A Lua escrita por Pedro_Almada


Capítulo 18
Um monte de verdades tolas, a visita do Oráculo e




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Um monte de verdades tolas, a visita do Oráculo e o mestiço

 

            A noite densa não ajudou em nada o clima de tensão. Minha mãe me olhava de forma estranha, como se eu fosse outra pessoa, um completo estranho. Meu tio também parecia não reconhecer o sobrinho quando me olhava. Apenas Richard estava ocupado demais, pasmo e aparvalhado, assistindo a regeneração do corpo de Brian.

            Detive meu olhar por um segundo para ter certeza de que Brian estava vivo. Abigail correu até ele, tirou a sua jaqueta e cobriu as pernas nuas que ainda estavam regenerando. Era uma cena horrível, assistir aquele monte de sangue e carne se recompor. Parte do meu cérebro estava feliz em ver Brian vivo, mas a outra parte não agradava nem um pouco em ver Abi cobrindo o rapaz semi-nu deitado na grama. Mas eu não preocupei com isso por muito tempo. Os olhares ainda me cortavam e, embora eu quisesse quebrar o silêncio e dizer alguma coisa, não havia nada de muito inteligente para se dizer.

            _ Matthew – era a voz de Abigail logo atrás de mim – não se preocupe, Brian está bem.

            Eu fui até meus amigos, tentando ignorar minha família.

            _ Eu não sabia... – comecei, ainda atônito ao ver os dedos dos pés de Brian se recomporem até formarem pele e unha – eu não sabia como seria essa habilidade. É incrível.

            _ É, eu sei... - a voz de Brian soou fraca, mas tinha um tom de riso – Mas dói um pouco. Principalmente a parte dos ossos, sabe?

            _ Uhg! - Abi gemeu – por favor, não me faça pensar nisso.

            Então eu senti os passos. Minha família estava vindo em minha direção e, a julgar pelos passos cautelosos sobre a grama, eles pareciam hesitantes em querer se aproximarem.

            _ Matthew... – foi meu irmão quem disse primeiro – Matthew... Você está bem?

            Eu me virei e encarei todos de frente. Não, com certeza eu não estava.

            _ Acho que sim...

            _ Então... O que foi aquilo? – ele perguntou.

            _ Ah, bem... Não faço idéia.

            _Aquilo... Que você fez... – nem Richard (na verdade nem eu) conseguia entender por que minha aura se materializara daquela forma – Como você materializou sua aura? Isso é coisa de Alucate.

            _ Isso tem alguma explicação, Matthew? – meu tio perguntou.

            _ Olha, até hoje eu não sabia que podia fazer... Aquilo.

            _ Isso não pode ser coisa boa – minha mãe falou – a quanto tempo você sabe sobre homúnculos?

            _ Er... Já faz algum tempo.

            _ E como nunca soubemos de nada disso? – a voz dela era perturbadora – Como você nos escondeu isso?

            _ Eu não sabia que vocês também eram... E vocês nunca me disseram o que eu era... Aliás, por que vocês pensaram que eu fosse um Desertado?
            Minha mãe lançou um olhar de dúvida para o meu tio, foi ele quem respondeu.

            _ Eles não receberam o seu sinal. Desde os seus aniversários, eles nunca perceberam.

            _ Sinal? Que sinal?

            _ Acho que eu posso explicar, Matt – Abi interveio. Brian levantou-se, com a jaqueta enrolada na cintura – Faz parte da natureza homúnculo. Os poderes de um homúnculo sempre se manifestam no aniversário. E isso deve acontecer até o décimo sétimo aniversário para os Alvos, e até o vigésimo para os Rubros.

            _ Só fui perceber meus poderes no meu aniversário de dezessete anos. Não... Espera. Foi antes. Eu bati em Edmund Davis, o cara da escola, na véspera do meu aniversário.

            _ Impossível – minha mãe retorquiu – ficamos atentos esperando o sinal desde os seus doze anos.

            _ Mas que raio de sinal é esse? – eu explodi.

            _ Quando o poder de um homúnculo se manifesta – ela começou – os pais são capazes de ver o sinal através da lua.

            _ Apenas os pais do homúnculo recém-desenvolvido consegue ver o sinal – falou Brian – eles vêem uma mudança típica na lua durante a noite do seu aniversário.

            _ Nunca vimos o sinal – minha mãe disse – e, no seu décimo sétimo aniversário, quando a lua não nos foi revelado nada, acreditamos que você fosse um Desertado.

            _ Mas, então que outra explicação haveria? – eu perguntei.

            _ Bem... A julgar pela sua forma... A forma como você agiu essa noite – Abi parecia ser a única a levar aquela hipótese em consideração – você poderia ser um... Alucate.

            As palavras dela provocaram um choque coletivo. Todos se entreolharam, preocupados, se perguntando como isso seria possível. Provavelmente era exatamente o que estavam perguntando, pelo menos EU estava.

            _ Não pode... Isso não... – minha mãe se calou.

            _ George é um Alucate – meu tio respondeu secamente – Abolido, mas é.

            _ Isso não muda nada. Ele perdeu as habilidades antes de Matthew nascer.

            _ Ah, claro, mas isso não significa nada. Ele continua tendo raízes Alucate.

            _ Eu não sou um alucate! – eu bradei – sou um Vance.

            _ Seu pai é um descendente direto de Grant, Matthew – meu tio respondeu com a voz imponente, o que não era muito comum vindo de alguém que, geralmente era infantil e divertida – Ele é irmão de Blaine!

            De repente, as verdades não eram tão urgentes como eu pensava. Por muito tempo eu ignorei o fato de não conhecer a maior parte dos familiares do meu pai, e isso nunca foi um incômodo. Minha paixão pela família Vance supria qualquer necessidade em ter laços sanguíneos. Mas ouvir que meu pai era um alucate e descendente direto de Grant não era uma coisa que eu gostaria de adicionar à minha genealogia.

            _ Meu pai! Irmão...

            _ Seu pai não é como eles – minha mãe interveio – ele foi restrito de seus poderes porque ajudou os Homúnculos contra um ataque surpresa dos homúnculos.

            _ Seu pai conheceu sua mãe no Submundo – meu tio comentou – bem, eles se apaixonaram. Depois que ele descobriu os planos dos Alucates, seu pai contou tudo a sua mãe. Os dois foram falar com os Conselheiros da FourFace.

            _ E por que ele não tem mais poderes? – eu perguntei.

            _ Era a única forma de permitir que seu pai e sua mãe ficassem juntos. O Conselho da FourFace retirou os poderes do seu pai para que ele pudesse viver no meio de Homúnculos. Era a única maneira. Ele foi selado com o juramento de duas faces.

            _ Que juramento é esse? – eu quis saber.

            _ Seu pai agora vive entre dois mundos. O convencional e o Submundo. E, entre eles, está dividido entre sua humanidade normal, sua família Homúnculo e sua origem Alucate. Normalmente isso cancelaria qualquer juramento padrão. Mas, com o juramento de duas faces, ele não pode falar sobre nós para ninguém, e ninguém pode falar pra ele sobre nós, a menos que o considere confiável.

            _ Apenas nós podemos falar sobre o Submundo com o seu pai – minha mãe falou – somos a família dele, e confiamos nele.

            _ Mas isso não importa agora – meu irmão interpôs – Caramba, vocês viram o que Matt fez! Ele é, o que, um Alucate?

            _ Talvez – meu tio falou – Tem uma forma de sabermos.

            _ Como?

            _ Precisamos do Oráculo.

 

            Estávamos todos na sala da minha casa. Não estávamos muito preocupados com a nova decoração do jardim no momento. A maior preocupação era “que raio de coisa eu sou”. Brian e Abigail estavam na cozinha com Emilliene e meu pai, conversando em voz baixa e tentando acalmar os ânimos de Emi. Apenas eu, minha mãe e meu tio estávamos na sala, conversando sobre o que eu era, ou poderia ser.

            Minha mãe explicou melhor sobre o sinal. Entre doze e dezessete anos, ocorre a manifestação dos poderes e, nesse meio tempo os pais recebem o sinal durante o aniversário do filho, o momento exato em que receberia os poderes herdado da lua. Mas, nos últimos anos, meus pais passavam a madrugada inteira observando o céu, nervosos, esperando o dia em que eu me tornasse um Homúnculo. Mas, de alguma forma, isso não aconteceu.

            _ Foi por isso... – eu disse, enfim – desde o meu aniversário você tem me tratado com aspereza, mãe. Como se eu fosse uma decepção.

            _ Ouça, filho...

            _ Não! Ouça você! Então, eu não era o que você queria? De rente, por não atender suas expectativas, eu não era um filho bom o bastante para te dar orgulho?

            Bradley não ousou dizer nada. Eu percebi a forma como ele olhava minha mãe e, eu sabia, aqueles olhos tinham um brilho diferente, meu tio estava me dando razão. Como meu avô, tio Bradley jamais me julgaria pelo que eu NÃO sou, ou supostamente não era.

            _ Eu... Sinto muito, filho... – embora ela soubesse que eu não havia renegado o dom da família, ela não me enxergava mais daquela forma – Eu só... Não queria que o nome da nossa família caísse em descrédito. Acabei jogando a culpa em você, mas eu sei que não era.

            _ Eu sei disso. – eu respondi friamente. O meu próximo movimento poderia machucá-la, mas era exatamente o que eu queria – que bom que vovô morreu. Ele morreria de vergonha de você.

            A reação dela era esperada, mas doeu mais do que eu imaginava. Ela abriu a palma da mão e aceitou meu rosto em cheio. Eu não tinha um espelho mas, a julgar pela forma como minhas bochechas ardiam, a marca de cinco dedos estavam se formando em meu rosto.

            _ Elisabeth!

            _ Não, Bradley! – ela uivou, mas não tirou os olhos de mim – você, menino. Não tem o direito de dizer isso.

            Eu soltei um riso baixo e desanimado, mas sarcástico o suficiente para ferir seu ego de mãe.

            _ Há muito tempo eu deixei de ter direitos nessa casa.

            Ela se levantou abruptamente e me deu as costas, saindo aos trotes. Ela subiu as escadas e não pude mais ver o seu rosto desolado. Eu sabia que tinha ido longe demais. Mas eu não tinha pedido pare chegar ate ali, de qualquer forma.

            _ Você não podia ter feito isso com ela, Matthew – a voz do meu tio era severa – ela é sua mãe, e fez muito por você.

            _ O que quer dizer? Que ela fez mais do que eu merecia? – eu estava explodindo, dizendo tudo o que o filho bom e exemplar não era capaz de dizer. Não, eu era um novo Matt, capaz de quebrar braços e assassinar feras – Eu fui um bom filho! Enquanto Richard trazia problemas pra casa, eu agia da melhor forma! Me esforcei para ser uma boa pessoa, eu perdi os melhores momentos da minha vida em Seattle, momentos normais! Pra vir até aqui, pra que?

            _ Vocês precisavam se desligar daquele mundo normal, Matthew! – meu tio tentava me explicar – como vocês conseguiriam se Homúnculos tendo amigos... Normais. Era preciso quebrar os laços.

            _ E não queria nada disso! Eu queria...

            _ Eu sinto muito, Matthew – meu tio falou em tom de consolo e, sem que eu me desse conta, ele me abraçou.

            Ele me envolveu num abraço protetor, algo que eu não sentia desde a morte do meu avô. Por mais que eu tentasse, era ao lado do velho Vincent que eu me sentia no lugar certo, eu me sentia vivo. Havia algo que nos ligava de uma forma absurdamente forte e, nos últimos dias, essa ligação estava sendo direcionada para meu tio.

            _ Obrigado... – eu murmurei – eu sei que você está tentando me ajudar... Mas eu nem sei o que estou fazendo.

            _ Estamos aqui para ajudá-lo. – ele me segurou pelos ombros, sorrindo – somos sua família. Não se esqueça, você é um irmãozinho pra mim.

            _ Valeu, Brad...

            Então meu tio se sentou novamente e, ainda com aquele olhar cauteloso, continuou.

            _ Bem, acho que não é a melhor hora, mas talvez não haja, de qualquer forma. Então, vou tentar falar da maneira certa.

            _ Ah, o que? Mais alguma coisa que eu não saiba? – eu perguntei, aborrecido.

            _ Sim. Existe – meu tio voltou a sua expressão séria – você logo, logo, vai ligar os pontos então, antes que tire qualquer conclusão precipitada vou contar de uma vez.

            _ Sobre o que? – de repente eu não me sentia tão contente em saber a verdade.

            _ Você ouviu nossas conversas. O seu poder, a sua habilidade, aquela da aura visível.

            _ Eu não sou um Alucate.

            _ Eu sei, acalme-se. Você pode não ser um Alucate, mas Homúnculos não fazem esse tipo de coisa. De qualquer forma, acreditamos que isso seja pelo fato de você ser filho de um Homúnculo e um Alucate. Nunca, na história, ouve a mistura entre famílias. Sempre, por motivos de preservação, as ramificações principais de cada família se mantiveram fechadas. Um relacionamento entre um descendente direto de Grant com um descendente direto de Vance é inusitado. E, só agora, cogitamos a hipótese de uma mistura de dons.

            _ Certo... Mas, e enquanto ao Rich...

            _ Eu sabia que você perguntaria. Bem, seu irmão não nasceu fruto dessa mistura.

            Levei alguns segundos para entender o que ele estava querendo dizer com aquelas palavras.

            _ Que... Como? O que isso significa?

            _ Seu irmão é filho de Elisabeth Vance. Não há duvida. Mas... Ele surgiu de um outro relacionamento.

            _ Meu irmão...

            _ Ele é filho de uma antiga paixão de sua mãe. Antes de Lisa conhecer seu pai, ela viveu com um homúnculo bastante conhecido no Submundo, um representante secundário dos Vance que conquistou um espaço honroso na nobreza.

            _ Nobreza... – eu preferi me apegar a palavras indiferentes. Era a única forma de esquecer o fato de que minha família era bizarra acima do aceitável.

            _ As famílias principais, puras, estão na Nobreza. Aqueles que possuem pais de famílias diferentes são os Baixos Títulos. Existem também os Plebes, que são aqueles com um dos pais humanos, quando um homúnculo acaba se conectando a um humano normal.

            _ Então... Eu sou um Baixo Título.

            _ Não. Grants não se aplicam a isso, pois não fazem parte do nosso povo. Eles são diferentes, habilidades diferentes, passado diferente. Você é o primeiro filho de um Grant e um Vance.

            _ Que significa...?

            _ Que o Oráculo está chegando e nos esclarecerá tudo – aquilo significava “chega de conversa”.

           

            Levou algum tempo, os minutos se passavam e a sala parecia ficar cada vez menor e mais quente, como se tentasse se converter em uma caixinha de música, onde eu era aquela bailarinazinha idiota que fica rodando e rodando, quando a única coisa que ela queria era acordar depois que a música acabasse. Ah, eu estava divagando na minha mente, mas logo isso não seria mais útil.

            Meu pai, finalmente, saiu da cozinha, mas Abi, Brian, Rich e Emi ainda estavam lá. Papai passou por mim sem me olhar nos olhos, foi até a porta da frente e abriu. Eu me debrucei sobre o braço do sofá para olhar por cima do ombro do meu pai, tentando ver o que havia de tão interessante do lado de fora, a não ser buracos e sinais de luta.

            No lugar do cenário de briga, um vulto gigantesco cobria a visão, nem mesmo o céu negro era possível ver. Fosse quem fosse, era grande o suficiente para derrubar a porta.

            _ Entrem – meu pai falou saindo do caminho para o vulto gigantesco passar.

            Assim que entrou, a luz da sala emergiu em seu rosto, iluminando os traços do homem gigante. Era umas cinco cabeças maior do que eu, mas sua expressão era calma. Um velho, grande demais, mais com rostinho de papai noel, exceto a parte da barba. Os traços de rugas e os lábios finos e secos revelavam um senhor já de idade, abatido e cansado. Mas os braços grossos e musculosos contradiziam completamente com sua expressão.

            _ Perdoem nossa demora – o velho falou. Sua voz era branda, como um senhor que fuma muito e fala pouco.

            _ Está tudo bem – meu pai sorriu.

            Minha mãe desceu as escadas e, sem trocar olhar com ninguém, acenou para o velho gigante e se sentou na poltrona, me ignorando por completo.

            _ Quem precisa dos cuidados do Oráculo? – disse o velho.

            _ O meu filho. Ele está ali, sentado.

            Eu me curvei para o meu tio e, num cochicho, perguntei:

            _ Hei, Brad. Quem é esse?

            _ Ele não é o oráculo, se quer saber. Ele é só o protetor do Oráculo.

            _ Qual o nome do grandalhão? Hulk?

            _ Ele não tem nome – meu tio disse, indiferente – é apenas um sentinela de proteção. Não precisa de identificação.

            Sem um nome? Que tipo de pessoa poderia viver sem um nome? Não me parecia certo usar uma pessoa apenas como um objeto.

            _ E o Oráculo? – perguntei.

            _ Ele já vai deixá-la sair.

            O velho caminhou até o centro da sala, em nossa direção. Ele precisou se abaixar por um momento para não derrubar o lustre. Então ele tirou o enorme manto marrou que cobria parcialmente seu corpo. Agora eram dois braços musculosos como os de um fisiculturista, o peitoral em evidência por baixo da camisa branca e as pernas grossas. Se não fosse a aparência idosa, ele seria um velhinho daqueles que passam a maior parte do tempo sentados na praça.

            Então eu notei. Uma menina estava a frente dele. Ela estava coberto pelo manto todo aquele tempo, mas agora eu podia vê-la. Ela parecia ter quinze anos, era tão delicada e magra, com um rosto rosado. Os cabelos louros cacheados cobriam os ombros, suas mãos estavam entrelaçadas uma na outra. Os lábios eram belos, rosados. Era uma linda jovem. Mas algo não combinava com ela. Os olhos. Cinza, sem cor na verdade. Ela parecia ser sega. Parecia um desenho magnífico com a pintura inacabada.

            _ Olá. – ela disse. Parecia saber que eu estava encarando-a.

            _ Ah... Oi. – eu respondi.

            _ Você é o jovem homúnculo? – ela não estava olhando para mim, mas eu sabia que era comigo.

            _ Sim, eu acho.

            Ela apenas sorriu. Veio em minha direção caminhando graciosamente. Os passos dela eram cautelosos, como se evitasse esbarrar em alguma coisa. Mas ela parecia não se importar com as pessoas a nossa volta, ou com a minha expressão de surpresa. Ela usava um belo vestido branco, apenas as canelas dos pés descalços eram visíveis. Eram pés delicados. Então eu percebi o quão vidrado eu estava naquela garota. Eu nem a conhecia, o que estava pensando? Por um momento acreditei estar traindo Abi com aquela atitude. Besteira, elas não tinham nada comigo.

            _ Eu vou ajudá-lo a se encontrar. – ela murmurou.

            Ela colocou as mãos em meus joelhos com delicadeza. Senti meu rosto corar como um tomate. Eu estava sendo patético, mas ela estava sendo encantadora, então acho que, de certa forma, a culpa era dela. “Eu não sabia que Oráculos eram tão perfeitos”, eu imaginei.

            Ela usou meus joelhos e apoiou o seu corpo. Então ela se ajoelhou bem diante de mim, ainda exibindo seu sorriso gracioso. Então, sem aviso prévio, ela aproximou o seu rosto do meu e me beijou. Seus lábios tocaram o meu de uma forma inexplicável, como se todo o meu corpo estivesse mergulhado em um banho quente, com um belo perfume. Era a aura mais magnífica que eu havia sentido.

            Mas não durou muito. Imagens desconexas, estranhas, começaram a surgir dentro da minha cabeça. Uma criança num berço, uma tatuagem de lua, sangue em todo o lugar, uma lua dourada e, então, o cheiro da morte.

            Abri os olhos, sem perceber que havia cochilado.

            _ Ele acordou – minha mãe murmurou.

            _ É normal... – a voz da menina Oráculo era a única coisa que parecia próximo de mim – ele tem muitas perguntas. Elas só se manifestaram desordenadamente.

            Percebi que estava deitado no sofá, e todos me olhavam apreensivos.

            _ Eu tenho as respostas, Matthew Vance – ela falou.

            _ Quem... É você? – foi a primeira coisa que perguntei.

            Ela deu uma risada, mas não era um riso exagerado. Tinha classe, adorável.

            _ Sou Angeline white. O Oráculo da sua geração. Tenho as respostas que você procura.

            _ Ótimo... – eu murmurei, me apoiando nos cotovelos para me sentar novamente – pode começar me dizendo por que me beijou.

            _ É a forma que os Oráculos usam para penetrar no coração e na mente de outra pessoa.

            _ Ainda bem que você não era um homem – eu arrisquei uma piada.

            Apenas ela sorriu.

            _ Oráculos sempre são mulheres.

            _ As respostas, Srta. White – falou meu pai, quebrando o clima descontraído que eu estava tentando criar – precisamos saber.

            _ Matthew Vance – ela falou. Dessa vez ela não sorria – Você nasceu na lua cheia de número 987.931 após o primeiro Vance. A lua se manifestou através da aura dourada em você quando tinha três anos.

            _ Como? – meu pai interrompeu, atônito – três anos. Isso é... Impossível!

            O velho gigante colocou a mão grande e pesada sobre o ombro do meu pai e, num sorriso meigo, falou.

            _ Sr. Chambers, a Srta. White nunca erra.

            _ Três anos – Angeline continuou, indiferente à interrupção – você desenvolveu com uma velocidade diferente de todos. A menor idade cogitada até hoje foi de doze anos. Você é diferente da maioria.

            _ O Que isso significa? – e perguntei.

            _ Você é mestiço. Filho de Elisabeth Rowen Vance, Homúnculo Alvo, e George Theodore Grant, Alucate. A mistura de raças concedeu a você forças distintas.

            _ Que tipo de forças? – meu pai perguntou.

            _ Matthew Vance é sensitivo. Presente o bem, o mal, conhece o perigo, a segurança... e a morte. Seu corpo e mente se adapta a qualquer situação. Você está protegido dentro de você mesmo. Não há lugar mais seguro do que esse. E...

            Angeline fechou os olhos, ocultando a íris incolor. Ela apertou as sobrancelhas, como se uma forte dor de cabeça começasse a incomodá-la. Não parecia ser grande coisa, mas eu estava enganado.

            _ Matthew Vance – ela continuou quando abriu os olhos – você é um manipulador de auras.

            Meus pais trocaram olhares preocupados. Não, era uma descrição vaga. Eles pareciam perplexos. Mas eles não puderam falar ou retrucar. Angeline não havia terminado.

            _ Tragam a menina, também – disse o oráculo.

            _ Menina? Que menina? – minha mãe perguntou, confusa.

            _ Ora, a outra Vance. Na cozinha. A outra mestiça. 

   


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