O Lado Escuro da Lua escrita por MaeveDeep


Capítulo 1
Capítulo Um


Notas iniciais do capítulo

Estou revisando a história, meus amores! Vocês acham que as melhorias são significativas?



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O Lado Escuro da Lua – Capítulo Um

Artemis Lancaster não era uma pessoa imaginativa e, por isso, não conseguia encontrar outra resposta para aquela barulheira que não envolvesse o prédio em chamas. Sentou-se na cama sem entender muito bem se estava sonhando ou acordada, e o brilho da tela de seu celular a ofuscou quando tentou ver as horas.

Sete e cinco. Em qualquer dia da semana esse horário a faria pular da cama, mas não num sábado seguinte a uma noite em que havia quase morrido de tanto treinar. Olhou ao seu redor para o quarto escuro, tentando dar um sentido à algazarra de passos e conversas que sequer entendia de onde vinha.

– Artemis? – e ali estava mais um motivo para ela arrumar uma chave para seu quarto; uma monitora louca de vinte e dois anos acendendo as luzes e a cumprimentando com um sorriso enorme.

Artemis poderia ter rosnado, mas talvez aquilo não causasse uma primeira impressão, e ela já achava Lily Macey uma chata o bastante sem conseguir a inimizade da garota também. Com seus cachos loiros e olhos enormes, ela se comportava como se tivesse quinze anos, e não vinte e dois, e era o tipo de pessoa que simplesmente irritava Artemis.

– Lily – disse em resposta. – Tem alguma coisa importante acontecendo?

– Não ouviu? – a loira perguntou, animada, como se alguém conseguisse não ouvir aquele pandemônio. – Os músicos da Berklee chegaram!

– Berklee – Artemis repetiu, tentando se lembrar de onde teria ouvido aquele nome antes. – Essa não é... aquela faculdade de música daqui? – conferiu, hesitante.

A maior faculdade de música independente do mundo, era o que constava na Wikipédia. Não que Artemis houvesse olhado. Ela também não sabia muito mais do que aquilo, mas porque não costumava prestar atenção ao que não lhe interessava. E uma escola particular de música moderna, cujo prédio parecia um edifício comercial, definitivamente não lhe interessava.

Por que ela estava acordada, mesmo?

– Não te contaram? A Orquestra estará fora da cidade na data da apresentação – Lily lhe informou, ainda naquele tom animado. – E então os alunos da Berklee concordaram em tocar para nós.

Perdão, como?

– Músicos amadores vão tocar na peça? – teve que confirmar. – Entendi direito?

– Eles são ótimos – Lily encolheu os ombros de forma graciosa. – E muitos têm a nossa idade, vamos nos divertir bastante.

Artemis juntou as sobrancelhas em descrença.

– Eu certamente duvido.

Lily não pareceu impressionada, a observando com ligeira desconfiança.

– Bom, eles estão lá embaixo com as coisas deles, precisamos recebê-los. Vamos ter uma reunião após o almoço também, e uma festinha à noite. Seria muito incômodo me ajudar com isso?

– Eles vão ficar aqui? - Artemis percebeu, incrédula.

– Está perguntando se vamos hospedar os músicos mais gostosos da cidade? - uma voz terrivelmente familiar se manifestou, e, de má vontade, Artemis teve que aturar a insolência de Gabriel, subitamente dependurado ao redor de Lily. – Exatamente. Não tem como ficar melhor, tem? – e seu sorriso mostrou covinhas.

– Consigo pensar em infinitas possibilidades – Artemis torceu o nariz. – Você precisa de ajuda para quê, Lily?

– Eu gostaria que você me ajudasse a mostrar a escola a eles – a monitora explicou, parecendo um pouco sem graça. – Achei que seria uma boa ideia. O prédio é grande e é bom que eles o conheçam bem para não se perderem com frequência. Gabriel e Bella vão, também.

– Yeap. Eu vou lá me arrumar – Gabriel contou, animado, acenando em despedida. – Tenho que estar gostoso para causar uma boa impressão.

Artemis duvidava de que aquele duende demoníaco pudesse causar uma boa impressão em uma pedra, mas nem teve a chance de dizer nada.

– Ele não é realmente o monitor chefe – Lily contou, apaziguadora. – Só está substituindo Michael porque ele está com alguns problemas e teve que ir para Long Island. Vai retornar logo - garantiu.

– Com esses músicos chegando, Gabriel é o menor dos nossos problemas – Artemis franziu os lábios. – Já estou descendo para te ajudar – concedeu, lentamente. – Quero dar uma olhada nesses estudantes.

{...}

Alguns minutos depois, descendo as escadas do dormitório, Artemis encontrou Lily e Isabella conversando animadamente nos banquinhos altos da cozinha. Era um mistério por que não se encontravam em pânico, mas ela já havia aprendido a não esperar muito da capacidade de discernimento de seus novos colegas. (No dia anterior, Gabriel havia passado boa parte do almoço tentando convencê-la de que Keanu Reeves era imortal.)

– Animada, Artemis? – Bella perguntou assim que a viu, os olhos escuros brilhando. Ela tinha o queixo apoiado em uma mão, suas unhas rosa-choque com estampa de oncinha.

– Animada para recepcionar os inúteis? – replicou, secamente. – Com certeza não.

– Inúteis, Artie? - Gabriel estalou a língua em desaprovação. Músicos são artistas. Isso é super legal.

– O nome é Artemis.

– Artie é muito mais bonitinho.

– Em quais dormitórios eles estão? – Bella juntou as sobrancelhas perfeitas, curiosa, interrompendo a resposta de Artemis. – Aqueles desocupados do segundo andar?

– Isso – Lily saltou do banquinho. – Vamos?

– Quanto mais cedo terminarmos, melhor - Andrew disse de repente. Artemis nem o havia visto, então se virou, encontrando-o deitado no sofá com a cabeça no chão, o cabelo escuro amarfanhado no tapete branco. Seu sorriso era todo dirigido a ela.

– Andy, meu querido, não tem essa de "terminarmos" - Gabriel observou, petulante. - Você não vem junto. Toda essa sua aura de bissexual vai me fazer ter que disputar por atenção.

O garoto ficou vermelho, provavelmente de raiva, mas Artemis deu uma risadinha.

– Você não tem que disputar muito por atenção - comentou, depreciativa.

– Eu sei! – ele exclamou, sorrindo. – Sou incrível. Vamos logo? - pediu para Lily, como uma criança.

A monitora suspirou, por demasiado acostumada ao garoto.

– Vamos, vamos sim. Voltamos logo, Andrew - acenou, feliz, como se a apresentação mais incrível do ano não estivesse ameaçada.

Às vezes as pessoas simplesmente irritavam Artemis.

{...}

– Eu e Artemis podemos ficar com um dormitório, e vocês dois com o outro - Lily ia dizendo, como se qualquer silêncio fosse pesar muito. Os quatro andavam pelo corredor, e a Academia era ainda mais linda pela manhã, o papel de parede azul-claro adquirindo um tom mais elegante na luz clara do sol. – Comporte-se, Gabriel.

– Eu sempre me comporto! - o garoto arregalou os olhos castanhos em inocência, sem ser levado a sério.

– Eu sou a única pessoa que acha que eles não têm capacidade para tocar na apresentação? - Artemis teve que perguntar, educadamente curiosa.

As garotas ficaram em silêncio, e então, infelizmente, foi Gabriel quem respondeu.

– Se tudo der muito errado, todo mundo tira a roupa. Não tem um prêmio de inovação? Deve ser um Oscar pelado – e riu sozinho.

Gabriel – Lily o repreendeu, tolerante, antes de se virar para Artemis. – Eles não são tão ruins assim. São alunos, como nós.

Estou bem acima da média de vocês, Artemis pensou, mordendo a língua para não dizer isso em voz alta. Felizmente, Bella a salvou de dizer alguma coisa.

– Foi o maestro da Orquestra quem os recomendou, eles com certeza são bons.

– Não basta interpretar – Artemis insistiu. – Não que eu ache que eles saibam. Acontece que eles vão precisar compor.

– Não foi sua a ideia de uma peça totalmente original? - Gabriel a lembrou, irritante.

– Oh, perdoe-me se não pensei que a diretora Lee fosse contratar um bando de inexperientes para uma apresentação digna do Bolshoi.

Ninguém a respondeu, e Artemis achou que, talvez, houvesse ido longe demais. Suspirou, frustrada.

– Ainda assim, o que eles estão fazendo aqui?

– A diretora Lee achou que seria gentil oferecer um lugar para ficarem – Lily contou, aparentemente tentando acalmá-la. – Mesmo porque eles precisam ter suas aulas normalmente, além de ensaiar muito para a nossa apresentação. É como se a carga horária deles houvesse sido dobrada.

– Isso não vai me condoer - Artemis lhe informou, sincera. - Tenho certeza de que aceitaram vir para cá apenas por se divertirem com nosso pânico.

– Nosso pânico?

– Vocês verão - Artemis avisou, o nariz franzido. - Não podem esperar que adolescentes vagabundos saibam se comportar em uma escola antiga e clássica de balé.

– Gabriel também não sabe - Bella apontou.

– Chegamos! - Lily exclamou, verdadeiramente aliviada, antes que o garoto pudesse responder alguma coisa. - Gabriel, Bella, fiquem com a porta de lá - os despachou, virando-se então para Artemis. - Podemos?

– Não temos exatamente escolha – Artemis replicou, indiferente.

Gabriel acenou alegremente antes de se afastar, e por um segundo Artemis teve pena das pobres almas que teriam que aguentá-lo. Mas então decidiu que já odiava essas pobres almas, e que não deveria sentir pena delas.

– Com licença? - Lily já estava dizendo, abrindo a porta. A monitora então congelou no lugar, e Artemis só precisou dar um passo para dentro do recinto para entender o porquê.

O elegante papel de parede marfim estava começando a rasgar num ponto em que eles haviam apoiado um dos aparadores de vidro, só para abrir espaço para uma enorme televisão e um Xbox. Havia malas surradas no chão, chapéus e mais instrumentos musicais que Artemis poderia identificar.

Um garoto tinha um dos tênis sujos sobre o sofá. O tapete estava amassado – um tapete que valia mais do que todos os gastos com educação que aquelas pessoas ali tinham feito a vida toda.

– Hum, oi, gente. Há algum professor responsável por vocês? - Lily perguntou, a timidez tornando seu tom de voz mais agudo.

(Bom. Talvez ela estivesse notando a enrascada em que haviam se metido.)

Os alunos, que antes conversavam, se calaram em um silêncio desconfortável. Sem entender, Artemis percebeu alguns trocarem olhares ansiosos e então encararem um homem sentado em uma poltrona.

Ele certamente tinha mais de trinta anos, mas não muito mais do que isso. A barba bem-feita ajudava a envelhecê-lo, Artemis supunha. Vestia uma camisa e calças sociais, os sapatos pretos brilhando. Seu cabelo escuro estava penteado para trás, farto e bem cortado, óculos finos equilibrados sobre seu nariz.

Lia uma revista, mas ergueu a cabeça ao sentir os olhares em sua direção.

– Não, minha querida. Não tão cedo. Permita que eu me habitue à minha nova realidade primeiro? Chame Apolo, se precisar de alguma coisa.

E com isso ele voltou a ler.

Apolo?, Artemis se perguntou. Ele não sabe o meu nome, procurou entender, curiosa, por que sugeriria que chamássemos um garoto de nome...?

– Ele disse que iria se trocar – alguém disse, andando até o meio da escada e então erguendo o rosto para gritar: – APOLO! Duas garotas da Academia aqui embaixo!

Apolo é um apelido, não é?

Mas meio minuto depois, um garoto desceu as escadas, e Artemis não pôde evitar entreabrir os lábios. Ele era lindo, de um jeito até mesmo familiar, por algum motivo, e, honestamente, seu nome não poderia se outro que não Apolo.

Era alto, talvez cinco centímetros a mais do que ela. Magro, mas forte, a pele queimada de sol. Tinha um nariz reto e comprido, olhos castanhos, um cabelo bagunçado tão loiro que chegava a ser dourado.

Quando sorriu para apertar a mão de Lily, o canto de seus olhos se enrugando e seus lábios se partindo de uma forma toda charmosa, Artemis já tinha decidido que Nietzsche estava absolutamente certo; que Deus estava morto e enterrado e não havia nada de bondade nesse mundo cheio de casualidades.

A monitora ao seu lado tinha uma expressão maravilhada no rosto, e parecia completamente derretida. Artemis armou então sua compostura, erguendo o queixo.

– Apolo Wright. – Quando ele se apresentou, sua voz era macia e rouca ao mesmo tempo. Tinha uma camiseta vermelha jogada por cima de seu ombro direito, como se fosse vesti-la. – Você é a Lily Macey, não é?

– Sim – ela respondeu, adoráveis olhos verdes se arregalando. – Como soube?

– Eu te vi mais cedo no pátio, mas não acho que você se lembre. Agora, você... - e o garoto se virou para ela, Lily completamente esquecida, algo de diferente em seu curvar de lábios.

– O nome é Artemis.

– Artemis? – o garoto repetiu, abertamente encantado.

Provavelmente havia uma banda indie com seu nome, desde que alguém como ele dificilmente conheceria mitologia.

– Viemos mostrar a escola a vocês - Lily tomou a palavra, no tom gentil de sempre.

– Assim que você vestir alguma coisa, é claro - Artemis teve que acrescentar, encarando seus olhos castanhos com firmeza.

– Sinto muito – Lily já estava pedindo, antes que Apolo tivesse a chance de respondê-la. – O humor de Artemis é péssimo pela manhã – tentou fazer graça, mas não era como se ela sequer a conhecesse.

– Não há motivo para pedir desculpas - Artemis a contradisse, portanto, sem desviar os olhos dos de Apolo. Eram de um tom forte de castanho, do tipo que poderia encarar o sol sem se franzir. - E o meu humor não é péssimo. As circunstâncias o explicam. Poderia dividir os seus colegas em dois grupos?

Ela não havia esboçado o mais ligeiro sorriso em todo aquele tempo. Sua postura continuava perfeita, as mãos juntas à frente do corpo. Sabia o que todos aqueles alunos estavam vendo – uma garota metida, arrogante e fria – e, naquele momento, sequer se sentia muito longe disso.

– Artemis, não diga isso assim – Lily pediu, tentando disfarçar seu incômodo com um sorriso; ela, o perfeito oposto de Artemis, cheia de vontade de agradar a todos. – Sinto muito – ela pediu de novo para Apolo, como uma boba. – Artemis--

– ... parece ter algo permanentemente enfiado naquele lugar? – Apolo completou por ela, apenas um leve tremor nos lábios estragando sua expressão séria, fazendo com que todos os seus colegas explodissem em uma risada coletiva.

– E é esse o cavalheirismo que a sua mãe elogia tanto? – o homem por trás da revista perguntou, sem desviar o olhar do que lia, fazendo as risadas morrerem. – Eu esperava mais de você.

– Não conte a ela – o garoto pediu, surpreendentemente sincero. Quando se voltou para as garotas, pareceu um pouco embaraçado. – David é mais ou menos o professor responsável, explico depois. Ele deve ficar mais sociável com o tempo. Podemos ir?

– Antes de irmos – Artemis retomou, graciosamente ignorando o insulto ridículo e cabível a meninos de treze anos – vou pedir pela segunda vez. Você poderia, por favor, se cobrir com alguma coisa?

E ali estava o sorriso perfeito de novo.

– Incomodada?

– Não diz respeito a mim. É só o hábito em culturas civilizadas.

Mesmo seu tom mais sério não foi capaz de abalá-lo; o loiro parecia tão à vontade quanto possível.

– Esse é um conceito bastante arrogante. Foi assim que os europeus devastaram a África e as Américas, sabia? Aliás, você não está sendo muito receptiva.

Artemis abriu um sorrisinho de escárnio, rosnando em frustração por dentro.

– Me dê um bom motivo.

– Um bom motivo? Puxa. Quer que eu tire a calça também?

Artemis ergueu as sobrancelhas, virando-se para Lily.

– Vou ajudar o Gabriel, mando a Bella para cá. Boa sorte com ele. – Olhou para Apolo uma última vez, e o garoto inclinou a cabeça, um trejeito de zombaria em seus lábios. – Parece que vai precisar.

Andou com toda a pose do mundo até a porta, educada demais para batê-la com força, mas achou ter ouvido um assovio baixo antes de sair.

Apolo, suspirou, descendo o olhar para o chão. O irmão gêmeo do seu contraponto mitológico, da deusa que havia lhe dado seu nome. Olhando de soslaio para o cômodo que acabara de deixar, enquanto andava até a outra porta, Artemis teve a inegável impressão de que alguma coisa estava começando.

{...}


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Notas finais do capítulo

Sim, senhoras e senhores, essa é a famosíssima Apolo/Artemis da Maeve que nunca que saía, e que eu levei meses a planejando com todo carinho! Sejam bem-vindos, sejam bem-vindos. Reviews são amor, vocês sabem. Elogios e críticas são igualmente bem-aceitos, mas os primeiros ganham cookies. Mil beijinhos.