Os novos herois do Olimpo escrita por valberto


Capítulo 23
Capítulo 23




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/460709/chapter/23

Entre mortos e feridos salvaram-se todos

Nathália acordou gritando. O pesadelo de novo. Num instante estava em casa coma irmã Verônica quando foram atacadas. Nathália tinha seis anos e Verônica dezesseis. Foram levadas ao santuário e lá, Verônica seguiu com as caçadoras de Artemis. E isso faz dez anos. Nenhuma notícia, nenhuma palavra. Apenas a dúvida. “A dúvida que leva ao medo; o medo que leva ao ódio; o ódio que leva ao lado negro da força”, como dizia a frase que tinha lido numa revista em quadrinhos do lado de fora do consultório da Dra. Cassandra certa vez.

Ela olhou ao redor. Estava no que parecia uma oca indígena. Chutou uns dez metros de diâmetro, teto baixo. Estava deitada numa cama improvisada, feita com bambus trançados e espetados no chão. Acima um teto arredondado em forma de cúpula era composto por uma centena de galhos de acerola. As árvores também forneciam a matéria prima das paredes. Num canto um pequeno e improvisado fogãozinho de lenha mantinha aquecido o que parecia uma panela de chá ou sopa. O cheiro era doce e se misturava com a fumaça da lenha, que emprestava um ar sobrenatural ao lugar. Ela estava toda enfaixada: pelo menos onde podia sentir.

Ao seu lado, em idêntica cama, mas em sono solto, Oliver babava, roncando despreocupadamente. Estavam com roupas limpas e também estava todo remendado. Especialmente seu rosto. O olho roxo ia ficar ali por vários dias, ambrósia ou não. Do lado de fora podiam ouvir o som da música tocando: era rádio. Uma dessas novas cantoras pop, cujo nome não conseguia decorar cantava alguma coisa em inglês sobre o coração partido. Na cabeça dela a imagem das filhas de Afrodite suspirando apaixonadas se formou. E junto com elas a imagem de Dezan. Ela sacudiu a cabeça com força, dissolvendo as imagens e voltando a realidade. Ela fez força para se levantar e percebeu que estava amarrada a vários sinos. Ela se sentiu um verdadeiro sino dos ventos enquanto se aprumava na cama.

– Não falei que ia funcionar? – disse Eric com o tom zombeteiro de sempre. – Foi como eu disse: era só passar o efeito do ferimento mortal que a rainha de todas as lutas ia bancar a machona e tentar se levantar. Dito e feito. Me deve 20 pratas.

Jade enfiou a mão no bolso e puxou uma nota de 20. Apontou-a na direção de Eric segurando a nota com a ponta dos dedos, resignada. Tão logo ele a tomou de suas mãos, ela virou-se para Nathália com um ar que era um misto de desapontamento, surpresa e preocupação.

– Você está bem amiga? Já consegue falar? – Jade soava realmente preocupada. Por um momento Nathália baixou a guarda e deixou sua fragilidade transparecer, apesar da presença de Eric. Seus olhos se encheram de lágrimas e ela fungou. Depois, engoliu o choro e com a voz ainda embargada respondeu: “ainda dói… aqui”, disse ela apontando para o coração. Jade aproximou-se e deu um fraternal abraço na amiga. – É o pesadelo, não é? – perguntou ela.

Nathália limitou-se a responder um melancólico “sim” e deixou a cabeça afundar no colo da amiga. Eric deixou a boca aberta como se fosse fazer alguma piada, mas subitamente achou pouco apropriado. Num instante, ao ver as duas abraçadas, Jade consolando Nathália como uma mãe consola uma filha ele se sentiu terrivelmente desconfortável. Virou de costas e partiu em busca de Lucas. “O que o menino do dedo verde estaria tramando e como eu poderia atormentá-lo um pouco?” pensava Eric deixando as duas a sós.

Por fim o choro de Nathália foi se acalmando e ela se recompôs na cama, guarda levantada e semblante sério como sempre.

– Onde estamos?

– Ainda perto do posto. Achamos que seria muito arriscado levar vocês a um hospital mortal e resolvemos montar nossa pequena emergência médica para semideuses aqui. Lucas providenciou abrigo e comida, eu cuidei dos ferimentos de vocês dois e sempre que precisava comprar alguma coisa Eric ia até a cidade. Ele é muito bom com compras, sabe? Um comerciante nato. – Jade explicou devagar, indo até a panela que fumegava com cheiro doce. Pegou uma concha de plástico, dessas de lojas de 1,99 e encheu uma cumbuca pequena com a mistura de cor rosada. Entregou a Nathália com uma colher de madeira. – Coma, vai te fazer bem.

Nathália deu uma boa colherada. Era gostosa, mas o cheiro adocicado servia apenas para esconder o ardido da mistura. Duas colheradas mais tarde já estava suando aos borbotões. Tentou divisar mentalmente os ingredientes. Sentiu um pouco de carne de soja, caldo de tomates, cebolas fritas e mais alguma coisa. Logo comentou:

– Quanto tempo?

– Dois dias. Oliver dormiu o tempo todo. E quando acordou só falava e grego. Quando finalmente colocamos aquele tabet dele para traduzir ele dormiu de novo. Ms agora é a minha vez de fazer as perguntas. Segundo Lucas vocês estavam se dando bem com as caçadoras. Por que o atrito com elas?

– Eu não sei – Nathália procurou mentir da melhor maneira que podia – não sei mesmo. Numa hora estávamos conversando e na outra eu já estava sendo atacada. Se Oliver não tivesse aparecido… – ela olhou para o amigo e deixou escapar um suspiro longo. Não soube se era de dor ou de outra coisa, mas o suspiro foi ouvido por Jade. No mesmo instante ela pegou no pulso de Nathália para verificar como estava o braço dela. O aperto fez a filha de ares soltar um gritinho de espanto e de dor.

– Pelo visto ainda não está bom o bastante. Vamos precisar de mais tempo aqui. Se quiser esticar as pernas, você está liberada, mas nada de sair por ai enfrentando monstros e semideusas imortais.

– Eu prometo – Nathália disse sorrindo ao se levantar, tentando esconder as dores no peito. Costelas quebradas doem muito.

Ela saiu da oca, deixando Oliver no sono pesado que estava. Lá fora o sol estava para se por. O céu do cerrado salpicava-se de vermelho com centenas de brilhos e nuances diferentes. Ela viu Eric tentando desenrolar cipós do cabelo. Seja qual for a brincadeira que ele tinha pensando não tinha dado muito certo. Ela sentou na carroceria da caminhonete, onde um colchão inflável tinha sido posto e deitou nele, olhando para o céu.

– Ela não me convenceu. Está escondendo alguma coisa. As caçadoras são leais aos servos dos deuses. Não nos atacariam sem provocação. – Jade olhava com seriedade para Eric que ainda estava empenhado na missão de livrar sua cabeça de cipós e ervas daninhas.

– Espero que Oliver possa nos dar alguma luz sobre isso. Eu não gostei do estado que o encontramos. E o descampado… parecia que tinha rolado um MMA dos deuses ali. Aquela grama queimada… a lama… cara, eu nunca vi nada assim na vida. Você acha que o Oliver vai demorar para acordar?

– Não sei. Sou nova nesse negócio de curandeirismo. Mas tem uma teoria que eu gostaria de testar assim que anoitecer. Ou melhor, lá pelas sete da noite.

Lucas acabara de chegar. Trazia consigo alguns cocos verdes. O pelo visto seria o que sobrou da sopa de ambrosia com caldo de proteína de soja e para beber água de coco. Eric revirou os olhos. O que não daria para um delicioso duplo cheese bacon com muita maionese extra ao invés da gororoba natureba que era forçado a comer já fazia dois dias.

A noite avançou e Jade pôs seu plano em prática. Com a ajuda de Eric e Lucas levaram Oliver para fora da oca. Tiraram também sua camisa, deixando-o só de bermudas. As ataduras também foram retiradas, sob os veementes protestos de Lucas que odiava ver sangue. Depois se afastaram. Num primeiro minuto nada aconteceu, mas depois a pele do menino começou a ficar laminada, dando reflexos do céu estrelado lá em cima. A sua pele foi ficando escura como a noite, especialmente nos locais mais afetados. Ali o reflexo das estrelas era tão forte que pareciam rivalizar com as originais lá no céu. Vários minutos se passaram assim e então o menino bocejou e se espreguiçou na cama de bambu e depois abriu os olhos assustado. As manchas negras na pele haviam sumido, assim como os vestígios de todos os ferimentos.

– Menina, não sei que magia você fez, mas espero que possa fazer de novo quando eu estiver ferido assim! – Eric exultava de alegria, dançando em volta do amigo um tipo de dança da vitória. Oliver olhava os amigos em volta com um olhar abobado, como o de alguém que é acordado no meio do sono por uma situação completamente diferente.

– Eu imaginei que fosse como os outros filhos dos Deuses. No seu elemento natural certos semideuses se curam mais rápido. Com os filhos de Posseidon é na água, com os filhos de Zeus é na chuva e na tempestade, com os filhos de Hades é ficar embaixo da terra… comigo e com meus irmãos o sol ajuda a cicatrizar as feridas mais rápido. Mas nada assim tão rápido. Não creio que exista as mesmas condições para os filhos de Hermes, Ares ou Deméter. – Jade explicava casualmente enquanto tomava a temperatura de Oliver e com a ajuda de um estetoscópio ouvia o coração do rapaz. Parecia uma médica de verdade.

– Como é que você está irmão? Se lembra de alguma coisa?

– Não muito. Senti que tinha algo errado com as caçadoras, eu acho… resolvi seguir as duas. Quando vi já estavam se atacando. – Oliver ainda estava confuso – eu combati com elas, mas não sei bem o que houve, mas acho que consegui afugentá-las. – mesmo confuso Oliver achou por bem deixar de lado a parte de uma tinha entrado em modo berserk e que um outro lado da sua personalidade tentou assumir o controle do seu corpo.

– Quer dizer que você não sabe por que as caçadoras nos atacaram? – Jade parecia estranhamente inquisidora ao perguntar.

– Não. Não faço ideia. Só vi as duas conversando à distância. Quando cheguei perto o bastante para intervir a Nathália já tinha apanhado mais que Chael Sonnen nas mãos do Anderson Silva.

Nathália se empertigou ao ouvir o nome citado dessa forma. Não sabia quem era Chael Sonnem ou Andeson Silva, mas sabia que vindo, tanto de Oliver como de Eric não poderia ser coisa boa. Ela gemeu ao descer da caminhonete, sendo prontamente amparada por Lucas. Mas mesmo assim ela estava agradecida por Oliver não sabe de nada – ou pelo menos não revelar o que poderia saber.

– E como foi que vocês nos encontraram? – Oliver procurava em volta por seu tablet enquanto tirava do bolso da mochila uma barra de chocolate.

– Eu senti um aperto no peito e um desejo de encontrar com vocês. Senti que tinha algo errado – disse Jade.

– É… eu também senti o meu sentido de aranha disparando. My spider sense is tingling. – disse Eric depois de roubar o chocolate das mãos de Oliver.

Todos olharam para Lucas. Ele estava sentado numa poltrona feita de galhos de goiabeira. Ele olhou para todos e deu de ombros. – Não senti nada… – disse ele continuando a crescer e comer goiabas.

– Bom, já que estamos todos quase recuperados, vamos jantar e depois dormir. Amanha cedo quero pegar a estrada. Já perdemos tempo demais aqui. – Jade soou como uma verdadeira líder. Não havia mais o que fazer… foram dormir.

Clube Pandiá Calógeras. Noite. As três enormes figuras, vestidas de camisetas havaianas, bermudas de praia e chinelos de dedo pararam no exato local onde o grupo tinha acampado, dias atrás. Um deles, algo e magro, cabelos longos e desgrenhados caindo pelos ombros, abaixou-se até o chão e começou a farejar como um verdadeiro perdigueiro. Ele falou com um arrastado sotaque carioca, desses que só se vê em novelas:

– É brother… passaram por aqui sim. Estão deixando uma trilha tão fácil de seguir que até mesmo o mais jojolão dos rastreadores pode seguir.

– Sem kaô para cima de mim. Não estou querendo levar uma vaca nessa não. Você vem bancando o casca grossa desde que saímos atrás desse grupo, mas ainda assim só nos leva para bottons vazios. – disse um segundo, com o cabelo completamente molhado, carregando o que parecia uma enorme prancha de surfe nas costas.

– Tô dizendo! Sem caldo aqui. É só fungar o chão e você vai ver!

– Se é assim, vamos confiar na sua palavra brother. Mas se você errar de novo vai ficar longe do pico por um bom tempo. – O terceiro deles, o maior de todos, tomou a palavra. Parecia realmente assustador, com uma enorme barba loira emoldurando o rosto largo e a boca cheia de dentes pontiagudos. – Vamos que tá na hora arrebentar!


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Os novos herois do Olimpo" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.