Caminhos Cruzados - Davi e Megan escrita por Alexia Lacerda


Capítulo 16
Capítulo 16 - Grande dia


Notas iniciais do capítulo

Oi gente! Desculpa a demora... estou meio ocupada ultimamente. Tenho muitas ideias para os próximos capítulos, então sofrerão nas minhas mãos. Muahaha



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Davi abriu os olhos e tudo ganhou mais cor. Aqueles últimos dois dias passaram como duas semanas dentro de sua cabeça e ele mal podia acreditar que aquilo enfim se tornara real. Levantou da cama em um pulo e tomou um banho rápido, antes de correr para o restaurante do hotel com o coração a mil por hora.

Ao chegar lá, encontrou todos os outros nove à sua espera. Ricardo Fagundes, o orientador chefe, estava dando últimas instruções sobre o que se sucederia no fim da tarde. Davi se sentou no último lugar da mesa e vagou com o olhar até encontrar Nêne, mas a distância entre os dois era grande demais. Ele precisava apertar alguma coisa, para que mantivesse a sanidade mental. A empolgação já lhe subia à cabeça e o intenso turbilhão de pensamentos o deixava estático, diante a tantas informações.

— Ás 17:30h, quero todos em frente a van. Serão levados até a matriz do programa, que fica na zona norte do Rio. Assim que entrarem, cada um de vocês será abordado por seu assessor. Estarão com um crachá, e são eles que vão lhes orientar por todos esses meses dentro do reality. Cada participante terá seu camarim, seu figurino e maquiagem para que, quando o relógio marque 21h, o The Genius Of Marra estreie, ao vivo.

Todos na mesa ficaram boquiabertos. Murmúrios e conversas paralelas dispararam desde então. Ninguém havia lhes dito que o programa seria ao vivo.

— Silêncio... — ele pediu, e com muita relutância, todos pararam de conversar. — Foi uma mudança meio em cima da hora, e por uma questão de audiência. Vocês já devem perceber que fizemos todos os tipos de propagandas possíveis, e acreditem... está tendo um retorno muito melhor do que esperávamos. Por isso, vamos fazer bonito. Qualquer problema ou complicação criarem... serão desclassificados. Entenderam bem?

O medo atacou repentinamente aquelas pessoas.

— Mas e se formos vítimas? — Tatiane erguera a mão, franzindo a testa enquanto soltava um suspiro. — Se houver indícios de trapaça no jogo, o participante será desclassificado imediatamente, né? Seria muito injusto se...

— Sim. Nós não nos importamos com números... se um sair, entraremos em contato com outro candidato das inscrições, e ele entrará em seu lugar, mas... apenas se acontecer na primeira etapa do jogo. Caso contrário, haverá menos uma pessoa para que se preocupem. Os participantes irão abandonar o jogo com base no seu desempenho e capacidade. Haverá votos do público, da bancada de jurados, e dos representantes da Marra... então somaremos os pontos de cada concorrente, faremos uma média, e o menos votado será identificado na porcentagem. Este, deixará a competição... ou seja, seguirão as etapas até que apenas dois dos participantes comandem o programa. E então... apenas um será o vencedor. Voltando apenas para relembrar: sejam carismáticos, joguem limpo, não entrem em confusões e deem o máximo de si. Boa sorte a todos, já podem voltar aos seus aposentos. Nos vemos as 17h30!

Todos se levantaram imediatamente e foram deixando a mesa, com exceção de Ernesto. O garoto não era nada vaidoso, e isso era fácil de identificar, até porque, o cabelo desgrenhado e a barba por fazer facilitavam . Se levantou do outro canto da mesa e sentou ao lado do amigo, que havia perdido o café da manhã em grupo.

— Oi Bela Adormecida... — viera num sorriso. — Sabe que é bem antipático tu sempre se atrasar pro café? Tem gente por aí achando que você não gosta de se misturar com a gente, e que se acha melhor do que nós. Mas nem adianta me pedir quem, pois não citarei nomes.

— Quem está me achando antipático?

— Danilo e Hana.

Davi sentiu um gosto amargo subir pela garganta.

— Aqueles idiotas que não calam a boca nem por um minuto?

— Bem esses.

— São companheiros de quarto?

— Não. Mas eu acho que eles já se conheciam antes.

— Antes quando? Na época das inscrições?

— Não, parece que são colegas de trabalho, em Santa Catarina.

— Que sorte a deles. Sabe qual o nome da empresa?

— Não faço ideia, mas eles são bem graduados.... fiquei sabendo que são ótimos no que fazem. Não que isso tenha me abalado, mas me serviu de alerta. As fases serão muito complicadas e tem gente muito boa por aqui... inclusive você.

— Por que ficam me dizendo coisas assim? Que neura.

— Davi, você foi o preferido da banca de jurados nas inscrições. Não pode culpar os outros por criarem expectativas em cima de ti. O maior QI, um desempenho perfeito em tempo recorde, e um baita raciocínio. Esse tipo de comentário faz com que o resto do grupo tenha um certo medo de ti, e dá o direito de falarem pelas suas costas. Entende?

— Entendo que não há porquê se preocupar . Não sou tão bom como dizem.

— Quem diz isso são os números, não os conteste.

Davi suspirou de alívio, mesmo que não gostasse de admitir, estava tomado pelo medo e nervosismo, contando cada segundo até a noite.

— Voltando ao assunto... o que mais eles disseram de mim?

— Olha... não que eu goste de fofoca, mas te chamaram de egocêntrico.

— Egocêntrico? — dissera, com ultraje. — Você me acha egocêntrico?

Ernesto hesitou de propósito, era engraçado testar as reações de Davi.

— Não me coloca nessa história, não tenho nada a ver.

— Você acha ou não?

— Não, mano. Nunca te vi se gabando por nada que as colunas disseram... você fica sempre tão na tua. Todas as inimizades que você criar, serão motivadas pela inveja dos outros. Eles provavelmente tiraram essa conclusão porque você não conversa muito com o resto do grupo. Nada além disso.

— Eu devo ser mais social então?

— Érrr... contribuiria para o bem da convivência dentro do reality.

— Então... eu serei o cara que eles querem que eu seja?

— Também não exagera... só seja mais comunicativo.

— O público pode gostar do meu carisma natural...

— Exatamente. Suas constantes provocações e péssimas piadas.

Davi deu um riso discreto e sentiu o estômago roncar.

— Bom... eu acho que vou me servir. Se quiser ir embora, tudo bem...

— É um saco comer sozinho, como não tenho nada melhor para fazer, te faço companhia.

***

Megan estava pensando obcecadamente durante aquela última hora, algo que raramente acontecia. Estava sentindo uma dor de cabeça medonha, e uma leve tontura estava lhe fazendo de refém. Provavelmente por causa de nervosismo... nada que precisasse se preocupar.

Ela costumava ler romances. Gostava de como um coração partido encontrava sua alma gêmea, também com um coração partido, e eles acabam felizes e inteiros. Era nos livros em que sua imaginação trabalhava, criando momentos perfeitos que ela sabia que nunca aconteceriam com ela. Quando era pequena, acreditava em destino. Mas ela foi crescendo e crescendo... e com o passar do tempo, ela acreditou um pouco menos... e um pouco menos. E era isso que a deixava intrigada, algo havia irrompido a ordem natural dos acontecimentos.

De um dia para outro, ela se sentia mais a vontade consigo mesma. Se sentia mais contente e também mais vontade de sorrir. Na noite anterior, quando se flagrou pegando o celular para responder uma mensagem que demorara um dia inteiro pensando... sentiu que alguma coisa diferente tinha acontecido.

Não sabia porquê, mas a ideia de que nada nas últimas semanas havia acontecido por acaso, estava a atormentando. Lembrou da manhã em que aterrizou no Brasil e de como estava furiosa por ter sido obrigada a estar ali. Lembrou de como queria afogar a cabeça de Jonas em um balde, e de como sentia nojo de cada parte do Rio de Janeiro. Ela achava tudo tão imundo... o povo tão fedido. Mas, depois de algumas semanas, começou a enxergar o lado do bom de viver ali. Deixou de se enjoar com o cheiro de mijo nas paredes e passou a relaxar com a maresia e o azul das ondas na Praia do Leblon. Deixou de desvalorizar os cachaceiros de plantão nos barzinhos, e passou a querer tomar duas ou três cervejas com alguém por ali. Deixou de ser uma típica californiana e passou a se considerar, pelo menos, 1/4 brasileira.

— Megan... — a voz de Antoine lhe chamou. — Não acha que deveria participar desse momento em família?

A garota olhou ao redor, se desligando um pouco dos pensamentos, e só então percebeu que a mansão estava um caos. Eram homens engravatados subindo e descendo as escadas, mulheres bem vestidas correndo pelos corredores, duas ou três crianças entediadas tirando a paciência dos empregados, e o som incessante de conversas paralelas agonizando todos os mortais ali presentes. Mas, para os Marra, não era algo demasiado.

Tudo e todos naquela casa gravitavam ao redor de Jonas, e isso tardaria muito a mudar. Aquela era a grande noite para ele. Era o começo de um inferno naquela casa, e ela tinha toda a certeza disso. O começo da eterna tpm do padrasto e das crises de fúria... tudo debaixo do seu nariz. Começou a sentir náuseas e a respirar com dificuldade. E, de um instante para o outro, se lembrou de uma cena terrível de quando tinha oito anos.

Era muito tarde, provavelmente passava das quatro da madrugada, e ela acordara de um pesadelo. Não conseguindo voltar a dormir, acendeu o abajur e sentou na cama, alcançando um livro cheio de figuras bem coloridas. Estava sorrindo sozinha, quando ouviu um grito de socorro do lado de fora. Os pequenos olhos bem redondos se arregalaram, e ela teve medo de quem poderia estar vagando pela sala de estar, de quem estava pedindo ajuda. Calçou as pantufas e se enrolou no cobertor, andando com muito cuidado até se aproximar da porta, girando a maçaneta bem devagar. Abriu uma frestinha, deixando-a quase encostada, e espiou como de costume, mas o que viu não era bem o que chamaria de 'um colírio para os olhos'. Um homem de cabelos negros e olhos claros, bastante másculo, estava caído no chão, e muito sangue saía pelo seu nariz. O rosto estava completamente desconfigurado e ele tremia, com o terror estampado em sua expressão. Abriu a porta mais um pouco e pôde ver Jonas, com uma garrafa de vodca na mão e ódio no olhar. Viu quando ele se abaixou até a altura do outro homem e praguejou algumas palavras. Viu quando ele tirou o canivete do bolso, e pressionou contra a garganta do homem, ameaçando matá-lo. Viu quando ele cambaleou para trás, completamente bêbado, e disse, sem notar que foi em voz alta, que se o homem cruzasse seu caminho mais uma vez, o mataria sem pensar duas vezes. Viu quando ele gritava o nome dele e o guiava até a porta, com a ponta do canivete tocando suas costas, e o despachava para os seguranças, deixando que fizessem o que bem entendiam. "Eu dei um jeito..." - ele gargalhava, incessantemente enquanto voltava para o quarto e se deitava ao lado de Pâmela na cama, mesmo que ela estivesse em sono profundo, e deslizava a mão por sua silhueta. "Eu dei um jeito nele, meu bem..." - ele gargalhava, até dormir. Megan assistia a tudo em transe, sem coragem nem de gritar.

Depois do que vivenciou naquela madrugada, passou a trancar a porta todas as noites antes de dormir. Os olhos de Jonas nunca mais voltaram a ficar tão nebulosos como os daquela madrugada, o que serviu de alívio para ela. Escolheu acreditar no que queria, que ele simplesmente saíra de controle, uma vez na vida, e que não voltaria a acontecer... mas, sabia que estava enganada. Sabia que sempre que ele bebia... não tinha limites. E tinha medo o que esse reality podia fazer com sua sanidade mental. Que quando chegasse a hora de seu substituto assumir, ele voltasse a ameaçar alguém daquela forma. Desta vez, ela não permitiria que se repetisse.

— Megan? — Antoine lhe sacudia, assustado. — Tudo bem com você?

A garota voltou a realidade. Perdera noção de tempo, absorta nas próprias lembranças e homem alto e careca ainda fitava com o olhar, tenso.

— Oi... me desculpe. Hã... eu...

— Estou falando com você há minutos!

— Eu... estava...

— Te chamei várias vezes e você nem se mexeu... tudo bem? Megan?

— Me desculpa... eu não vi... não vi nada acontecer.

— Você tá tão estranha... parece tão distante. Teus olhos parecem apagados e...

Isso era tudo o que Megan lembrava, antes de ver tudo rodopiar ao seu redor e sentir o choque de seu corpo batendo no chão. Podia ver Antoine se desesperar e lhe sacudir, mas diante de seus olhos, nada passava de vultos. Ela foi tomada pela escuridão, enquanto o frio do piso tomava seu corpo. Megan Parker estava desmaiada.


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