Caminhos Cruzados - Davi e Megan escrita por Alexia Lacerda


Capítulo 10
Capítulo 10 - Fraquezas


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo é um daqueles empatas, sabe? A decorrência dos dias antes do que realmente nos interessa - a ligação. hahaha Espero que gostem. (OBS: fiz um vídeo com personagens que estarão presentes e com o poder de mudar os caminhos de Davi e Megan aqui, se quiserem assistir: https://www.youtube.com/watch?v=WDelineqkjI&feature=youtu.be) Beijão!



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Faltavam quatro dias, dezesseis horas, vinte e três minutos e trinta segundos para a estréia de "The Genius of Marra". Davi travava o corpo todas às vezes que alguém vinha lhe parabenizar nas ruas, dizendo que ele podia contar com sua torcida. Quando via sua foto em uma revista, ou quando uma fila de garotas bonitas pediam fotos. Era demais para ele... melhor do que um dia pôde sonhar. Então, sempre que alguém lhe reconhecia das propagandas, ele abria um sorriso, soltava um suspiro e dizia com o tom mais humilde que conseguia. "Sim, sou eu mesmo.".

Sua vida deu uma alavancada considerável de um dia para outro. Já eram quase nove horas quando ele voltou para o quarto, exausto de tanto caminhar, e entrou debaixo do chuveiro gelado. O calor da noite era de deixar qualquer um tonto... todos precisam de bons vinte minutos ali, tendo crises existenciais e refletindo sobre o sentido da vida. Principalmente ele.

"A criança que você era, teria orgulho da pessoa que você é hoje?" — a voz da sua consciência lhe perguntava, lhe deixando intrigado. Ele sabia que era do tamanho dos seus sonhos, sabia que com muito esforço e perseverança, teria grandes chances de ganhar. Sabia desde pirralho... sabia quando acabou o colégio. Sabia disso quando fez faculdade e quando se formou em computação. Sabia... e mesmo assim, se perdeu no caminho. "E qual o motivo?"

A falta de incentivo era um deles. E a outro...? Comodismo. Não havia nenhuma Marra International abrindo portas para ele quando acabou a faculdade. Não haviam oportunidades de crescimento aonde ele ficava, em hipótese alguma... ele iria para longe da mãe. Talvez todo esse desperdício de tempo nem fosse nem culpa dele. Nem de ninguém. Talvez as coisas tivessem uma hora certa para acontecer.

Davi percebeu a quanto tempo já estava no chuveiro, e se pegou pensando no porquê dele não ter trazido uma cadeira junto. As pernas ainda doíam, lhe trazendo memórias da eterna caminhada debaixo de sol que ele fizera desde a manhã. Ele precisava se exercitar um pouco mais. Observou a água que escorria pela sua barriga, e percebeu que estava começando a criar pança. Lembrou das costas malhadas de Zac e dos ombros largos de Ernesto, apavorado com a ideia de ser o único com uma pré-pança naquele reality-show. Tinham quatro dias, duas horas, vinte e sete minutos e dez segundos para perdê-la. Ele saiu do banheiro e rumou até o guarda-roupa, agradecendo a ausência de Zac , enquanto vestia uma camiseta velha.

O peito inchava de nervosismo todas as vezes que olhava para o relógio, percebendo como o tempo corria depressa. Logo ele estaria diante de todo aquele público, tentando convencê-los de que tinha capacidade de eliminar todo o resto. Que podiam depositar suas confianças e planejar suas apostas, pois ele não decepcionaria. "Socorro..." - ele pensou, pasmo, enquanto o canto do seu olhar observava o celular em cima da cômoda. Já haviam se passado dois dias, de três. Seria uma pena se alguém violasse as regras...

— Larga o celular. — uma voz masculina fez com que se virasse. Ernesto também usava pijama, e não se importou em vagar pelos corredores de um hotel chique como o Royal Tulipa, com aquelas vestimentas. — Eu tinha certeza que não se aguentaria.

— Eu não ia ligar pra ninguém.

— Ia fazer o que então? Jogar o jogo da cobrinha?

Davi abafou uma risada.

— Eu só ia programar o alarme despertador.

— Ah é? E sabe quem está no meu quarto...? Jennifer Lopez!

— Casa com a tua ironia...

— Nós seríamos felizes para sempre. — completou com uma risada.

Um meio sorriso apareceu no rosto do garoto, que sentou na cama, calado. Ele olhou para o celular, e o celular olhou pra ele... mas de nada adiantava.

— Não que eu esteja pensando muito a respeito, mas se... por um acaso... eu ligasse, o que diria? —perguntou, vendo que os olhos de Ernesto pareciam mudar de tom à medida que as palavras chegavam aos seus ouvidos. — Acho que posso estragar tudo... se é que há alguma coisa.

— Não que eu possa garantir muita coisa... mas ela tá na sua.

— Ela tá tão na minha, né? — ele riu. — Até parece.

— Se ela não estiver, é uma ótima atriz.

— E porque acha isso?

— Tu precisa de quê para notar? Tá escrito na testa dela... "Davi, eu quero gritar seu nome até o amanhecer." — deu um empurrão tão forte em Ernesto que o derrubou no chão. — Ei! Valeu cara! Mas quer saber? Tudo bem, se me empurrar vai te fazer ficar melhor consigo mesmo, eu não me importo.

— Você é tapadão né... — ele dizia, afogado com a própria saliva.

— Não. Estou te fazendo enxergar o que esse grau de óculos não.

— Que a Megan também está interessada em mim?

— Exatamente!

— Então eu devo ligar?

Os neurônios de Ernesto deviam estar queimando em sua cabeça. O jovem deixou o olhar vagar pelo quarto, a procura de algo. No criado mudo, à sua direita, havia um copo com água, ao lado de uma cartela de aspirinas. Ele sentia muitíssimo pelo o que estava prestes a fazer.

— AAAAAAAAAAAAH! VOCÊ É MALUCO? — Davi berrou, enquanto a água pingava de sua camisa. — PORQUE FEZ ISSO?

— Você não ouviu nenhuma palavra que eu disse! Nunca. Ligue. Para. Uma. Garota. Antes. De. Três. Dias. Completos!

— E de onde foi que tirou esta teoria estúpida?!

— Eu já lhe respondi cinco vezes... por experiência própria!

— Talvez o problema fosse você, cara! Eu vou ligar pra ela...

— Não, não vai. — ele disse, pegando o celular da mão de Davi.

— Vou sim.

— Só por cima do meu cadáver.

— Não seja por isso...

Davi pulou em cima do amigo, que se desvencilhou e correu para o outro lado do quarto. Ele foi atrás, e de repente se viu ainda mais distante de alcançá-lo.

— Me - entrega - esse - celular.

— Vai ter que buscar.

— Que merda! Ok! Fica com essa desgraça. Palhaço!

— Bom garoto, é assim que eu gosto.

— De qualquer forma... — ele deu de ombros. — ... eu ligo para ela amanhã.

— Já está começando a aprender...

— E você vai parar de me atrapalhar.

— É assim que se fala... meus parabéns.

— Vai se lascar.

— Qual é, mano. Tá aqui teu celular. — ele lhe entregou, abrindo um sorriso de orelha à orelha. — Se quiser ligar... pode ligar. Se não quiser... terei muito orgulho.

— E porque jogou água na minha cara e me fez correr pelo quarto todo?

— Diversão.

O olhar de fuzilo que Davi lhe lançou era de deixar qualquer um intimidado.

— Estou começando a não gostar de você...

— Bela alternativa! Eu te aconselharia a ouvir seu coração.

— Está me encorajando a me afastar de você?

Ernesto bufou e seus ombros descontraíram. Parecia piscar com lentidão e se sentou ao seu lado na cama, batucando os dedos nas coxas, como de costume. Estalou o pescoço e tentava dizer algo, sem muito sucesso. Sua garganta era entalada de palavras e o timbre não saía como o normal.

— Não seria nada diferente dos outros. Estou acostumado.

Outros? — o encarou, arrastando alguns centímetros para o lado. — Eu hein...

— Outros amigos... — ele riu, mudando a expressão logo em seguida. — Eu crio uma barreira com as pessoas, de certa forma. Não permito que entrem na minha vida. Nem que opinem sobre ela, o que é uma ironia, já estou estrando em um canal de tevê aberta. Sei lá... tenho características que não agradam todo mundo.

— Como por exemplo?

Honestidade. — disse num sorriso. — Eu sou honesto demais, o que, por incrível que pareça, é um defeito desprezível. Se me perguntam "Ei Nêne, fiquei feia nesta blusa?" eu dou um jeito de responder "Sim, e gorda também".

A risada de Davi pôde ser ouvida no andar de cima.

— Gosto de gente honesta.

— Não foi o que me pareceu...

Ele tinha toda a razão.

— Vamos fazer um trato. Eu aturo o seu complexo de honestidade... e você atura minha amplitude emocional. Pode me xingar, dar suas teorias sem sentido, e dizer suas palavras pervertidas, mas não me jogará água, nem café, nem tijolos quando eu vacilar nas promessas. Estamos acertados?

— Érrr... estamos.

— Então agora... "Nêne"?! Que apelido de merda é esse?

***

Megan estava dirigindo de volta para casa quando o queixo caiu. Lá no alto, a foto de Davi estava estampada com a de outros jovens em um imenso outdoor. Percebia que todos os motoristas prendiam sua atenção ali. "The Genius of Marra" estava estampado em letras douradas, e por um instante ela quis abrir o vidro e exibir seu rosto famoso para todos do engarrafamento. "Hi people, my name is Megan. Megan Parker. "– a frase ecoava em sua cabeça, e por pouco não saiu em voz alta. De certa forma, estava muito contente pela paz que sua vida estava levando no Brasil. Nada de repórteres em sua cola. Nenhum jornalista investigando seus passos. Era uma mulher livre.

O celular vibrou no banco do carro e o coração saiu pela boca. Davi estava lhe ligando, ela tinha certeza disso. Mas quando foi pegar o aparelho, teve vontade de socar a própria mãe. Então era isso... ele não lhe ligaria. Ele não lhe procurou. Ele nem lhe agradeceu decentemente. Era ingrato... cego... e otário.

"Pfff... não preciso disso."– ela gargalhou, estremecendo no banco de motorista. - "Consigo homem muito melhor que ele."

"Pobre coitado... não sabe o que está perdendo."

"Correr atrás dele? HAHAHA Por favor."

Mesmo que sua mente o esmagasse como um inseto insignificante, todas às vezes que o celular se manifestava, ela o tomava em mãos, como se fosse o objeto mais precioso do mundo. O coração palpitava e uma brisa forte lhe envolvia a barriga. Ficava cheia de esperança e a imagem de seu rosto lhe deixava boba. Megan estava sendo fraca. Ela era fraca.

Nunca ninguém disse que seria tão difícil para um rapaz lhe notar. Será que pedir que ele colasse a boca na dela e deslizasse a língua pelo seu pescoço era pedir demais? Qual é... o universo sempre lhe foi tão generoso. Porque desistiu de ajudá-la, de uma hora para outra?

Enfim... mesmo que garantisse o contrário, mantinha fé que ele lhe ligaria no dia seguinte. Depois de todas as decepções que teve, queria demais que ele dissesse sentir o mesmo. Que não fosse outro canalha qualquer...! Tudo bem, ele não tinha a mínima obrigação em lhe fazer uma ligação e lhe levar para sair. Podia tê-la convidado porque estava sob pressão de um idiota como seu companheiro de quarto. Talvez quisesse apenas brincar com seus sentimentos, como se ela fosse boba. Que a tratasse como se fosse feita de vidro... como se fosse de papel. Porque... afinal de contas, ela não ligava. Não permitiria que isso acontecesse.

Quando chegou em casa, largou a bolsa no sofá e subiu as escadarias, de cara fechada. Entrou no quarto e se jogou na cama, passando as mãos pelo cabelo, como de costume. Respirou fundo e prendeu o cabelo comprido em um bico de pato, ouvindo passos na direção da porta. As batidas vieram logo em seguida.

— Megan?

— Oi Antoine... pode entrar.

— Boa noite!

— Pra ti também... como foi a tarde?

— Jonas estava de cabeça quente, dessa vez era pra valer.

— E por quê?

— É que... ele pediu que eu não lhe contasse, por nada nesse mundo.

— Não, não, não, não... está dizendo que mudou de lado?

— De modo algum... mas acho que é melhor você não saber.

— Não ouse fazer isso comigo, cara.

— É pelo seu próprio bem!

— Me conta, Toinê, por favor...

— Tem certeza? É que...

— Você me conhece bem... sabe que tenho.

Antoine bufou.

— Bem... digamos que... ele tem assuntos mal resolvidos aqui no Brasil.

— E...?

— Ele descobriu que um romance passado de sua mãe está na cola dele.

— Como é? — ela arqueou a sobrancelha. — Da minha mãe?

— É... — dissera, abismado. — Mas parece que ele já está dando um jeito.

— Dando um jeito?

— Foi isso que ele disse, mas eu não acredito muito.

— Acha que "dar um jeito" significa... "dar um fim"?

— Não, não, claro que não. Jonas não seria capaz de algo assim.

— Eu não sei, prefiro acreditar que não. Sabe ao menos o nome do homem?

— Eu ouvi eles comentarem, mas saí logo em seguida. — disse ele, apertando os olhos e ficando em silêncio por um instante. — Eu preciso me lembrar... ah caramba... era um nome estranho. Juvenal... Nicolau...

— Pasqual?

— Não... argh, maldição... — ele falava, sacudindo a cabeça careca. — Terminava com essa sílaba, mas era tão... — as pupilas se dilataram e ele começou a comemorar de repente. — Me lembrei! Ahááááá! Herval! O nome do homem era Herval!


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