Por volta das 19:30 daquela sexta-feira, iniciou o combate final entre os participantes da nonagésima quarta edição do Rei dos Lutadores. Foi uma semana intensa onde oito times se enfrentaram em diversos tipos de competições de lutas, variando um pouco as regras, locais e até mesmo a forma das arenas. Vinte e quatro participantes se conheceram tanto durante o treinamento quanto nos dias de combate. Nesse ínterim, conheceram o anfitrião do torneio e parte das suas ambições de permanecer como o campeão absoluto, entretanto não só isso como os próprios participantes geraram um laço afetivo entre si. Kyo Kusanagi e Terry Bogard se tornaram bons amigos desde o início, desde quando eles enfrentaram os ninjas das sombras em Kaido, desde que a caixa d'água caiu sobre eles, inundando a feira livre da cidade e assim terminando aquela noite de sábado em confusão. Foi muita confusão, foram muitas lutas, conflitos até ambos chegarem na mesma arena e prestes a se enfrentarem como rivais.

Às 19:33 uma forte explosão ocorreu no bosque perto do lago. Duas árvores caíram devido ao impacto do soco de Bogard e mais outra por causa da propulsão do fogo que Kusanagi liberou. O loiro, sem nenhuma cerimônia, partiu para cima do amigo e ameaçou com um soco, porém ele socou o chão e do chão saiu um jato de ar quente que fez o moreno voar e bater as costas contra a copa de uma árvore.

— Sem descanso, Kusanagi. Sem descanso! — disse Terry dando um pulo de uns dez metros e parando em cima da árvore. Logo ele perseguiu Kyo pulando de árvore em árvore.

— Como eles são ágeis. Esse cara consegue ser tão habilidoso quanto o Kyo — disse Benimaru.

— O meu irmão realmente é forte, mas nem toda a sua força se compara com a do homem que queremos matar. — Afirmou Andy também correndo na direção dos dois competidores.

Os dois corriam em campo aberto bastante próximos à mansão. Bogard deu um soco bem forte no chão fazendo surgir raios de energia de dentro do solo que mais pareciam gêiseres de luz. Kyo desviava para não ser pego, pois aqueles jatos de luzes eram quentes como o fogo. No entanto, em um determinado momento ele foi atingido por uma dessas luzes e bateu com as costas na parede da mansão. Subiu a parede sendo seguido por seu oponente. Ao chegarem no terraço, Kyo formou uma bola de fogo grande e lançou contra o Bogard que foi atingido e entrou na casa por uma das janelas do terraço.

Mature ficou completamente desesperada ao ver que a mansão do seu patrão era destruída por dentro. A única coisa que queria era sumir de uma vez por todas dali, mas nada podia já que era vigiada de perto por Benimaru, além de estar algemada e amordaçada.

Dentro da casa a luta continuava intensa. Paredes eram destruídas, quartos incendiados, lustres derrubados, um verdadeiro pandemônio. Enquanto Kyo usava seus poderes de fogo, Terry utilizava da sua força bruta juntamente com seu poder especial. Num determinado momento o loiro deu um soco no assoalho daquele andar fazendo-o ceder e tudo cair para o andar térreo perto da escadaria. Sem muita demora eles cada qual se aproximaram um do outro com uma voadora e se acertaram.

— Mais... — disse Terry já sangrando.

Sem dar muito tempo para Kyo se recuperar, Terry socou o chão mais outra vez só que agora criando um jato de energia cinco vezes maior e mais forte. O jovem Kusanagi foi pego e lançado aos andares superiores.

— Será que eu peguei pesado com ele? Droga, essa fumaça não ajuda.

Terry subiu ao local onde Kyo foi arrastado, mas o segundo andar da mansão estava completamente tomado pela fumaça. Assim que chegou ao corredor viu a imagem de uma pessoa parada na frente dele coberta de fogo. Sem pensar duas vezes ele correu e tentou dar um golpe, mas a pessoa desapareceu como se fosse uma ilusão feita de fogo. Kyo apareceu por trás e o segurou.

— Não vai adiantar nada, Kusanagi. Eu tenho mais força bruta e ainda tenho gás de sobra para continuar lutando.

— E quem disse que quero continuar essa luta? Você se empolgou demais, por isso está me atrasando. Mas agora eu tenho que te colocar para dormir.

— O quê? O que é isso?

Kusanagi criou uma espécie de redoma de fogo que cobriu os dois.

— Aqui dentro não entra ar. O fogo vai consumir todo o oxigênio aqui de dentro e você perderá a consciência.

Por mais que Terry tentasse se desvencilhar, não conseguia. Tentou até dar cabeçadas, porém sem sucesso. Do lado de fora os outros ficaram preocupados com a mansão ardendo em chamas. Algumas explosões aconteciam em algumas janelas e partes da casa caíam.

— Sério. Agora estou começando a ficar preocupado — disse Andy ao perceber a demora do irmão.

— Olhem ali — apontou Joe ao ver alguém sair.

Kyo Kusanagi carregava Terry com o braço deste em volta do seu pescoço. O Bogard estava inconsciente por causa do último golpe que o japonês aplicou. Foi deitado na grama bem longe da entrada da casa. Pediu que os outros se acalmassem e bateu com o cotovelo no peito do inconsciente que logo despertou tossindo fumaça.

— Eu disse que você dormiria um pouco. Cara, foi bom ter que lutar contigo. Pena que eu não podia mais, preciso ter gás para enfrentar a final verdadeira. Desculpa aí.

— Tudo bem, Kusanagi. Cof... cof... Eu só queria um pouco de diversão. Estou guardando todo o meu poder contra outra pessoa. Hahahahahahaha que sensação boa! Mano, estou morrendo de saudade desse torneio. Sério! Um dia quero ter essa mesma experiência.

Uma chuva fina começou a cair. Todos ficaram num clima de despedida, porque o grupo de Terry teria que ficar enquanto o de Kyo teria de partir. Entretanto, os convidados como Yuki e Shizuka não poderiam ir por ser muito perigo.

— Eu tenho um mau pressentimento, querido. Por favor volte com o Kyo — disse ela abraçando o marido.

— Eu juro que farei o meu melhor, querida. A minha prioridade é proteger o nosso filho das garras do mal. Sou o pai dele e preciso protegê-lo.
Yuki abraçou Kyo e pediu que ele ganhasse e voltasse são e salvo.

Na última despedida da noite, Kyo foi até Terry e estendeu a mão. Ambos se cumprimentaram e mais uns tapinhas nas costas.

— Não se preocupe, amigo. Um dia eu irei a South Town e lutarei ao teu lado. Vamos pegar esse tal Geese Howard e você se vingará pela morte do seu pai.

— Estaremos esperando. Eu estarei esperando e farei questão de te mostrar a cidade onde eu moro.

O piloto subiu no helicóptero acompanhado dos quatro e Mature. Assim que a aeronave partiu, Bogard tirou o boné e atirou para cima. Sim, um dia ele estará esperando Kyo em South Town.

...

Navio de Guerra Black Noah

Hospedado num dos quartos do navio, Iori Yagami continuava a esperar ansiosamente por alguma notícia do seu rival. Enquanto aguardava, tomou um delicioso jantar farto por conta do anfitrião. Ouviu um barulho de helicóptero ao longe e deduziu ser os finalistas.

— Kyo. Tenho certeza que é você. Uma pessoa do seu nível jamais perderia para um bando de fracotes e tolos — lambeu os lábios.

No convés do navio, Collin e alguns guardas ficaram perto do heliponto a fim de esperarem o pouso da aeronave. Para eles tudo era como o combinado, não desconfiavam que uma pessoa a mais subiu no veículo, Saisyu.

— Que enorme. Aquele então é o quartel general do anfitrião? — perguntou Kyo admirado ao ver o navio pela primeira vez.

— Pode falar, vadia — disse Benimaru tirando a mordaça da mulher.

— Claro que sim, idiota. Você queria que fosse o que? Um barco de pesca? Mas vou logo avisando que o chefe Bernstein é um homem impiedoso com quem o contraria. Vocês estão mortos, porque destruíram a mansão dele. E juro que vou contar tudo.

— Minha jovem, você mesmo disse que ele é impiedoso. Se você contar sobre a mansão, ele vai te punir também. Rugal é um homem que não tem escrúpulo, por isso ele logo vai colocar a culpa em ti — concluiu Saisyu. A loira pensou duas vezes e decidiu não contar.

Goro pediu que ficassem em silêncio. O helicóptero pousou e todos saíram de dentro. Beni empurrou Mature que caiu aos pés do capitão Collin.

— O que significa isso?

— Dá pra me desalgemar!

— Tirem as algemas dela. Isso não estava no acordo. O que o senhor faz aqui? Os únicos que poderiam embarcar são os finalistas.

— Não quero conversa com um reles empregado. Chame o seu patrão e diga que o patriarca do clã Kusanagi está aqui e que quer conversar pessoalmente com ele. Diga também que eu sei dos planos dele de manipular o espírito do deus Orochi, mas que farei de tudo para impedi-lo. Você dará o recado ou prefere ficar aqui desmaiado enquanto isso?

Sem nenhuma outra saída, Collin assentiu. Pediu que os quatro fossem para a cabine dos convidados onde teriam um banquete antes da luta final acontecer. Mature foi liberta e foi com muita raiva para a sua cabine pessoal tentar se limpar. E assim as coisas aconteceram dentro do previsto.

— Quer dizer que alguém proeminente como Saisyu Kusanagi veio junto? O que aquele homem pensa que é para me chantagear assim?

— Ele até fez Mature de refém.

— Isso não me importa. O que quero é que aqueles dois lutem até a morte ou até conhecerem a face da morte — ele estalou o dedo e das sombras surge um homem vestido de preto igual um ninja. — O-Ren, quero que fique atento e cuide dos outros três. Kyo Kusanagi precisa ficar sozinho.

— Sim, chefe.

— Chame os outros shinobis e fiquem atentos. Essa luta entre os dois herdeiros dos clãs deve sair sem nenhum contratempo.

— Com absoluta certeza, chefe.

Os empregados do navio prepararam um verdadeiro banquete pré-luta. Saisyu pediu para que o filho e os outros se alimentassem bastante para ficarem dispostos à última luta. Collin entrou na cabine e confirmou que Rugal aguardava a todos e que o Kusanagi sênior poderia conversar com ele pessoalmente.

Os participantes foram chamados dez minutos para as nove da noite, horário combinado na tabela do torneio. Os quatro foram chamados para terem a tal conversa em particular com o anfitrião. Durante o trajeto no corredor, uma bombinha de fumaça branca explodiu perto deles. O quarteto ficou desorientado. O-Ren surgiu das sombras e puxou Kyo Kusanagi para um lado e uma parede se fechou entre ele e os outros três como num labirinto. As paredes mudaram de posição e deixaram os demais confusos.

— Kyo! Onde você está? — Saisyu tentava enxergar algo, mas a fumaça ardia em seus olhos.

— Essa parede estava aqui antes? — indagou Benimaru tocando nas superfícies.

— Fomos enganados. Eu posso dar um soco bem forte pra ver se abre alguma brecha.

— Não, Daimon. Você pode acertar no casco do navio e começar a entrar água. — Saisyu fez surgir fogo no ar e assim a fumaça se dissipou.

— Perdemos o Kyo, merda! — Resmungou Beni.

Uma transmissão de áudio surgiu a partir de uma pequena caixa de som no corredor. A voz de Rugal Bernstein surgiu imediatamente. Claro que ele se gabou por ter feito a separação de Kyo do resto dos outros. Saisyu tomou a palavra.

— Com que direito você manipula o torneio para fazer o meu filho se matar com Iori Yagami, hã? Responde!

— Senhor Kusanagi, hoje à noite teremos um experimento social forte e proveitoso. Veremos o quanto o seu filho estará disposto a viver. Ele lutará com o seu mais prodigioso rival de sangue. Será um fim honroso para o herdeiro do clã Kusanagi.

— Já vi que você não é um homem com uma palavra honrada. Não passa de um vigarista querendo poder a todo o custo. Diga-me, você quer matar não só o meu filho como também o jovem Yagami. Assim acabará com dois clãs de uma vez só. E isso tem a ver com o descendente de Orochi. Quem você está manipulando que possui o sangue de Orochi?

— Hahahahaha. Admirável, senhor. Como eu imaginava, a sua inteligência é louvável. Eu estou com a filha de Gaidel. Sabe quem é?

— Não pode ser — os outros dois não entendiam a conversa. — Uma pessoa que carrega o sangue de Orochi em suas mãos é o fim do mundo.

— Exatamente. A sobrevivente da vila perdida e que foi adotada pelo capitão Heidern. Parece até o destino: a pessoa que eu quis foi adotada pelo homem que quer me matar por vingança. Parece uma peça de teatro de Berlim. Enfim, quando o seu filho e Iori estiverem fracos, soltarei a jovem Leona como uma leoa numa jaula e estraçalhará os dois. Aproveitem que logo vocês serão os próximos — Rugal desligou a transmissão.

Benimaru ficou perguntando sobre essa conversa de descendente de Orochi e o que Kyo tinha a ver com isso. Saisyu respondeu que tanto Kyo quanto Iori eram descentendes diretos dos homens que aprisionaram o demônio mais temível de todos os tempos. O mais terrível de tudo era que ele tinha em tutela uma possível criatura de guerra e sanguinária.

— Precisamos salvar o nosso filho imediatamente.

Do ouro lado, Kyo caminhava pelo corredor quando o líder dos shinobis apareceu na frente dele. O ninja pediu que o rapaz lhe acompanhasse até um salão.

— Entre sozinho.

O salão era grande, parecia mais um depósito e cheio de canos e máquinas nas paredes. Havia também várias armas brancas de diferentes formas penduradas. Da porta de onde Kyo entrou dava para ver uma cabine com um vidro na parte superior. Rugal estava dentro sentado numa poltrona com a sua pantera. Ele segurou um microfone.

— Kyo Kusanagi, herdeiro do clã Kusanagi. Hoje chegou o seu dia. O grande momento começará agora. Esteja preparado.

— O senhor é o anfitrião do torneio. Vai lutar comigo?

— Não, eu cedi a minha luta para permitir que algo mais interessante ocorresse. Não se preocupe, porque será tão interessante quanto eu lutar pessoalmente.

A porta que ficava à frente de Kyo e logo abaixo da cabine se abriu. A figura sombria de Iori Yagami apareceu finalmente. Seu semblante era terrível e amedrontador. Ele misturava ódio com alegria enquanto lambia os lábios.

— Iori Yagami.

— Kyo Kusanagi.

— Magnífico. A única regra é: vence quem matar o seu oponente.

Os dois caminharam para perto do outro e se olharam profundamente. O ruivo ficou satisfeito de ter ali a sua presa, enquanto o moreno não escondia mais o desejo de se acertar com o rival.

Continua...