—Se agora é a hora do lanche... – Eu comecei. – Quando vai ser a hora da caça?

Eles me olharam torto e Kovski riu, acho que ele era o único que tinha realmente entendido minha pergunta e o que melhor saberia me responder também.

— Ela ta falando do almoço. – Ele disse calmo e me encarou, só agora reparei que os olhos dele variavam de verde escuro para mel dependendo da iluminação. – Geralmente é ao meio dia, no topo mais alto do sol.

É, essa foi a melhor explicação que eu tive desde que cheguei aqui, mas eu tinha aprendido o que era almoço.

—Pera, caça? Você caçava tipo aqueles caras locões de filme? – Roger me interrogou de uma maneira empolgada e divertida.

—Ah, claro, ela saia de árvore em árvore usando arco e flecha, Rô. – Foi a primeira vez que eu ouvi nitidamente a voz de Luke, ela era tão melodiosa e masculina de um jeito que eu nunca tinha ouvido antes. Mas a questão é que aquela frase debochada havia me deixado meio irritada.

— Eu usava arco e flecha, sim. – Minha voz era séria. – Eu fazia treinamento para valkyria, obvio que eu usava arco e flecha. – Conclui cruzando os braços.

— Valkyria é uma guerreira de Odin. Elas que levam os guerreiros pro Valhalla, o “céu dos nórdicos”. – Koski disse, e eu fechei os olhos e engoli seco com aquela blasfêmia de misturar cristianismo com tudo, urght. – Mas, mudando de assunto, como vão você e a Bela? – Perguntou voltado ao moreno que mexia agora no celular.

— Acho que nem tem volta. – Não posso negar, eu fiquei me perguntando se eles tinham algo sério. Sim, sou bem curiosa. – O jeito é investir na próxima, que é a Lia...

Antes que ele pudesse concluir, a conversa cessou e eu percebi que Rafael chegou por trás de mim olhando pro resto do pessoal, meio sério. Ele parecia meio surpreso por me ver com eles.

— Já se enturmou,Luna? Ia te chamar pra almoçar comigo. – Ele disse se dirigindo a mim enquanto ignorava os outros que também não pareciam lá muito contentes com sua presença. Luke tinha fechado a cara, Kovski e Roger cochichavam alguma coisa e o único neutro ali era Petter, que até chegou a comprimentá-lo. – Eaí, Pet. Ansioso pro campeonato de xadrez?

—Nem um pouco, cara, eu sinto que já perdi. – Respondeu. – Mas é, a gente trouxe ela pro nosso bonde.

—Espero que não se importem de eu pegá-la emprestada. – Ele disse colocando uma mão sobre meu ombro, me dirigindo um sorriso delicado e calmo. – Tenho que te mostrar o laboratório ainda durante o intervalo, assim que terminarmos de almoçar.

— E não pode levar ela depois? Estamos conversando, se não percebeu. – Luke disse sério. Percebi que os dois tinham uma rincha muito grande entre si, e eu estava louca pra saber o que era.


—Faço parte da Sala Modelo, esqueceu? – O loiro começou com um tom de óbvio, como se aquilo tivesse sido explicado milhares de vezes. Eu apenas abaixei a cabeça me sentindo num fogo cruzado entre os dois, era como se fossem soltar fogo pelas narinas enquanto se olhavam. Mas depois de alguns segundos Rafa se virou pra mim, e me sorriu mais uma vez. – É que eu tenho uma prova horrível todo começo de ano, e vai ser depois do intervalo.


— A-Ah, tudo bem, vamos sim. – Eu sorri e acenei pro resto do grupo, enquanto o seguia. – Acho que vejo vocês depois... – Apenas Petter me olhou e acenou um sim sorrindo, e eu percebi que o clima parecia tenso entre os meninos agora.


~~~~~~~~*~~~~~~~~*~

— Hãn... Tá tudo bem? – Perguntei. Desde que havíamos chegado ao refeitório e pegado nossas bandejas de comida, Rafael permanecia-se completamente calado e pensativo, e estava me deixando curiosa e aflita. Parece que conversar com eles tinha tirado aquela feição magníficamente divertida e brincalhona do rosto dele, que parecia meio triste e/ou nervoso agora.


— Ele é um idiota. Só pensa nele, egocêntrico. – Comentou, mais pra si mesmo do que para mim, o que tinha aumentado minha curiosidade, e pelo jeito ele percebeu. – O Laurent... Ou Luke, como preferir. – Ele deu um soco na mesa, e eu a senti tremer toda, por um momento me assustei. – Desculpe.


—Não foi nada, mas... O que há entre você e ele? – Recebi um olhar gélido da parte dele, o que me fez arquear a sobrancelha. Ninguém ousava me encarar daquele jeito.


—História para outra hora. – Ele se levantou sério. Eu nem tinha acabado de comer ainda, mas tive que segui-lo até o balcão para deixar a bandeja e provavelmente ir em direção ao laboratório, porém, aquela mudança repentina de estado de espírito dele tinha me deixado meio preocupada. Será que ele me odiava?

Fiquei pensando nisso enquanto caminhava, ele parecia bem mais simpático quando eu o conheci. Parecia que algo muito ruim estava envolvido e eu estava muito curiosa pra saber, de verdade, mas provavelmente ele nunca me contaria. Mas também, estava pedindo demais, era o primeiro dia que eu o via e já esperava que ele depositasse suas confianças em mim. Ri com esse pensamento.

~~~~*~~~~~~*~

Enquanto andávamos, aproveitei pra reparar nas outras pessoas da escola que me encaravam com uma expressão não muito legal, pareciam ter medo ou nojo, algo assim. Tinha algumas meninas que chegaram a revirar os olhos quando me viram. O pior de tudo era saber que eu não tinha feito nada de mais pra ninguém daquela escola ser tão rude assim comigo.


—Chegamos. – Rafa disse abrindo a porta, agora um pouco mais sorridente, o que me aliviou. – Luna, essa é a Yuui. Yuui, essa é a Luna.


Yuui era uma garota de olhos puxados bem diferente dos padrões que eu tinha lido. Era magra, cintura finíssima e peitos enormes que chegaram a parecer de mentira, ainda mais por que usava a roupa da escola um pouco mais decotada. Se não tivesse tanta cara de puta eu até a acharia bonita, mas além dela ter parecido não gostar muito de mim, também não tinha gostado dela.


— Famosa Luna Skallagrimm. É um prazer. – Ela sorriu de uma maneira que eu julguei FALSO COMO A PELE DE UM DRAGÃO [Nota da autora: “Falso como a pele de um dragão” é uma gíria do folklore islandês, que significa um grau extremo de falsidade, tipo Made in China aqui].


— Uhum. – Respondi fria, aquela garota tinha uma voz insuportável aos meus ouvidos, e eu nem tinha ficado um minuto perto dela. – O que eu preciso conhecer aqui?


—Preciso saber o que sabe sobre química. – A garota respondeu ajeitando os óculos de um jeito debochado e superior. Era uma pena, por que eu sabia bastante sobre elementos químicos.


—Bom, eu sei que metal explode água. – Eu disse convicta enquanto ela abafava uma risada e Rafa me olhava curioso, parecia querer uma explicação. – O sódio puro é reativo. Eu tenho muita experiência com explosões. – Suspirei, isso era uma coisa tão obvia que eu sabia desde os meus cinco anos (por isso mamãe sempre dizia pra eu não brincar com metal na água).


—Ah, então você sabe bem mais do que eu esperava! - Rafael suspirou e me deu alguns potezinhos com líquido coloridos, parecia bem interessado. – Misture alguns deles e faça explodir.


— Mas eu não sei mexer com isso... – Relutei, e não sabia mesmo, não fazia idéia, mas ele me incentivou mais uma vez e eu resolvi tentar.


E então eu peguei uns potes e examinei a água colorida dentro deles atentamente até escolher os meus, o que fez com que eles dois me olhassem de maneira curiosa, provavelmente era uma mistura que nunca tinham tentado. Porém, assim que eu coloquei elas no mesmo recipiente, uma estranha fumaça surgiu ao redor fazendo com que eu me assustasse e, em seguida, ouvi o loiro gritar “ABAIXA, VAI EXPLODIR” e eu obedeci rapidamente.


Em questão de segundo eu ouvi um KABOOOOM muito louco, e depois, quando vi que estava tudo seguro, me levantei olhando meio sem jeito pros dois, que tinham os olhos arregalados.


— Bom... – Começou Rafa. – Pelo menos sabemos que misturar Azida de Chumbo com Fulminato de Mercúrio não é uma boa idéia. E misturar Luna com laboratório é uma coisa a se evitar.