Lily arrastou seus pés pelas escadas. Durante seu primeiro ano, ela vivia se incomodando com o movimento delas, mas hoje pisava em cada degrau com invejável equilíbrio. James estava ao seu lado, falando algo sobre uma viagem que fez enquanto estava de férias. Lily achava adorável como os olhos castanhos brilhavam em fascínio conforme cada palavra repleta de convicção deixava os lábios dele. Entretanto, por mais romanticamente idealizado que possa soar, ela não pôde evitar sentir uma dorzinha no peito, sabendo que em poucos minutos já não estariam mais juntos.

Exibindo seu sorriso de tirar o fôlego, James abriu o retrato da mulher gorda, permitindo que Lily entrasse primeiro na sala comunal. Tentando não deixar sua desanimação transparecer, ela caminhou cautelosamente, esperando que ele se despedisse e anunciasse o fim do encontro.

– Dá para acreditar que eles comem sapos de lavanda na Holanda? – James exclamou, gesticulando amplamente com as mãos. – Eu fico abismado, é tão estranho!

– Muito estranho – Lily comentou, porém realmente não se importava com o assunto.

James interrompeu seus passos e se posicionou na frente dela. Lily procurou não se intimidar diante da proximidade dele, afinal, não tinha por que se sentir amedrontada. Como ela já percebera, James Potter não era o indivíduo idealizado de sua imaginação. Ele era egoísta, mimado e... incrivelmente bonito. O cabelo dele estava ligeiramente bagunçado como sempre e o fantasma de um sorriso divertido marcava seu rosto. Os olhos castanhos a encaravam com uma intensidade que ela não julgava ser normal.

– Preciso ir – Lily disse repentinamente, os olhos esbugalhados. Aparentemente, apesar de todos os contras, ela ainda se sentia terrivelmente apavorada com qualquer tentativa de proximidade por parte dele. Era difícil se livrar de certos hábitos.

– Ei – Potter chamou-a confuso.

Como um reflexo, a mão dele agarrou o pulso dela como se fosse um ligeiro pomo de ouro em fuga. Lily interrompeu sua tentativa de se afastar, sentindo-se incrivelmente tola. James deveria achar que ela era uma idiota, francamente.

– Onde você pensa que vai? – Ele perguntou levantando quase imperceptivelmente as sobrancelhas, o tom de voz ainda brincalhão.

– Oh, - Lily disse, buscando uma resposta que não parecesse boba e insincera. – Eu me lembrei de que preciso fazer um... relatório. Coisa de monitor.

Dessa vez, James não hesitou em erguer as sobrancelhas, um sorriso dominando seus lábios.

– Lil, eu sou um monitor – ele disse tranquilo. – Pelo que me lembro, já fizemos todos os nossos relatórios.

Envergonhada, Lily piscou algumas vezes. Era por isso que nunca mentia; suas mentiras não eram concretas, sempre era pega no final das contas.

Por outro lado, James estava desfrutando mais do que deveria daquele momento. Era inegável que o maroto tinha um ego inflado naturalmente e assistir ao efeito que ele causava em Lily Evans era mais do que satisfatório para sua natureza narcisista. Além disso, também havia o fato que ela ficava linda corada.

– De qualquer forma – ele continuou incerto se ela seria capaz de formar palavras novamente. – Você já pensou na minha proposta?

– Que proposta? – Ela perguntou procurando raciocinar com clareza. Por que Potter a proporia algo? Ele não estava a propondo em casamento, estava?

– Sobre tentar sair novamente – James esclareceu paciente.

Lily respirou aliviada.

– Ah, - ela disse ligeiramente mais calma. Merlin, ela não deveria se estressar tanto, só piorava a situação. – Isso. Pode ser.

– Pode ser? – James perguntou incrédulo. Definitivamente, ele não esperava que ela fosse aceitar facilmente.

– Pode ser.

Ainda surpreso, ele encarou-a com cautela. Será que havia alguma pegadinha por trás das palavras dela? Não que Potter estivesse reclamando, é claro.

– Por que está me olhado desse jeito? – Lily perguntou desconfortável. Parecia que ele analisava-a como se ela fosse um ratinho de laboratório numa experiência.

– Você é bonita – ele respondeu, sabendo que qualquer garota que namorou se derretia por essa frase. James possuía um conhecimento do universo feminino e não tinha medo de usá-lo. Dessa vez, no entanto, ele não estava necessariamente falando apenas por falar.

Como esperado, Lily corou e desviou o olhar. Ela sentia-se um verdadeiro paradoxo humano, já que por um lado odiava ter que lidar com romantismo dele, visto que não tinha a mínima ideia do que e de como responder sem parecer uma otária de primeira. Por outro, cada partícula de seu corpo vibrava com os elogios vindos de Potter.

– O que acha de jantar comigo e com meus amigos? – James perguntou de repente.

– O quê?

Por acaso ele estava enlouquecendo? Os amigos dele? Lily nunca tivera uma boa impressão deles. Entre Sirius Black, Petter Pettigrew e Marlene Mckinnon, todos eles pareciam legais demais para ficar na presença de alguém tão vagal como a pacata Lily Evans. Além do mais, Lily tinha que se lembrar de que eles eram vândalos desordeiros que colavam nas provas. Em outras palavras, não eram boa influência; assim como James.

– Eles não mordem – James acrescentou, quase adivinhando os pensamentos dela. – Para dizer a verdade, acho que vocês vão se dar muito bem.

Lily lançou-o um olhar que claramente dizia que ela duvidava do estado mental de Potter.

– Não sei, –

– Por favor – James interrompeu-a, sabendo que ela inventaria uma desculpa esfarrapada. – Assim não vou ter que esperar até amanhã para vê-la novamente.

Merda, Lily pensou. Por que James Potter sempre conseguia dizer frases que faziam o coração dela explodir? James sabia o que estava fazendo, afinal, seduzia garotas desde a pré-escola.

Honestamente, apesar de todas as palavras encantadoras e o charme incontestável, Lily não podia deixar de se sentir desconfortável quando se perguntava por quê. Por que ela? Por que um perfeito Don Juan como ele estava atrás dela? Não fazia sentido. Era óbvio que James Potter era muito mais do que Lily Evans estava preparada para lidar...

No entanto, Lily não queria desistir antes de tentar.

– Tudo bem – ela assentiu a contragosto. – Eu janto com vocês.

– Isso! – James respondeu com um sorriso inocente demais para seus padrões.

Antes que Lily tivesse tempo para raciocinar, James impulsivamente aproximou seu rosto ao dela, até que seus lábios se tocassem. Não foi um beijo cinematográfico, mas ainda assim todo o corpo de Lily se incendiou instantaneamente.

James estava beijando-a. James Potter estava beijando-a.

Tão rápido quanto se aproximou, James se afastou, um sorriso torto nos lábios. Sua expressão era a de uma criança que acabara de fazer algo muito errado – como armar um esquema a fim de roubar o chocolate escondido em cima do armário. Estava inacreditavelmente orgulhoso de si mesmo.

Ainda em choque, Lily não sabia o que fazer com si mesma. Ela ainda respirava, o que era um bom sinal. Seu coração palpitava intensamente contra seu peito, podia praticamente ouvi-lo pulsar. Ainda podia sentir os lábios de James quentes contra os seus e a memória do que acabara de fazer suscitou um largo sorriso em seu rosto.

– Eu te levaria até seu quarto, - ele disse calmamente, como se não tivesse acabado de bagunçar cada linha de raciocínio da mente de Lily. – Mas, sabe como é, garotos não são permitidos no dormitório feminino.

– Não tem problema – Lily respondeu, ainda sorrindo. Algo a dizia que não seria tão fácil afastar o sorriso de sua boca tão cedo.

Por um segundo, o infame James Potter não sabia mais o que dizer. A verdade era que ele não queria ter que deixa-la. Sentia-se como se olhos verdes o puxassem para si. Queria beijar os lábios rosados novamente, dessa vez um beijo que o deixaria sem fôlego. Entretanto, sabia que deveria ir devagar com Evans, saboreando cada etapa da conquista.

– Te vejo mais tarde, então – James disse, pronto para se afastar primeiro.

– Te vejo mais tarde – Lily repetiu com a voz suave.

Enquanto caminhava até as escadas, ele se atreveu a olhar para trás uma vez. Lily encarava-o de volta ainda parada em seu lugar com o mesmo sorriso. Diante da visão, estava confirmado: James tinha Lily nas palmas das mãos. E ele gostava disso.

ღ

– Eu espero que você tenha algo para dizer, Wormtail, ou vou começar a suspeitar que está interessado em mim.

James mal abriu a porta do dormitório quando foi metralhado pelos intensos olhos redondos de Peter. O garoto tinha nas mãos um pacote de feijãozinhos mágicos pela metade enquanto estava sentado na cama próxima à janela – a cama de Remus Lupin, o cara mais paranoico com açúcar nos lençóis. Peter seria um homem morto.

– Na verdade – Peter disse rápido, limpando suas mãos açucaradas na roupa de cama. – Eu tenho duas coisas para lhe dizer.

Era óbvio que ele estava empolgado, seus olhos pareciam os olhos de um maníaco. Conhecendo bem o amigo, James sabia que Peter queria que ele implorasse por informação para se sentir importante.

– Desembucha - James disse impaciente. Não estava com vontade de satisfazer as vontades de Peter. Acabara de beijar Lily Evans, nenhuma fofoca poderia ser tão surpreendente quanto a vida de James.

– Você sabia que Marlene e Sirius quase terminaram de vez? - não houve sequer um segundo de hesitação para as palavras deixarem a boca dele. – Hogwarts inteira está falando sobre isso! Se eu tivesse que apostar, acho que até Dumbledore está falando sobre isso!

Por um instante, James sentiu como se tivesse levado uma bofetada.

– O quê? – Ele perguntou pasmo. – Isso é horrível! O que aconteceu?

Peter revirou os olhos decepcionado.

– Não, Prongs! É ótimo! – O garoto continuou, tentando trazer James para seu lado. – Esse é o momento em que eu tenho que atacar.

– Atacar? – o deboche era claro na voz de Potter.

– Atacar. Seduzir. Acasalar. – Peter disse, alienado aos risos e as reviradas de olho que James dava. – Chame do que quiser, mas Marlene será minha.

Talvez fosse bonitinha a maneira como Peter realmente acreditava que um dia namoraria Marlene Mckinnon. Talvez fosse apenas triste.

– Boa sorte com isso – James disse, desfazendo os nós dos sapatos. – O que mais tem para me dizer?

Voltando para a realidade, os olhos de Peter focaram no amigo.

– Ah, sim, já ia me esquecendo – ele disse, levando um feijãozinho cor de rosa à boca. – Sua namorada esteve aqui. Ela disse que quer que você vá encontrá-la às sete.

Surpreso, James ergueu as sobrancelhas.

– Que estranho, acabei de falar com Lily sobre isso – ele disse calmo, jogando suas meias no chão ao lado da cama. – Pensei que estava implícito que iriamos nos encontrar lá pelas sete.

Dessa vez, foi Peter quem pareceu confuso.

– Lily? - Ele perguntou ao mesmo tempo em que mastigava. – Não essa franguinha. Vanessa.

Foi como se um balde de água fria tivesse caído sobre a cabeça de James. Vanessa. Como ele pôde se esquecer?

– Espera, Vanessa esteve aqui? – James perguntou trêmulo.

Não o leve a mal, James realmente amava Vanessa. Porém, não queria que a mulher chegasse a nenhum lugar perto de Hogwarts. Ele não queria que seus colegas soubessem que sua namorada era uma... prostituta. Pelo menos não antes dela largar esse estilo de vida. Repentinamente, James se sentiu irritado com Vanessa. Se ela queria algo, podia esperar sua próxima visita ao prostibulo, não é? Por que foi entrando em Hogwarts sem falar com ele antes?

– De qualquer forma – James disse firme. – Não importa o que ela quer. Já tenho um compromisso para essa noite com Lily.

Peter arregalou os olhos boquiaberto.

– Espera – ele disse estupefato. – Você está deixando de sair com um mulherão para sair com a monitora? Está maluco?

James olhou-o de volta. Ele também não sabia por que estava agindo daquele modo. Talvez fosse o lado mimado dele que queria ensinar uma lição à Vanessa, por mais que isso significasse não transar essa noite. Ou talvez ele apenas gostaria de ter uma noite normal com os amigos e fazer uma gracinha a fim de ver Lily corar como só ela fazia.

– Acho que sim – admitiu. – Mas não é como se Vanessa tivesse direito de exigir nada de mim. Ela já me deixou na mão antes. Agora é a minha vez.