Oneirataxia escrita por venus


Capítulo 4
Stuck On The Puzzle


Notas iniciais do capítulo

desculpem pela demora amores
dessa vez, eu tenho um motivo por não ter postado, e esse é a minha nova história, Phoenix.
enfim, como podem ver, mudei a capa da fanfic (aliás, o que acharam?) que na minha sincera opinião, achei uma meiguice (to muito amorzinho hoje, pois é).
mais um capítulo pra vocês, que apesar dos meus esforços, saiu meio cocozento.



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Acredito que todos merecem ter uma história a ser contada. E sei que essa é a de Mavis McKiddie e do seu amigo imaginário, porém há uma vastidão de personagens envolvidos nessa trama. Há a sra. McKiddie — que raramente sorri —, há Iris McKiddie — a irmãzinha frágil, mas adorável de Mavis —, há Alfie Dorothea — que tem mais problemas do que todos os outros — e é claro, há Christopher Redford, com quem me sinto endividada.

Muito bem, falemos então sobre Topher — como ele prefere ser chamado. Um breve resumo da sua vida: Sobreviveu a seis abortos, nascendo num clima de ódio e desespero. Quando deu sua primeira respirada, sua mãe deu a última. Estava fragilizada demais devido ao impacto dos seis abortos (que não deram certo. Morreu em vão, sem poder saber a cor dos olhos do filho. Seu pai não era muito bom com crianças. Muito jovem, muito desavisado, muito negligente. O bebê foi lhe arrancado dos braços pelo serviço social, que o colocou em uma nova família.

É triste dizer que a nova família, mesmo sendo perfeitamente calma e pacífica, não o agradou completamente. A curiosidade se alastrou pela cabeça e, mesmo que Cindy e Robin fossem pais bondosos e afetuosos, Topher não conseguia deixar de pensar no pai alcoólatra e na mãe falecida. Gostava de imaginar como estaria se tivesse permanecido com a família biológica. Talvez, seria muito pior do que já era.

Obviamente, Topher Redford não sabe que sua vida foi ameaçada por uma série de abortos e que seu nascimento foi totalmente acidental. Também não sabe que a mãe lhe segue por todos os lados desde que seu espírito deixou seu corpo. Espíritos bons vão para o Céu e espíritos ruins vão para o Inferno. Porém, ninguém sabe efetivamente porquê alguns permanecem na Terra.

O quarto de Topher na casa dos Redford é largo e espaçoso, porém é vazio. Ele não possui muitas coisas; raramente pede algo à Robin.

Uma corrente de ar entra pela janela quadrada, esfriando o ambiente, congelando o coração. Não passam das três horas e seus olhos amendoados permanecem abertos — arregalados, na verdade — devido às latinhas de energéticos que agora jazem no chão, vazias e amassadas.

— Maldita. — suspira pesarosamente, erguendo seu trabalho do chão e colocando-o na altura dos olhos.

Encara os olhos cinzentos, sinceros e frios. Originalmente, eles têm uma coloração turquesa sob a luz e meio violeta na penumbra. Mas Topher prefere usar lápis grafite em vez de lápis coloridos. Os tons fúnebres de branco, cinza e preto dão um ar dramático e melancólico para o desenho.

Os fios de cabelo negros e sedosos são tão bem feitos que Topher sentia que se encostasse seu dedo na superfície sem-vida do papel e acreditasse — acreditasse muito; como Peter Pan acredita em fadas ou como Alice acredita no País das Maravilhas — que Mavis está ao seu lado, poderia sentir o perfume e a textura dos seus cabelos alisados.

— Ei, Toph. — sua mãe dá duas batidinhas leves na porta do quarto. — Deus, quantos litros de Red Bull você bebeu? Recolha isso e jogue tudo no lixo.

Ele deixa o desenho — junto com os outros seis — no chão e cata todas latas do chão, atirando-as no lixo do seu banheiro em seguida. Retorna ao quarto e nota a sua mãe agachada, contemplando o perfeccionismo dos seus desenhos — ou esboços, como ele preferia chamar.

— Isso é lindo. — diz Cindy, alternando o olhar entre os seis retratos de Mavis. Quando fita o terceiro, onde ela está cuspindo fumaça de cigarro pela boca e seus cabelos espessos cobrem seu torso desnudo, faz uma careta e comenta: — Achei esse vulgar demais.

— Ah, deixa isso aí mãe.

— Quem é?

— Ninguém.

Cindy empilha as folhas sulfites e coloca-as sobre o criado-mudo. Fecha a janela e as cortinas, deixando apenas o abajur ligado. O objeto emite uma luz dourada, que banha a cômoda inteira. Tudo se torna mais amarelado, mais claro, mais confortante. Topher não se sente mais desolado; muito pelo contrário, sente-se esperançoso. Talvez seja verdade o que Mavis disse: Aiden é somente um amigo de infância ciumento. Ponto final.

— Vá dormir, meu bem. — fala a sua mãe, tirando as réguas, borrachas, lapiseiras e outras coisas que estavam sobre a cama de Topher. Ele agradece mentalmente e joga seu peso no colchão macio, que faz seu corpo quicar um pouco no instante em que deitou.

Sua mãe de criação fecha a porta do quarto quando tem certeza de que seu filho está adormecendo. E é sob a luz dourada, trêmula e esperançosa do abajur antigo, que a mãe real — biológica — de Topher inclina sobre a cama e deposita um beijo breve, mas caloroso em sua testa. Tudo o que ele sente é uma brisa; uma brisa com cheiro de narcisos amassados e lírios apodrecidos.


×××

No dia seguinte, sua mãe insistira em levá-lo para a escola com a sua Mercedes novinha em folha. Deixa Topher no estacionamento do colégio e fica tão ocupada apontando minuciosamente os erros na roupa do filho, que a garota que fuma sobre o capô de sua picape passa despercebida pela sra. Redford. Topher agradece por isso, porque se Cindy comparasse a fumante com a garota do desenho, faria questão de descer do carro e interrogá-la até que o sinal batesse.

Quando Mavis repara em Topher, desce do capô de Bessie e corre até ele.

— Sobre sexta-feira, eu não sei muito bem... — começa ela, mantendo uma expressão neutra. É difícil analisar o rosto de Mavis; Topher não sabe se está triste, arrependida ou indiferente.

— Não, o.k. Não precisa se desculpar.

E continua andando na direção das portas da escola.

Ela bate levemente no cigarro, fazendo as cinzas aterrissarem no chão de concreto. E então, tira duas baforadas enquanto o acompanha silenciosamente. Era impressão dele, ou Mavis estava o seguindo assim como Topher fazia há uma semana?

— Só queria que você soubesse que... — ela faz uma pausa e resfólega. Seus dedos compridos brincam com as correntes de metal penduradas em seu pescoço. Está evidentemente nervosa, como se estivesse medindo as palavras que estava prestes a pronunciar. — Aiden não se importaria. Ele sumiu. Desapareceu da minha vida.

Topher percebe que ela está brava, sorvendo a fumaça densa quase com raiva. Mas acima de tudo, está triste. Uma tristeza atípica; não a sua melancolia diária.

— Aconteceu alguma coisa? — questiona ele num tom desconfiado.

Ela nega com a cabeça, olhando para as pequenas crateras espalhadas pelo chão. Estranhamente, livrou-se do casacão cor chumbo, que duplicava o seu tamanho. Agora, veste uma blusa longa e surrada como um vestido. Sobre ela, usa um suéter de caxemira preto, que a abriga do frio e dos ventos cortantes.

— O que ele fez?

— Ele quem? — indaga Mavis, desnorteada.

— Aiden. — ralha com desprezo e irritação. Soava como algo metálico aos seus ouvidos. Porém, para Mavis, o nome é suave como uma lufada de vento quente, que a abraça e sussurra palavras bonitas para ninguém específico. Dá-lhe uma sensação instantânea de conforto e segurança, assim como o próprio Aiden faz.

É engraçado como Topher fala do amigo imaginário como se fosse uma pessoa real. Se Aiden estivesse ali, já estaria se desatando em risadas.

— Não. Ele não — ela sorri brevemente, lembrando-se do rosto do amigo. Contudo, ao recordar-se que este havia sumido, comprime seus lábios e retoma a fala: — Ele não fez nada. Só desapareceu.

— Sinto muito. — lamenta ele, tentando esconder sua felicidade e satisfação. Talvez uma noite inteira dedicada à desenhos de Mavis não tenha ido em vão.

— Tudo bem. — ela dá de ombros. — Ele não era real, mesmo. — murmura tão baixo, que o som sai como um gemido.

Aiden não tinha se despedido.

Seu desaparecimento não fora proposital.

A imagem dele ainda estava nítida na cabeça de Mavis.

Ela não o esqueceu.

×××

Mais tarde no mesmo dia, Topher resolveu acompanhá-la até a sua casa. Quando os dois chegam até o jardim mal-cuidado dos McKiddie, Mavis fica indecisa se é melhor convidá-lo para entrar ou não. Allison McKiddie resolve a situação oferecendo um copo de café/chá/suco/água à ele.

— É muita gentileza sua, sra. McKiddie.

Ao contrário das outras mães, a sra. McKiddie prefere ser chamada de senhora e é bem adepta a elogios e comentários educados, por mais desconfortáveis que estes fossem em algumas vezes. Portanto, adiciona Topher em sua lista mental de Possíveis Futuros Genros.

— Não há de quê. — responde a mulher, empertigando-se na cadeira da mesa de jantar. — Muito bem, fiquem os dois aí. Vou ver como Iris está.

— Quem é Iris?

— A minha irmã.

— Não lembro de ter visto ela da última vez.

— Minha mãe tinha a levado para fazer uns exames.

Ele não faz perguntas sobre que tipo de exames, porém a curiosidade fixa-se em sua mente e não a deixa até que Mavis diz:

— Quer conhecê-la?

— Seria ótimo. — e termina sua água num gole.

A casa dos McKiddie é bastante excêntrica. Eles têm vários retratos de alguns membros da família espalhados pelas inúmeras paredes da residência. Tem um cheiro característico, meio amadeirado. Todos os móveis são meio atarracados e desleixados; o sofá, por exemplo, expõe seu enchimento amarelo e sujo. É totalmente o contrário do seu domicílio, onde tudo é feito de vidro, mármore e aço escovado.

Mavis abre a porta e dá de cara com Allison, que estava saindo do quarto no mesmo instante que ela adentrava. O quarto de Iris é bem abafado, porém ele consegue ver uma figura tremendo de frio sob o cobertor de lã.

— Mavis? — questiona uma vozinha fraca e aguda. — É você?

— A-hã. Temos visitas.

Como se não tivesse escutado o que a irmã dissera, Iris acrescenta:

— Pode preparar uma xícara de chá pra mim?

— Jasmim ou erva cidreira?

— Tanto faz.

Mavis deixa o quarto, lançando um olhar para Topher como quem falasse "Espere aqui".

Meio intimidado, ele se aproxima da cama e diz vagarosamente:

— Oi, Iris. Meu nome é Topher.

— Eu sei. — e em seguida, ela começa a sibilar coisas desconexas, sem se dirigir a alguém específico.

— Mavis falou de mim pra você?

— Não. Mas Aiden falou. Ele está bravo e triste. Mais triste do que bravo, na verdade.

— Aiden... Ele esteve por aqui?

— Ah, ele vive aqui. — solta algumas risadinhas. — Sempre está por perto.

— Eu achei que ele e Mavis fossem somente amigos. — ralha Topher, sem conseguir ocultar sua raiva.

— E são. Mas isso não significa que... Aiden, não seja bobo! — profere a última frase com um tom de repreensão.

— Ele está aqui?

— Você não pode vê-lo?

— Não.

— Sério? Ele está do meu lado, bem aqui, olha! — pela primeira vez naqueles segundos, ela se volta para Topher. A única coisa que este consegue captar do seu rostinho, são os seus olhos turquesa que contrastam com aquele breu desesperançoso.

— Eu ainda não consigo vê-lo, Iris.

— Venha cá, Toph. — pede ela, esticando seu braço em sua direção.

Ele o faz, com um tanto de hesitação. Iris acaricia de leve a sua mão e a leva delicadamente para um ponto alto, na altura de uma estante mais ou menos.

— Aiden não existe? — questiona ele, sem conter a satisfação.

— Claro que sim. Não consegue ver os seus olhos verdes azulados? Eles estão olhando pra você. Acho que ele não está muito feliz.

Ele não está nada feliz.

Encara o outro com tanta ferocidade, que faria qualquer homem correr com o rabo entre as pernas. Se fosse feito de átomos, células, tecidos e órgãos, Topher conseguiria sentir sua respiração pesada e ofegante sobre ele.

— E o Aiden — agora, sabendo a verdade, profere o nome com inflexão. — diz alguma coisa agora?

— Sim. — responde a menininha inocente e ingênua. — Não fode, não. — pronunciou as palavras com uma entonação grave e rouca, que não combinava nada com a sua vozinha fraca e feminina.

E então, pela janela semi-aberta, uma corrente de ar adentrou o quarto, acertando o peito de Topher. Mas era uma rajada de vento tão forte e tão intensa quanto um mini-tornardo. O garoto cambaleia e bate a cabeça numa prateleira cheia de ursinhos de pelúcia. Um dos brinquedos, um especialmente pesado e mal-cheiroso, despenca sobre ele.

— Ah por favor, coloque Boddah ali em cima de novo. — suplica Iris.

— O que tem dentro desse negócio? — indaga Topher, meio atordoado pela ventania súbita.

— Mavis guarda sua garrafa de whisky aí.

Ele balança a cabeça afirmativamente e recoloca Boddah sobre a prateleira novamente.

Mavis adentra o quarto como um furacão e avança na direção da irmã. Sussurra as palavras tão rapidamente, que Topher consegue pegar somente alguns fragmentos da frase.

— Ouvi a voz dele... — e mais um bolo de palavras incompreensíveis. — Onde está?

A pequena Iris dá de ombros e responde:

— Ele foi embora de novo. Por causa dele. — e aponta seu dedo indicador para Topher, de forma quase acusadora.

— Tudo bem. — diz Mavis, meio desconsolada. — Tudo bem.

Talvez aquela rajada de vento que o acertara fosse apenas uma reles rajada de vento. Topher forçou-se a pensar nisso. Porém, uma parte dele sabia que não fora apenas um vento inofensivo.

A partir daquele dia, Christopher Redford começou a temer do nome "Aiden".


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Notas finais do capítulo

e o que vocês acharam? comentem, por favor :)
queria dizer que estou tremendamente satisfeita com o número dos comentários e de visualizações, continuem assim
duas últimas informações:
1) a música do capítulo foi feita pelo Alex Turner (meu vendedor de icegurt) para o filme Submarine
2) se vocês não tiverem mais nada pra fazer, pode dar uma passadinha na minha nova fanfic? é importante pra mim :) o link: http://fanfiction.com.br/historia/503924/Phoenix/