Always With Me escrita por Menta


Capítulo 4
The Cold Never Bothered Me, Anyway


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoal! Esse capítulo é um pouco grandinho, mas é essencial pro desenvolvimento dos protagonistas. Tem vários momentos fofos, participações de diversos personagens da história, e é do ponto de vista do Sirius, heheh. ;)
Espero que gostem! Pretendo que os outros não sejam tão grandes, mas espero que não abandonem a leitura. Agradeço a Dreamer, Babi Prongs (companheira de sempre =D), Natália Leão e Lune Noire que comentaram em diversos capítulos! Peço que mantenham o costume, a fic consta com 14 leitores até agora mas por enquanto só vocês se manifestaram, e, portanto, merecem o reconhecimento!
Muitos beijos e boa leitura!



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Depois de algum tempo caminhando à esmo pelos corredores do castelo dos MacLearie, ele finalmente decidira retornar à companhia de seus parentes, julgando já ter passado tempo o suficiente para constrangê-los com sua grosseria.

Desinteressado, Sirius Black pensava no que James, Remus e Peter poderiam estar fazendo naquele momento. Peter era amado pela mãe, muito protegido por ela; James, nem se falava, sua personalidade era decerto um reflexo da semi-idolatria que recebia dos pais. Remus, por sua vez, lhe confessara em determinada ocasião que seus pais, uma trouxa chamada Hope Howell e um bruxo empregado na sessão de registro e pesquisa de fenômenos sobrenaturais do Departamento de Mistérios do Ministério da Magia, de nome Lyall Lupin, passaram sua vida tentando lhe proteger do preconceito da sociedade bruxa com os infectados pela licantropia.

Certamente se divertiam com primos, amigos e familiares que de fato os aceitavam por quem eram, e não viviam mais um dos pesadelos puro-sangue que sempre fora obrigado a suportar. Cada minúcia daquela situação o enojava, pensava ele, rangendo os dentes e passando as mãos nos cabelos, irritado, enquanto descia a escadaria principal do terceiro andar daquele castelo, ignorando os quadros e afrescos da era vitoriana que pareciam julgá-lo e reprová-lo por suas vestimentas não condizentes com a aparência de um bruxo “de respeito”.

A aura de falsidade presente entre os convivas, os sorrisos e conversas ensaiados, a luta de egos e a competição implícita entre quem tinha mais dinheiro, prestígio e filhos “dignos de orgulho”, tudo era hediondo. Jovens mulheres e rapazes recém-casados em seus casamentos por interesse, exibindo um ao outro como troféus; velhos demenciando em sua megalomania pelo privilégio de ter uma linhagem pura e livre de abortos, nascidos trouxas ou sequer mestiços... E a maldita loucura elogiosa às artes das trevas, como se feitiços e magias imorais, covardes e movidas pela ganância de um poder desenfreado e falsamente supremo fosse uma ideologia digna de qualquer bruxo com um mínimo de conhecimento.

A cada passo dado, agora já descendo os últimos degraus das escadas, ele sentia seus pés pesarem cada vez mais, como se gnomos de jardim se segurassem nas solas de seus tênis, puxando-os para baixo com força. Sua vontade era de estourar um milhão de bombas de bosta pelo castelo inteiro, especialmente em cima do casaco e do penteado caríssimos de sua mãe. Entretanto, o ato não levaria a nada, talvez apenas a convencer Walburga a torturá-lo com a maldição cruciatus, ou talvez, se conseguisse fugir, torturar à mãe de Cordelia ou à própria.

Sentindo-se especialmente repleto de ira por não ter outra opção senão aturar aquela noite por mais algumas horas, o rapaz vagou em direção às portas duplas do grande salão de lareiras no qual inúmeros Blacks, junto a alguns Lestranges e Malfoys e outros bruxos escoceses desconhecidos se reuniam.

Porém, seus ouvidos sensíveis captaram uma voz feminina abafada falando de maneira apressada, sussurrando, em alguma localidade próxima. Seguiu o som, satisfeito por ter algum motivo para postergar ainda mais o encontro com seus parentes e outras companhias desagradáveis.

Ao finalmente captar sua origem, franziu as sobrancelhas, estranhando. Parecia vir de dentro de uma das paredes, dentro de algum compartimento… Secreto.

— ...Já lhe disse, não há motivos para ter medo de Bellatrix Lestrange. — Uma voz feminina dizia por entre as grossas paredes de pedra escura do térreo do castelo do Clã MacLearie.

— Mas ela me assusta. Eu a vi mexer em algo estranho no próprio braço, assim que chegou. Vi que estava caminhando nos jardins, às escondidas, tem de acreditar em mim. — Uma voz aguda e infantil respondia, e Sirius prontamente a associou com a criança mais nova possível de estar presente por tal ambiente, a irmã mais jovem de Cordelia.

— Ela não vai lhe fazer nada. Apenas a cumprimente e fique conversando com a Bairbre a noite inteira. E com o Regulus, ele é bonzinho. — A voz sussurrada de Cordelia parecia tentar confortar a irmã, e Sirius sentiu vontade de rir debochadamente ao ouvir o comentário sobre o irmão mais novo. Bem, ele é inofensivo, mas “bonzinho”... “Merdinha” é o melhor termo.

— Mas é sério! — a pequena garota quase gritou agudo, e ele pôde ouvir um “shh” audível vindo por parte de Cordelia.

— Ela parecia sentir dor, e coçou o braço, e lá tinha um desenho horrível, uma imagem muito feia, assustadora… — A voz da menina pareceu vacilar e ela soluçou e pôs-se a chorar baixinho.

— Eu também não gosto disso… Não gosto de quase nenhum deles. Você sabe. Mas temos de fazer isso, pela mamãe, pela nossa família. São poucas vezes por ano, seja forte. Eu sei que você consegue. — Sirius sentiu-se surpreso ao ouví-la dizer de maneira que parecia tão honesta o quanto não apreciava aquele tipo de reunião. Não condizia com seus modos frios e arrogantes, e sua aparência impecável de boa lady da sociedade bruxa.

— Eu não quero encontrar com ela. Não quero que ela olhe para mim. Ela me apavora, não consigo nem dizer o nome dela… — A menina ainda parecia encontrar dificuldades em não chorar.

— Mairéad. Vamos fazer o seguinte. — Cordelia pareceu mais segura. — Vamos juntas, e vamos cumprimentá-la juntas. Depois disso, passarei a noite inteira do seu lado. Posso te dar a mão por baixo da toalha de mesa, durante a Ceia, toda vez que sentir medo. — A menina disse de uma forma carinhosa que o surpreendeu.

— Só se você prometer brincar comigo depois. — A menina mais nova disse, em tom de chantagem.

— Mairéad… Vocês já vão dormir tarde hoje. Se a mamãe descobrir… — Cordelia começou, mas a irmã pareceu decretar:

— Ela não vai. Eu prometo. Vou te obedecer em tudo. Vamos aos jardins, enquanto eles ainda estiverem festejando. Por favor. Por favoooooor — a menina implorou, e Sirius teve a impressão de ouvir Cordelia rir.

— Está bem. Mas vai me obedecer em tudo. Tudo. — a irmã mais velha reiterou — E Bairbre irá conosco, não é justo apenas você receber recompensa por seu bom comportamento — Cordelia ratificou.

— Melhor ainda! — Ele ouviu o som de palmas curtas e abafadas, e mais uma vez um “shh” por parte de Cordelia.

— Vou te confessar uma coisa — a irmã mais velha disse, em tom de confidência — eu também tenho um pouco de medo até hoje — Cordelia admitiu.

— Você está mentindo — Mairéad respondeu, descrente.

— Não estou. Mas sabe o que fez o meu medo diminuir? Enfrentá-lo. Este é o único jeito, a única maneira de ser forte. Não há coragem sem medo — a irmã mais velha disse em um tom professoral que, por algum motivo, fez o rapaz sorrir.

— Só vou se você brincar comigo — a mais nova insistiu, como se ignorasse a irmã.

— Sua pentelhinha! — Cordelia respondeu, rindo, e Sirius passou a ouvir passos na direção onde encostava uma de suas orelhas. Pensando e agindo rápido, escondeu-se dentro de um enorme armário que havia ali perto, contorcendo-se dentro do espaço escuro e apertado.

Aguardou até que os passos cessassem e o som de uma porta abrindo e fechando, logo em seguida, ecoasse pelo Salão Principal onde se encontrava.

Depois, saindo do esconderijo improvisado, nem sequer limpou da jaqueta as teias de aranha que desfez ao apertar-se lá dentro, sabendo que aquilo irritaria ainda mais sua mãe. Passou uma das mãos pelos cabelos em um gesto automático, e aguardou mais alguns momentos. Ao julgar ter passado tempo suficiente, finalmente entrou no salão das lareiras.

Passou os olhos rapidamente pelo cômodo. Era inegavelmente belo, tendo o mesmo estilo de construção que o castelo de Hogwarts, porém claramente mais mal cuidado; medieval, ancestral, construído com pedras escuras e de teto alto em todos os aposentos. Inúmeras lareiras estavam postadas em meio a arcos que pareciam levar para entre-salas construídas como pequenas cabines adesivas ao salão, e muitos bruxos passavam, sorrindo e desfilando pelo ambiente, ostentando suas vestes caras, levando em suas mãos taças de vinho, champagne, copos de whiskey de fogo, gim tônica, conhaque e todo o tipo de bebida alcóolica refinada.

Sentadas em um sofá mais próximo da lareira, Sirius prontamente avistou suas primas Narcissa Black, agora Malfoy, e Bellatrix Black, também mais conhecida por seu sobrenome de casamento, Lestrange. Bebiam duas enormes taças de vinho tinto, e pareciam se divertir, como se não tivessem se visto por muito tempo. A loira sorria com alguma simpatia, e sua prima, morena, de olhos caídos e pesados, com seu olhar sempre malicioso, parecia consideravelmente desvairada, como se estivesse prestes a gritar de entusiasmo.

— Boa noite, belas damas. — Sirius fez uma reverência sarcástica, curvando-se próximo de Narcissa para propositalmente deixar cair em cima dela um pouco da poeira pesada do armário sujo que se escondera.

As duas o olharam de cima a baixo, e Black teve de sorrir debochado pela expressão de desagrado de ambas.

— Se eu fosse sua mãe… — Bellatrix Black contorceu os lábios como se fosse cuspir em cima dele. — Já teria me livrado de um estorvo assim há muito tempo. — Ela sequer o encarou nos olhos, e moveu seu rosto para encarar Narcissa outra vez, que ignorou solenemente a presença do primo.

— Curioso mencionar isso. — Sirius parou de sorrir, mas continuou a encarando arrogante. — Tento meus maiores esforços possíveis para ser expulso de casa, mas será que seu marido sabe que você o faz também? — ele perguntou, debochado.

Bellatrix continuou o ignorando, mas Narcissa levantou as sobrancelhas, parecendo preocupada. Sirius pôde reparar, pelo perfil da prima morena e louca, que seus olhos negros pareceram se fechar mais.

— Será que seu querido Rodolphus sabe do seu nível de obsessão pelo Lorde das Trevas? — Black insinuou, e, no mesmo instante, Bellatrix se levantou, fazendo o movimento de alcançar a varinha guardada em seu vestido negro.

— Bella… Aqui não. Não podemos. Não ainda — Narcissa disse, séria, seus olhos se arregalando de preocupação.

— Esse pirralho, esse traidor do próprio sangue está pedindo... — Bellatrix se aproximou dele, perigosa, fuzilando-o com o olhar, seu rosto a centímetros do dele.

— SIRIUS! — A voz retumbante de um idoso gordo fez-se ouvir a centímetros dos dois. Distraídos, Sirius e Bellatrix desviaram os olhos para quem a proferira, e no segundo seguinte o rapaz sentiu braços fortes dando-lhe tapas carinhosos ao rosto. Seu tio Alphard Black, obeso, com um papo de duas camadas, porém tendo a quantia equivalente em galeões ao seu peso, o saudava. Trazia junto a si sua opulência que resplandecia em suas vestimentas refinadas, como pelo detalhe de um enorme relógio de ouro maciço pendurado em sua cintura, e o cumprimentava com fervor e entusiasmo que não era típico da família Black.

Em segundos, o tio já havia lhe afastado de perto da companhia desagradável das duas primas. Serviu-lhe um copo de whiskey de fogo, e passou a bombardeá-lo com um monólogo sobre Andromeda e alguns outros parentes Black. Sirius reparou em alguns rostos conhecidos ao longo do Salão: seu avô, Arcturus Black, que o cumprimentou com um aceno de desprezo, sentado em uma poltrona com um copo de conhaque em mãos; em pé, conversando com um bruxo escocês desconhecido em frente a uma das lareiras, à direita do rapaz, estava Cygnus, um de seus tios desagradáveis, que sequer o enxergara, parecendo contar vantagem a respeito de alguma transação comercial com o homem à sua frente. Ao longo do cômodo, avistou Lucretia, uma de suas tias, usando um chapéu horrendo em formato de um corvo morto, sempre dada a esse tipo de esquisitices, além de Cassiopeia, famosa por ser beberrona, levando uma garrafa de hidromel pelas mãos, sem que algum dos convidados reparassem.

Sirius fingiu prestar atenção à conversa por mais alguns instantes, até que em determinado momento foram chamados para a Ceia pela anfitriã. Ele mal se lembrava da aparência da mãe de Cordelia, surpreendendo-se ao revê-la.

A mulher era a própria imagem de Cordelia mais velha; tinha os mesmos olhos verdes de um tom muito claro, grandes e bastante redondos. Sua pele era alva, bem cuidada para a idade que poderia ter, e os cabelos loiros pareciam, apesar de presos em um coque, compridos e vistosos como os da filha. Sirius percebia em seu comportamento as mesmas atitudes de toda bruxa puro-sangue que se considerasse alguma espécie de “jóia” rara, que merecesse todo um tratamento especial e entediante, as que também pareciam ser repetidas pela filha, exceto nos poucos momentos de fragilidade que, por acaso, ele pudera testemunhar.

Sentindo-se mais uma vez entediado, fingiu escutar o discurso de agradecimento da anfitriã, e logo ocupou seu lugar junto a comprida mesa na qual seria servida a Ceia. Sentou-se ao lado de seu tio Alphard, companhia que, apesar de muito falante, era a única agradável presente naquele Salão. Sua tia Andrômeda já fora desprezada pela família, tendo sido inclusive retirada da tapeçaria dos Black pelo seu casamento com Ted Tonks, um nascido trouxa, e o nascimento de Nymphadora, fruto da união mestiça do casal.

Ao passar os olhos pelos convivas sentados, reparou em sua mãe sentada ao lado de Regulus, acariciando um de seus ombros em um gesto carinhoso — tal ato que só poderia ser feito após tomar inúmeras doses de gim tônica —, parecendo que atingira o êxtase da felicidade, acompanhada ao lado por seu pai. Ele a abraçava com um sorriso de orgulho que ele jamais vira ser motivado por algo que tivesse relação consigo.

Aquilo dera um nó no peito do rapaz, mas a raiva fora superior a qualquer outro sentimento distorcido que o afastamento e a indiferença deles poderia lhes trazer. Rangendo os dentes, e ignorando ao máximo que podia a grande quantidade de bruxos hipócritas e racistas ali sentados, reparou em Cordelia, no outro ponto da mesa, longínquo de onde se sentava, movimentar quase imperceptivelmente a mão por baixo da toalha da mesa. Esta era ricamente bordada para parecer ter sido feita em cristais de gelo, encantada inclusive para que os mesmos dançassem pelo tecido. Olhou para quem sentava ao lado da menina, e reparou em uma menina pequena, de longos cabelos morenos como os da outra irmã da garota. As duas eram morenas, de olhos castanhos, e com expressões vivazes que não condiziam com o jeito mais controlado da mãe e da irmã loira.

Ele reparou que, em segundos, a expressão da menina mais nova se abriu em um sorriso genuíno de alívio, e a própria Cordelia pareceu sorrir, por pouco tempo, o sorriso que dera ao falar consigo na forma de cachorro. “Boa noite, Senhor Sinistro.”

Como se tivesse lido seus pensamentos, Cordelia levantou os olhos do pedaço de frango que comia e olhou na direção de Sirius. Ele não teve tempo de desviar o olhar, e a garota, ao testemunhá-lo a fitá-la, tornou sua expressão outra vez emburrada e distante, voltando os olhos para a comida.

Revirando os olhos, mais irritado do que já estava, pegou disfarçadamente o copo de whiskey de fogo de seu tio Alphard e o virou, sem que o mesmo o percebesse. A maioria dos convivas do Salão já se encontrava levemente alta naquele momento.

A Ceia se passou, com algumas fadas encantadas por Guinevere dançando passos típicos animados ao som de violinos e violoncelos encantados que tocavam a música ambiente da Noite de Natal, enquanto todos se serviam das sobremesas e mais aperitivos alcóolicos, magicamente surgindo à mesa pelo trabalho dos elfos domésticos. Além da meia-noite, depois do brinde mais hipócrita da vida de Sirius até aquele momento, até mesmo Bellatrix Black soluçava bêbada e sorria — alucinadamente — mas sorria.

Um pouco mais satisfeito pela noite que se aproximava do fim, Sirius conseguiu se afastar da companhia do tio, desviar do irmão mais novo que conversava animadamente sobre a “Revolução Bruxa” com amigos escoceses que pareciam ter a mesma idade que ele, o que fez o estômago de Sirius revirar, e evitar sermões da tia Lucretia, que agora parecia declamar um poema com o corvo empalhado que era seu chapéu, trazendo inúmeras gargalhadas debochadas de outros bruxos junto a ela.

Ao enfim sair do castelo do Clã MacLaerie, Sirius outra vez voltou a andar a esmo, e retirou a varinha do bolso de sua jaqueta de couro preto, aquecendo-se com um feitiço de retenção de calor, lhe fazendo sentir como se em volta de si a temperatura fosse muito mais branda e agradável. A madrugada estava escura, e mais uma vez nevava. Sirius conjecturava transformar-se em cachorro apenas para explorar os terrenos do castelo e distrair-se um pouco, mas sabia que aquilo o faria se sentir ainda mais irritado por estar longe de seus amigos. Sempre que usava sua condição de animago, ao menos um deles estava presente.

Já caminhava muito perto do cais que lhe trouxera uma memória tão antiga no início daquele dia, quando ouviu vozes de crianças pequenas, e de uma garota que parecia animada, como se aprontasse alguma travessura.

Assim já é perseguição.

Sirius fez menção de dar meia-volta, ainda mais irritado, passando uma das mãos pelos cabelos em um gesto automático de raiva controlada. Porém, sua atenção foi atraída por um grito eufórico e agudo de uma das garotas.

— Você PROMETEU que ia me ensinar! — A voz aguda de Mairéad se abria em uma exigência urgente. — Cora, você jurou que ia me mostrar como se fazia! — A garotinha impunha sua vontade sem receio algum, e, rendido, sem realmente ter nada mais interessante para ver, o rapaz decidiu voltar e mais uma vez estudar em segredo as irmãs MacLearie.

— Você não vai conseguir dormir depois! Vai passar a noite em claro no seu quarto, eufórica. E eu já falei para não gritar. Você prometeu me obedecer. — Cordelia ressaltou, enquanto Sirius se escondia atrás de um tronco de um salgueiro de folhagens espessas à beira do lago semi-congelado. Ela e as irmãs usavam casacos e cachecóis, as meninas usando inclusive gorros de lã para se protegerem do frio. Cordelia vestia-se toda de preto, contrastando com sua pele clara, seus cabelos loiros e seus olhos brilhantes que chamavam muita atenção na escuridão. Preto seria uma cor que apagaria a maioria das pessoas, mas nela o contraste apenas evidenciava seus traços físicos.

— Mas só uuum... Só uuuum... — Mairéad parecia à beira do choro, e naquele momento Sirius afinal reparou que a irmã do meio, chamada Bairbre, portava uma espécie de fiddle em suas mãos. A menina do meio ameaçou tirar uma nota, e Cordelia revirou os olhos, ao ouvir a súplica da caçula e a tentativa de começar uma música de Bairbre.

— Está bem. Só uma música. Levanta, Mairéad, e vem logo! — Cordelia nem parecia consigo mesma, falando alto, indiscreta, e rindo com as irmãs. Mal parecia conseguir ralhar com elas.

Bairbre passou a tocar alguns acordes, e a melodia começou. Era uma música crescente, divertida e animada, e a irmã mais nova e a mais velha passaram a se encarar, cada uma com um mesmo sorriso contido no rosto. Aquilo era claramente familiar para as três.

Em segundos, passaram a bater palmas em uníssono, fazendo cada uma pequenos pulinhos com um sapateado discreto, o som disfarçado em meio à neve que caía por todo o terreno dos jardins do castelo de seu Clã.

Cordelia puxou a mais nova para uma espécie de dança em roda, movimentando-se ora para a direita, ora para a esquerda, levantando os pés e as pernas no ritmo da melodia, em uma dança que não lhe lembrava o que era típico dos bailes bruxos da Grã-Bretanha, mas sim algo mais similar à dança folclórica que uma vez vira em Dublin, capital da Irlanda, país reconhecido como berço da magia celta, em uma viagem com a família Black.

Assim que a melodia se intensificou, Mairéad começou a errar alguns dos movimentos, parando para estudar a irmã, e Cordelia passou a dançar sozinha. A mais nova e a irmã do meio fitavam a irmã mais velha, que, de olhos fechados, com as mãos na cintura, passou a saltitar e dançar no ritmo da música, dançando pelo cais enevoado. Rodopiava sempre em frente, junto ao movimento sinuoso da música, seus braços guiando sua direção, agora soltos, como se fosse se lançar em um movimento gracioso em pleno ar. Seus movimentos eram naturais, leves, diferentes das atitudes contidas que sempre portava no dia a dia. Assim, a música cresceu até que atingiu o acorde final, e Cordelia, sorrindo, abriu seus braços e pernas em uma espacata que beirou uma reta perfeita, como se, por alguns segundos, parecesse flutuar.

— Cora. Cora, veja isso! — Bairbre falou, entuasiasmada, apontando para a irmã mais nova. Parecendo acordar de um torpor, Cordelia abriu os olhos devagar, voltando-se para as irmãs, na ponta do cais, parada a centímetros do lago.

Mairéad, sorrindo com uma alegria inocente, com uma expressão de entusiasmo tão puro que trouxe um sorriso até para os lábios de Sirius, movia com o movimento de suas mãos a neve que caía dos céus daquela noite, transformando-a em cristais de gelo. Fez-los brincar com sua irmã do meio, fazendo-lhe cócegas no pescoço, e depois os levou para rodopiar em volta de Cordelia, como se imitassem os movimentos graciosos e dançarinos da irmã.

Lágrimas subiram instantaneamente aos olhos de Cordelia, que levou uma das mãos ao rosto. Bairbre largara o fiddle junto ao solo nevado e abraçara a irmã mais nova, apertando-a contra si e soltando gritinhos de alegria, e a irmã mais velha, parecendo segurar as próprias emoções, levou uma das mãos, cobertas por luvas pretas, aos lábios, lágrimas grossas formadas em meio aos seus olhos verdes claros em uma expressão que parecia da mais genuína alegria.

Ownnn, Mairéad! Sua primeira mágica, minha querida, minha irmãzinha! — Cordelia gritou, por sua vez, ainda mais alto do que as irmãs, e, fechando as mãos em punho, correu na direção delas, abraçando-as desajeitada, caindo por cima das duas na neve. Sirius pôde ver um relance de seus cabelos loiros cobrindo o rosto delas, simultaneamente, enquanto as beijava estaladamente em suas bochechas, cabelos e testas.

— Eca, Cora, para! — Mairéad disse, fingindo irritação, mas ria tanto quanto as duas irmãs, todas se abraçando desajeitadas em um doce momento de união familiar.

Com um sorriso discreto ao rosto, Sirius esperou que as irmãs enfim se recolhessem, para ocupar o lugar no cais que desejava. Ao vê-las entrarem pelas portas principais do castelo, guiadas pela irmã mais velha, sem que o descobrissem, caminhou para o cais. Foi aos poucos lembrando-se de brincar, muito novo, com Regulus, e de quando o vira quebrar, sem querer, uma das pratarias mais antigas da mãe, fazendo-a voar como se fosse um pássaro pela casa. Fora também a primeira demonstração de magia do irmão. Riram muito, aquele dia, e Sirius protegera o ato do irmão, o escondendo dos pais até que sua mãe afinal o descobrisse.

Sirius sorriu amargamente, já não mais tão irritado, e buscou em um dos bolsos da jaqueta a varinha e o maço de cigarros que trouxera consigo. Eram cigarros trouxas, que costumava fumar na frente da mãe e do pai apenas para irritá-los e confrontá-los, mas sentiu-se necessitado deles naquele momento. Perdeu a noção de quanto tempo passara, enquanto tragava cigarro atrás de cigarro, jogando as guimbas na neve, se perdendo em meio à imensidão branca.

Ao jogar um dos últimos cigarros já apagado fora, olhou de relance as pegadas de Cordelia na neve de quando dançara, e lembrou-se dos movimentos fluidos, diferentes e excêntricos que a garota realizara de maneira tão inegavelmente graciosa. Sua família era famosa pela herança celta, mas Sirius não vira nada dentro de seu castelo que a tanto lhe remetesse a ela quanto aquela dança diferente. O gesto final da dança fora especialmente belo, e seu corpo parecendo flutuar em um arco gracioso pareceu aliviar um pouco da raiva distorcida que o consumira durante toda aquela noite.

— Não é possível! — Ele ouviu a voz surgir da escuridão antes que percebesse sua presença, o tirando de seus pensamentos. Acho que já está na hora de sair desse lugar. Sirius pensou, exasperado, tragando fundo seu agora último cigarro.

— Sinto muito por fumar na sua área, princesinha — disse, grosseiramente, soltando a fumaça de qualquer jeito de propósito, sabendo que o vento a levaria em sua direção.

— Não imaginei que fosse aparecer justamente por aqui. Ou será que está me seguindo mesmo? — Sirius Black encarou o rosto da garota que pouco a pouco aparecia em meio à escuridão, sorrindo malicioso. Sua expressão de felicidade anterior fora substituída por um olhar arrogante, como se o julgasse da cabeça aos pés. Nada que eu não esteja acostumado.

— Já disse que esta é a minha casa, Black. Ando para onde quiser e ajo como quiser, diferente de você, se tivesse alguma noção de educação — retrucou, fria, mantendo uma distância de poucos metros de Sirius. Ele logo percebeu que ela desejava ficar na ponta do cais, local onde estava parado.

— Não sei se ainda não ficou claro pra você, mas não está cercada de muitas boas companhias — Sirius debochou, olhando para o lago congelado e sentindo saudades dos amigos.

— Sei muito bem com quem ando — a garota redarguiu, cruzando os braços.

— Será? — Black a encarou debochado. — Como eu disse, não me parece muito uma aprendiz das trevas.

— Tem alguma ideia do que alguns Black, Lestrange e Malfoy realmente querem? — Sirius perguntou, com ar de troça.

— Do que está falando? — Cordelia não parecia querer dar-lhe conversa. Teria de ser direto.

— Seguem um bruxo que se auto-intitula Lorde das Trevas. Falam de uma “Revolução” que não trará nada além de morte e guerra. Guerra que já começou — ele disse ousadamente, sem nem entender porque era tão direto com uma garota que mal conhecia.

— Você só diz isso porque os despreza. É claro que daria ouvidos à essas teorias da conspiração — Cordelia rebateu, fazendo um muxoxo de desdém.

— E você não? — Sirius indagou, diretamente, fuzilando-a com o olhar. Os olhos verde-claros de Cordelia pareceram vacilar, e naquele momento ele simpatizou um pouco mais com a garota.

— Não é do seu interesse — a garota respondeu, desviando o rosto, parecendo ansiosa para que ele a deixasse sozinha, mas orgulhosa o suficiente para, dessa vez, não deixá-lo “ganhar” e ficar com o seu lugar.

— De fato não é — Sirius falou, grosseiro, e ela estreitou os olhos em sua direção, parecendo ainda mais fria.

— É uma pena para si mesma que ainda não saiba. Ou que negue tanto assim. — Black jogou o resto de seu cigarro no lago, para deixar Cordelia revoltada.

— Não me julgue por tola, Black — a menina replicou, parecendo levemente irritada, sua voz baixando de tom. Sirius a encarou uma última vez, enquanto caminhava para fora do cais, a centímetros de passar perto da garota.

— Então não aja como se assim o fosse — o rapaz retrucou, sorrindo petulante para ela, jogando os cabelos para o lado displicentemente.

— O mundo é muito pior do que as festas de falsidade dentro do seu castelo, garota. É melhor aprender logo — Sirius asseverou, curto e grosso, enquanto se afastava do cais, e dava espaço para que ela pudesse caminhar até o lugar em que desejava ficar.

— Não preciso dos seus conselhos — Cordelia redarguiu, arrogante, virando-lhe as costas e caminhando por sua vez até o final do cais.

Assim que estava longe o suficiente para não levar uma azaração, Sirius fez questão de despedir-se, chamando MacLaerie até que ela finalmente revirasse os olhos para ele, aparentando desprezo e impaciência, afinal cedendo aos seus chamados debochados.

— Feliz Natal, Cora. Bela dança! — Sirius acenou-lhe um adeus com uma das mãos, e agilmente sumiu em meio à escuridão, mantendo as próprias risadas ao ver a reação de surpresa, constrangimento e raiva simultâneas em meio ao rosto da garota loira. Cordelia ficara indignada. E, afinal, usara o apelido que somente vira as irmãs assim lhe chamarem. Parecia ter ficado revoltada não só por ter testemunhado seu momento de desinibição com suas irmãs, como também algo de sua intimidade que provavelmente guardava escondido junto a sua personalidade controlada.

Personalidade, que, antes tão entendiante, agora parecia muito mais divertida.



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Notas finais do capítulo

~ No gif do fim do capítulo: Sirius bad-boy fumando para delírio das fangirls! =P
Para quem ficou curioso a respeito da dança celta: http://25.media.tumblr.com/14c06f07bfe29624102fb4128057d9c9/tumblr_mfdoagRCHh1s167qro1_500.gif
=)



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