Os novos herois do Olimpo escrita por valberto


Capítulo 54
Capítulo 54




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A apresentadora do programa de auditórios

Eric acordou sentindo a cabeça girar. Ela parecia estar de ressaca. Não. Ressaca não. Ele conhecia o sentimento de ressaca de quando era mais jovem e resolveu beber toda uma garrafa de cachaça que tinha conseguido afanar de um mercadinho. Caninha da roça. Mais uma das péssimas escolhas de Eric. Não, o que ele sentia era bem pior.

Ele abriu os olhos e achou que ainda estava dormindo. Ele estava numa espécie de cela, mas não como das prisões brasileiras. Pareciam aquelas prisões de filmes norte-americanos, onde uma pessoa sozinha ficava numa espaçosa cela vazia de 30 metros quadrados. Havia uma privada feita de aço escovado num canto, com um rolo de papel higiênico pela metade. Mas não havia grades. A porta da cela, que deveria ter uns três metros de comprimento, era feita de um vidro plástico, parecido com acrílico, embora Eric suspeitasse que fosse bem mais resistente. Mas Eric estava em pé e não deitado nas famosas camas de prisão dos seriados. Ele estava em pé, preso a uma estrutura em formato de X. Não dava para ver as mãos e os pés. Quando tentou mexer as mãos e os pés teve a sensação de estar com as mãos enfiadas num pote de geleca. Parecia coisa de filme de ficção científica. Como se não bastasse estava usando uma calça de um tecido estranho e sem camisa. Atados ao peito alguns eletrodolos levavam a uma mesa ao lado, que parecia monitorar seus sinais vitais.

Além da cela estava uma TV montada sobre um rack móvel, feito de tubos de alumínio. Era um aparelho bem antigo, de antes da era dos controles remotos. Era de tubo, com acabamento em madeira. Uma verdadeira peça de museu. Imagem analógica e seletores circulares para mudar o canal ou aumentar ou abaixar o volume. Ela estava ligada. Passava um tipo de programa de auditório na tela preto e branca. Parecia uma versão “produzida no Paraguai” dos primeiros anos do programa da Xuxa. Tinha até mesmo uma apresentadora de cabelos platinados e shorts curtíssimos, mas bem mais canastrona que a própria Xuxa. Não que a Xuxa fosse uma boa apresentadora. Mas perto da versão paraguaia, a Xuxa de verdade mereceria um Oscar. Depois de despachar um menininho de volta para a plateia a Xuxa paraguaia olhou para frente, como se percebesse que Eric tinha acordado.

– Então amiguxinhos! O nosso convidado, o Eric acordou. O que ele merece? Uma salva de palmas! Quem tá feliz bate o pé! – gritou a moça com um entusiasmo mais falso do que a certidão de venda da Ponte Rio-Niterói nas mãos de um otário. Apesar disso a plateia gritou e bateu palmas. Alguns sentaram no chão e bateram o pé com força. – Então Eric, você sabe quem sou eu?

– Sei lá – respondeu o menino tentando ganhar tempo – a prima pobre da Xuxa Maranhense?

– É... me disseram que você era mesmo “boca suja”. – a plateia não se conteve e começou a gritar em coro: “Boca suja! Boca suja!” – Não é muito esperto ser mal educado com a pessoa que te prendeu. As coisas podem ficar desagradáveis pro seu lado. Não só você, aliás, como todos os seus amigos. Eles ainda estão dormindo. Eu sabia que você seria o primeiro a acordar.

A imagem da TV mudou a menina agora estava com cabelos mais comportados, enfiada num blazer preto. Estava atrás de uma bancada de telejornal.

– Uma bem orquestrada operação envolvendo diversas agências de segurança prendeu nesta manhã um grupo de semideuses foragidos. Com os detalhes, nossa repórter Hebe Bonner fala do local. – a imagem cortou e a mesma apresentadora estava de repórter, na frente do que parecia ser a fachada do Hotel Parks. Os semideuses estavam sendo levados em macas, desacordados. Uma das camareiras foi até a repórter e tirou o rosto como se fosse uma máscara de silicone. Não era uma camareira e sim uma Hárpia. Ao lado dela apareceu o gerente do Hotel, vestindo uma roupa que Eric conhecia muito bem: terno preto vagabundo, gravata preta combinando, camisa branca de segunda categoria e indefectíveis olhos escuros.

– Obrigado Hebe Maria Braga. Estamos aqui com o major Homem de Preto. Como foi que vocês conseguiram essa auspiciosa captura?

– Positivo. Usamos um truque de câmera para fazer o nosso agente Simplício Camaleão se parecer com um dos membros do bando, indicando para eles o local da emboscada como um porto seguro. Eles não tiveram como resistir a nossa tática superior!

– Obrigado mais uma vez agente. É isso mesmo. De volta ao estúdio!

A imagem voltou e a moça da Tv agora estava sentada num sofá, como se desfrutasse de um ambiente de um a casa qualquer. Um garçom com cara de Brad Pitty veio deixar-lhe um drink e ela olhou para a tela, em direção a Eric.

– Isso deve sanar suas dúvidas para que possamos conversar civilizadamente, não é?

– Na verdade eu tenho mais uma dúvida – disse Eric – Seu nome é mesmo Hebe Maria Braga?

A imagem revirou os olhos como um meme do facebook e depois olhou sério para Eric. Em seguida continuou.

– Quero fazer uma proposta para você. De acordo com nossas pesquisas você é dos seus amigos o que tem a mente mais maleável e pode ser que entenda o nosso ponto de vista. Queremos a sua ajuda para ascendermos ao trono do Olimpo.

– Ascendermos quem? – perguntou Eric, subitamente interessado.

– Eu e os meus amigos. Os novos deuses, se quiser chamar assim. Eu sou a Telecomunicação. O que eu digo se torna verdade. Eu sou a diva que transforma a mentira em verdade. Mas temos outros, como o galã, a mocinha, o garoto da técnica... – quando ela disse aquele nome Eric arregalou os olhos. Ele mesmo já sabia de alguma coisa do garoto da técnica. Era um dos inimigos ocultos que vinha atacando seguidamente o grupo. – Queremos a sua ajuda para completar o nosso intento.

– E o que eu deveria fazer? O que eu ganharia com isso?

– Bom, para nos ajudar a vencer basta que você saia do caminho por hora. Deixe que Apolo, aquele palhaço metido à galã, assuma o posto como líder do panteão. Depois disso a operação “meteoro da ascensão” vai criar um novo guerreiro capaz de derrotar os deuses, e é aí que você entra. Você e seus amigos abrem a porta dos fundos do Olimpo e nós entramos. Derrotamos os deuses e assumimos o poder. E o que você vai ganhar? A vida que sempre quis, ao lado de seus amigos e da mulher que ama. Imagine um mundo onde você é adorado e respeitado por ser um dos salvadores? Um mundo onde você é mais rico que o Tony Star e o Bruce Wayne juntos e onde é mais amado que Justin Bieber, One Direction e todos esses astros pop?

– E se eu me recusar? Ou os meus amigos, sabe como é... eles não são tão maleáveis como eu... – disse Eric com um sorrisinho canalha nascendo no canto da boca.

– Você pode tentar convencê-los... eles só vão acordar daqui a uma hora. Podemos manter vocês aqui indefinidamente. E se vocês ficarem aqui, automaticamente, vão ficar fora do caminho. Não é o ideal. Teríamos que entrar no Olimpo pela porta da frente. Seria uma carnificina. O Datena Rezende adoraria, mas acho que podemos chegar a um acordo sem tanto derramamento de sangue.

– Pois é... você poderia começar me soltando. Eu queria ir ao banheiro...

– Ah não precisa. Essas roupas especiais que você esta usando são feitas para coletar fluidos corporais. Pode fazer nas calças mesmo. O pessoal da Nasa, da Missão Marte, usa. Você faz o que precisa e ela limpa tudo. Converte em energia. Ela também tira do ar todos os nutrientes e água que você precisa. É como se você fosse uma planta. Eu ainda posso calibrar os trajes para injetar calmante caso vocês tentem fugir. Um dia você vai apreciar isso.

Eric não teve tempo de ficar enojado. Ele já tinha visto os Cavaleiros de Sidonia e não estava nos seus planos passar o resto da vida como um daqueles caras. Quem sabe Lucas até que gostasse, mas não. Mas ele não teve tempo de responder. Um dos agentes dos homens de preto veio e levou a TV, empurrando-a pelo corredor. Só então Eric percebeu que seus colegas estavam em celas adjacentes à dele. Ele tinha uma hora até lá, quem sabe menos.

Ele esperou seus colegas acordarem e os pôs a parte de tudo. Jade e Nathália ficaram furiosas e foram colocadas para dormir mais de uma vez enquanto ele falava. Eles perceberam que tudo o que diziam era gravado e vigiado. Cada cela tinha sido preparada para deter um deles. Havia gel nas amarras de Eric, que negavam seu movimento ultra veloz. Geradores de ruído branco na cela de Isabel, que pareciam impedi-la de recitar feitiços ou se concentrar em magia. Sempre que Oliver tentava chamar por sua espada a sua garganta fechava e ele sufocava. Um gerador de radiação infra-violeta parecia enfraquecer Lucas a ponto dele mal poder se mover. E sempre que Jade ou Nathália tentavam alguma coisa, eram colocadas para dormir.

– Temos de sair daqui. Não gosto dessa situação. – disse Nathália bocejando cada palavra.

– Temos que descobrir o que é essa tal de operação “meteoro da paixão” – disse Isabel – Se ela pretende criar alguma criatura forte como um deus...

– “Meteoro das Ascensão” – corrigiu Jade, também bocejando de sono – fico imaginando o que seria isso.

– Vocês não vão à parte alguma. – A voz do homem de preto ecoou pela sala. – Pelo jeito o “boca mole” aí não pode convencer os amiguinhos. Não tem problema. Muito antes do resultado do Master Chéf tudo vai estar funcionando, e só precisaremos de vocês para abrirem a porta dos fundos do Olimpo... Embora eu ache que nosso grupo possa dar conta de alguns deuses divididos. – ele parou na frente de Oliver e olhou fixamente para o menino – Lembra-se de mim, rapaz? Do restaurante, a caminho de Anápolis? Você roubou o meu carro.

O homem de preto digitou alguma coisa no painel do lado de fora e a porta da cela de Oliver abriu-se com o som de pistões hidráulicos expandindo. Ele parou perto do garoto, mostrando o topo da cabeça, onde uma ferida quase cicatrizada o tinha obrigado a raspar a cabeça toda.

– Você se lembra dessa aqui também? Quando faz frio ainda dói. – dizendo isso o homem fechou o punho e acertou um cruzado de esquerda na boca de Oliver. O sangue desceu num filete pelo canto da boca. O agente esfregou a mão, satisfeito e saiu da sala. Duas harpias surgiram no corredor, uma delas ainda vestida como arrumadeira do hotel.

– Seu desgraçado! – Jade explodiu em fúria, se debatendo em suas amarras – quando eu sair daqui eu vou matar você! Você não tem que se preocupar com deuses, meteoros ou aerólitos. Eu vou matar você.

– E como vai fazer isso menininha de Apolo? Vai mandar o papai me dar câncer de pele? – o agente abriu a cela de Jade entrou nela. Ele estendeu a mão e pegou a menina pelas bochechas, apertando-as até Jade forçar um bico. – Sabe moleque, eu vou adorar me divertir mais tarde com a sua namoradinha. Mostrar a ela o que é um homem de verdade.

Oliver estremeceu. Ele gritou alto, em fúria e frustração. Ele se contorceu até que uma descarga elétrica o derrubou.

– Olhe bem garoto... – disse o agente.

Foi quando aconteceu. Enquanto estava olhando Oliver se contorcer pela descarga elétrica, e menina virou a cabeça com rapidez e com uma forte mordida abocanhou um dos dedos do agente. Ele gritou e puxou o braço, ato contínuo. Em dor ele olhou a mão e o dedo indicador estava faltando, vertendo sangue de seu coto machucado.

– Meu dedo, sua cadela! Devolva o meu dedo! – dizia ele tentando estancar o sangue com a outra mão. Jade limitou-se a mostrar o dedo entre os dentes, com um sorriso de criança mal criada que faz alguma traquinagem sabendo que não será ser punida por isso.

– Fofê quer? – ela perguntou. – É imporfânti para fofê? – perguntou novamente. Ela sorriu de novo e dessa vez mastigou o dedo com muita vontade. Depois de uma dezena de mastigadas ela cuspiu o toco mastigado aos pés do agente. – Pode ficar. Tem gosto de frango. Duvido que alguém possa colocar o que sobrou disso no lugar, mas se você for agora quem sabe acha algum médico capaz.

O agente saiu correndo da sala, com o toco do dedo mastigado na mão, repetindo impropérios.

– E assim que se faz garota! – vibrou Nathália. Todos a congratulavam, menos Eric. Lucas observou bem quando, no meio da bagunça, ele chamou a atenção de uma das harpias e trocou algumas palavras de pé de ouvido com ela. A harpia esperou o agente sair e depois de uns minutos saiu também.

– Eric, o que você fez? – perguntou Lucas, pedindo forças aos deuses para continuar confiando no garoto.

– Eu acho que consegui colocar em curso uma série de engrenagens que pode abrir as fechaduras e nos soltar daqui. Só precisamos de tempo.

Tempo... é tudo o que não temos, pensou Isabel, eixando-se vencer pelo barulho que a deixava cada vez mais confusa.


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