Caçador escrita por Lian Black


Capítulo 44
Meu amigo maligno vem me fazer uma visita




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/477213/chapter/44

Encontrar o endereço foi fácil. Apenas pegar um jornal. Los Angeles está cheia de médiuns, e a maior parte parece ficar num dos bairros pobres e... digamos que menos convidativos para pessoas normais. Para mim, são ossos do oficio. E não vão ser alguns drogados que vão me assustar.

Ele atende num puxado do lado de uma casa. Um letreiro de neon fraco mostra o nome dele. O puxado está pintado de tons escuros, preto, roxo e vinho. Abro a porta, e meus olhos lacrimejam com o cheiro de cigarro e maconha do lado de dentro. Megan entra também e torce o nariz.

Panos sujos em tons escuros pendem do teto, e uma divisória com uma porta corta o puxadinho ao meio. Do lado de cá, em uma mesinha, um atendente está sentado. O cara é bem pálido, e possui marcas “místicas” pintadas no rosto com tinta vermelha e branca. As roupas excêntricas devem ser por causa do trabalho. Pelo menos eu espero que ele não se vista assim na rua.

— Olá, bem vindos a caverna do mistério de Mister Obscuros. Vocês têm hora marcada?

— Não exatamente. — Eu respondo, me aproximando.

O atendente sorri malicioso, e seus olhos ficam totalmente negros. A mão de Megan vai diretamente para o cós do jeans, para pegar a pistola, mas eu seguro sua mão.

— Tudo bem. — Largo o pulso dela, e Megan me olha como se eu fosse louco. Não dou bola e me viro para o atendente. — Já pedi para não aparecer sem avisar. E não na frente dela.

O demônio ri e se escora na cadeira, colocando as mãos atrás da cabeça e as pernas em cima da mesa.

— Nem se esquenta.

Reviro os olhos.

— Já estava possuindo o cara ou é só para falar comigo?

— Para falar com você. Depois deixo ele ir, e nem vai se lembrar de nada.

— O que é isso? — Megan pergunta, recuando alguns passos e nos olhando assustada.

Solto um longo suspiro. Ele me paga.

— Lembra que eu disse que tinha fontes extras? Bom, conheça Chuck, meu quebra-galho. Temos uma espécie de trato. Ele não exagera nos contratos, e eu não o caço. Também me consegue um bom número de informações em troca de cobertura. — Megan me olha como se fosse louco. Acho que sou um pouco. — Fique tranquila, ele não é um perigo para os humanos. Os contratos dele são melhores que a média. E ele faz poucos, de qualquer maneira.

Megan hesita.

— Eu vou esperar lá fora.

Fico observando ela sair. Quando a porta se fecha atrás dela, jogo um pouco de água benta em cima de Chuck.

— Ai! Pra que isso, seu maluco? — Ele segura o rosto, de onde vapor sai.

— Seu idiota! — Eu rosno. — Eu falei pra não aparecer na frente dela. Devia te exorcizar aqui mesmo.

— É, mas não vai fazer. — Ele fala, ainda esfregando o rosto. — E de qualquer modo, como sabia que era eu?

— Sua aura. — Respondo contra vontade. — Já me acostumei com ela. Sem falar que é o único demônio idiota o bastante para aparecer na minha frente assim.

Chuck suspira e revira os olhos.

— Muito obrigado. — Ele aponta com o polegar para a porta na divisória. — O cara que você está procurando está lá atrás, desmaiado de tanto ópio. Faça as honras.

Fito a porta.

— Ele é um médium?

Chuck sorri.

— Mister Obscuros. Sim, ele aprendeu a convocar espíritos, e aproveitou para se vingar de alguns idiotas que o atormentavam alguns anos atrás. Panaca. Nem consegue controlar direito os espíritos. Em breve essa cidade vai estar tão saturada de fantasmas que você vai precisar de um batalhão para cavar tantas covas. — Chuck ri alto ao ver minha cara. — Fique tranquilo. São só sete até agora. Ele os mantém presos num circulo de sal aqui perto. Só tira um quando precisa. Mas vai perder o controle em breve. Se vai fazer algo, que seja antes disso.

Dizendo isso, Chuck abre a boca e fumaça negra sai num jato. O corpo do atendente cai desmaiado no chão. Solto um suspiro.

— Acho que ouviu, certo Megan?

Nem preciso olhar para percebê-la atrás de mim. O som da porta se abrindo foi leve, mas eu estou sempre atento.

— Ouvi. — Ela responde suavemente. — Vamos dar um jeito no cara e depois conversamos sobre isso, está bem?

Assinto. Por mais que a conduta seja leve, posso notar que ela não gostou dessa aliança. Ótimo. Eu vou matar o Chuck da próxima vez que o achar.

A porta está destrancada. Do outro lado, vemos algo que parece uma sala de mediunidade, só que cheia de fumaça e cheiro de ópio. Viciado de uma figa. Vou passar uma semana para tirar tanto cheiro de fumaça do corpo.

O “Mister Obscuros”, ou simplesmente Mike, está deitado, meio desmaiado, com um cachimbo caído ao seu lado. Vou até o seu lado e dou um empurrão no ombro, sacudindo-o todo. Ele resmunga um pouco, mas não acorda.

Bom, vai ser do jeito difícil então. Pego um dos cantis e derramo toda a água gelada na cara dele. Ele abre os olhos e da um pulo se afastando.

— Mas que merda é essa? Quem são vocês, e o que estão fazendo aqui? — Então parece recuperar alguma postura. — Desculpe, tem horário marcado? Eu não atendo fora de hora, mas posso fazer uma exceção.

Seu olhar vai para Megan. Pelo sorriso dela, posso adivinhar o que está pensando. E Paul pode atestar que esse pensamento não é agradável.

— Na verdade, sim, temos um horário. Mas seu atendente parece ter esquecido de avisar. Podemos voltar outra hora... — Me faço de bobo. Vamos ver até onde isso vai.

— Não, não. Não precisam. Só me dêem um segundo.

Ele vai até uma mesinha em um canto e pega uma garrafa. Toma um longo gole. Vodca. Então vai até a mesinha no centro com cartas e uma bola de cristal. Faz sinal para nos aproximarmos.

Sentamos os dois no chão, no lado oposto a ele. Quero ver se ele vai mesmo tentar evocar algum fantasma. Se ele tentar, vou dar um jeitinho. Tenho aqui comigo um saquinho de bruxa preparado.

— Então, o que desejam? Futuro, sorte, amor? — Seu olhar se volta novamente para Megan. — Ou contatar algum ente querido? Mister Obscuros é capaz de fazer tudo. — Ele pisca para Megan, e posso adivinhar o duplo sentido disso. Quase estou com pena dele. Quase.

— Um ente querido que faleceu. Meu pai. — Eu invento depressa.

Mike assente. Sério, vou chamá-lo de Mike. Mister Obscuros é muito idiota.

— Preciso de seu nome... Talvez uma foto, se tiver.

— O nome é Antônio Dark. — Eu respondo, sem mentir. É mesmo o nome de meu pai. Mas eu acharia interessante se ele conseguisse invocar esse fantasma. Eu tomei minhas precauções algum tempo atrás. — Desculpe, nada de fotos.

Mike assente, ficando sério, e estica as mãos apontando para mim. Ele fecha os olhos.

A temperatura baixa um pouco, e a luz já fraca pisca. A fumaça que ainda permeia a sala começa a se agitar. Megan olha em volta, nervosa. Mas eu estou calmo. Essa parte é exibição, depois vem a séria.

Ele abre a boca e começa a balbuciar, num tom rouco e sobrenatural, desumano. Minha pele se arrepia. Esse feitiço... Então ele não é nenhum charlatão. Mas se continuar usando esse feitiço em especifico...

— Pare! — Eu grito, mas ele finge que não ouviu. Solto um rosnado. Vamos do modo difícil então.

Atiro o saquinho de bruxa em cima da mesa, e começo a entoar um feitiço. Nossas vocês se chocam uma com a outra, criando um contraste arrepiante. Megan estremece e tapa os ouvidos, se encolhendo. Não posso culpá-la.

Ele é bom, mas eu sou mais forte. E o saquinho de bruxa está fortalecendo meu feitiço. A lâmpada no teto explode, mas em contrapartida chamas azuis surgem na mesa, iluminando nossos rostos com um tom doentio. Eu termino o feitiço. Mike emudece e me fita com os olhos arregalados e a boca meio aberta.

As chamas que conjurei são chamas espectrais. Não conseguem queimar nada físico. Mas fui obrigado a usá-las para cortar o feitiço dele. O que eu usei foi um feitiço de interrupção. Impedi a invocação dele, e com as chamas tornei essa sala um santuário, onde nenhum espírito ou demônio pode entrar.

— Como... Você... — Mike gagueja ainda me fitando. Megan se senta ereta de novo, mas se afasta um pouco da mesa.

Eu bufo.

— Seu idiota inconseqüente. Eu mandei você parar. A alma do meu pai está lacrada, impossível de invocar. Seu feitiço quase abriu uma porta para o Mundo dos Mortos aqui mesmo. Se eu não tivesse intervindo, em breve teríamos alguns milhares de fantasmas circulando pela cidade.

Minha voz sai ríspida e irritada. Mas ele nem parece perceber.

— Você é um bruxo... Não, um bruxo não, um necromante! Achei que vocês estivessem extintos!

Solto um grunhido.

— Estávamos. Sou um necromante e Caçador. Acho que não burro demais para adivinhar o que estou fazendo aqui.

Talvez não tenha sido a melhor ideia, mas por causa da raiva minha cautela foi pro espaço.

Os olhos de Mike se cerram, e ele se afasta um pouco de nós.

— Vieram aqui em matar? — Quando eu não respondo, ele ri guturalmente. — Podem tentar, mas não vão conseguir. E se eu matei aqueles idiotas? Eles mereceram. Me atormentaram todo o tempo em que estava estudando. Mas aprendi artes mágicas, e agora vou ter minha desforra. E você não vai me impedir. Saiam daqui!

Megan se levanta sem hesitar e se dirige para a porta. Ergo uma sobrancelha, e então entende o que ele está fazendo. Me levanto num pulo e vou até ela. Seguro seu pulso e a viro, dando-lhe um beijo. Seu olhar se desanuvia.

— O que foi isso? — Ela pergunta.

— Persuasão. Nosso amiguinho tem andado bebendo sangue de demônio.

Pego um amuleto no bolso e entrego para Megan. Ela o olha por um momento, então coloca no bolso do jeans.

Mike fica nos olhando, mais curioso do que irritado.

— Então você é imune a Persuasão. Interessante. Mas tenho outros truques.

Ele assovia, e a parede atrás dele se abre num mini-explosão. Lá aparecem sete vultos brancos. Ah, merda. Parece que a história de estarem presos no circulo de sal foi pro espaço.

Olho para Mike. Ele parece ensandecido, nos olhando com a expressão totalmente louca. Alguém exagerou no ópio, ou enlouqueceu por causa dos fantasmas. Um ou outro, não faz muito diferença agora.

Hora de dançar com os fantasminhas. Depois eu cuido do maluco ali.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Caçador" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.