O Lado Escuro da Lua escrita por MaeveDeep


Capítulo 2
Capítulo Dois




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O Lado Escuro da Lua – Capítulo Dois

Artemis retornou ao dormitório soltando suspiros de impaciência. Gabriel havia desaparecido de suas vistas em uma totalidade de noventa e nove por cento do tempo em que durara o tour (Artemis o fez o mais breve possível), provavelmente utilizando sua altura diminuta e sua agilidade para dar em cima de vários garotos ao mesmo tempo, correndo de um lado para o outro como um elfo travesso.

Os alunos da Berklee haviam se impressionado com a Academia, mas não teria como ter sido diferente. O lugar era mesmo fantástico, fundado havia várias décadas por uma aristocrata generosa que não economizara em absolutamente nenhum detalhe. A garota só podia imaginar as fotos cheias de filtro e efeitos que aqueles indivíduos compartilhariam no Instagram, com legendas e hashtags vergonhosas.

Com um último suspiro, ela se empoleirou num banquinho, propositalmente virando-se para o lado para não ter que olhar para Andrew Summers ainda deitado no chão (por que ele não estava treinando?).

Gabriel e Isabella logo chegaram, conversando animadamente sobre qualquer coisa que não fosse a apresentação, ou seja, um assunto realmente importante.

— ... ‘tá, mas e daí? Mesmo se ele fosse preso, eu iria vê-lo todos os dias na prisão – Gabriel ia dizendo, em tom animado. – Pena que tem aquele vidro, mas se os policiais não ficarem olhando, eu posso levantar minha camiseta e mostrar meus mamilos.

— Você sequer ouve o que sai da sua boca? – foi a voz de Bella quem perguntou, soando genuinamente curiosa. – Ah, oi, Artemis!

Ela não havia reparado antes, mas Bella já estava de maquiagem àquela hora da manhã. Era suave, mas havia sim algo em seu rosto, e rímel nos seus cílios, gloss nos seus lábios. Era admirável como ela tinha força de vontade para se arrumar tanto todo o tempo.

— ARTIE! – Gabriel exclamou, lançando mão de um de seus apelidos ridículos. – Eu tenho uma pergunta para você: onde estão suas sardas?

Apenas Gabriel formularia uma questão daquelas, com toda a sabedoria de um menino três ou quatro centímetros mais baixo do que Artemis, com covinhas e sobrancelhas acrobáticas e a maturidade reduzida.

— Sério, seu cabelo é muito legal – o garoto continuou dizendo, já que Artemis não o havia respondido. – Como conseguiu? É sangue de virgens em um pacto demoníaco, não é? Você faz um ritual satânico e oferta sangue puro para ter essa cor?

— Seria bom para você, não é? – Artemis riu. – Não teria perigo de eu querer o seu sangue.

— Oooh! – Gabriel pôs uma mão sobre o coração, fingindo horror, mas Artemis não o levou a sério. – Isabella, você vai deixar minha honra ser atacada assim?

— Que honra? – a morena deu uma risadinha.

—Oh, vocês duas – Gabriel estalou a língua, mas Artemis o interrompeu antes que a discussão infrutífera se prolongasse.

— Sobre o que vocês dois estavam falando quando chegaram? Quem vai ser preso? Você, por assédio sexual? – tentou adivinhar.

— Nenhuma tentativa minha de assédio foi recusada até hoje – Gabriel deixou claro, muito sério. – Sou adorável, quem me recusaria? – ele suspirou, como se realmente ponderasse sobre a questão. – Mas sabe aquela hora em que eu sumi?

— Oh, você vai ter que ser mais específico.

— Ah, vai, nem fui tão inútil assim. Bom, teve uma hora em que esse cara gostoso de olhinhos verdes, o nome dele é Sam, tentou pegar um daqueles vasos de porcelana que ficam no segundo andar. Sabe, aqueles chineses feinhos?

— Ele tentou o quê?— Artemis arregalou os olhos.

Mas antes que Gabriel continuasse sua história maluca, Lily entrou na sala, saltitando até onde eles estavam e atraindo a atenção dos três. Suas bochechas estavam avermelhadas, e ela tinha um sorriso plastificado no rosto, como uma Barbie.

— E então, Artemis? – ela perguntou, assim que parou ao lado de Isabella. – Como foi o tour?

— Ah, pergunte para o Gabriel – Artemis sugeriu, um tanto grata pela mudança de assunto. – Ele foi a alma do passeio.

Bella deu uma risadinha, mas Gabriel revirou os olhos como se Artemis houvesse exagerado loucamente.

— Eu tinha que por meu gaydar para funcionar.

— Foi tão horrível quanto possível. – Artemis ignorou o argumento absurdo de Gabriel para responder Lily. – Espero que você tenha tido mais sorte.

A loira deu de ombros.

— Oh, foi até muito legal. Apolo foi conversar com aquele professor, e acabou convencendo-o a ir, então foi bem fácil manter a ordem. Chamam-no de Chamberlain ou de Sr. D, mas ouvi Apolo o chamando de David. Ele foi muito educado, mas deu a entender estar aqui por uma obrigação. Para ser sincera, não entendi muito bem.

— Apolo – Gabriel repetiu, pasmo, encarando Lily como se só houvesse ouvido aquele nome no meio de tudo o que ela havia falado. – Apolo. Tipo, Apolo. – Havia uma estranha expressão de fascínio em seu rosto, desde as sobrancelhas levantadas ao sorriso de lado. –Apolo? Sério? Apolo gostoso Wright, futuro melhor guitarrista do mundo?

Lily deu uma risadinha infantil.

— Esse mesmo.

— Ele é meio famoso na cidade – Bella comentou. – Ouvi falar muito bem dele, mas não o conheço.

— Ele toca muito sempre que tem alguma festa com música ao vivo – Andrew disse, lá do seu canto. – Não adianta tentar colocar outra pessoa, as casas só lotam quando é com ele.

— Apolo Wright está debaixo do mesmo teto que eu, minha vida está completa. – Artemis não fazia ideia de como Gabriel chegara àquela conclusão, mas os olhos do garoto estavam brilhando. – E foram vocês, suas sortudas, que conseguiram falar com ele? Eu deveria ter pegado a primeira porta!

— Não seja ridículo, ele foi horrível— Artemis franziu o nariz. – Teve a indecência de descer para nos cumprimentar completamente seminu. Vestiu algo depois, não vestiu? – perguntou a Lily.

— Ele estava sem camisa?! Sem camisa, tipo, todo aquele bronzeado e músculos à mostra? – A voz de Gabriel saiu maravilhada e excitada ao interromper Lily, soando mais aguda do que o normal, e Artemis revirou os olhos.

— A sua baba está pingando no tapete – apontou, debochada, e a resposta madura de Gabriel foi lhe mostrar a língua. – E ele não é cheio de músculos. Por que um guitarrista faria esforço físico?

Artemis abominava pessoas que eram musculosas porque iam à academia. Em sua concepção, fazia sentido ter músculos se eles fossem ser usados. Dançarinos, lutadores, esse tipo de coisa. Mas criar bíceps do tamanho de coxas apenas para usar camisetas apertadas e se sentir sexualmente atraente? Repugnante.

— Ele não é mesmo – Lily concedeu. – Mas é lindo... Ainda assim – retomou rapidamente, após olhar para a cara de Artemis. – Ele está em uma escola, não em casa.

— Então eu acho que deveríamos fazer o máximo para que ele se sinta em casa – Gabriel propôs, animado. – E vai que ele é daquelas pessoas que andam sem roupa em casa? Deus, eu vendo minha alma para ter Apolo andando pelado por aí.

— Não é como se a sua alma valesse muita coisa – Artemis não pôde evitar comentar.

— Nem se vendêssemos as almas de todo mundo dessa escola iriam nos dar Apolo andando pelado – Gabriel acabou concedendo, derrotado. – É uma visão divina.

— Ele é tão bom assim? – Isabella arregalou os olhos, parecendo impressionada.

Muito gostoso – Gabriel enfatizou. – Muito, muito, muito. Loiro, alto, maravilhoso.

— Olhos azuis?

Pelo amor de Deus.

— Castanhos. Mas aqueles olhos... – Gabriel até suspirou. – No festival da Berklee do ano passado, ele tocou Sweet Child O’ Mine – contou, parecendo saudoso. – Juro que uma hora ele olhou para mim, e eu quase fiquei duro.

— Informação demais, Gabriel. – Artemis comentou, seca. – E isso não é algo bom, é péssimo. A última coisa de que precisamos para a apresentação de dezembro é de um cover do Axl Rose.

Gabriel deu uma gargalhada.

— Qualquer pessoa que não seja assexuada precisa de Apolo fazendo um cover do Axl Rose, vai por mim, Artie. Ele dá uma definição totalmente nova à palavra sexy. – Ele suspirou, ainda com aquele ar sonhador no rosto. – Andrew, quando eu conseguir trazer Apolo para o nosso quarto, você se importa de vir dormir no sofá?

— Será melhor do que ficar por lá – o moreno respondeu, indiferente.

Artemis sentiu uma súbita compaixão por aquele menino que conseguia dividir um teto com Gabriel todas as noites.

— Apolo perguntou de você – Lily disse de repente, pensativa.

Isabella soltou uma risadinha aguda.

— Então ele gostou da Artemis?

Oh, não.

— Não, não gostou – Artemis esclareceu, muito séria, cruzando uma perna sobre a outra. – Nós dois nos irritamos mutuamente.

— Ele não pareceu irritado – Lily apontou. – Foi você quem foi estranha com ele desde o princípio.

— Ele disse que eu tinha alguma coisa enfiada naquele lugar – Artemis relembrou, estreitando os olhos, fazendo a risadinha de Isabella evoluir para uma gargalhada. – Em que planeta isso não é rude?

— Bom, o que ele poderia ter dito? – Lily tentou argumentar. – Você o tratou como se eles fossem plebeus e você algum tipo de rainha, fiquei morta de vergonha.

— É claro que você vai defendê-lo, ficou encantada – Artemis não pôde se conter, em tom de acusação, desviando então o olhar para outro canto da sala.

— Ele é um cavalheiro – Lily tornou a argumentar, imbatível em sua defesa de Apolo. – Me ajudou a carregar todas as caixas com os preparativos para a festa, mesmo depois de eu ter dito que não precisava.

Artemis bufou.

— Era o mínimo que ele poderia ter feito, essa festa é por culpa deles.

— Artemis, é uma festa de boas-vindas.

— Eles não são bem-vindos – Artemis reclamou. – Não vão dar conta de substituir a Orquestra, como poderiam?

Todos os outros ficaram em silêncio. Mas não um silêncio quieto, e sim um cheio de julgamento. Artemis suspirou, abaixando o olhar. Havia ido longe demais. Quem realmente era e a pessoa que precisava ser se misturavam com tanta frequência e de forma tão ruim que, lá no fundo, ela sequer sabia quem era de verdade. Se essa arrogância toda era sua ou não. Ao erguer os olhos de novo para seus colegas, percebeu que para eles aquilo não fazia diferença alguma.

Uma rainha e todos eles plebeus. Não era assim que Artemis se sentia. Mas se fosse preciso, que fosse. Saltou do banquinho, decidida.

— Temos uma reunião depois do almoço. Eu vou treinar um pouco antes disso.

Quem sabe o Bolshoi não a chamava por ter conseguido carregar nas costas um espetáculo inteiramente fadado ao fracasso?

{...}


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Notas finais do capítulo

Estarei distribuindo abraços para aqueles que comentarem, só porque eu posso. Eu sei que vocês prefeririam iPods coloridos, mas não sou rica e famosa ainda.
Mil beijos da Maeve.