The Last Taste - Season 1 escrita por Henry Petrov


Capítulo 27
I Know What You Did Last Summer


Notas iniciais do capítulo

Olá seus lindos.
Bom, aqui está, este capítulo lindo e maravilhoso que, modéstia a parte, eu acho que ficou ótimo. Quatro mil palavras, bastante coisa acontecendo. Esse capítulo marca a metade da primeira temporada. Sim, teremos TRÊS TEMPORADAS! Olha que cara legal, chega com um capítulo e uma notícia dessas. Sim! TRÊS TEMPORADAS. Uma já está na metade :(, mas não demoro pra começar a postar a segunda temporada. Vou passar cerca de cinco meses sem postar. Talvez eu escreva, mas não vou postar nada aqui durante alguns meses QUANDO eu terminar esta temporada. E assim sucessivamente. Como já estão idealizadas, não tem perigo de eu mudar ideia. Enfim. Era só isso. Boa Leitura (:

Ah, comentem por favor. To com saudades de vocês.



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Eu não sabia o que fazer.

Eu tentara estar do lado de Sophie, uma pessoa que eu amava. Falhei. Tentei ignorar o que eu era. Falhei. Tinha medo de tentar outra coisa e falhar. De novo. Mas no fim, resolvi que não. Eu não voltaria com Hanna, tampouco me deixaria abalar pela aquela noite no parque. Eu tinha de seguir em frente e fingir que nada aconteceu. Senão, aquilo me consumiria.

Fui para a casa e tomei um longo banho. Logo depois, dormi uma boa noite de sono. Só que não. Acordei três vezes, todas pelo mesmo motivo. Comecei a ter pesadelos sobre aquela noite, sobre o que acontecera. Eu via minha mãe, na sala de estar, conversando com Candice. De repente, eu me via correndo pela sala, estraçalhando o pescoço de minha mãe, enquanto Candice observava, pasma. Então, eu acordava suado, ofegante, como quem acorda de um sonho em que está caindo. De qualquer jeito, eu consegui acordar no outro dia bem e disposto para ir a escola.

Já vestido, desci as escadas para a cozinha e encontrei uma nota sobre a mesa:

“Precisei viajar para Chicago. Volto durante a madrugada. Não esqueça de regar as flores.

Markus R.”

Bufei. Fiquei indignado com a audácia do meu pai. Como ele viaja pra Chicago – de novo – e ainda me deixa tarefas domésticas? Mas esse pensamento fugiu de minha mente logo. Eu sabia da importância daquelas flores. Eram as filhas adotadas da minha mãe. No jardim da casa, cresciam lírios, rosas, margaridas, girassóis, orquídeas, jasmins, cravos... Minha mãe cuidava de cada uma com cuidado. Ás vezes, eu a pegava conversando com elas. Quando pequeno, eu ria com ela, comentando que estava ficando louca. Mas com o tempo, aprendi a não debochar das paixões dos outros. Principalmente quando eu, Peter Roman, mantinha uma coleção de bonequinhos dos Power Rangers dentro de uma caixinha sobre minha escrivaninha, da qual eu limpava todo dia. Afinal, toda paixão tem uma explicação, nunca é tão literal quanto se acha.

E ainda tinha o fato de que ele estaria fora o dia todo. Isso era bom. Isso era ótimo. Era o que eu precisava.

Na escola, tudo parecia bem. Eu conseguira sobreviver aos três primeiros tempos. Sra. Mozella ainda parava algumas vezes para me observar, com um olhar de pena, como se eu tivesse passado o verão em um sanatório ou coisa do tipo. Outra louca daquele lugar. Eu ainda era o alvo de muitos olhares e burburinhos, sem falar nas perguntas inconvenientes.

–É verdade que você foi sequestrado por um motociclista traficante e foi usado como experimento para uma nova maconha? - uma menina em Quimica me perguntou

Mas por enquanto, tudo ia bem. Após o terceiro tempo, fui ao meu armário, pegar meu material para a aula de História, que seria em alguns minutos. O corredor estava lotado de crianças apressadas, além de algumas bem lentas, que estavam fazendo de tudo para perder o máximo de aula possível. Mas a maioria, me observava por cima do ombro, como se esperassem que eu fosse dar um chilique a qualquer momento.

–Sr. Roman.

Virei-me para ouvir quem me chamara. Era um homem, de cabelos grisalhos e olhos pequenos, com um terno cinzento. Ele estava acompanhado por dois outros homens, um de pele escura e bigode e outro magricela e pálido. Ambos usavam uniformes azuis, cintos pretos e um distintivo com o dizer “Polícia”.

–Sim? - perguntei, intrigado

–Eu sou o Detetive Hills, Por favor, o senhor poderia nos acompanhar? - ele perguntou

–Até...?

–Até a delegacia.

Pisquei. Respirei fundo e assenti.

Eu tinha CERTEZA do que eles queriam comigo. Com certeza, saber a razão do meu desaparecimento. Querendo ou não, eu desaparecera por dois meses e não havia nenhuma razão... Normal que pudesse explicar isso. Bom, havia o motivo verdadeiro, mas ninguém acreditaria em mim se eu contasse. Além de que não seria inteligente contar.

Eu nunca achei que a delegacia poderia ser tão agonizante.

Ao chegarmos, fui levado a uma espécie de sala de interrogatório, com um daqueles espelhos que de um lado, reflete, e do outro é só um pedaço de vidro. Era uma sala bem pequena, com uma mesa branca e uma cadeira, além da minha. Havia uma câmera no canto da sala e eu encarava o espelho, certo de que estava sendo observado. Demoraram alguns instantes, até que o detetive de cabelos grisalhos entrou na sala e sentou-se na cadeira.

–Sr. Roman, nós o chamamos aqui em prol das investigações do seu desaparecimento e do desaparecimento de outra garota, Hanna Whitlight. - ele falou, pondo as mãos sobre a mesa.

Resmunguei em consentimento.

–Conte-me: o que aconteceu?

Minha mente trabalhou rapidamente para pensar em alguma coisa. Eu não podia simplesmente soltar que tinha ido pra uma outra dimensão lutar contra anjos e demônios. Então, veio a coisa mais lógica pra se dizer:

–Não lembro.

O detetive ergueu uma sobrancelha.

–Eu lembro de ter saído com Hanna. - expliquei. - Mas não lembro do que aconteceu. Só lembro de ter acordado em um campo.

–Um campo? - ele perguntou

–Sim. - confirmei – Então fui para casa, onde encontrei meu pai.

–Foi para casa como? - ele estreitou os olhos, como se procurasse alguma coisa em minha expressão

–Saí do campo e segui a estrada até em casa. - respondi.

Sua expressão suavizou.

–O problema, Sr. Roman, - ele explicou – é que ontem a noite, foi encontrado um carro, que colidiu em uma casa. Como uma investigação normal, checamos tudo o que pudemos para encontrar o motorista. A Sra. Whitlight, dona do carro, me contou que seu carro fora roubado.

Franzi o cenho. Eu sabia o que ele ia dizer.

–O que o senhor tem a me dizer sobre isso? - ele perguntou, com os olhos estreitos

–Se está perguntando se eu roubei o carro, não. - menti, me sentindo mais descarado do que nunca. - Não roubei.

Um sorriso brotou no canto de sua boca, como um caçador que observa o animal preso em sua armadilha.

–Tem certeza? - ele voltou a perguntar

Pisquei, um pouco atordoado. Minha boca se abriu e fechou várias vezes, mas nenhum som saiu dela. Minha mente trabalhava mais do que nunca. Já podia vê-lo puxando algemas e me jogando dentro de uma cela com um bando de estupradores e bandidos. Porém, fui salvo pelo gongo. A porta se escancarou, revelando uma mulher de longos cabelos pretos e um casaco de chuva cinzento.

–Com licença, detetive? - ela falou. - O que está acontecendo?

A Sra. Whilight parecia bem mais destemida e corajosa do que a mulher que eu lembrava. Seus cabelos estavam caídos sobre seu casaco de chuva. Pela primeira vez, eles me pareciam muito bonitos. Tão bonitos quanto os cabelos de um... Anjo.

O homem a observou, intrigado.

–A senhora deveria saber que não pode interromper um interrogatório--

–Um interrogatório? - ela ergueu as sobrancelhas. - Está interrogando um menor sem a presença de um adulto? Para qual departamento de polícia você trabalha? Em que século você está?

Ela falava, gesticulando impacientemente.

–Senhora, devo avisá-la que--

–Não, eu devo avisá-lo para se afastar. - ela o cortou, ríspida – Tudo o que ele lhe disse aqui, não pode ser usado em seu julgamento. Ponto final. Peter, querido, vamos.

Bufei com minha sorte. Levantei da cadeira e segui para fora da delegacia com a Sra. Whitlight, me segurando para não rir da cara do detetive ao perceber que tinha sido completamente humilhado diante de uma desconhecida.

Sem dar uma palavra, Sra. Whitlight me levou para um Porche, estacionado um quarteirão depois da delegacia. Entrei no banco passageiro e ela sentou no motorista, colocando sua bolsa no banco de trás. Coloquei o cinto e esperei-a dar partida no carro, mas ela permaneceu encarando o volante.

–Sra. Whilight? - perguntei

–Como ela está? -ela perguntou, enfim. Seu olhar demonstrava preocupação, mas ela parecia tentar esconder.

–Aqui. - respondi. - Quer que eu volte com ela para quebrar os selos.

–Aqui?! - ela exclamou, alegremente. - Mas... Por que não veio me visitar?

Abri a boca para responder, mas não havia palavras. Eu não tinha o que dizer.

–Não sei, Sra. Whitlight. - respondi. - Mas acho que seja por falta de tempo e por sua mente estar tão atolada de coisas, que ela não consegue...

–Se lembrar que tem uma mãe? -ela completou, ríspida

–Não. - respondi de volta. - Se sentir bem em voltar pra casa.

–Oh. -suspirou ela

Ela respirou fundo e deu partida no carro.

Seguimos em silêncio pelas ruas de Wayland, em direção à, provavelmente, escola. Sra. Whitlight estava bem diferente do que eu me lembrava. Ela parecia mais alegre, mais feliz, mais livre. Parecia que tinha tirado um grande peso de suas costas. Ela estava maquiada e seu cabelo brilhava. Não, eu não me senti “atraído” pela mãe da minha ex-namorada. Eu só observei sua mudança.

–Sra. Whilight? - chamei, quase sussurrando. - Obrigado.

Ela deu um leve sorriso.

–Por nada. - ela respondeu. - Quando ouvi as conversas de pessoas que diziam tê-lo visto, corri para a escola para encontrá-lo. Quando soube que foi pra delegacia, sabia exatamente o que fazer.

–A senhora é advogada? - perguntei

–Não. - sua voz tremulou, como se eu tivesse tocado na cicatriz de uma ferida.- Mas poderia ter sido. Se não tivesse me casado como brutamontes do Byron. Conheci-o na faculdade de direito, então para dividir as tarefas, ele seguiu a carreira e praticamente me obrigou a ficar em casa. Esse é o meio maior arrependimento. Desistir dos meus sonhos por ele. Mas Hanna nasceu, a única coisa boa que saiu disso. Então não foi uma completa perda de tempo e paciência.

–A senhora parece mais... - comentei

–Jovem? -ela perguntou – Livre? Poderosa? Sim. Estou me separando de Byron. Aprendi que não posso viver em suas rédeas para sempre. Aquela noite em que ele ameaçou matá-lo e bateu em Hanna, foi a gota d'agua. Estou morando sozinha na casa.

–Ah, falando nisso. - lembrei, encarando o chão do carro – Eu meio que... Quebrei, quer dizer, destruí o seu carro.

Ela riu.

–Nada que não possa ser consertado. - ela respondeu. - Aquele carro é mágico. Esqueceu?

Ergui as sobrancelhas, aliviado.

Ela me deixou na escola e a agradeci por tudo. Desci na calçada em frente ao pátio e ela deu uma buzinada amigável enquanto eu entrava no edifício.

Os corredores da escola estavam vazios e silenciosos, a não ser pelos ruídos de cadeiras e das explicações que os professores davam dentro das salas. Tentei me apressar para não perder a aula. Pois é, eu estava me tornando responsável e estava levando mesmo a sério esse negócio de seguir em frente.

Eu não aguentava mais. Estava cansado de ficar andando por aí, atrás de quebrar selos e lutando contra todos e qualquer um que me cruzava o caminho. Meu limite de loucura já estourara e eu precisava de normalidade. A escola era o lugar mais chato, entediante e normal que eu conhecia. Era onde eu começaria. Enquanto eu pegava alguns livros no armário, tive uma ideia repentina que traria minha vida de volta ao normal de uma vez por todas.

O sino tocou. O intervalo começara. Hora de voltar ao normal de uma vez por todas.

–Hanna!

Ela se virou, com um olhar suspeito. Ela carregava um caderno na mão e usava uma blusa florida. Ela parecia seguir meus passos. Tentando ser normal. Mas de acordo com sua expressão, não tava sendo nem um pouco legal.

–O quê? - ela perguntou, ríspida

Tentei me aproximar, mas não o bastante para um soco. Ela não parecia nem um pouco feliz.

–Então você ficou. - falei

Ela olhou para os lados, apreensiva.

–Sim, fiquei. - ela respondeu.

–Por quê?

–Porque você ficou. - ela respondeu de volta – E só vou embora no momento em que você perceber que isso não vai dar certo, que esse não é o seu mundo. Não é o nosso mundo. Não mais.

–Ah é? - perguntei, um pouco irritado

–É. E quando você perceber isso, o que eu tenho certeza que vai acontecer, eu estarei lá para dizer “eu te avisei”.

–O que te dá tanta certeza? - cruzei os braços e encostei o ombro em um armário.

–Lembra daquele grupo do Lúcifer? - ela perguntou, dando mais uma olhada nos alunos que passavam, despreocupados. - Aquele que... Levou sua mãe? Eles não pararam de te procurar. Eles acham que você, por ter quebrado o selo, está tentando libertar o Satã e te veem como um general. Eles vão tentar te recrutar pra esse exército de um jeito ou de outro.

–Certo. E daí?

–E daí que você não pode viver com demônios psicopatas querendo te recrutar para o juízo final. - ela fechou o armário com um solavanco e saiu pelo corredor, apressada

–Espera! - chamei, acompanhando seu passo. Ela corria rápido, mas eu sou rápido também. - Não vim aqui te pressionar nem nada. Na verdade, eu queria deixar bem claro que não guardo nenhum ressentimento. Não seu. Só quero continuar vivendo minha vida e o único jeito de fazer isso é fazer coisas normais. Hoje. Sete horas. Minha casa. Que tal?

–Uma festa? - ela parou de andar, estática. - Sério? Estou louca com esse problema dos selos e de você querendo ser normal e você dá uma festa?

Assenti.

–Uma festa de Boas-Vindas. De volta. - completei.

–Você vai dar uma festa pra si mesmo? -ela ergueu as sobrancelhas e riu de leve.

–Tecnicamente, para minha vida normal. - respondi.

–Você está tentando tanto ser normal, que me doerá muito ver você quebrar a cara. - ela cortou. - Dá licença, tenho aula para ir.

Ela deu mais alguns passos apressados e dobrou um corredor.

–Espera! - alcancei-a, me colocando na sua frente. - Você vem?

–Provavelmente não. - ela respondeu. - Porque se eu for, vai parecer que estou de acordo com tudo isso. O que não é o caso. Agora dá licença, faz favor.

Dei um passo para o lado e ela saiu, deixando o cheiro de seu perfume de rosas pelo ar. Senti-o subir pelas minhas narinas. Nossa, eu me senti tão... Bem. Eu me senti como eu não me sentia a muito tempo. Eu poderia ter aberto a boca e babado, mas eu cortei logo esse pensamento. Era A Maldição do Selo brincando com a minha mente, me fazendo alucinar coisas como ficar obcecado pelo perfume de Hanna. Ignorei, não queria pensar nisso. Aquele dia, seria perfeito. Nada poderia estragá-lo.

Só que não.

Minha casa estava uma loucura. Até hoje, eu não consigo me lembrar claramente dos acontecimentos daquela noite. Lembro de mangueiras de cerveja, de pequenos frascos de uísque, vodca, licor e outras bebidas quentes. Lembro também de pequenos tragos de cigarro, que as pessoas fumavam sem preocupar. Eu detestava cigarro e tinha ódio a quem fumava, mas não repreendi os que fumavam na minha cozinha. A sala de estar estava com todos os móveis afastados e empurrados para os cantos. As pessoas pulavam, dançavam e se beijavam ao som das músicas que tocavam de um pequeno aparelho de som que, conectado a um ampliador, fazia um enorme estrondo. Como minha casa ficava quase no meio do nada, poucas pessoas ouviriam o barulho, então tínhamos bastante tempo para aproveitar a noite. Lembro de ver um casal se esgueirando para dentro do banheiro. Sem comentários.

Eu andava de cômodo em cômodo, tomando várias bebidas de várias garrafas, fracos e copos diferentes. A cada dez garotas que passaram na minha frente, eu beijei e dancei com onze. Foi uma festa louca. Ás vezes, tocavam umas músicas bem lentas e com um bom swing, logo todos estavam dançando eroticamente, com movimentos sensuais. Estava uma delícia! Eu me sentia de volta a minha velha vida, aquela em que eu não tinha droga nenhuma na cabeça e só queria saber de festas. Amelia Hawks foi além da dança, foi logo se abaixando sem pedir nenhuma permissão. Mas eu não estava para sexo. Não naquela hora. Eu queria beber, queria dançar, queria beijar. Queria aproveitar. Não transar e passar o resto da noite dormindo. Eu queria curtir com meus amigos, me sentir em casa, me sentir bem, me sentir... Normal. Esse era o ponto.

Dei um empurrãozinho em Amelia e comecei a dançar com Rosalyn Cartwright, que era mais uma amiga, então não passou de uma dança. Depois Greta, então Elena, então Leonora... Enfim. Então eu fiquei com sede, e foi até a cozinha beber alguma coisa.

A cozinha estava com uma névoa branca de fumaça pairando no ar. Um casal sentado em uma cadeira (a garota estava no colo dele), fumavam um mesmo cigarro. Um rapaz caído no chão derramava cerveja de seu copo. O resto, roubava comida dos armários e das bandejas sobre a mesa. Fui pegar um copo, pois perdera o meu. Minha mão esbarrou em outra.

–Desculpa.

Era Hanna. Quando percebeu que tinha topado comigo, ela revirou os olhos e saiu da cozinha.

–Ei, pare! - chamei, começando a me cansar de ficar seguindo-a. - Por que está sendo tão evasiva?

–Porque sim. - ela cortou e saiu. Dessa vez, não me dei o trabalho de segui-la

–Hum. Peter Roman foi congelado.

Um menino disse, rindo.

–Cale a boca, Roy. - respondi, com os olhos apertados.

Voltei para a sala de estar. Olhei para os lados. Algo estava errado. A música parara. Todos se aglomeravam em um semicírculo, olhando para algo que eu não conseguia ver através da multidão. Havia silêncio. A não ser por uma voz estrondosa.

–Peter Roman!

Era grossa e imponente, me arrepiou. Eu sabia quem me chamava, mas desejei estar errado.

–Peter, você chamou esses caras? - perguntou Simon, saindo do aglomerado – Eles são muito estraga prazeres! Eu estava quase lá com a Amelia, quando eles chegaram, gritando por você.

Franzi o cenho.

–Não creio. - pensei em voz alta

Corri para a multidão, abrindo espaço a cotoveladas. Finalmente, cheguei ao fim e vi quem me chamava.

Eram eles. Os líderes do exército de Lúcifer. Eles tinham em encontrado. Os três, o magricela, o corcunda e o carrancudo (que me pareceu o líder), estavam lá, junto com mais, talvez, vinte comparsas.

–Aqui estou. - falei. Minha cabeça latejava de palavrões, irritada com aqueles três idiotas que estragavam minha ideia de normal.

–Que bom. - o mais alto deles falou. - Sabe porque estamos aqui.

–Sim. - respondi de volta, minha voz soou mandona. - Querem que eu vá com vocês.

O do meio sorriu com o canto da boca.

–Mas não vou.

Seu sorriso sumiu e sua boca se contorceu em raiva.

–Olha, eu não quero mais nada com isso, tá? - falei, tentando soar amigável e pacífico. - Eu não quero mais essa vida. Eu sei que desde o começo, eu tive tudo a ver com isso. Mas não posso mais suportar essa loucura, beleza? Seu chefe é muito inteligente e eu sei que ele pode obter sucesso sem mim. Por favor, vão embora. E me deixem em paz.

Dei as costas e me virei para a multidão.

–Não achei que seria assim tão fácil mesmo. - o do meio falou. - Venha conosco, Peter Roman. Lidere os exércitos de nosso senhor e será recompensado. Terá sua vida de volta. Terá ela de volta.

Minha mente levou um pequeno choque. Ela. Minha mãe. Virei para encará-lo.

–Última chance. - ele falou.

Minha mente trabalhou como uma engrenagem. Quase pude ouvir os ruídos. Ele me dava uma proposta aceitável. Eu iria com eles, libertaria Lúcifer de vez e traria minha mãe de volta. Mas quem me garantia que ele era de confiança? Ele era o diabo! Não tinha como confiar. Mas era uma chance única, uma oportunidade de ter minha vida completamente de volta, mesmo que eu tivesse que esperar mais.

Após pensar por alguns instantes, me decidi.

–Não. Não vou vender minha alma a um bando de trapalhões para ter minha mãe de volta. Sim, eu a amava. Mas eu não seria idiota o bastante para confiar em vocês. Estou cansado de ser usado como um meio dos outros conseguirem o que querem. Então é não. Não, não e não. Agora, façam-me um favor: Saiam da minha casa. Agora!

O do meio balançou a cabeça, como se pensasse no assunto.

–Se não vai por bem, que vá por mal.

Ele abriu a boca, exibindo seus enormes caninos. Seus olhos se tornaram vermelhos com sangue e os três se tornaram borrões pulando de um lado para o outro da casa, atacando todas as pessoas que viam no caminho. Corri para impedi-los, pulei sobre o mais magricela e saímos bolando pelo chão, tentando desferir socos nos rostos um do outro, mas sem sucesso. Eu o impedia de me socar e ele fazia o mesmo, nos deixando em um impasse. Então, o joguei para o outro lado da parede e me ergui rapidamente, usando O Poder. Ele fez o mesmo e jogou-se sobre mim, me atirando na parede oposta. Senti minhas costelas se quebrarem, mas não foi uma dor imensa. Elas se curaram rapidamente. Eu ainda conseguia lutar. Pulei para a mesa mais próxima, dando uma cambalhota e caindo de costas para a lareira. O magricela correu para mim, voando em meu pescoço. Desviei e ele caiu direto na lareira. As labaredas se tornaram cinzentas por uns instantes e se apagaram.

Corri atrás do corcunda, que estava sentado no sofá, sugando o sangue de Amelia. Arranquei o corpo dela das suas mãos e delicadamente pousei-o sobre o chão. Dei um pulo para socar o corcunda, mas ele desviou e minha mão afundou no sofá. Tentei tirá-la, mas ela ficara presa. Enquanto isso, ele me deu socos no rosto, o que minha mão livre não conseguia impedir. Então, consegui arrancar a outra mão e lhe dei um soco no... Bem, naquele lugar. Ele se contorceu de dor e caiu de joelhos, grunhindo. Dei-lhe uma joelhada. Duas. Três. Então chutei seu estômago e empurrei sua cabeça com toda força para o chão. Houve um baque surdo e uma poça de sangue se formou em volta de sua cabeça. Respirei fundo, tentando me acalmar.

À minha volta, havia um verdadeiro massacre. Os demônios corriam loucamente, arrancando cabeças e sugando corpos. Porém, o carrancudo, o líder era o que mais impressionava. Ele aparecia em diversos lugares, mordendo e quebrando pescoços. Ele jogava os corpos no chão, como se fossem sacos de salgadinhos vazios. Sua boca transbordava de sangue. Eu estava pronto para impedi-lo de continuar, quando, por incrível que pareça, o corcunda se ergueu e conseguiu fugir. Fiquei aterrorizado com sua capacidade de cura.Vi-o correr para a escada, como se tentasse alcançar os quartos. Porém, algo o impediu. Ele olhou sobre o balaústre: Hanna. Ela corria pela casa, decapitando e arrancando os corações dos outros demônios que atacavam meus amigos. Um sorriso malévolo brotou em seu rosto e ele sacou a faca, olhando para o teto acima de Hanna, presunçoso.

Havia um candelabro, cheio de velas e vidros pontudos. O que era pra ser um belo lustre luxuoso, era uma arma fatal. Ele jogou a faca e ela cortou a madeira que segurava o lustre ao teto.

–HANNA!

Pulei para salvá-la, dando o maior impulso possível. Senti-a se chocar contra meu corpo. Saímos bolando pelo chão, tropeçando no tapete. Então, bolamos escada abaixo (que dava no porão) e eu me senti como uma bola de neve. Hanna grunhiu de dor enquanto nossos ossos se partiam com o impacto, que parecia inacabável. Quando finalmente paramos, eu estava nauseado. Nossos rostos estavam a poucos centímetros um do outro. Pude sentir o cheiro de seu perfume e o do seu hálito de canela. Ela observou meu rosto, olhando cada detalhe, cada curvatura. Acariciou meus cabelos e aproximamos nossos lábios. Era um beijo sem toque, um quase beijo. A beleza estava no semi-toque. Então, eles se tocaram e eu senti algo queimar dentro de mim. Hanna fechou os olhos e sua cabeça caiu para um lado. No mesmo momento, senti minhas forças se esvaírem. Tudo escureceu e eu desmaiei.

Acordei com uma dor imensa sobre todo o meu corpo. Soltei um suspiro de exaustão. Tentei me levantar. Estava escuro e eu não conseguia ver nada, mas conseguia ouvir a respiração pesada de Hanna. Tateei o chão atrás de seu corpo e sacudi-a, para acordá-la. Sem sucesso. Tive medo que estivesse morta. Então, ela soltou um gritinho abafado e me acalmei.

–Onde estamos? -ela perguntou

–Caímos no porão. - falei, pegando seu braço. -Vem, levanta.

Ajudamo-nos a nos erguer. Ficamos de pé e tentamos subir as escadas de volta a sala de estar.

–O que aconteceu? - ela perguntou, enquanto subíamos as escadas com cuidado para não tropeçar no escuro

–Acho que nos ferimos tanto que a cura não foi rápida o bastante. - falei. - Então desmaiamos e só acordamos quando estávamos completamente curados. Por aqui.

Subimos mais alguns lances e chegamos ao topo.

Minha casa estava destruída. O teto? Não existia. Os móveis? Transformados em pó. Tudo parecia queimado. Exceto os corpos. Quase um cento de corpos, caídos no chão e imóveis, todos de algum modo, destroçados. Uns sem cabeça, outros completamente desmembrados, outros com enormes marcas de sangue em seu pescoço e alguns queimados. Minha boca se escancarou, em surpresa, dor, tristeza, frustração, culpa. Tudo unido em um só sentimento. De raiva.

–Não, não, não...

Caí de joelhos. Eles estava mortos. Roy, Simon, Rick, Elena, Leonora, Jack, David... Todos estavam mortos. Meus amigos morreram. Minha vida havia desmoronado e nada mais sobrara. Eu sentia como um idiota. Eu tentara tantas vezes e todas haviam falhado. Por quê eu não entendera? Por quê eu não percebi que não daria certo? Eu poderia ter evitado todas aquelas mortes. Todo o sangue derramado... O sangue dos mortos naquela noite. Sangue que agora, eu carregava em minhas mãos e carregaria junto com a culpa até que eu os vingasse.

Afundei o rosto nas mãos e chorei. Chorei como um bebê que teve seu pirulito levado. Meu pirulito, minha vida tinha sido brutalmente arrancada de mim. E eu não conseguia reavê-la. Era injusto. Era errado. Mas Hanna estava certa: Esse não era mais mundo. Eu não pertencia mais aquelas pessoas. Eu era Peter Roman, O Demônio, e eu tinha que entender isso. Enxuguei as lágrimas, olhei para os corpos, raivoso e levantei.

–Ele pode trazê-los de volta. - falei. - Não pode?

–Lúcifer é um Arcanjo. - ela respondeu. Sua voz estava trêmula. - Um Arcanjo Negro, o Anjo Caído, mas é. Ele não tem poder de trazer os outros de volta a vida.

–Não Lúcifer. Deus.

Houve silêncio.

–Sim. - respondeu ela. - Ele pode sim.

–Então se trouxermos Lúcifer e Miguel de volta, ele voltará. - pensei. - Deus terá seus dois lados, as duas orbes, seu bem e seu mal restaurados. Assim ele voltará. Certo?

Hanna assentiu.

–Mas Peter...?

–Vamos Hanna. - interrompi-a. - Vamos quebrar alguns selos.


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