Terminado o terrível Conselho que pode vir a culminar com uma catástrofe, os outros deuses (aparentemente desinteressados na minha tragédia pessoal), foram se encaminhando para a saída, em direção às suas rotinas. Coisa que eu deveria estar fazendo também, mas parece que só agora caiu a ficha: terei que não só conviver com meu inimigo declarado, mas também organizar, com ele, uma festa para o dia dos namorados! Urg! Onde foi que eu me meti?

Saindo, por fim, do mundo dos meus pensamentos, deparei-me com a vastidão de um enorme salão vazio. Olhei para os lados e já estava quase conformando-me com o conforto da solidão quando percebo que há alguém escorado na porta que dá para os jardins. É Poseidon. Noto, com surpresa, que ele me espera e apresso-me para segui-lo. Conforme me aproximo, sem querer, acabo reparando na bela imagem formada pelo Sol refletido em seus olhos verdes, esmeraldas hipnotizantes. E ao descer o olhar quase me deixo levar por seu sorriso, acreditando que ele (por algum motivo inexplicável) estaria feliz em me ver. O que há comigo hoje? Vocês se odeiam! E mesmo tendo consciência de que estou certa, subitamente sou tomada pela vontade de tocá-lo e descobrir se é real o calor que parece emanar de sua pele... Foco, Atena, foco!

– Pallas! Então quer dizer que teremos que unir nossas inteligências para bolar uma festança?

– Você quis dizer usar minha inteligência e tentar conseguir a proeza de deixar você de boca fechada, não é? - digo sarcástica - E não me chame de Pallas!

– Há há há Muito engraçado, Loira! Como se você não quisesse ficar uns tempos na minha companhia, né?

– Como assim?

– Pensa que eu não sei o porquê de você não querer outro sorteio? – disse com uma expressão brincalhona. Levantei as sobrancelhas.

– E qual é sua brilhante explicação para esse fato?

– Você finalmente resolveu parar de fingir que possui esse ódio ridículo por mim e assumir de vez o quanto me ama!

– Dionísio pôs algo em sua bebida? Ou Afrodite possuiu sua mente? Porque você só pode estar louco!

– Louco pra passar um mês sozinho com você... - e foi se aproximando de meu rosto lentamente, seus lábios vermelhos semiabertos de forma sedutora... Pera aí, o quê?!

– Fica longe de mim seu acéfalo! – reclamei em alto e bom som enquanto seguia pelo corredor sem olhar para trás.

– Há há há há há Espera! – disse me alcançando e segurando pela mão - Você tinha que ter visto sua cara! Foi hilário!

– Não teve nada de engraçado! – estaquei no lugar e devo ter feito um bico gigante, com raiva e contrariada por ter sido feita de boba.

– Sem manha, Atena! – proferiu ao cruzar os braços me olhando como se eu fosse uma criancinha.

– Não tô fazendo nada... – mas tinha noção de realmente estar agindo como se fosse uma menina um pouco mimada.

– Ser a favorita de Zeus te deixou mal-acostumada... - concluiu bufando - Ok ok, eu paro com as gracinhas!

– Jura? – digo com esperançosa surpresa.

– Fazer o quê? Vai perder metade da graça, mas não vamos conseguir fazer nada se brigarmos por cada palavra que o outro diz...

– Nem acredito que vou dizer isso, mas você está certo, vou tentar me controlar também, para não ser tão chata...

– Ih, vai ser difícil! – ele sorria.

– Posseidon, seu bobo! – não pude conter uma risada.

– Então, por onde começamos?

– Vamos falar com Afrodite e pedir ajuda dela, precisamos de inspiração...

Seguimos caminhando em silêncio até o quarto de Afrodite. Incrivelmente até que estamos começando bem, conseguimos parar de brigar sem ninguém precisar interferir! E no final das contas ele não é tão sem graça e idiota assim...

Chegamos lá e paramos em frente à porta que exibia seu nome em letras delicadas, floreadas e... rosa, claro!

– Então, quem vai bater?

– Um dos três grandes com medo da deusa do amor? – fiz uma cara presunçosa.

– Ela é louca... – deu de ombros – e além do mais, sabe-se lá o que ela vai estar fazendo aí dentro...

– Ah, Poseidon! Agora eu não bato de jeito nenhum!!

– Exagerada... Também não é pra tanto!

– Cala a boca e bate logo você!

– Ok! – ele bate ritmadamente à porta e faz uma voz aguda – Elsa? Você quer brincar na neve?*

– Não acredito! Você viu Frozen?

– Pelo visto você também... – disse rindo – Fazer o quê, gosto de personagens divertidos como o Olaf...

– Ele é tão fofo! – sorrio de orelha a orelha.

– Não espere que eu concorde, o adjetivo “fofo” vai contra minha masculinidade...

Revirei os olhos.

– Seu idiota.

– Quem diria que teríamos algo em comum? Ainda mais um filme da Disney!

– Eu diria, meus amores! – ficamos tão entretidos na conversa que nem notamos que a Dite nos observava – Preciso confessar que vocês são tão lindos juntos que quase chorei aqui!

Reviramos os olhos simultaneamente.

– Nós não estamos juntos!

– Tudo bem, acham que é muito cedo pra admitir? Não vou pressionar vocês para me contarem todos os detalhes sórdidos... ainda! - Ela terminou de falar e deu uma piscadela.

E com essa sua frase carregada de dramaticidade que finalmente entramos em seu quarto.