Dança com Demônios. escrita por zRainbow Dash


Capítulo 6
Um encontro com o desconhecido.


Notas iniciais do capítulo

Não terminado.



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— Sabe, eu nem fiquei tão assustado quanto achei que ia ficar. – dizia Khain, distraido, enquanto ele e Habel caminhavam pela grama despreocupados.

Estava muito frio e o vento soprava para longe as ultimas folhas que restavam nas árvores. Os dois garotos estavam presos na masmorra fazia muito tempo e, por isso, decidiram sair para respirar e aproveitar para falar sobre Khain e Laura sem que Laura pudesse ouvir alguma coisa.

Habel sabia o que Khain e Bella haviam feito, mesmo Khain não tendo contado nada para ele e, dizia Habel, que era óbvio e Laura descobriria. Khain deu de ombros.

— Eu nunca tive nada realmente com ela. Nada que... sabe... – dizia ele, mas perdeu-se nas palavras. – eu sei que foi meio errado, mas eu gosto muito da Bella e venho gostando cada vez mais com o passar do tempo. Isso é errado?

— Você não tem culpa, Khain. – disse Habel, suspirando. – Mas acho que a melhor atitude que você poderia tomar, é contar pra Laura. Vocês não são namorados e nem nunca se beijaram nem nada do tipo, mas é obvio que ela gosta de você e você, bom, gostava dela.

Khain lançou um olhar fixo para o amigo, em tom de repreensão.

— Eu gosto dela!

— Gosta mesmo? – perguntou Habel, enquanto se abaixava para amarrar cadarço do sapato. Então continuou, olhando para o nó que fazia. – Você pode até gostar, mas ela acha que você gosta mais do que gosta. Deu pra entender?

Khain assentiu com a cabeça e fechou os olhos. Respirou fundo e então sentiu o braço de Habel segurar sua perna. Quando abriu os olhos, o amigo encarava o horizonte com os olhos desconfiados.

O garoto então olhou para onde Habel olhava e viu, entre uma pequena e baixa névoa que crescia lentamente, uma figura caminhando. Estava com uma capa preta e os cabelos longos e negros caiam-lhe nos olhos. Os dois se entreolharam.

— Qanah’hyr. – Disse Khain, enquanto Habel se apoiava no amigo e se levantava.

— O que será que ele está indo fazer? – perguntou-se Habel. – Está frio demais e só nós somos loucos o bastante pra sair aqui fora com essa temperatura.

O homem desapareceu no horizonte, entre a pálida névoa que ficava cada vez mais espessa, enquanto Khain imaginava o que ele poderia estar fazendo ali, sozinho, caminhando errante em direção a floresta. É isso.

— Pra lá fica a floresta. – comentou, olhando para Habel com um pequeno sorriso no canto dos lábios.

— Merda. Você quer seguir ele, né? – riu Habel. – Achei que tinha aprendido a não chegar perto daquele lugar.

Os dois correram pela campina na direção em que o homem estava. Já o haviam perdido de vista em meio ao nevoeiro, mas continuaram seguindo em linha reta. Não estavam rapidos demais, pois tinham medo que o homem os ouvisse, por isso avançavam velozmente, mas com cautela.

Quando perceberam, já estavam em meio a árvores. Os dois diminuiram o passo, enquanto Khain observava o local tentando reconhecer alguma coisa. A floresta parecia completamente diferente aos seus olhos e ele não sabia se era por estar claro, se era por causa da névoa ou se realmente as árvores haviam mudado. Estas que, mesmo na época do ano em que estavam, ainda mantinham suas folhas impecáveis.

— Isso aqui tá muito esquisito. – comentou Khain, enquanto ele e o amigo caminhavam entre as raízes e troncos no chão.

— Esquisito como?

Khain ergueu o pé e tropeçou e um tronco caído. Apoiou-se em uma árvore para não cair enquanto Habel o segurava pelo ombro.

— Sei lá. Tá diferente. Parece outro tipo de vegetação. – comentou Khain, puxando um pedaço de cipó que ficou preto em seu sapato.

Conforme avançavam, Khain sentiu um leve formigamento em sua marca. Sabia que aquilo, geralmente, significava algo, mas nunca sabia exatamente o que. Ela não havia escurecido e nem nada parecido. Apenas formigava levemente.

As árvores ficavam cada vez mais juntas e era cada vez mais difícil passar entre seus caules e galhos. Mas logo conseguiram ver um vulto em meio a névoa e as árvores. Estava parado, ao longe, de costas para os garotos. Os garotos, desconfiados, foram até atrás de uma grande árvore delicadamente. Não fizeram qualquer som alto e podiam ouvir até as próprias respirações. Escondidos, observavam o homem ao longe. Ele continuava de pé, porém, moveu a cabeça para os lados. Está perdido? Ou está procurando algo? Ele não nos ouviu. Tenho certeza. Ele não pode ter nos ouvido. Foi tudo muito baixo.

O garoto sabia que era perigoso entrar na floresta. Sabia que por lá caminhavam aquelas criaturas sombrias da noite em que encontrou Bael e sabe-se lá o que mais se esgueirava entre as árvores. Não é nada demais. É só aquele maluco da gaita.

O homem no horizonte se abaixou. Permaenceu abaixado por um tempo enquanto Khain e Habel o observavam. Mas, bruscamente, o homem se levantou e virou para a árvore onde eles estavam. Os dois garotos esconderam-se atrás do caule e prenderam a respiração. Se entreolharam, assustados, mas não falaram nada. Não era Qanah’hyr, disso eles tiveram absoluta certeza. Merda. Merda merda merda. Eu sou um idiota.
Habel puxou do cinto uma pequena faca e apertou a mão contra o peito, segurando-a com força. Olhou para Khain e balançou a cabeça.

Um barulho muito alto soou onde o homem estava. Quase como um estalo e, em seguida, um grito estridente. Era agudo e terrível, alto o bastante para reverberar entre as árvores. Parecia um berro de dor.

Em um ímpeto de coragem, Khain respirou, contou até três e olhou para onde o homem estava. Não havia ninguém lá. A névoa parecia cada vez mais densa e, enquanto Khain olhava em volta, não via nem sinal dele. Os dois se desencostaram da árvore e, ainda alertas, começaram a observar os arredores.

— Cadê ele? – sussurrou Habel em um tom quase inaudível enquanto se virava para o amigo.

Khain balançou a cabeça. Sabia que havia cometido um erro. Havia escapado daquelas criaturas uma vez por sorte. Sentiu o formigamento em sua marca crescer até tornar-se praticamente ferro quente em sua pele.

Quando tocou a marca com a mão, apertando-a como se isso pudesse resolver algo para aliviar a dor, sentiu algo puxar seu braço e tampar sua boca. Dedos. Sua respiração parou instantaneamente e o corpo paralisou. Virou o rosto lentamente, e suspirou com o que viu. Era Qanah’hyr. Ele olhava para o garoto com seus olhos escuros arregalados e o dedo indicador na frente do rosto.

— Shhhhh. – fez, enquanto Habel se virava e colocava a mão na boca para não gritar. Os dois garotos se olharam enquanto o homem tirava a mão da boca de Khain.

Qanah’hyr fez um gesto para que os dois o seguissem e assim os três começaram a correr pela floresta. O homem ia na frente, guiando o caminho, enquanto os garotos, confusos, corriam ao seu lado. Não muito longe, o homem virou bruscamente. Entre o nevoeiro, surgiu um conjunto de pedras irregulares, grandes o bastante para criarem uma pequena caverna onde os três entraram e se esconderam.

Eram pedras enormes e negras, cobertas por limo e insetos que rastejavam pela sua superfície áspera. O conjunto era feito de cinco ou seis desses pedregulhos que, amontoados, fechavam uma pequena clareira para o mundo lá fora.

Qanah’hyr se abaixou e os garotos se abaixaram junto. O homem os lançou um olhar acusador e depois abaixou a cabeça.

— Eu não vou perguntar o que vocês estão fazendo aqui. Não agora. Mas vocês sabem que se meteram em uma merda bem grande, né? – disse, claramente se esforçando para manter a calma.

— A gente tá seguro aqui? – perguntou bruscamente Habel. Ele sempre foi mais sagaz que Khain e, em poucos segundos, já parecia estar com a cabeça no lugar.

Qanah’hyr pareceu surpreso e olhou desconfiado para Habel. Khain percebeu que, por baixo da capa do homem, havia uma bainha onde o cabo de uma espada repousava no cinto.

— Sim. Essas pedras vão mante-los afastados. Não sei se eles não conseguem se aproximar delas ou se não sentem a sua presença, mas os bichos não entram aqui.

Khain examinou as paredes negras da rocha e tocou com a palma da mão. Eram ásperas e frias, frias como gelo, mas havia algo nelas que o arrepiou. Quando olhou para Qanah’hyr, o homem obsevava a marca em seu braço, examinando-a. Mas logo virou-se para fora das pedras e observou o caminho por onde haviam vindo.

— E quando você vai explicar o que são essas coisas e o que você tá fazendo aqui com elas? – resmungou Habel.

— Ah, eles são uma raça de seres que vivem nessa ilha faz tempo. Eu não sei ao certo se são demônios ou alguma coisa parecida. Vim ver eles de perto, tentar coletar algumas informações.

— Pra..? – dessa vez foi Khain que se manifestou.

— Ai já é querer saber demais, não acha? – disse Qanah’hyr, com a voz entediada. – Chega de perguntas. Quando a gente sair dessa, podem perguntar o que quiserem. Digo, eu até consigo lidar com um ou dois deles. Derrubei um que estava indo na direção de vocês, mas acho que ele já deve estar de pé. Eles são rápidos, fortes e tem algum tipo de regeneração. Sabe, eles sempre voltam. Mesmo que arranque a cabeça dos desgraçados.

O vento assobiou entre as pedras e Khain se levantou. Sua marca latejava no braço e parecia que as raízes do desenho se contorciam entre seus nervos. O desenho estava mais escuro e Khain estava mais pálido.

— Acho que eles estão perto. – comentou, olhando entre as frestas das rochas. Só conseguia ver árvores entre o nevoeiro e nada além disso, mas sabia que havia algo ali fora. Algo esperando que saíssem daquela pequena caverna de pedras negras, como um lobo observando sua presa.

— Como você sabe? – perguntou Habel, confuso, enquanto Qanah’hyr também se levantava e olhava por uma fresta.

— Não tenho certeza. Só sei. – respondeu Khain, enquanto estendia a mão para ajudar o amigo a se erguer. Habel o encarou durante alguns segundos e depois olhou por outra das frestas.

Durante algum tempo, nenhum dos três falou nada e apenas o som das folhas lá fora e do vento assobiando entre as pedras soou naquele local. Khain estava assustado, mas não tanto quanto na noite em que esteve perdido na floresta. Por algum motivo, estar com Habel e, principalmente, com aquele sujeito de nome estranho, trazia-lhe uma enorme segurança.

— Nós não podemos ficar aqui para sempre. – comentou Qanah’hyr. E quando nenhum dos dois garotos disse algo, ele continuou. – Eu poderia sair e atrair eles enquanto vocês correrem de volta pra masmorra, mas não sabemos quantos são. Eles podem nos cercar e... e eu certamente ia morrer assim. Isso definitivamente não é bom. – continuou, balançando a cabeça de forma negativa.

Os garotos se entreolharam e Qanah’hyr os encarou. Respirou fundo e soltou o ar lentamente dos pulmões. Se abaixou e puxou um pedaço de giz branco de um pequeno bolsinho da sua capa.

— Vão ali pro canto, tá? – disse, enquanto empurrava os dois garotos para longe.

Então, com o giz, começou a escrever na parede de pedra negra. Era algum tipo de alfabeto que Khain não conhecia, com letras retas e simples. As palavras eram curtas e foram escritas em partes diferentes da pedra. Entre elas, Qanah’hyr fez alguns desenhos, medindo sempre a distância entre um e outro.

— Vocês não deviam estar vendo isso. – comentou, enquanto desenhava uma lua minguante perfeita. – A escola vai me matar. Eu tô ferrado. – continou, resmungando. – Vão arrancar minha pele.

Os garotos, não entendendo o que estava acontecendo ou do que o homem estava falando, resolveram simplesmente não se manifestarem. Se tinha algum jeito de sair dali, era confiando em Qanah’hyr e eles não sabiam bem o motivo daquilo.

Então, com um ultimo risco, ele se virou para os garotos.

— Isso vai ser meio esquisito. Sério. – disse, enquanto puxava do cinto uma pequena adaga de lâmina prateada. O brilho da arma cintilou em meio as pedras negras. Quando o homem percebeu que os garotos olharam assustados para a faca, ele sorriu. – Calma, isso não é pra vocês. Falei que ia ser meio esquisito, não que seria dolorido. Bom, um pouco pra mim só. – e dito isso, passou a lâmina pelo dedo. Em poucos segundos, surgiu do pequeno corte uma linha de sangue. – Fechem os olhos. Se vocês abrirem por um segundo, estamos mortos. - E eles fecharam. – Ah, não falem nada também.

Khain sentiu seu braço sendo puxado pela mão bruta de Qanah’hyr, mas não fez nada para impedi-lo. Apenas seguiu por onde a mão o puxava, dando curtos e lentos passos. Sentiu medo de bater nas pedras, mas nada aconteceu. Apenas continuou caminhando em linha reta.

Quando respirou, sentiu que o ar estava mais frio do que deveria, chegando a doer em seus pulmões. Havia um cheiro no ar que não conseguiu identificar. Um cheiro que nunca havia sentido. Estava muito tentado a abrir os olhos, mas não o fez. Já havia visto coisas esquisitas demais ultimamente e aquilo era só mais uma delas. Sua marca parou de queimar e, em vez disso, começou a doer de uma forma diferente. O garoto não olhou, mas sentia que as raízes do desenho no braço estavam se mexendo e podia perceber quando elas se tocavam, tocavam seus nervos e sua carne. Não era apenas um desenho. Estava vivo.

— Merda. – ouviu Qanah’hyr resmungar, mas não abriu os olhos. A mão que o segurava o soltou e o garoto ficou perdido. - Não abram os olhos. Não falem. Eu já volto.

Khain sentiu-se sozinho. Sabia que Habel estava ao seu lado, mas não podia se comunicar com ele, então resolveu tentar toca-lo. Esticou a mão para o lado e encostou em algo. Sentiu que era o amigo quando ele também o tocou. Os dois deram as mãos e ficaram ali, perdidos, sem saber o que fazer, em um completo e mortal silêncio.

Tudo parecia diferente. Khain não sabia quanto tempo havia se passado. Minutos? Horas? Estava com frio ou com calor? Parecia algo entre as duas sensações, mas ele não saberia explicar. Quanto tempo será que vamos ficar aqui? Acho que já era pra eu estar com fome. Será que o Qanah’hyr está bem? Será que eu estou realmente segurando o Habel? Isso tá esquisito demais.

Enquanto sua cabeça se enchia de perguntas, sentiu um forte vento soprando bagunçando seu cabelo. Tudo o que estava sentindo momentos atrás havia desaparecido e até mesmo sua marca parecia ter sentido a mudança repentina. Agora ela ardia. Apenas ardia como costumava arder.

O cheiro havia passado. A sensação estranha também. E então, um grito. O mesmo grito agudo e terrível de antes.

Será que eu posso abrir os olhos? Tudo estava como antes. Acho que não tem mais problema. Khain estava assustado, mas não queria desobedecer Qanah’hyr. Por algum motivo, confiava naquele homem. Será que está tudo bem com ele? Mas antes que decidisse o que faria, a mão de Habel o soltou.

— Khain! Acorda! – soou a voz de Habel.

Ao finalmente abrir os olhos, Khain percebeu o problema. Entre o pálido nevoeiro que preenchia o local, Qanah’hyr estava de pé a alguns metros de distância e Habel corria para chegar ao se lado.

Qanah’hyr estava ao lado de um pequeno riacho que corria em um vão de terra. Empunhava em uma das mãos uma comprida espada prateada. Era fina e de aparência leve, com apenas um gume. Não possuía guarda-mão e a lâmina terminava em um cabo negro, que estava enfaixado com um tecido negro. Outra espada, muito parecida, porém menor, jazia no cão, quebrada ao meio.

Em frente a Qanah’hyr, dois corpos estavam deitados sobre a grama, aos pedaços. Eram os homens negros da floresta e estavam completamente cortados. De seus restos, emanava uma sinistra fumaça negra que se misturava a névoa esbranquiçada.

No horizonte era possível ver mais três criaturas avançando entre as árvores na direção de Qanah’hyr. Eles eram velozes e moviam-se em uma estranha fúria selvagem, dando enormes passos e saltos por cima das raízes, troncos e pedras no caminho.

— Corram! – Gritou Qanah’hyr, virando-se para os dois garotos. E então Khain percebeu algo diferente nele. Por baixo de sua capa negra, havia uma grande mancha de sangue borbulhando e preenchendo de vermelho a camisa que usava por baixo. Parecia grave.

Habel, ao chegar perto de Qanah’hyr, puxou a faca que trazia e a empunhou.

— É, eu sei que é pequena. – Comentou e deu de ombros. Qanah’hyr, espantado, olhou para o garoto, para a faca e depois para o garoto de novo.

— Vai embora. Vamos todos morrer se vocês continuarem aqui.

Khain deu um passo para a frente e sentiu o corpo todo estremecer. Sua marca pulsava no braço, oscilando entre a dor pura e a ardência, enquanto as raízes da árvore paravam de se mover em sua pele. Tá tudo bem.

As criaturas se aproximavam e, ao olhar para o lado, percebeu que mais duas vinham de outra direção e estavam mais próximas.

— Vamos morrer nada. – Comentou Habel, abaixando-se e pegando o cabo da espada quebrada e a empunhando como outra faca. – O nosso amigo ali é bom em fugir de encrencas. – Continuou, indicando para Khain com o rosto.

Khain precisava fazer alguma coisa. Qanah’hyr estava machucado e Habel não parecia ter nenhum plano além de lutar até a morte. Merda. Olhou para os lados e havia apenas árvore e pedras. Nada mais. Nada que pudesse fazer. Apenas o riacho.

Não parecia ser fundo. Corria lentamente pela floresta, entre as árvores, com uma pequena queda formada por pedras. Sua água era escura, mas parecia ter não mais do que meio metro de profundidade.

Bael precisa de mim. Lembrou-se. Precisa de mim e eu preciso dele. Preciso dele agora. O barulho da água caindo das pedras era baixo e logo desapareceu, sendo engolido pelo agudo e estridente grito das criaturas. Estavam perto, mais perto do que ele havia imaginado.

Khain correu em direção ao riacho e se abaixou, olhando para a água. Habel olhou para o amigo, mas não disse nada, então voltou os olhos para os inimigos que se aproximavam.

Na água escura, Khain não conseguiu ver seu reflexo, apenas uma completa escuridão. Bael, eu preciso de você assim como você precisa de mim. Pensou, desesperadamente. Não sabia bem o que estava fazendo, mas sua marca começou a queimar incessantemente. As raízes começaram a mover-se novamente enquanto a visão do garoto começava a ficar embaçada. A dor era forte, mas havia algo mais acontecendo com o garoto.

Sentiu-se fraco, olhando para a água que corria. Me ajude. Pediu, enquanto sentia seus braços perderem a força lentamente. Não sabia o que estava acontecendo em volta e não tinha forças para se virar e olhar. Ouviu alguns sons em volta, mas a sua visão apagou-se sem prévoi aviso. Em alguns segundos voltou e o garoto sentiu seu estômago embrulhado. Havia algo queimando dentro dele.

— Desgraçados!

Ouviu Khain enquanto tentava se manter acordado. Então, subtamente, algo queimou em sua garganta. Não teve tempo para reagir e vomitou. Sentiu o líquido escorrer de sua boca e cair nas águas negras do riacho.

Rolou para o lado e viu Qanah’hyr. Ele estava parado, ao lado de Habel, cercado pelas criaturas. Eram cinco no total e nenhuma delas avançava mais. Todas estavam exatamente na distância entre Qanah’hyr e os dois corpos no chão.

Qanah’hyr, por sua vez, estava em uma estranha posição de luta, com sua estranha espada erguida no ar. Parecia prestes a dançar, mas algo naquela posição parecia ameaçadora para as criaturas. Habel deu alguns passos para trás e virou-se para Khain.

Khain olhou nos olhos do amigo enquanto tentava recuperar as energias, mas logo sua atenção foi tomada por uma enorme criatura que desceu do céu. A visão do garoto estava prejudicada pela fraqueza e tudo parecia mais escuro do que deveria, mas reconheceu no mesmo instante o cão demoníaco de Bael.

A criatura caiu sobre um dos homens negros e imediatamente cravou os dentes em seu pescoço. Suas costas, onde outrora havia uma carapaça, agora estava coberta por compridos espinhos negros.

Qanah’hyr, aproveitando a distração, moveu rapidamente os pés na direção de um dos homens e desceu a lâmina de uma forma quase graciosa na direção de seu pescoço. A cabeça voou como se fosse um toco de árvore e sangue negro espirrou para os lados.

Correndo na direção de Khain, Habel guardou a faca e segurou no braço do amigo. Khain tentou se levantar, mas apenas desabou novament sobre o gramado. Virou a cabeça para Habel e abriu um leve sorriso.

— O que diabos você fez? – Perguntou Habel, assustado.

Zonzo demais para pensar em uma resposta coerente, Khain limitou-se a apontar para o cão.

— Por incrível que pareça, aquilo tá do nosso lado. – E então, as sombras em volta de Khain cresceram rapidamente, tomando totalmente a visão do garoto e, logo, tudo em volta era escuridão.

Demorando algum tempo para perceber que estava acordado, Khain piscou os olhos. Estava no escuro, deitado, olhando para o alto. Talvez o teto de algum lugar.

Sentou-se lentamente e percebeu que estava em seu quarto, sobre sua cama de peles.

Olhou para o lado e encontrou Habel, sentado, encostado na parede e dormindo profundamente. Estava com a mesma roupa que usou na floresta, mas Khain estava trocado. Logo passou pela sua cabeça que o amigo o havia visto nu e sentiu o rosto corar um pouco.

— Habel? – Chamou, baixinho, quase em um sussurro. – Habel? – tentou novamente e então o amigo se mexeu e abriu os olhos, encarando Khain.

— Nossa, finalmente. – disse, enquanto se esticava, sem sair da posição em que estava, na direção de uma sacola que estava ali perto. – Já tava achando que você tinha morrido. – comentou, quando alcançou a sacola e a puxou para perto. - E me arrependido de ter carregado você da floresta até aqui, lógico. Não que você seja muito pesado, mas...

Khain olhou para o braço e percebeu que a sua marca estava quase apagada. Não havia dor, não havia ardência e nem nada parecido. Sua cor estava fraca e parecia quase uma cicatriz ou queimadura comum.

— O que aconteceu lá? – perguntou, enquanto Habel tirava um pedaço de pão da sacola e jogava na direção de Khain.

— Antes ou depois de você desmaiar? – riu Habel, enquanto mordia um grande pedaço de pão. Khain não entendeu como cabia um pedaço tão grande na boca do amigo. – Ah, não entendi direito pra falar a verdade. Apareceu aquele bicho esquisito sei lá de onde e começou a atacar os caras de preto. O Qanah’hyr, quando percebeu que o bicho não precisava de ajuda, saiu correndo na nossa direção. – Mordeu outro pedaço de pão e então continuou. – A gente foi embora. Eu carreguei você o caminho todo, nas costas, acho que ele tava machucado demais pra te levar.

O pão estava gostoso, mas causou uma estranha sensação no estômago de Khain.

— E depois?

— Ah, cada um foi para um lado. Eu achei melhor deixar o cara na dele. – disse Habel, enquanto mordia o ultimo pedaço de seu pão. – Ele pareceu meio perturbado depois daquilo. Mais do que eu. Olhava pra você como se você fosse um demônio. Assustado, sabe?

Khain deixou-se cair de costas sobre a cama. Será que fui eu que chamou o cachorro? Eu tentei chamar o Bael, fazer alguma coisa, pedir ajuda e aquele bicho apareceu do nada. Será que ele está me seguindo ou algo do tipo ou eu realmente o chamei? Perguntou-se, enquanto fechava os olhos e bocejava.

— Esquisito. – comentou Khain, ainda de olhos fechados. – E você? Tá bem? Não ficou assustado nem nada?

Após uma pequena crise de tosse, talvez por causa do pão, Habe se apoiou no joelho e levantou.

— Eu... – começou, enquanto caminhava me direção a porta. Ficou de costas para Khain, parado. – Eu estou legal. Ah, tem uma pessoa esperando pra te ver. Eu falei que você passou mal enquanto a gente carregava umas coisas. Que o esforço foi muito e você apagou, então, seja lá qual o segredo que você tem, ele tá guardado. – após respirar fundo, virou-se e olhou para o amigo. – guardado até de mim.


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