Cadente escrita por Sah


Capítulo 11
Sem rosto




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Olhei para ela assustada.

— Sua mãe?

E ela chorou mais ainda.

— Minha mãe morreu há três anos! E eu queria ela de volta!

Tudo estava ficando confuso de mais. Olhei para Bryan, ele sempre sabe das coisas.

— Não tenho nada para falar. Annie é que tem que dizer o que houve.

Aproximei-me dela e a abracei. Um abraço fraternal que controlou as tremedeiras dela, ela se acalmou um pouco.

— Vamos sair daqui. Quero que você me explique o que está acontecendo e assim poderemos decidir o que fazer.

— Eu gostaria de um café. – Soltou Bryan despreocupado.

Me virei para ele.

— Isso é hora de pensar em café?

— Ah, vocês me acordaram às três da manhã, é claro que é uma boa hora para um café.

— Pode deixar. – Annie vai até a porta de saída e pede para Francesca três xícaras de café.

Nos sentamos.

Bryan logo tirou os tênis e ficou mais a vontade do que deveria.

— Antes de começarmos. È possível que alguém saiba da conversa que teremos aqui? – Fala Bryan

— Não, o isolamento acústico aqui é perfeito.

— Isso é bom, por que o que falaremos aqui hoje ninguém deverá ficar sabendo por que as consequências serão muito ruins – Falou Bryan

Meu coração estava palpitando. Um misto de sensações ruins me incomodava. Aquela coisa no banheiro havia monopolizado todos os meus pensamentos. Eu precisava desabafar eu tinha que tirar aquilo da minha cabeça.

— E por acaso vocês tiveram paz depois que acordaram? – Perguntei me afastando do foco.

Annie não disse nada apenas concordou com os ombros.

— Eu tive. Isso foi a melhor coisa que me aconteceu. A bolsa-auxílio que o exército dá, faz o meu pai largar do meu pé.

— Bolsa-auxílio? – Perguntei incrédula.

— Vocês não estão sabendo? Parece que o tal incidente foi culpa do exército e por isso a bolsa-auxílio é uma espécie de indenização.

— Eu não estou sabendo disso. E você Annie?

— Sim, mas meu pai recusou.

Annie ainda parecia aflita, tremia de vez em quando. Apesar de estar bem mais calma.

— Nem imagino o porquê. – sussurrou Bryan

— Minha mãe não me disse nada sobre isso. Na verdade ela não me conta mais nada! -- Desabafo.

— Acho que ela quer te proteger. Pelo o que eu soube quando tudo aconteceu as coisas ficaram ruins.

— Me proteger do quê? Por que ninguém diz nada com nada. - Falei elevando a voz

— Ah, Olivia. Muitas coisas aconteceram, coisas que não deveríamos saber.

— Você por acaso sabe?

— Sim eu sei.

— E você não vai dizer nada?

— Acho que estamos aqui para falar da Annie. Em breve eu conto o que houve para vocês. Mas não agora.

Ele tinha razão. Minha cabeça está confusa, meu coração apertado.

Nos viramos para Annie que havia ido buscado o café.

— Francesca também trouxe um lanche.

— Era disso que eu tava falando. – falou Bryan já atacando a comida.

Annie se sentou.

— Desde que eu acordei muitas coisas mudaram. Eu imagino que vocês sintam o mesmo. Meu pai nunca foi muito presente na minha vida, ele acha que o dinheiro e a resposta para tudo.

— Seu pai tem razão.

— Bryan! – Gritei

— Talvez ele esteja certo, no fim das contas. Mas uma coisa que nunca mais aconteceu desde que minha mãe morreu voltou a acontecer, eu voltei a sonhar. Sonhos vividos, sonhos que me afetam. E com esses sonhos eu descobri que posso ter o que eu quiser.

Ela já tem tudo o que ela quer. Ela é bilionária não é?

— O que você quer dizer com isso? – Falou Bryan aparentemente concentrado.

— É difícil explicar, mas eu não quero fazer isso nunca mais na minha vida!

E ela desabou a chorar.

— Annie, se controla! Nós estamos aqui para te ajudar, se você não nos mostrar, como poderemos resolver?

Annie olhou para mim. Ela parecia mais forte.

—Mas não querem que me chamem de aberração depois.

E ela mostrou as mãos. Primeiro eu não vi nada de mais, mas alguma coisa estava acontecendo. Uma massa vermelha surgia na palma da mão, a coisa começou a ter forma e de repente uma rosa estava lá. Como um passe de mágica. Um truque de ilusionismo, fiquei encarando a rosa por tempo demais.

— Olivia? – Bryan me cutucou.

Estava me sentindo um pouco tonta.

— Como isso é possível?

—Eu queria a minha mãe e pensei exatamente em como era ela. Eu achei que eu conseguiria tê-la de volta mas foi aquele monstro que surgiu e eu não sabia o que fazer.

— Você consegue fazer isso com objetos maiores?

Annie limpou algumas lágrimas que estavam se formando.

— Sim eu tentei com algumas coisas. Mas nada tão grande como uma pessoa.

Isso é um poder? Uma habilidade? Um dom?

— Foi isso que aconteceu com todos os outros?

— A maioria. Os que não conseguiram aguentar morreram.

— Como você pode ser tão despreocupado?

— Não adianta se preocupar com coisas que você sabe que inevitavelmente vão acontecer.

— Você também foi afetado não foi?

— Desde o primeiro momento em que eu abri os olhos. Eu soube.

Me senti um pouco excluída.

— Annie, posso dar mais uma olhada,lá no banheiro?

Ela não disse nada, mas eu apenas fui. Eu queria ver aquilo de novo. Para provar que eu não estava em um dos meu sonhos malucos.

A coisa estava na mesma posição. Dei a volta e fiquei de frente. Como isso pode ter surgido do nada? Hesitante eu toquei na pele da criatura. Era meio plastificado e muito frio. Isso nunca foi uma pessoa. Não tinha unhas ou qualquer pelo fora da cabeça.

Vi uma movimentação estranha. A coisa respirou? O peito se mexeu? Cai para trás. Fazendo muito barulho.

— Olivia?

Bryan entrou depressa.

— Se mexeu, a coisa se mexeu.

— Tem certeza?

— Você não viu o que ia aconteceu? Ela respirou eu tenho certeza.

— Temos que dar um fim nessa coisa. Tudo bem para você Annie?

Ela confirmou.

— Precisamos de um tapete.

— Podem pegar o do meu quarto.

Bryan era rápido e forte, em menos de três minutos a coisa já estava enrolada.

Agora precisávamos sair da casa com a coisa.

— Eu vou com vocês. - Annie disse

Annie ainda estava chorosa. O tempo passava e ela ficava mais forte. Foi difícil passar pelos criados com aquele peso. Bryan estava aguentando bem. Falamos para a empregada que era alguma coisa que Annie tinha me dado e ela não fez mais perguntas. Colocamos no porta-malas.

— Nós precisamos enterrar essa coisa.

Quando Bryan deu a partida, eu ouvi batidas no porta-mala. Engoli em seco, e senti um medo que eu nunca havia sentido.

Todos nos prendemos a respiração. Eu e Annie dividimos o banco da frente. Nenhuma de nós teve coragem de sentar no banco de trás com aquela coisa batendo.

— Aonde devemos ir? – Bryan perguntou.

— Vamos para o lago. Minha família tem uma casa lá. Ninguém vai desconfiar. – Annie afirmou.

Ela estava melhor que eu. Eu estava mais afetada. Depois de tudo o que havia acontecido, esse problema me fez piorar. A angustia apenas aumentava. Mas ao olhar para os dois lidando com os problemas eu me senti mais forte, mesmo que só um pouco.

A chuva começou tímida, logo gotas gigantes atrapalhavam nossa visão.

O lago não era longe. O portão para as propriedades estava trancado. Mas Annie conseguiu a chave.

O chão estava lamacento. E tudo estava muito escuro. Não era possível ver nenhuma luz no horizonte. Quando finalmente estacionamos, fizemos silêncio por alguns minutos. Pegamos toda a coragem que tínhamos e fomos em direção ao porta-malas.

A batidas cessaram quando Bryan abriu e a coisa parou de se mexer. Sem hesitar ele pegou o tapete e o colocou nas costas.

Da onde ele tira tanta força.

— Precisaremos de uma pá. – Ele afirmou colocando a coisa no chão.

Annie foi até uma espécie de galpão e com facilidade o abriu de lá ela trouxe duas pás.

Bryan pegou uma e começou a cavar.

— Quando a senhoritas vão me ajudar.

Annie pegou a outra e o acompanhou.

Eu fiquei olhando para tudo ainda chocada. Estávamos molhados e sujos, enterrando uma aberração na casa de lago dos Donan depois de um dia como esse. Definitivamente as coisas haviam mudado e eu precisava me adaptar.

Fui até o mesmo galpão e peguei uma picareta. Eu estava pronta para ajudá-los. Mas a coisa começou a tremer. Primeiro aquele braços plásticos tentaram me agarrar e um grunhido estranho saiu da coisa.

Annie estava no meio do buraco recém-cavado ela se abaixou e tapou os ouvidos. Bryan olhou para mim e assentiu. Eu sabia o que deveria fazer.Com apenas um golpe eu acertei aquela coisa. Meu coração ficou mais leve e assim eu fiz de novo e de novo até a coisa parar de se mexer.

Levamos Annie até o carro.

Bryan terminou de enterrar.

Eu deveria-me sentir culpada? Aquela coisa não era humana, nem nunca foi. Annie não parecia perturbada. Agora ela me olhava com alivio.

— Obrigada. – Foi o que ela disse para nós dois, quando os primeiros raios de sol nos iluminaram.


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