Caçador escrita por Lian Black


Capítulo 43
Médium habilidoso, e sem criatividade


Notas iniciais do capítulo

Desculpe a demora. É que escrevo na semana e posto dos fins de semana. Mas hoje consegui dar uma escapadinha e postar alguns capítulos.



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Massageando as costelas por que isso doeu, oras. Ela se jogou com tudo em cima de mim, e não é brincadeira não.

Vocês devem estar se perguntando: Como achou ela? Já até sei o que estão pensando. Fiz algum ritual bem loucão usando um fio de cabelo dela, um pouco do seu sangue, e alguns outros ingredientes mais estranhos. Então, completando o ritual de localização, impregnei a magia no meu punhal, de modo que ele sempre apontasse na direção dela se eu o pousasse no chão. Então, é claro, vim pra cá correndo sem nem pensar duas vezes.

Bom, vou ter que dizer que estão ERRADOS!

O método foi muito mais simples. Eu coloquei um rastreador no celular dela. Apenas abri o aplicativo e funcionou como um GPS. E antes de vir, me armei para combate contra demônios, fantasmas ou criaturas místicas fedorentas (que eles fedem mesmo) e nem um pouco amistosas. Só então vim pra cá.

É claro que quando entrei no beco e vi ela correndo na minha direção com uma pistola, tive de apelar. Desarmei ela e então... Se jogou em cima de mim quase quebrando minhas costelas de novo.

Observo-a. Jene está sorrindo, com algumas lagrimas nos olhos. Mas parece bem. Um pouco abalada. Posso apostar que foi o pavor que a fez agir assim. Acontece sempre. É tremendamente raro um Caçador não ser tomado pelo pavor no começo. Eu sou uma exceção, mas nos primeiros casos eu estava quase suicida. Estava com pavor de viver, não de morrer. Depois recuperei o juízo.

— Vai me contar o que aconteceu?

Seu sorriso vacila. Jene desvia o olhar, parecendo desanimada e um pouco temerosa. Ela volta para dentro do beco e senta no chão, se recostando na parede e abraçando os joelhos. Vou até ela e sento ao seu lado. Fico esperando pacientemente. Quando ela estiver pronta, vai falar.

— É bem complicado ser Caçador, né? — Jene fala depois de um tempo. Dou os ombros.

— Depende no que. É difícil, normalmente, e quase sempre fatal. Mas... — Deixo a frase morrer. Jene ri de leve.

— E você está nessa profissão. Por quê?

Olho para longe.

— Viver sendo caçado... Sem saber se a próxima Caçada vai ser a última... Saber que o futuro é morrer pelas mãos daquilo que caça, sendo perseguidos por monstros e homens. — Dou os ombros de novo. — Pode parecer uma tarefa ingrata, e é mesmo. Mas... Eu gosto. Somos a última barreira entre o mundo atual e o caos total. Vivemos para morrer, sem reconhecimento, esquecidos, afogados em números. Isso é ser Caçador. E isso é a minha vida. — Olho para ela. — Você me lembra o Philip.

Jene estremece.

— Você conheceu meu avô? — Ela pergunta com curiosidade e algo mais na voz.

— Conheci... Foi um ótimo Caçador. Mas se aposentou muito antes de eu conhecê-lo. No seu caso, Caçar está mesmo na família. Ele ensinou John, John me ensinou e eu vou te ensinar. — Sorrio um pouco, para quebrar a tensão. — Eu quis dizer parecida pelo modo que age contra o sobrenatural, por assim se dizer. Com teimosia, sem se deixar abater facilmente. É como se você caçasse só para mostrar que pode, para fazer birra contra os fantasmas. Philip era parecido. Se surgia uma ameaça, ele ia vencê-la apenas para mostrar que podia, sem se preocupar se morreria ou não. Ele morreu faz uns cinco anos, não é?

Jene assente. O silêncio se prolonga novamente. Quando estou prestes a sugerir que voltemos para o hotel, ela começa a falar de novo.

— Esse caso... Eu acho que sei o que é. — Ela toma fôlego. — Eu escutei o meu avô. Hoje mesmo, várias vezes. Primeiro durante a manhã, quando fui entrevistar os conhecidos das vitimas, e depois quando saí do hotel e vim até aqui. Ele queria que eu fosse até ele, mas não conseguia vê-lo.

— Você ouviu seu... — Começo a perguntar surpreso, então solto um rosnado. Não consigo me conter. Jene me olha assustada. — Merda. — Praguejo.

Me levanto, puxando o braço de Jene. Ela se levanta também, ainda sem entender, mas eu fico alerta. Esse cheiro... Não posso estar errado.

— Tire a jaqueta.

— O que? — Jene pergunta sem entender, me olhando como se fosse louco.

— Confie em mim.

Ele tira a jaqueta de couro, me olhando apreensiva. Não dou atenção para isso. Por baixo, ela está usando uma camiseta totalmente preta, encharcada de suor pela corrida. Mas além do suor, também consigo ver...

— Merda. — Praguejo de novo, quase cansado demais para usar pragas mais fortes. — Por que nada pode ser simples?

— O que foi? — Jene pergunta.

Sem responder, passo a mão pelas costas dela, na região na espinha. Então mostro os dedos para Jene. Ela fica olhando sem entender o muco esbranquiçado que tenho na mão.

— O que diabos é isso?

— Ectoplasma. — Respondo. — Ou seja, algum fantasma passou bem perto de você.

Jene me fita por alguns minutos, confusa. Então cai a ficha.

— Você não quer dizer...

— Quero. — Confirmo sem nenhuma vontade. — Philip. Só não entendo como. Queimamos o corpo com sal, é impossível que ele tenha voltado sozinho.

Jene começa a andar de um lado para o outro pensativa.

— Acha que todas aquelas pessoas foram atrás de fantasmas dos entes queridos?

— É possível. Deve haver algo na cidade que está evocando esses fantasmas. Ou seja, só o que temos que fazer é descobrir o que é e dar um jeito nisso.

— Falando parece tão simples. — Jene comenta.

Eu rio, animado por ter um objetivo de novo. Caçar sem saber o que estou caçando é meio mórbido.

— Sempre parece.

Pego o celular e ligo para Megan. Ela atenda na segunda chamada.

— E aí, ainda está viva? — Pergunto em tom de brincadeira.

“Se estivesse morta, não teria atendido o celular” Ela responde bem humorada. “Ou talvez teria. Ultimamente não tenho muita certeza disso. Então, achou ela?”

— Sim. Olha, tivemos uma ideia. O quarto esta lacrado, não é? — Pergunto.

“Contra demônios, fantasmas e Anjos. Pode ficar tranquilo.”

— Ótimo. Me faça um favor. Temos um palpite sobre o que pode ser. Procure por ligações entre as vitimas. Qualquer uma, por mais ínfima que seja. Tipo, freqüentam o mesmo bar ou tem amigos em comum. Qualquer coisa.

“Pode deixar. Mas o que acham que é?”

Hesito por um momento.

—Não posso falar mais por telefone. Quando chegar aí te explico.

“Bom, você que sabe. Vou ver o que consigo achar. Beijo.”

— Beijo. — Desligo e devolvo o celular para o bolso. Olho de relance para Jene, que já vestiu a jaqueta de novo, e tiro sutilmente um frasco do bolso. Então atiro água na cara dela.

Jene balança a cabeça e passa a manga no rosto.

— Eu não estou possuída. — Ela reclama. — E de qualquer modo, existem demônios que resistem a água benta.

— Só três. — Respondo em tom de desculpa. — Está bem, vamos logo então. O quanto antes chegarmos, melhor. Se tem fantasmas andando por aí como bem entendem, nenhum lugar está seguro. Com exceção de lugares protegidos por nós.

Eu sei que ela entendeu o “nós” como Caçadores.

Vamos até a rua, um pouco mais movimentada mesmo a essa hora, e entramos no Dodge. Deixei ele estacionado ali quando entrei no beco. Que bom que ninguém tentou roubar. Esqueci de tirar o saquinho de bruxa que aciona a maldição anti-ladrões.

Bato na porta usando a nossa antiga senha. Se eu simplesmente abrir a porta do quarto, Megan ainda me dá um tiro. O que não seria nada legal.

Depois de alguns segundos, Megan abre a porta. Nós dois entramos. Megan e Jene se entreolham, e parecem conversar com o olhar. Sério, ficaram amigas assim tão rápido? Não, pera, já estamos Caçando juntos a mais de três meses.

— E então? — Megan pergunta, sem esperar.

Me jogo na cama e bocejo. Tenho que começar a dormir mais de duas horas por noite.

— Então nada. Quero saber o que você conseguiu.

Megan pega um aviãozinho de papel em cima da mesa e atira para mim. Pego ele e abro, lendo a lista de nomes dentro. Então franzo o cenho.

— Hã... Não é por nada não, mas... Pelos “codinomes”... Isso é uma lista dos adivinhos da cidade? — Pergunto para Megan. — O que isso tem a ver com o que te pedi.

— Veja o terceiro nome da lista. Ele tem algo a ver com as cinco vitimas. Todas as vitimas estudavam no mesmo colégio durante o ensino médio, e ele também. E três das vitimas estudavam na mesma turma que ele. — Ergo uma sobrancelha. Isso levanta novas possibilidades. — Então... Não sei. Ele é um médium que diz fazer “contatos com os familiares” falecidos. Metade dos da lista dizem isso, mas esse pode ser verdadeiro.

Fico batendo com a folha de papel na palma da mão e pensando. As vezes, em cidades grandes ou pequenas, encontramos alguns médiuns verdadeiros. Não é muito difícil. Pessoas que tiveram contato com fantasmas na infância ou na gestação, ou as vezes pessoas normais mesmo, desenvolvem alguma premonição. Coisa pouca na maior parte das vezes, e nunca tentam desenvolver. Mas ganham grana enganando trouxas. O poder mais comum é identificar mentiras. Mas as vezes surge um que pode convocar fantasmas. Eu nunca me meto, mesmo nesses. A maioria não sabe ao certo o que está fazendo, então eu deixo quieto. Mas se tem um que realmente sabe o que está fazendo...

— Hummm... Acha que ele pode estar convocando esses espíritos?

Que espíritos? — Megan pergunta. Me lembro que ela não sabe da história do avô de Jene. Resumo rapidamente a história.

Megan fica pensativa.

— Sim, eu acho. Mas acho que não são simples favores para amigos. Liguei para o colégio e falei com alguns amigos dele, e... Bom, parece que ele não era muito popular. Já levou algumas surras durante o colegial. Eu acho que ele pode estar invocando os espíritos para se vingar deles.

Olho para o teto. É, vai ser mais simples do que parecia. Pelo menos já temos o alvo.

— Vamos dormir um pouco, depois eu e você vamos ter uma consulta com o... — Olho para a folha. — “Mister Obscuros”. — Rio sarcástico. Olha os nomes que essas criaturas escolhem!

— E eu? — Jene pergunta.

— Você fica. — Ela parece que vai protestar, então acrescento. — É mais fácil se tiver alguém aqui, e... É mais fácil trabalhar em duplas que em trios. Também preciso que, caso descubramos um outro fantasma lá, você esteja pronta para ir atrás da vitima.

Jene me olha por um momento. Tanto ela quanto Megan sabem que isso é apenas desculpa. Mas para meu alivio Jene concorda.

— Bom... Então boa noite para vocês.


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Notas finais do capítulo

Só tenho mais um capítulo escrito depois desse. Então, depois de ler o próximo, vão ter de esperar até domingo.



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