Caçada escrita por Gabi Gomes


Capítulo 16
Segredos Revelados


Notas iniciais do capítulo

Olá gente!
Aqui está mais um capítulo de Caçada!



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Parada na frente do alto espelho, fiquei encarando o meu reflexo, sem acreditar que aquela garota refletida era mesmo eu. A aparência continuava a mesma, com aqueles cabelos castanhas claros, que caíam em cachos nas pontas, a pele pálida com sardas em todo o rosto e os olhos azuis tão claros que pareciam cinza.

Tudo estava do mesmo jeito, mas eu sabia que por dentro, eu já não era mais a mesma garota sonhadora que passava as tardes dando banhos em cachorros de circo.

Em poucos dias, fui exposta à coisas que só imaginaria poder acontecer em livros e filmes. Maldições, viagens para o outro lado do mundo, tigres, feiticeiros e coisas sobrenaturais, tudo foi jogado em cima de mim e agora eu tentava me acostumar com tudo isso.

Mas será eu estava preparada para enfrentar essas coisas?

– Mia, você não vai descer? - A voz de Kishan me fez acordar do transe em que eu me encontrava e, rapidamente, me voltei para onde ele estava, dando as costas para o meu reflexo.

Com as mesmas roupas pretas de sempre, ele se encontrava escorado no batente da minha porta, com os braços cruzados sobre o peito. Mas o que realmente me intrigou foram as enormes olheiras que tinham se estabelecido em baixo de seus olhos dourados e, toda a sua postura era cansada.

– Só estava terminando de me vestir. – Digo, amarrando meus cabelos em um coque solto e indo até onde meu tigre se encontrava, me encarando com olhos de predador.

– Você devia deixar seu cabelo solto, ele fica mais bonito caindo sobre seus ombros. – Ele sussurra, brincando com uma mecha perto do meu pescoço.

– Ele fica bonito solto nas poucas vezes que eu consigo domá-lo e hoje ele não quis cooperar. – Começo a pular os degraus da escada, sendo seguida por Kishan, que estava em silêncio. – Aconteceu alguma coisa? Você parece cansado.

– Só não dormi direito. – Paro no último degrau e me viro, encarando-o com as mãos na cintura. O fato de Kishan estar alguns degraus acima de mim fez com que eu tivesse que levantar a cabeça, mais do que normalmente levanto, para poder olha-lo nos olhos.

– Ontem à noite você dormiu durante todo o filme, impossível estar cansado por causa disso. – Vejo-o desviando o olhar. – É algo que eu não possa saber?

– Não. – Rapidamente ele desce os degraus que nos separavam, ficando ao meu lado. – Você sabe que eu não esconderia nada de você, Mia, não agora.

– Então pode começar a falar. – Me sento na escada, vendo-o rir enquanto se sentava ao meu lado.

– Depois que você, praticamente, desmaiou ontem na biblioteca, te levei para o quarto e sai para caçar, afinal já faz um tempo que não me alimento, mas estava com muita coisa na cabeça e tudo que consegui foi ficar cansado enquanto corria pela floresta. – Kishan soltou um suspiro pesado, passando as mãos nos cabelos negros.

– Não sabia que você precisava caçar, já que você consegue comer a dispensa toda só no café da manhã. – Seguro a risada, enquanto Kishan me encarava, bufando.

– Você tem um senso de humor incrível, Mia. – Ele diz, revirando os olhos ironicamente, me fazendo soltar a risada. – Mas eu preciso caçar, sim, pois a comida normal, não é o suficiente para manter a forma de tigre, vamos dizer que “sadia”.

– Deve ser muito legal ver uma caçada, seria como assistir o Animal Planet ao vivo. – Minha voz saiu animada. – Você bem que poderia me levar junto consigo da próxima vez que for caçar.

– Acho que não seria um boa ideia.

– Por que? - Tombo a cabeça para o lado.

– Você iria me distrair, afinal, seria bem mais interessante caçar você do que um antílope.

Me senti como uma presa pequena e indefesa sob o olhar ameaçador de tigre de Kishan e acabei chegando à conclusão que não gostaria de ser o animal que ficaria presa em suas garras.

“Não mesmo?”, rapidamente tiro esse pensamento de perto.

– Nem venha com essa, não sou comida para tigre. – Digo, vendo Kishan abrir um sorriso maroto.

– Mas que você daria uma ótima caçada, você daria. – Ele diz, dando de ombros de um jeito despreocupado.

– Ok, vamos parar de falar sobre as suas caçadas. Agora me conte sobre o que você estava pensando.

Kishan fica em silêncio por alguns minutos, olhando para alguma coisa alheia, até que finalmente se volta para mim, soltando um suspiro pesado e tomando minha mão na dele.

– Estava pensando sobre Ren. – Um pequeno choque percorre meus braços, quando ele começa a brincar com meus dedos. – Estou preocupado com ele e com o que Lokesh pode estar fazendo. Quero sair para procura-lo, mas Kadam não deixa, dizendo que é arriscado.

– Ele está certo, Kishan. – Ele me olha, fechando sua mão em torno da minha, fazendo meu coração bater mais rápido. – Você não pode, simplesmente, sair por ai em busca do seu irmão, o risco de você ser capturado por Lokesh seria muito grande. E nós vamos conseguir salvá-lo, eu prometo.

Não fazia ideia de onde tanta confiança estava vindo, mas estar ao lado de Kishan me deixava corajosa para fazer qualquer coisa que pudesse ajuda-lo.

– Eu só... Me sinto culpado por tudo o que está acontecendo, pois se não fosse por minha causa, nós não estaríamos presos em uma maldição, enquanto Ren está sendo torturado por Lokesh. – Sua voz era cheia de angustia, o que me fez apertar sua mão, na tentativa de lhe passar algum conforto.

– Kishan, o que aconteceu para...

Estava pronta para fazer a pergunta que rodeava minha cabeça desde a viagem de avião, quando o senhor Kadam apareceu no corredor, com uma xícara, que deveria ser de café, nas mãos.

– Estava procurando por você, senhorita Mia.

– Ah, me desculpe, senhor Kadam. – Digo, me levantando com um salto e soltando a mão de Kishan. – Quando vamos voltar às pesquisas?

– Depois que a senhorita tomar seu café. – Ele disse, rindo. – Vou estar na biblioteca.

Assim que Kadam entrou pelas amplas portas de madeira da biblioteca, me virei para Kishan, mas o mesmo já tinha voltado para a forma de tigre e agora ronronava baixinho, como um gatinho querendo carinho.

Depois de passar a mão por seu pelo macio, fomos para a cozinha, onde Nilima nos esperava com toneladas de panquecas cheias de calda.

Kishan e eu praticamente lutamos pela última panqueca.

Agora, eu me encontrava sentada na mesma poltrona vermelha de ontem à noite, com um livro de mitologia africana no colo, enquanto sentia a respiração pesada de Kishan, que estava deitado ao meu lado, dormindo.

– Kishan está preocupado com Ren. – Quebro o silêncio, fazendo o senhor Kadam desviar seus olhos do livro em mandarim que lia atentamente.

– Eu sei, Mia, ele me contou que queria deixar a maldição de lado e colocar o resgate de Ren como prioridade. – Kadam passou as mãos pelos olhos. – Não que eu não esteja preocupado com ele, pois eu estou, mas quero ter alguma informação sobre essa maldição que Lokesh lançou sobre os príncipes, para ter uma ideia de com o que estamos lidando.

– Entendo. – Aquela pergunta que não consegui fazer a Kishan de manhã, voltou para minha mente. – Senhor Kadam, Kishan me contou que se sente culpado pelo o que aconteceu com ele e com Ren e, eu gostaria de saber se o senhor poderia me explicar o porquê dele se sentir assim.

– Sinto muito, senhorita Mia, mas Kishan me proibiu de falar isso com você. – Ele sussurrou, olhando para o lado e me deixando cada vez mais curiosa.

– Por favor, senhor Kadam! – Implorei, colocando o livro em minhas mãos em cima da mesa de mogno e puxando minha poltrona para mais perto.

Kadam suspirou pesado, se ajeitando em sua própria poltrona enquanto espiava Kishan, que parecia mais uma pedra. Todo aquele mistério me fez começar a pensar em inúmeras coisas improváveis.

– Bem, como a você já sabe, Lokesh era imperador de um reino vizinho. – Confirmei com a cabeça. – Ele tinha uma filha, seu nome era Yesubai.

– Ela que se tornou noiva de Ren? - Perguntei, cortando Kadam.

– Isso mesmo, mas como na época o príncipe Ren estava em campo de batalha, a jovem garota ficou hospedada na casa Rajaram. Nesse meio tempo, Yesubai e Kishan se conhecem e começam a se aproximar...

Era como se pecinhos de um quebra-cabeça começassem a se juntar no meu cérebro e tudo começou a ficar claro para mim.

– Kishan se apaixonou por Yesubai. – Sussurrei.

– Sim. – Kadam confirmou, me deixando sem reação. – Os dois tinham se apaixonado, ou foi o que Kishan pensou.

– Como assim? - Perguntei, confusa.

– Tudo isso fazia parte do plano de Lokesh para conseguir os amuletos de Damon. O feiticeiro conseguiu capturar os príncipes, mas os dois negaram entregar o medalhão e em um momento de fúria, Lokesh lançou a maldição sobre eles e acabou por matar a filha.

Eu estava atônita, sem saber como reagir àquilo. Meus olhos pousaram em Kishan, que estava sereno no chão e senti um aperto na garganta e uma queimação nos olhos.

– Quer dizer que Yesubai nunca amou Kishan? - Tentei não gaguejar, mas minha voz saiu um tanto falhada.

– Se amou de verdade ou apenas seguiu o plano do pai, nunca saberemos. – Kadam estendeu a mão e tocou minha, em um ato carinhoso. – Por isso Kishan se sente culpado tanto pela maldição quanto pela morte da jovem garota.

– Obrigada por me contar, senhor Kadam. – Sinto uma lágrima teimosa descer pela minha bochecha, mas a limpo rapidamente. – Acho que vou para o meu quarto...

– Estarei aqui se precisar de algo.

Apenas assenti, me levantando abruptamente da poltrona e batendo minha perna na mesa, fazendo com que um livro caísse no chão. Ouvi um rugido baixinho, mas não tive coragem de encarar Kishan.

O tigre se espreguiçou, passando os olhos pela biblioteca a minha procura.

Os olhos dourados dele pousaram sobre mim e, só percebi que estava chorando quando seu olhar se tornou preocupado. Meus pensamentos estavam confusos e eu sentia um enorme aperto no peito, então apenas me virei, saindo daquele cômodo e indo para bem longe do tigre.

Precisava ficar sozinha, mas sabia que Kishan iria me encontrar em qualquer canto daquela casa. Corri escada acima, em uma tentativa de me trancar no quarto, mas sinto mãos segurando meus braços e me fazendo parar.

Bilauta, o que aconteceu? - Kishan me virou de frente para si. – Por que está chorando?

– Pensei que você não esconderia nada de mim. – Cuspi as palavras, com amargura.

– Do que está falando? - Seu olhar era confuso.

– Por que nunca me contou sobre Yesubai? - Assim que ouviu minhas palavras, Kishan ficou imóvel.

– Kadam contou à você sobre isso? - Sua voz era fria.

– Sim, afinal, quando você iria me falar que... – Amava outra pessoa? Aquelas palavras não ditas foram como uma facada em meu peito.

– Mia, por favor, apenas me deixe...

– Explicar? - Perguntei, rindo baixinho. – Não precisa, sério. Apenas me deixe um pouco sozinha.

– Você não entende, Mia... – Kishan parecia aflito.

– Eu não quero entender, ok? - Explodi, soltando meus braços do seu aperto.

Encarei uma última vez seus olhos dourados, antes de lhe dar as costas e correr para dentro do meu quarto, fechando a porta com força, sem me importar se Nilima ou o senhor Kadam ouviriam.

Eu estava frustrada por motivos desconhecidos, raiva tomava conta do meu corpo. Bufando, joguei todos os travesseiros contra as paredes e deitei sobre o maciou tapete negro. Limpei as lágrimas chatas que não deveriam estar ali e passei minhas mãos sobre os cabelos, fechando os olhos e soltando um grunhido estranho.

Porque eu estava daquele jeito?

Eu não fazia a menor ideia.

Continua...


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