As minhas sete ex-melhores amigas. escrita por Rodrigo Lemes


Capítulo 2
Parte I - Eu conheço uma menina ruiva-super-esquisitona.




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/460696/chapter/2

Minha cabeça tá doendo. Minhas costas estão doendo. Minhas mãos estão doendo. Meus pés estão doendo. Abro os olhos lentamente, enxergando tudo embaçado, sem poder distinguir pessoa de objetos. Ouço uma voz feminina falar ao fundo, provavelmente comigo, mas o som agudo parece indecifrável para meus ouvidos, até eu fechar os olhos e dormir novamente.

Não demorei muito a ser despertado novamente, dessa vez por um forte latido de cachorro ao fundo, e quando abri os olhos novamente, eles não estavam tão embaçados como antes. Não demorei a perceber que aquele lugar não era minha casa, nem mesmo um hospital, pois o local tinha perfil de um quarto domiciliar. As paredes alternavam entre vermelho e branco, sendo que longas estantes com livros e CD’s de músicas completavam a paisagem do local. A cama onde eu estava era ligeiramente pequena para mim, e quando olhei para uma mesinha de madeira ao lado, vi um maço de cigarros e um celular preto muito parecido com o meu encima dela.

Levantei a cabeça lentamente, olhando então para uma porta de madeira rústica que estava entre aberta. Na entrada do quarto, uma garota me olhava fixamente com seus olhos cor de mel, sem proferir uma única palavra. Oh, deus, ela era tão bela! Os cachos avermelhados lhe caiam sob o seio como chamas em brasa, que alinhadas as suas sardas no rosto davam um tom de indecisão. A pele parecia branca e fria como neve, destacando assim que sua beleza era como chuva: serena e discreta para algumas pessoas, e para outros, intensa e chamativa,

Naquele momento eu só tinha uma certeza: aquela era a garota mais gostosa que eu já vi em toda minha vida.

Depois de longos minutos me encarando com um olhar incrédulo, a menina ruiva resolveu provar que não era muda.

“Aleluia você acordou, Dante Collins”. Eu já ia fazendo milhares de perguntas, como o porque meu corpo está doendo, e principalmente quem era ela e como sabia meu nome, mas ela não tardou a continuar falando.

“Eu sei que você tem milhares de perguntas para se fazer, mas agora, só responda as minhas, ok?”

“Ok”, assenti, com uma voz mansa e calma.

“Ainda lembra-se de tudo da sua família, quem é você, de onde você veio, etc?”

“Uhum, eu tenho dezesseis anos, minha mãe morreu quando eu ainda era garoto, e eu vim da vagina da minha mãe.”

A menina ruiva deu um riso discreto e tímido, embora eu não ache que minhas piadas sobre vaginas sejam legais.

“Bom, Dante Collins”, ela fez uma pausa novamente, tirando uma cartela de comprimidos do bolso de sua bermuda jeans, até ingeri-los na boca sem o auxílio de água. Engoliu em seco, e logo retornou a falar. “Acho que você tá bem, cara. Eu meio que te atropelei de bicicleta na rua, machucando seu pé direito. Suas costas também ficaram raladas, e você só desmaiou porque estava com um distúrbio emocional na hora que bateu a cabeça no asfalto molhado. Sério mesmo cara, foi mal por tudo isso, é que meu ex-namo...”

“Humm, tá bem”, dessa vez, eu a interrompi. “Você não sabe o que eu daria para ter uma namorada pra terminar, e que mesmo que tudo durasse só um dia, ficar com a pessoa que eu gosto, seria um momento especial o suficiente para ser lembrado por toda sua vida”.

“Você é um babaca, Dante Collins. Não é porque as pessoas que você gosta são umas merdas, assim como você, que você precisa ter esses pensamentos de merdas.” Sua voz agora parecia muito mais intensa, violenta como chamas procurando um lugar para incendiar. Ela sacou um comprido do bolso novamente, antes de retornar a falar. “Bom, eu fucei seu celular inteiro para ligar pro seu responsável e avisar que eu mesmo cuidaria de você e não ia precisar de hospital e tal. Aliás, seu pai está fumando lá na varanda. Mas, indo ao ponto que importa, Dante Collins: você é o maior merda que eu vi na vida. Então se você quiser uma amiga por caridade e tal, pode contar comigo. Eu só não vou te beijar, ou sei lá o que você quiser fazer comigo que envolva algo sexual. Eu posso até te ajudar a arrumar uma namorada gatinha pra você....”

“Eu mal te conheço, e você já está me deixando na zona amizade...” Respondi, em um tom raivoso. Obviamente, ela era uma pessoa arrogante que se achava demais, e de garotas assim eu já estava farto.

“O termo certo é friendzone, Dante Collins.” Corrigiu-me a garota, empinando o nariz num gesto arrogante.

“Que seja caralho, vá se foder!” Arfei cada vez mais nervoso. Acho que todos os vizinhos ouviram meus gritos agudos. “Eu já tô cansado dessas suas gírias de adolescente cool e gostosinha, de ficar me chamando pelo meu nome inteiro, como ELAS me chamavam antes de tudo acontecer.”

“Quem são elas?” Perguntou-me a garota ruiva, remexendo os lábios de curiosidade.

“Hum, são pessoas muito especiais. Mas eu quero ir embora menina-ruiva-super-esquisitona, me deixa sair logo daqui, chama meu pai.”

Ela não disse nada. Ao invés disso, veio até mim em passos lentos, dando uma espécie de abraço para me ajudar a levantar. Seus cabelos ruivos pareciam mais avermelhados e chamativos de perto, seus lábios eram finos e carnudos, e seu hálito tinha cheiro de canela.

“Eu gosto de canela”, comentei, tentando quebrar o clima chato de silêncio.

“Tanto faz. Não quero falar com você até você me adicionar no facebook”, foi tudo o que ela respondeu, ligeiramente ignorante. Não sei se eu a magoei, mas bem, não fui eu que fiquei a chamando de ‘merda’ sem ao menos conversar com ela. Logo, pela lógica básica da vida, eu é que deveria estar magoado.

“Mas eu não sei nem seu nome, cara.”

“Porém, eu sei o seu nome, idiota. E eu já enviei o pedido de amizade.”

“Você é tão misteriosa, menina-ruiva-super-esquisitona”, e então eu apoiei o pé machucado no chão, então deixei escapar um gritinho de dor. Quando estávamos caminhando por entre um corredor que daria, provavelmente para a sacada daquele apartamento, continuei a falar. “Estou curioso pra saber seu nome. Você é tão inteligente e culta, deve ser algo como ‘Minerva’, ou ‘Afrodite’, nomes de deuses e tal.”

“Para de viver nesse mundinho de fantasia, Dante Collins. Meu nome é tão comum quando o seu nome de merda.”

“Pelo seu senso de humor, eu imagino que sim”. E então ficamos em silêncio, até eu chegar mancando até a varanda daquele apartamento, onde se encontrava meu pai e um homem muito parecido com aquela garota ruiva, que obviamente, também era ruivo e possuía uma pele branca cheia de sardas. Sua barba era rala como a de meu pai, e os dois fumavam cigarros enquanto davam pequenas goladas numa caneca de café. Os dois estavam sentados numa pequena mesa branca que só possuía três lugares. A garota de cabelos avermelhados me auxiliou até a cadeira, onde eu sentei-me. Meu pai ficou me regulando com seus olhos acinzentados.

“Tá bem?” Perguntou-me meu pai, num tom razoável de preocupação.

“Sinceramente, não estou muito melhor que um paciente em estado de câncer terminal”.

“Ele tá bem sim”, advertiu a menina ruiva, passando a mão nos cachos avermelhados, “É tudo uma frescura, Sr. Collins.”

“Cala boca maninha!”, gritou o homem que estava ao lado de meu pai na mesa, jogando o cigarro da sacada para a rua. A maneira como ele falou não era um tom de bronca, mas sim um tom de ‘você é chata demais e ninguém quer ouvir você’, embora ela fosse chata demais e ninguém quisesse ouvir ela.

Ela pareceu assentir, e então se retirou da varanda, sabe-se lá por que. E então o homem ruivo dirigiu seu olhar cor de mel para mim. “Você tá bem, Dante?”, perguntou-me ele.

“Tô sim”, respondi de forma tímida.

Ele estendeu o braço em um gesto de cumprimento, e logo depois de sua mão gélida tocar na minha, ele apresentou-se. “Chamo-me Cauã. Trabalho de enfermeiro no posto policial da cidade. Espero que você melhore garoto, e me desculpe, por eu não poder te levar para o hospital, e por minha irmã ser uma completa babaca”.

“Hum... Ok. Tudo bem, cara.”

E então eu e meu pai nos despedimos de Cauã, caminhando lentamente até nossa casa, numa noite silenciosa e fria, que sem dúvida nenhuma viria a fazer parte dos piores dias da minha vida.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "As minhas sete ex-melhores amigas." morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.