Os novos herois do Olimpo escrita por valberto


Capítulo 45
Capítulo 45




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Pensamentos proibidos.

A semana arrastou-se enquanto Jade e Oliver se revessavam como enfermeiros dos colegas. Tinham transformado a espaçosa sala de estar numa enfermaria mista. Colchonetes deitados no chão, dispostos lado a lado ocupando o centro antes vazio. Os meninos do lado do poente (menos Lucas que continuava enterrado no jardim, cada vez mais envolvido por uma espécie de casulo pulsante) enquanto as meninas aproveitavam o lado do nascente da casa. Era melhor de cuidar de todos num lugar só.

Essa tinha sido a sugestão de Jade, mas logo ela percebeu que os seus poderes de cura tinham sido roubados junto com a sua centelha divina. Os poderes de Balder, seu pai adotivo, eram fantásticos. Ela poderia receber um relâmpago de Zeus no peito e nada sofrer. Era capaz de pular de um avião sem paraquedas sem ao menos lascar uma unha. Bem, talvez suas roupas sofressem, mas ela não teria nem mesmo uma manchinha na pele. Balder também poderia ser o deus que trazia paz e a justiça para os nórdicos, e aclamado como um deus da cura, mas, sinceramente, seus poderes de cura não eram nada perto dos de Apolo. O tio de Oliver orientava como podia, procurando ajudar, mas ele mesmo estava ferido demais. Usaram uma ampola da tal “ambrosia injetável” que tanto foi falada na luta e ela realmente salvou o sujeito das portas da morte, mas os ferimentos mais extensos persistiram. A sua ambrosia injetável era sem dúvida poderosa, mas muito escassa. Acharam melhor diluí-la e ir administrando aos poucos, junto com o soro injetado de forma intravenosa.

Isabel foi a primeira a ficar recuperada. Seus ferimentos eram mínimos comparados aos outros. Embora ela reclamasse de pontadas de dor de cabeça e eventual tontura, recusava-se a receber a ambrosia. Segundo ela os amigos precisavam muito mais do que ela. Seus poderes mágicos ajudaram bastante. Ela conseguia trazer soro, analgésicos e bandagens com rapidez quase instantânea. Ela procurava manter um clima ameno e de otimismo. Numa tarde quente ela pegou um violão esquecido em um dos quartos e começou a tocar músicas de sua terra natal. Ah, como sentia falta de tudo! Dos pais, do clima, da vida que tinha. Sentia até mesmo falta de sua preletora, a finada irmã Agnes, uma mulher cuja voz era a cura para qualquer tipo de insônia. Apesar disso quando não estava de um lado para o outro brincando de faz tudo ficava sempre ao lado da cama de Eric, redobrando cuidados nele.

Eric tinha uma fratura horrorosa na perna. Não fosse a ambrosia e o tratamento de Jade teria de amputar a perna. Ele mostrou-se grato quando soube que o tratamento tinha colocado e colado os ossos no lugar, mas a dor tinha feito com que ele ficasse calado e introspectivo. Não incomum Isabel tinha de lavar o rosto do cavaleiro com um pano úmido. Mas não era apenas seu corpo que estava quebrado. Lá dentro de si mesmo Eric estava experimentando um sentimento avassalador, que lhe enchia os dias e lhe assombrava a noite: ele experimentava o medo da morte. A morte impotente, sem defesa, que quase ceifou sua vida dias atrás. Quando era bem tarde da noite e os roncos de Nathália cobriam todos os outros sons, ele se deixava chorar sozinho. No bolso o dracma de ouro – presente de seu pai – brilhava e aquecia.

Nathália era um caso à parte. A ambrosia tinha funcionado bem nela. Era capaz de estar de pé e pronta para a ação em poucos dias – isso se ela ficasse quieta o bastante para que a ambrosia a curasse. E ela estava ansiosa de verdade para levantar da cama. Não foi uma e nem duas vezes que Jade teve de refazer os pontos da extensa sua ferida nas costas. Mesmo com os poderes de Apolo aquela ferida deixaria marcas. Mas ela não parecia se importar. O seu coração bombeava o sangue com força em suas veias. Dentro de sua cabeça cada batida de seu coração parecia o choque de uma onda furiosa batendo contra a força inexorável de um rochedo. Ela queria vingança. Vingança pelos amigos mortos, pelas surras que levou, por tudo o que passou. E passar o dia na cama apenas aumentava a grossura do caldo que ardia dentro dela.

Oliver, por sua vez, dedicava-se a cumprir as ordens de Jade. Era normal, afinal ela sabia das coisas de medicina e não ele. Isso de certa forma aproximava os dois e os distanciava ao mesmo tempo. Embora o humor de Jade não fosse tão ruim e tempestuoso quanto o da Dr. Cassandra era claro que ela não queria misturar trabalho com outras coisas. Quando não estava cuidando de ninguém em especial – precisava regar Lucas pelo menos duas vezes por dia – ele se dedicava a arrancar segredos de seu tio. Não que o menino fosse realmente competente. Parecia mais uma criança tentando abrir um cofre sem a sua combinação.

– Então era isso que você queria me contar quando eu fizesse 16 anos? – perguntou o menino depois de servir ao tio uma sopa que Isabel tinha terminado de cozinhar.

– Não queria contar dessa forma – respondeu o tio limpando a boca com um guardanapo de papel – mas sim, basicamente era isso. Eu sabia que você era filho dos deuses no dia que pus s olhos em você. Esse tipo de coisa é razoavelmente comum na nossa família. Eu sou filho de Atena, mas pelo que eu sei meu avô por parte de mãe era filho de Hermes. Mas nunca pensei que seria filho de Astréia. Astrid, que era o nome que sua mãe deu, tinha um quê especial. Achava até que ela poderia ser uma meio-sangue não reclamada. Mas nunca pensei que seria uma deusa.

– E meu pai? – perguntou Oliver tentando não demonstrar emoção, virando a visão para o jardim lá fora e o céu noturno que começava a se salpicar de estrelas.

– Tomás sempre fora um cara normal. Normal no sentido de ser 100% mundano, mortal. Ele não tinha sangue divino o bastante correndo nas veias para ser mais que uma pessoa comum. Mas ele sabia o que eu era. Sempre formos muito ligados. Durante alguns anos ele me seguiu nas nossas aventuras e missões pelo santuário. Foi nessa época que montamos o nosso grupo, chamado de “javelin dourado”. Eu, Cassandra, Roberto, Luciano e seu pai. Ele era quase um mascote do grupo. Ele nunca aceitou que não tinha poderes.

Eduardo tomou fôlego e suspirou. A sopa era boa, apesar do caldo conter mais beterraba do que seria desejável. Por um momento pareceu voltar duas décadas atrás, quando era ele que tinha uma profecia sobre a sua cabeça. Ele olhou longamente para Oliver. O menino tinha mais traços de sua mãe do que de seu pai, mas o olhar era exatamente o mesmo. O olhar de alguém que não ia desistir até ter o que queria.

– Depois da minha última missão pelo santuário nos separamos. Nós nos reencontramos nos Estados Unidos, anos mais tarde. Ele já namorava a sua mãe. Ela parecia mais feliz do que ele. O resto da história eu já te contei.

– Que ele morreu num acidente de carro e eu fui deixado pela minha mãe na sua porta pouco tempo depois. Só que a história não fecha. Encontrei o meu pai, aqui em Fortaleza. E ele não parecia ser uma pessoa comum – Oliver deixou escapar uma pontada de desgosto na sua voz, tanto pela dolorosa lembrança quanto pela nítida impressão de que o tio ainda lhe escondia alguma coisa.

– É, eu sei. Eu estava lá... – Oliver arregalou os olhos e quase se engasgou com o caldo de beterraba que estava em sua boca – aliás quem você acha que arrancou a espada das mãos do seu pai com um tiro? Eu estava tentando rastrear você, mas acabei me atrasando. Mas acho que cheguei na hora certa.

– Um mago nunca se atrasa, Frodo Bolseiro, e nem se adianta. Ele chega exatamente na hora que ele quer. – a voz de Eric soou soturna e carregada de um peso incomum. Ele estava apoiado sobre duas muletas, com a perna enfaixada semi-flexionada. Ele sentou-se com dificuldade numa cadeira ali perto, ignorando os olhares de que não era bem vindo e de que a conversa era particular. – Mas continue tio Dudu. Fala mais de tudo o que você sabe dessa situação aqui.

Oliver apressou-se para interpelar o amigo, mas o tio foi mais rápido. Ele fitou os olhos de Eric. O menino resistiu com vontade férrea, mantendo o cenho franzido, como se estivesse diante de um desafio, marcando o seu território. Eduardo deixou a tigela de sopa de lado, abriu um largo sorriso e continuou, como se Eric estivesse a par da conversa desde o começo.

– Bom, depois daquela situação eu tentei alcançar você. Mas você e seu grupo sumiram do mapa por alguns dias depois que entraram no Del Paseo. Aproveitei o meio tempo para fuçar no submundo e descobri umas coisas bem desagradáveis. Primeiro, o seu pai fez um pacto com uma nova divindade. Não sei quem é esse deus. Ele é novo. Não é um dos deuses clássicos. Ele é chamado de garoto da técnica.

– É... aquele seu ex-companheiro de grupo se referiu a ele enquanto vocês lutavam – completou Eric, o mesmo tom de voz soturno.

– Pois bem. Ele não está pactuado apenas com esse cara. Ele fez um pacto com... – a voz do tio baixou até virar apenas um sussurro – Gaia. A mãe de todos os titãs e gigantes. Ela é tradicionalmente a maior inimiga dos deuses do olimpo.

– E onde Apolo se encaixa nisso tudo? – perguntou Jade, juntando-se à conversa. O tio olhou para Oliver com uma expressão como se perguntasse “vem cá, ninguém aqui respeita a privacidade da conversa alheia, não?”, mas limitou-se a continuar.

– Apolo quer poder. Simples assim. Ele viu uma oportunidade única de assumir o trono do Olimpo. Não tente entender os deuses. Pense neles como as criaturas mais poderosas do universo, mas com a mentalidade de crianças mimadas e birrentas de cinco anos de idade. Se ele tiver que se unir ao garoto da técnica é o que ele vai fazer. Não acho que se uniria às forças de Gaia. O seu orgulho não deixaria.

– Então estamos lutando em duas frentes. Como se não bastasse um mundo inteiro povoado de criaturas sobrenaturais nos querendo para o jantar ainda temos que enfrentar o deus-sol, uma nova divindade? Confere? Pode isso Arnaldo? – o tom de voz de Eric tinha voltado a um estado mais natural, jocoso. – Sabe Oliver, anda com você nunca é chato.

– E que vamos fazer? – perguntou Jade, levantando-se para ir regar Lucas.

– Temos que esperar que Isabel aprenda a usar o pêndulo e o mapa. Ele vai apontar o novo local que devemos ir. – o tio respondeu com calma, espreguiçando-se na cama.

– E como vamos chegar lá? – perguntou Eric.

– Uma coisa de cada vez. – assentiu o tio antes de tirar um antiquado telefone celular do bolso. Ele mal teve tempo de olhar a tela quando todos ouviram o grito de Jade, vindo do jardim.


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