Paper Women escrita por MrsHepburn, loliveira


Capítulo 35
Helen Gluck & Vivian Winter


Notas iniciais do capítulo

eu não sei o que eu sinto em relação a esse capítulo mas eu espero que gostem
E ELE VEIO CEDO! Mais cedo que de costume, pelo menos.



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Nessa dia —noite— eu vou para casa mais cedo. O que é estranho porque parece que eu passei uma eternidade com Richard e Becker e os outros ao redor da cama de Vincent, conversando sobre qualquer detalhe e tudo que Richard nos contou antes disso. Há lágrimas. As duas irmãs explodem. O engraçado é que, quando ele apareceu, Victoria o reconheceu. Ela encarou por tanto tempo, que é quase como se ela estivesse copiando seu rosto para dentro das suas memórias. Ela ficou tão chocada que não conseguiu nem abrir a boca para falar alguma coisa. Visia não lembrava dele, mas ela sabia que Vivian tinha um amigo e que é o homem que estava na sua frente, bem ali. Eles o acolheram bem rápido, e logo ele começou a explicar a mesma coisa que tinha explicado para nós. Nessa parte, Becker e eu ficamos no canto do quarto, competindo num jogo no celular de Ian. Mas então, quando Richard chegou na parte dos significados, e como elas estavam participando no plano original de Vivian, ouvimos os soluços e cada um foi consolar uma pessoa. Vincent não chorou, mas apertou a mão de Vis, em consolo. Então eles conversaram e conversaram e conversaram. E o assunto chegou em Helen e eles pararam de conversar. A única pergunta foi de Victoria,

—E o que a gente faz agora? Fala com ela? —e Vincent bufou e disse não. Mas no caminho para o hospital, enquanto eu dava carona para Richard e Becker, ele nos contou que fazia visitas periódicas, mas não falava mais com ela desde que tinha voltado a morar sozinha. Ele sempre se importou com ela, mas não a amava mais. Era como se fosse uma parte dele que nunca iria embora, então ele aprendeu a aceitá-la. Agora que ela tinha sido readmitida no hospital, ele faria outra visita, perguntaria se ela precisava de alguma coisa, falaria com advogados e a polícia caso o que aconteceu com Vincent ficasse grande e ajudaria ela, como se ela fosse uma criança. E então viveria sua própria vida. Richard tem uma esposa agora. Ele tem filhos. Ele fez um bom trabalho superando o passado. Melhor que Vivian. Ele também nos contou que Vivian visitava Helen com mais frequência que ele, e que não achava que isso era saudável porque ela ficava nervosa nos dias seguintes. Tinha que tomar remédios. Eu nunca percebi isso, também, mesmo que eu já tivesse visto ela tomando pílulas entre aulas.

A única promessa que nosso pequeno grupo faz é esperar para ver se Richard tem outro poema, outro nome, e então decidir a partir disso. Nem ele nem Becker falam sobre a possibilidade de ser Ian. Eu também não. E aí eu vou para casa, deixando Richard de volta na escola para pegar o seu carro e Becker em casa. Ela assopra um beijo e grita para eu não esquecer de arrumar as coisas para sábado, que é quando a gente vai para Nova York, vem apartamentos, trabalho, t u d o.

Eu passo a ida para casa pensando em como dizer isso para os meus pais. Quando deixo meu carro na garagem, vejo o carro da minha mãe e o do meu pai também. Me preparo emocionalmente para isso. Lembro da última vez que falei com a minha mãe, e o que eu disse para ela e isso me deixa mais nervosa ainda. Mas quando entro em casa, só vejo minha mãe, fazendo algo na cozinha. Ela está com roupas de trabalho, mas sem o computador, em pé, virada para o fogão. Sem sinal do meu pai.

—O que você está fazendo? —pergunto, corando pelo meu tom incrédulo. Nunca vi minha mãe cozinhar. Quando a família estava reunida, geralmente íamos em restaurantes ou pedíamos comida. Quando Gwen entrou na idade de ser independente, ela fazia comida às vezes. Quando ela foi embora, peguei a mania dos meus pais. Nunca cozinhei na minha vida inteira. Estou em choque.

—Omelete. Você quer? —faço que não, ainda desconfiada, como se isso fosse um sonho.

—Eu não estou com fome. —comi um sanduíche na lanchonete perto do hospital com Ian antes de ir embora, e ele e eu fizemos uma competição de quem conseguia beber o maior copo de milkshake que eles tinham no menor tempo. Meu estômago está meio lacrado agora. Ian apostou cinco dólares que eu ia passar mal. Quanto a ele, Ian disse que tem o corpo de ferro, mas eu apostei cinco dólares que é ELE quem vai botar tudo para fora mais tarde. —Papai?

—No escritório dele. —aquiesço, então lembro do que Becker disse.

—Eu vou para Nova York esse final de semana com Becker. Para ver as coisas da faculdade e apartamentos e trabalho. —aviso, esperando sua reação. Ela só coloca o prato com o omelete na bancada da cozinha, abrindo o computador (aí está!). Em seguida levanta os olhos para mim, a expressão calma.

—Avise o seu pai. —meus ombros caem, em cansaço, e eu espero que ela não perceba. Faço que sim novamente e vou direto para o escritório do meu pai. Inspirando. Expirando. Inspirando. Expirando. Bato na porta. Meus pais tem escritórios separados na própria casa. Inspirando. Expirando. Ele não diz nada, então abro a porta. Ele olha para mim, levantando a cabeça de onde está sentado, com pilhas de papéis na sua frente.

—Pai.

—Diana. —o tom dele parece casual, mas no fundo, eu sinto seu gosto amargo. Não entro. Fico na porta, quase presa em duas realidades, facilitando escapar se ele quiser puxar briga. De novo.

—Eu vou para Nova York com Becker nesse final de semana ver as coisas da faculdade. —termino rapidamente. Assim como com a minha mãe, fico esperando sua reação, sem nem respirar direito. Ele arruma mais alguns papéis e depois olha para mim novamente, sério.

—Que utilidade tem você me avisar se não vai escutar nada do que falamos para você?

—É isso que filhas fazem, não é? Contam as coisas para os pais.

—Filhas respeitam os pais.

—Eu respeito vocês. Eu só não vivo para vocês. —Ele me ignora. Espero mais alguns segundos para ver se ele diz algo mais.

—Então quando você se muda? —Meu Deus. Ele não cansa nunca.

—Se eu conseguir um bom apartamento, em um mês, talvez mais. Posso ficar com Becker por um tempo, se você quiser que eu saia antes.

—Ótimo. —Minha mão está na maçaneta da porta. Mas eu não consigo ir embora. Ao invés disso, falo mais: —Ian, aquele garoto que a mamãe conheceu, ele tem um avô que eles chamam de avô-terrorista. Todo mundo tem medo dele. Até sua própria família. Ninguém gosta dele por perto. Eu não quero que as coisas sejam assim, pai. Mesmo fazendo as escolhas certas, parece que isso não é o suficiente para você. Mas não quero que fiquemos daquele jeito. —eu rezo para que ele saiba quão sério é o assunto, que não é um desejo leviano, é algo que pode melhorar todas as nossas vidas. Assim ele responde:

—Então talvez seja melhor que você só vá embora. —e eu reconheço a raiva e irritação e decepção dele, como sempre, mas as palavras são mais importantes que isso. É como uma permissão, mesmo que ele não tenha as proferido com esse objetivo. É melhor do que congelar minha conta. Eu aceito isso. Aquiesço. Fecho a porta. Passo pela minha mãe no caminho do meu quarto, pego o telefone, caio na cama. Olho ao redor. Desço até a garagem, e encontro minha mãe novamente para perguntar se temos caixas de papelão. Ela parece surpresa, e faz que sim com a cabeça, então começo a procurar até achar. Volto para o meu quarto com algumas caixas e respiro fundo. Para me acalmar, acalmar a mente, me preparando para a mudança, o desconhecido, o fim de alguns laços e o começo de outros. Depois eu começo a limpar meu quarto, guardar roupas, achar objetos na estante, relembrar memórias. Lembro de Gwen aqui. Becker aqui, quando éramos menores. Elas foram as únicas pessoas exceto meus pais que já entraram nesse quarto. Me sinto bem sabendo que elas ainda são as duas pessoas que eu mais confio no mundo, mesmo que Ian entre nisso aí também. E tem Ariel, e a família de Ian, e o padre Jonah. Mas Gwen e Becker estavam aqui desde o começo. Até antes de Vivian.

Eu durmo como um bebê nessa noite. Ian me deve cinco dólares.

No dia seguinte eu tenho literatura. Como as aulas estão acabando, assim como as provas e exames, o professor nos deixa ler o que quisermos. Depois de alguns minutos, Becker levanta a mão. Ele balança a cabeça.

—Eu tenho uma pergunta.

—Que é?

—Você sabe se esse cara morre no final? —Ela levanta o livro e aponta para a capa. Ninguém está prestando atenção em nós —alguns leem de verdade, mas a maioria só conversa enquanto o professor ignora —e Richard Fawkes precisa de um segundo para entender o que está acontecendo e se aproximar. Ele cruza os braços.

—Eu não sei, não li esse livro.

—Ele não morre. —Becker replica, encolhendo os ombros, casual.

—Você achou o poema? —ele me olha, e depois aquiesce. Meu coração acelera, e eu me viro para Becker. Ela parece tão chocada quando eu. Ele vai até a sua mesa e retorna tão rápido que quase não o vejo ir.

—Você estava certa. —murmura, e sou pega de surpresa. Eu estava certa? Só posso estar certa de uma coisa. Ele joga um pedaço de papel em cima da minha mesa e eu leio as duas palavras, como se fossem as únicas palavras do mundo, as únicas letras existentes no alfabeto. Ian Winter. Encaro o papel por mais tempo do que seria considerado normal, mas eu não consigo evitar. As sensações mais estranhas passam por mim. Não é nada nem centrado na Vivian, como das últimas vezes. Não são perguntas. Eu sei o porquê do nome. Eu sei como. Eu conheço a história. É por causa de Ian. Eu só consigo pensar finalmente. Vivian amava-o mesmo. Eu sabia. Essa é a confirmação. Eu sinto como se devesse agradecê-la. Porque é um ciclo que se completa tão perfeitamente. Isso significa tanto para ele, o filho rejeitado, mandado para longe, com todas as suas dúvidas. Eu estou feliz por associação. Ian Winter. É a caligrafia dela. O que será que ela pensou quando escreveu o nome que ela mesma escolheu? Esse era o filho dela. Esse ainda é o filho dela. Ian Winter. Não me parece um nome distante; há um calor no meu coração.

—Ian Winter. —eu digo em voz alta agora, para Becker. Ela não fica emocionada como eu, mas abre um sorriso brilhante que ilumina seu rosto todo.

—Você acertou! Meu Deus! Que loucura...

—Estava no meu escritório, em casa. Bem escondido. Acho... acho que vou mostrar isso para Vincent, também. —diz ele, estendendo a mão. Eu devolvo o papel, sem antes dar uma olhada no nome e na caligrafia familiar outra vez. Eu conheço eles. Os dois. Sim. Um sorriso se forma no meu rosto.

—Ei, pode nos fazer um favor primeiro? —indaga Becker. Ele não responde, então ela continua. —Pode nos levar para ver Helen? Hoje? Antes de irmos ver Vincent. —Richard nos encara como se pedíssemos para ir até a Lua. Ele nos olha como se fôssemos Helen.

—É claro que não!

—Por favor... —Becker usa sua voz persuasiva. Aquela que parte seu coração.

—Vocês estão doidas? Deus sabe qual será a reação dela! Não, não, não.

—Aceitamos as consequências. —eu digo, e Becker espera a resposta expectante. Me sinto meio aliviada e menos assustada em saber que ela ainda planeja ir comigo, mesmo que se recuse a encontrar Helen. É bom saber que eu não estou sozinha, que alguém vai me ajudar, mesmo que ela não queira. Richard intercala olhares entre eu e ela, decidindo qual é a mais doida, provavelmente. —Olha, Becker não quer ir, nem falar com Helen. —digo isso olhando para ela, que assente. —Eu quero. Então é só você me levar hoje, para uma das suas "visitas periódicas".

—Dias depois de ela atacar Vincent? —encolho os ombros, porque não tenho argumentos contra isso.

—O que você tem a perder? —Becker pergunta. —Isso é importante pra Diana, por motivos que nem sempre fazem muito sentido. Mas não vai matar ninguém nos dar uma ajudinha. —As palavras "matar ninguém" ecoam em nossas cabeças, um nuvem negra. Um silêncio pesado vem depois disso, mas logo passa quando Richard balança a cabeça e responde.

—Vocês enlouqueceram.

—Grande coisa. Por favor.

—Por favor. —repito as palavras de Becker. —Eles só vão me deixar entrar com alguém na lista de visitantes. —ele me olha intrigado, então explico sobre nossa tentativa de contato com Helen e sua expressão, se isso for possível, fica ainda mais incrédula. Posso ouvir seus pensamentos gritando PIRADA! e não me sinto nem um pouco repelida. Quando você quer alguma coisa com muito fervor, o limite do ridículo fica meio borrado.

Mais um segundo se passa e ele reveza olhares novamente, e quando ele percebe que não vamos desistir de implorar, seus ombros caem em rendição.

—Eu devo estar ficando louco. —diz ele, balançando a cabeça, olhando para o resto da sala, onde ninguém tem a menor ideia do que estamos falando, nem estão prestando atenção. Gordon está no final da sala, lendo um livro sobre Woody Allen e Robbie não veio para a aula hoje, porque segundo Becker, ele está treinando com o time antes de competir uma última vez pelo time da escola. Sei que é verdade porque posso vê-lo da janela da sala de aula, no campo, é só eu levantar da minha cadeira. Quando ele termina de escanear e sala e é forçado a se focar em nós, suspira mais uma vez dramaticamente. —Vocês ficaram loucas.

—Talvez.

—Quinze minutos. Eu vou deixar você entrar por quinze minutos, depois você vai embora. Eu estou falando sério, Diana. —aquele tom de reprimenda volta, como em outras aulas. Eu concordo com um movimento, ele relaxa, mas não o suficiente para não nos deixar nervosas. O clima está tenso agora. —Me esperem depois da aula. —Aquiescemos. Pelo resto da manhã, Becker fica em silêncio e eu começo a ficar preocupada. Ela tem seus dias ruins, mas é algo mais. Eu espero até o final da aula, quando estamos a caminho do meu carro, para perguntar o que tem de errado. Ela me olha meio triste.

—Não deixe a Helen fazer nada com você.

—Claro que não. —ela faz que sim, bem quanto encontramos Richard no estacionamento. Dessa vez, vamos com carros separados. Eu e Becker, seguindo o carro de Richard mesmo que eu saiba o caminho. Puxo conversa com Becker sobre qualquer coisa, focando a conversa em Robbie para deixá-la menos nervosa com o que eu vou fazer. Consigo arrancar um sorrisinho apaixonado dela antes de chegarmos. Eu estaciono o carro, e Becker me abraça.

—Tudo bem se eu não for, não é? —Faço que sim.

—Não se preocupe. Eu volto daqui a pouco. —trocamos sorrisos cúmplices, e eu encontro Richard na entrada no hospital, me esperando. No balcão de informações, encontramos uma mulher diferente da que nos atendeu da última vez. Richard fala com ela, e ela confere seu nome na lista, então olha para mim.

—Ela está comigo. —Ela aquiesce, mas a expressão impassiva não some. Será que não vou entrar de novo?

—Maior de dezoito? —dessa vez, estou preparada. Pego minha identidade e mostro para a mulher. Ela pega papéis e preciso assinar algumas vezes, algo como um contrato para a minha segurança. Richard disse que é preciso. —Devo colocar o seu nome na lista? —pergunta para mim.

—Não. —responde Richard. Ela não parece satisfeita, porque olha para mim como se não escutasse Richard. Gosto dela nessa mesma hora. Mas eu repito a resposta dele, e então ela assente novamente e nos dá uma pulseirinha azul, indicando o caminho certo a seguir. A ansiedade que eu tinha escondido para não deixar Becker nervosa volta a tona, meu coração voando para fora do meu corpo, minhas mãos tremendo. Eu queria que Ian estivesse aqui. Eu queria que Becker estivesse aqui. Mas se a única opção é essa, eu aceito. Mesmo assustada. Será que era assim que Vivian se sentia? Será que Richard se sente assim? Olho para ele ao meu lado e a sua expressão é calma, sem dar nenhuma evidência de qualquer coisa, na verdade.

—A sua mulher sabe sobre Helen? —indago, curiosa, e ele faz que sim.

—Ela nunca veio visitar, se é o que você quer saber. Mas como eu disse, isso é uma parte da minha vida, e ela aceita isso.

—Estou feliz por você. —murmuro, pensando em Vivian. —Estou feliz por, sabe, conseguir superar isso. —Ele aceita minhas palavras.

—Demorou um pouco, uns vinte anos.

—Mas você está melhor agora?

—Sim.

—Você não fica nervoso vindo aqui? —ele me encara rapidamente, considerando o que eu disse.

—Não. —responde ele, finalmente, e então para em um corredor azul. Eu lembro de um estudo sobre as cores que eu li um dia, sobre representar paz e calma. Talvez seja por isso que o choque da cor intensa me atinge. Só que eu só fico mais nervosa ainda, pois um homem que parece um guarda, mas se veste com roupas brancas nos para e faz perguntas. Mostramos a pulseirinha, e eu leio "Helen" no lado de dentro dela, que eu não tinha visto antes. Mostro isso, também.

—Me sigam. —o homem se vira e começa a andar. Passamos por quartos, todos com as portas abertas. Alguns com visitantes, mas a maioria em silêncio, apenas com o paciente lá dentro, fazendo alguma coisa. Há câmeras por toda parte. Isso parece uma prisão.

Paramos em uma entrada, onde assim como os outros lugares, a porta está aberta. Só que não passamos pela porta, para Helen não nos ver. Paramos uns dois metros para trás.

—Vocês vão entrar juntos? —o homem pergunta. Richard balança a cabeça, aponta para mim e eu quase desmaio. Passo cinco minutos ouvindo instruções sobre o que é adequado ou não de se falar em cada situação, o que eu devo evitar fazer (muitos gestos repetitivos, andar de um lado para o outro, muitas perguntas seguidas, toque, etc) e o que é recomendado (manter contato visual, distância, firmeza na voz, sorrir), parece que estou sendo treinada para algum teste. Quando chega a hora de entrar, o homem solta uma risada. É tão estranho ouvir esse som num lugar que me deixa tão agitada. —Não se preocupe, moça, eu vou estar lá o tempo todo.

O alívio me deixa tão confortada que eu sinto meus músculos —antes tensos —se tornarem gelatina. Quase choro. Ele continua sorrindo para me trazer mais confiança até eu estar pronta para entrar.

E isso tudo que eu senti antes some. A confiança, a calma, a sensação de estar preparada. As palpitações do meu coração são tão rápidas e é tão alto que quando entro e a primeira coisa que vejo é Helen, não escuto o que o homem diz ao meu lado. Só o meu coração e o meu pânico. O que vem em seguida me acalma um pouco. Helen, numa cama de hospital, com um daqueles tubos inseridos no braço e com máquinas do lado da calma. Uma bolsa com um líquido que vai até o tubo, e uma aparência doentia. Meu medo passa, porque eu sei que ela não vai fazer nada. Seu rosto está tão pálido que as marcas e olheiras embaixo dos olhos são evidentes até demais. Magra demais. O cabelo com fios brancos, se eu prestar atenção. A única coisa viva são seus olhos. Eles dançam, olhando por toda parte.

—Helen, essa é...

—Diana. —eu digo, respirando fundo. Firmeza na voz. —Eu não sei se você lembra de mim. —olho para o homem, a procura de um sinal de que estou fazendo isso certo e ele assente. Volto-me para Helen. Suas sobrancelhas quase se juntam, e ela franze o cenho.

—Não lembro de você. —Me arrepio ao som de sua voz, e a adrenalina daquele dia, do que ela fez com Vincent volta em ondas que demoram para passar, mas eu tento esconder. Mantenho minha distância. —Acho... acho que eu já sonhei com você. Você é um anjo?

—Ela não é um anjo, Helen. —interrompe o homem. Preciso descobrir o nome dele. Os olhos dela voltam a se focar em mim.

—Eu sou amiga do Ri... Vincent. —A expressão dela é de surpresa, sobrancelhas arqueadas, a boca aberta, só um pouquinho. Será que ela lembra do que aconteceu? Eu espero.

—Vincent? Como está aquele garoto? —Ela sorri abertamente, mostrando todos os dentes, e eu fico parada por um segundo sem entender. Ela parece uma daquelas amigas antigas que você reencontra na rua e tenta colocar a conversa em dia. Meus olhos vão para o homem do meu lado, e ele assente novamente. Só converse. —Por que ele não veio me visitar? Ele nunca veio me visitar.

—Ele está no hospital. Você...

—Não! —Agora ela parece chocada e furiosa, uma fusão das duas coisas. Eu dou um passo para trás quando ela grita, assustada. O homem se aproxima. —Robert, você ouviu isso? —Ela pergunta para o homem, Robert, quando ele se aproxima e toca no seu braço. Acho que ela está tentando distraí-lo antes que ele faça alguma coisa com ela. —O que aconteceu com ele?

Helen não lembra de nada.

Ele sofreu um acidento. De... carro.

—Ah, meu Deus! —ela leva a mão com o tubo até a boca, cobrindo-a. —Pobrezinho. Agora eu sei a razão para Vivian não ter me visitado! Ela está com Vincent! —Ela sorri, tão doce, tão inocente, e eu me pergunto onde está a mulher descontrolada que machucou Vincent. Ela nem lembra de ter feito isso. Mas então eu paro, abruptamente e reviso suas palavras. Ela está com Vincent. Presente. Vivian no presente. Ela não sabe que Vivian morreu? Eu não sei o que dizer. Penso em uma mentira rápido, para ela continuar falando.

—Ah... sim, ela está ocupada.

—Oh, você conhece ela? Vivian? —Engulo seco.

—Conheço. Ela era... é... minha professora.

—Ai meu Deus! Não! Há! —Ela cobre a boca novamente, sorrindo tão radiante que é como se o sol entrasse no quarto. Não entendo. Mas aquiesço de qualquer forma. —Espere, como é seu nome outra vez?

—Diana.

—Diana! Sua menina maravilhosa, ela me contou sobre você. —Apesar de tudo, sorrio.

—Há quanto tempo você não fala com Vivian?

—Eu não sei. —Ela responde pausadamente, a expressão como a de uma criança. Olha para baixo, de repente triste. Helen é tão confusa. —Muito tempo. Feliz aniversário, aliás, querida Diana. —Quando olha para cima novamente, ela está cheia de doçura. Um incomodo se forma no meu coração, uma vontade de sair correndo.

—Aniversário?

—Vivian estava falando sobre o seu aniversário. —ela sorri como se fosse minha melhor amiga, e tivéssemos segredos compartilhados e anos de história, não uma pessoa em comum que nos conecta. Me pergunto o quanto é a realidade e o quanto é fantasia na sua cabeça. Essa mulher matou o pai de Victoria, o próprio bebê, e namorou Richard. E era a melhor amiga de Vivian e estragou tudo. Agora ela fala comigo como se tivesse quinze anos. —Sabe, no dia que ela veio aqui. Eu acho que eu sei porque ela está demorando tanto. Diga a ela, se você a encontrar, é claro, que eu estou pedindo que ela esqueça o que eu disse e venha me visitar. É muito chato aqui. —Ela continua sorrindo, mas não consigo manter a máscara. Meu cérebro tenta juntar os pontos perdidos.

—O que você disse? —Helen balança a cabeça. —Por que ela parou de te visitar?

—Não se preocupe, darling. —Eu não respondo. —Nós brigamos muito. —Ela encolhe os ombros, como se isso fosse nada de mais. O gesto é até meio arrogante, como aquelas pessoas que se recusam a reconhecer que erraram. Ela deve ter dito alguma coisa para Vivian. Eu lembro do que Richard disse, sobre Vivian ficar nervosa sempre que visitava Helen. E se ela veio antes do meu aniversário...

—O que você disse à ela?

—Isso não é importante. —O homem (Robert?) se aproxima dela novamente, e eu posso ver que ela está alterada. Cancelar, cancelar, cancelar. —Só peça para ela vir. Ela precisa parar de ser tão vaca, às vezes.

—Helen... —Robert ameaça. A expressão de Helen fica cem porcento irritada.

—Me desculpe, eu esqueci adultos não podem xingar. Bem, ela foi uma vaca, Robert. —o volume da sua voz aumenta. —Uma vaca!

—Por quê?

—Nada é bom pra ela! Ela sempre quer o que eu tenho! Filha da puta. Estou mandando, mande-a vir aqui! Ela não precisa agir como uma idiota só porque eu disse umas coisas. Deus! Vaca! Você me escutou? —O rosto dela está vermelho. Ela está explodindo, e eu também. É como se eu tivesse corrido uma maratona. Eu quero correr uma maratona, fugir daqui.

—Essa visita acabou. —Robert diz, olhos arregalados, voz forte. E então Helen explode em lágrimas.

—Me desculpe! Me desculpe... diga isso à ela. Eu não queria... eu só queria que ela... peça para ela me desculpar. —Ela leva as mãos ao rosto, com uma expressão que me faz entender porque ela significa toda a dor de Vivian. É um remorso profundo e uma loucura que ninguém pode salvá-la, e não sei se há alguém que consiga amá-la desse jeito. Ela chora e chora e chora mesmo que Robert tente consolá-la. Me sinto tão perdida. Descontrolada. Meu coração partindo em milhares de pedacinhos, por razões diferentes.

—Ela morreu. —eu sussurro, e eu não acho que ela me ouviu, então saio do quarto, respirando forte, com o nó na garganta e preparada para deixar isso tomar conta de mim por inteiro, deixar isso sair, esse sentimento horrível, essa culpa e a percepção. Vivian estava aqui antes do meu aniversário. Ela brigou com Helen.

No corredor, eu olho para Richard, que mantém o rosto vazio, mesmo depois de ver o meu prestes a derramar lágrimas. Não confio na minha voz, mas me forço a falar.

—Sobre o que elas brigavam? —ele demora para falar, também. Seu rosto está sério. Ele está sofrendo tanto quanto nós todos. Os soluços de Helen no quarto me assombram, e quando ela grita, Richard pula no lugar, fechando os olhos. Se recompõe e me explica.

—Vivian não podia ter filhos. Ian foi um milagre. Ela culpava Helen pela sua incapacidade de ser uma boa mãe. Helen —ele faz uma pausa, a voz falhando. —jogava isso na cara dela. Que Vivian não conseguia cuidar de ninguém. Nem mesmo de Helen e do... bebê dela.

Eu sinto. Eu sinto o fogo da dor e da saudade e do remorso e da pura compaixão por Vivian subir em mim, me queimando durante o trajeto. Eu fecho os olhos tão forte para tentar segurar isso dentro, mas eu não quero mais. Quero isso fora. Abro os olhos novamente.

—Você vai pro hospital falar com Vincent sobre Ian? —Ele aquiesce. Eu aquiesço.

Estou me distanciando no corredor, então. Eu me deixo chorar, primeiro desesperadamente, idiotamente, sem pensar em razão nenhuma, apenas porque tenho esse fogo que preciso apagar, eu tenho esse amor por Vivian que não suporta toda a dor. Eu ouço vozes me chamando quando eu saio do hospital, mas ninguém vem atrás de mim. Escuto minha voz de novo vindo de Becker, e vou ao seu encontro. Ela abre a sua porta do carro e espera eu estar perto, sem perguntar o que aconteceu, mas eu vejo ela escaneando meu rosto e o meu corpo para ver se eu não estou machucada. Não me machuquei, quero garantir a ela. E mesmo com a choradeira sei que é verdade. Por dentro e por fora, eu não estou machucada. Só magoada. E quando Becker fica do meu lado, no meio do estacionamento, só apertando meu ombro, meu choro tem motivo. Porque Vivian não merecia isso, a culpa, a rejeição, a falta de esperança. Não era isso que ela era. Ela era viva e vibrante e boa, tinha um bom coração. Helen estava errada quando disse que ela não conseguia cuidar de ninguém. Ela cuidou de mim. Eu choro por Vivian, pelo que ela não conseguiu fazer, sentir, pensar sobre si mesma. Porque ela nunca verá Ian se tornar uma pessoa tão boa quanto ela era, ou ver como a sua família está agora. Ela nunca vai se apaixonar de novo ou usar sapatos malucos. Mas eu lembro sobre o significado de todo mundo na vida dela, e eu choro porque Ian significa futuro, e ele ainda está aqui. Ela ainda tem um futuro. E eu choro porque o seu futuro vai ser melhor que a vida dela. Lágrimas para o passado, para a morte. Meu Deus, isso dói. Eu respiro fundo. E então começo outra vez. Mas agora, são lágrimas de rendição, de adeus, de obrigada, lágrimas pela vida, pelo presente. Que continua aqui, com oportunidades de perdão e segundas chances e felicidade e amor, por causa de Vivian, por Vivian. Que continua aqui, gloriosamente, dolorosamente acontecendo. Você fez isso, Vivian. Obrigada.

E então eu paro de chorar. Limpo as lágrimas, mas dentro de mim me sinto molhada, refrescada, leve. Becker dirige, nos levando para longe disso, longe da dor, perto do futuro, de Ian, de tudo de bom que Vivian deixou para trás. É o suficiente para eu me sentir completa.


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Notas finais do capítulo

qualquer dúvida, erro, me avisem. O que acharam? Eu chorei um pouco no final (mas eu sou como a Diana, eu choro por tudo) então só posso falar por mim mesma. E *agora chorem comigo* a história só tem mais um ou dois capítulos. TA ACABANDO!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!



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