinada arregalou os olhos, assustada, como se tivesse visto através da Névoa. Mas eu pouco me importei com esse detalhe. Me concentrei completamente em Travis, e o vi engolindo em seco ao me olhar.

– Não me peça para ter calma. – eu disse, notando meu tom de voz se tornando frio como gelo e cortante como uma adaga.

O ar na estação se tornou mais gélido, e a lâmpada logo acima de nós piscou algumas vezes antes de estourar. Percebi aquela fúria como antecedente de algum desastre, como sempre acontecia com a angústia e o desespero de ser perseguida por monstros. Respirei fundo algumas vezes para me acalmar ao ver olhar assustado dos meus amigos. O que eu menos precisava naquele momento era algo assim. Quando a fúria se foi, uma tristeza e um cansaço imenso me apossou e eu senti um peso imenso em meus ombros. Suspirei derrotadamente, ajeitando as mechas ao redor do gorro e enfiei minhas mãos no casaco. Meus olhos se tornaram tão negros quanto minha íris, a não ser pelo brilho prateado que indicava que, apesar de arrasada, eu ainda estava assombrada com minhas habilidades.

– Só... Comprem as passagens, okay? – pedi baixinho antes de me virar e sair da estação o mais rápido que eu conseguia.

Andei por vários metros e várias esquinas com a cabeça a mil, os pensamentos nunca parando em um ponto só. Depois de passar por algumas lojas de roupas e sapatos e até alguns prédios residenciais, me deparei com uma cafeteria com aparência aconchegante. Era tudo o que eu queria naquele momento. Quando entrei, deparei-me com o painel de cardápio e meus olhos seguiram pelas bebidas quentes e suspirei, aliviada, quando li que eles ofereciam chocolate quente. Paguei por uma xícara de chocolate quente antes de seguir até alguma mesa livre no fundo. Sentei-me no banco acolchoado que fica de frente para a parede e de costas para o mundo. Olhava alheiamente para a janela, observando as pessoas que passavam na calçada, envolvida com seus próprios problemas, sem ao menos se dar conta de que a pessoa que os observava tristemente era justamente aquela que poderia salvar a vida deles em menos de duas semanas. Suspirei novamente. Era muita responsabilidade para uma pessoa como eu.

– Esse lugar está ocupado? – ouvi alguém perguntando atrás de mim e eu nem olhei para trás para saber que era Nico.

– Está vago. – respondi-lhe e logo senti o assento ao meu lado afundar levemente com seu peso.

Não desviei meu olhar da janela, apenas apoiei meu cotovelo na mesa e meu queixo na palma da mão. Beberiquei um pouco do chocolate quente e vi um casal passando com uma criança entre eles, segurando a mão de seus pais como se o pequeno que estivesse decidindo por onde iam. Sorri tristemente, pensando que a maioria dos semideuses não tinham a sorte de sobreviver tempo o suficiente para criar uma família, como era meu sonho. Dar a uma criança o amor de mãe que eu não tive. O amor de família que eu não recebi.

Tirei a xícara de meus lábios e a deslizei pela madeira da mesa para mais próxima de Nico, oferecendo-lhe um pouco. Ele não disse uma única palavra enquanto pegava a xícara e bebericava um pouco. Respeitou meu tempo, deixou-me em privacidade com meus pensamentos. Eu adorava quando ele me pedia para me abrir com ele, mas também adorava o fato de que ele respeitava meu espaço. Ele sabia exatamente quando eu precisava disso. A xícara voltou para minha mão direita e eu levei-a até meus lábios. O processo se repetiu outras três vezes, até que ao invés de a xícara tocar meus dedos, foram os dedos de Nico.

Desviei, finalmente, meus olhos da janela e encontrei os olhos negros de Nico encarando os meus azuis claro. Eu nem ao menos reparara o momento em que eu me acalmara. Seus dedos fizeram uma leve pressão nos meus e eu deitei minha cabeça em seu ombro. Levando isso como sinal verde para um avanço, Nico passou o braço esquerdo por cima do encosto do banco e me abraçou pelos ombros, puxando-me para mais perto e me aconchegando contra si. Eu sabia que ele estava esperando apenas uma palavra minha. Possivelmente não sabia o que diria, e se manteve calado. E eu o admirei ainda mais por isso.

– Compraram as passagens? – perguntei depois de vários minutos, remexendo a xícara com o resto de chocolate já frio.

– Compramos. – respondeu Nico, virando a cabeça e beijando o topo da minha. – Só precisamos passar nosso tempo até lá.

– E o que faremos enquanto isso então? – eu perguntei.

Mas antes que Nico pudesse dizer qualquer outra coisa, uma loira ofegante entrou correndo pela cafeteria e se jogou no banco à nossa frente. Arqueei uma sobrancelha, perguntando-me o que dera nela, até que Travis seguiu até nós e se sentou ao lado de Paige.

– Paige, você tem que respirar antes de fazer qualquer coisa! – brincou ele quando ela abriu a boca e tudo o que saía eram lufadas de ar.

Paige riu levemente, dando um soco leve no braço de Travis.

– Já arranjamos o que fazer até irmos para Kansas City! – ela disse animadamente.

Troquei um olhar receoso com Nico, meus olhos mudando para roxo, e rezei para que nenhum mortal por perto pudesse ver através da Névoa.

– Diga de uma vez, então, Willians! – eu disse rapidamente.

Ela simplesmente levantou um panfleto, daqueles distribuídos nas calçadas, onde se dizia “Luxus, a melhor balada da cidade”, e eu quase me arrependi de ter dado ouvidos a Paige.


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