Paper Women escrita por MrsHepburn, loliveira


Capítulo 36
O Futuro


Notas iniciais do capítulo

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Victoria foi buscar os filhos em Sterling Lake, porque o marido tinha que ir embora outra vez, então Ian me implorou para que eu fosse no mercado, comprasse todas as porcarias de criança possíveis e voltasse para casa dele para cuidar dos seus primos, porque ele e Visia tinham que assinar os papéis do hospital e da policia. Becker até poderia vir comigo, mas a polícia estava lá e eles precisavam de duas testemunhas para contar o que aconteceu com Vincent, e ela teve que ficar. É por causa disso que eu não vejo a reação de Ian quando Richard conta que ele é o último e primeiro nome da lista. Não tive nem tempo de avisá-lo ou prepará-lo para isso. Só posso imaginar. Não é tão difícil, porque depois de fazer tudo que Ian me pediu e ir para casa dele esperar Victoria chegar com as crianças, Becker liga para o telefone de casa dele, e eu atendo (como ela sabia que ia acontecer) e me conta. Ele chora.

—Não que deixe ninguém ver. —disse ela. —Ele está no corredor, sozinho, chorando. Eu fui lá e conversamos, e eu tentei consolá-lo mas... acho que ele só precisa de tempo pra se recuperar. Não é como se a notícia fosse horrível.

Isso deixa meu coração pesado, mas mesmo assim, não tenho tempo de pensar nisso por muito tempo. Logo Victoria chega —e as cinco crianças também —e eu estou ocupada demais para pensar em qualquer coisa. Yoshi e Yuri me estranham no começo, se perguntando onde está Ian e porque eu estou ali e reclamando que eles querem a mãe de volta. Victoria murmura um "me desculpe" quando vai embora, e só entendo isso quando os dois começam a correr a minha volta, em círculos, gritando. Então Zoya (que sempre me pareceu tão calminha) começa a gritar para eles pararem e Yasha tem que vir me ajudar, porque Lena começa a chorar no meio desse rebuliço. Ele pega a irmã mais nova no colo e pede que eu coloque num canal infantil. Assim que boto um filme em que Yuri e Yoshi estejam de acordo, os dois se acalmam. Eu pego giz de cera e papéis para as duas meninas e elas ficam desenhando na cozinha, enquanto eu e Yasha conversamos e conseguimos ter uma visão dos dois menores na sala, quietos por enquanto. Nós conversamos sobre o pai dele, mas ele não sabe muita coisa a não ser que ele é russo e viaja bastante. Mas é um bom pai. Ele liga toda hora. Não precisa ser um pai fisicamente presente para estar lá emocionalmente. Acho que ele percebe o peso de suas palavras quando fala. Ele me pergunta sobre os meus e eu conto sobre a minha irmã e as brigas, e como ele é meio "que seja" com tudo, só diz:

—Que merda. —e é até reconfortante, saber que os seus problemas não são dignos de tanto drama, não são grandes o suficiente para preocupar outra pessoa. Te dá clareza.

—Merda, mesmo. —Eu digo. —Mas a minha mãe melhorou.

—Mães são legais. —Eu sorrio. Não cabe mais conversa entre nós porque Yuri vem ao nosso encontro e senta no colo de Yasha, segundos depois começa a chorar. É o choro de bebê, e ele até faz biquinho. Quero apertá-lo.

—FOME! —Ele grita, e eu e Yasha reviramos os olhos. Eu retiro uma caixa de cereais que comprei no supermercado, mas Yuri começa a chorar de novo. —Esse NÃO TEM COR!

—Ele gosta do colorido. —diz Yasha, como se não fosse óbvio. Guardo o cereal e tiro o outro, com as cores e sabores de fruta. Yuri grita de satisfação.

—Yuri, você tem que parar de gritar.

—MAS EU ESTOU COM FOME.

—Eu só vou te dar o cereal se você parar de gritar.

—AH MEU DEUS, VOCÊ É MÁ! SUA BOBA!

Boba?

—Boba? —eu pergunto, tentando conter minha risada.

—Boba é o sinônimo de babaca no dicionário dele.

—Babaca é feio! —exclama Yuri.

—ESTOU COM FOME. —Yoshi grita da sala.

—Não é pra repetir o que eu digo, seu idiota. —Yasha dá um empurrãozinho no irmão. Eu respiro fundo, e peço para ele pegar o cereal para Yuri enquanto vou até a sala. Yoshi está deitado no sofá, com as pernas para cima, assistindo o filme de cabeça para baixo. Demora para eu abrir a boca e voltar a consciência.

—Uh... Yoshi, o que você está fazendo?

—Estou fazendo o sangue subir para a minha cabeça, eu ouvi que te deixa mais inteligente.

—Isso é mentira. —Eu digo, puxando-o para cima. —E tecnicamente, você está fazendo o sangue descer. Não faça isso. Você quer o cereal normal ou o colorido?

—O normal. O colorido é horrível.

—Então vamos para a cozinha. —Guio ele, segurando seus ombros, até chegarmos na cozinha. Acho que Yasha já estava preparado, porque quando eu entro, ele estende o cereal para Yoshi. O irmão mais novo segura, mas os olhos estão em Yuri. Yuri percebe a atenção e para de olhar para o seu cereal e seus olhos caem em Yoshi. Então...

—UUUUUUIIIIIIIIIII. —exclama ele. Parece que cada letra dura uma eternidade. Sua expressão é de puro nojo, e eu não sei como alguém tão novo pode sentir isso com tanta intensidade.

—EU NÃO QUERO VER O YURI COMER ISSO! EU VOU VOMITAR!

Meu Deus. Eu vou ficar louca.

—Então coma na sala! —grito, não tão estridente quanto eles, a última evidência de que eu sou uns dez anos mais velha nessa situação.

—O Ian vai ficar puto. —comenta Yasha, e eu o encaro com mais raiva do que esperava, perdida na balança.

—E eu vou ficar doida da cabeça.

—Bem vinda a família, prima. —Ele levanta um copo de refrigerante (que eu não vi ele tirar da geladeira), como uma saudação. Eu balanço a cabeça, tentando manter minha desaprovação bem clara, mas assim que ele começa a rir, eu vou junto. Talvez o mundo seja feito para os doidos da cabeça. E no fundo, eu sei que eu adoro cada um deles. Mesmo que eu esteja sentindo como se precisasse tomar uns cinco energéticos. Yasha empurra um copo cheio para mim também, e eu reviro os olhos mas o levanto também. Bem vinda a família, Diana.

—O que é ficar doida da cabeça? —pergunta Lena, com sua voz delicada. Ela é a mais quieta de todas, desenhando no canto da cozinha. Respondo ela ao mesmo tempo que observo Yoshi ir até a sala, assistir seu filme, com o cereal na mão como se fosse uma arma. Isso me lembra Eric. Fico meio triste.

—É só... ver as coisas de uma outra maneira.

—Inteligente. —murmura Yasha, olhando para o celular com atenção. Ele vai até a sala, sem nem piscar e se joga no meio de Yuri e Yoshi. Fico parada na porta da cozinha, observando. Yuri, depois de alguns segundos, se arrasta mais perto de Yasha. O irmão mais velho mexe no cabelo do mais novo, enquanto eles assistem o filme. Sinto uma falta horrível da minha irmã, e uso o telefone da casa de Ian para ligar para Gwen. Como eu sei que eles vão demorar para voltar para casa e que não tenho nada melhor para fazer, ligo na intenção de poder conversar por bastante tempo. Quero contar sobre a conversa com a mamãe, e o que meu pai disse mas Gwen está ocupada com o trabalho.

—É dia de semana. As coisas estão corridas. —Ela explica, a voz cansada, mas isso é um bom sinal. Se há trabalho, é porque as coisas estão dando certo. Eu conto rapidamente sobre a mamãe, e ela promete me ligar depois. —Me desculpe mesmo, Diana. Eu só...

—Não se preocupe. —Tento acalmá-la. —Foi meio idiota eu ligar agora, eu falo com você depois. Estou com saudades.

—Eu também! Claire também! Se esse final de semana for lucrativo, prometo que compro as passagens de avião na semana que vem.

—Você acha que é possível você ir falar com os nossos pais quando vier? —Gwen fica quieta por um segundo, hesitante ou pensativa.

—Uma coisa de cada vez, está bem? —Reviro os olhos, mas sei que não posso colocar pressão nela. Gwen tem suas próprias mágoas. E se tem uma coisa que eu aprendi com Vincent, Vivian e até eu mesma, é que cada um tem o seu tempo. Para curar machucados ou até mesmo abri-los, para depois lidar com eles. E eu não posso salvá-la, mas vou estar aqui apoiando, amando-a para sempre. É suficiente. Quando minha conversa com a minha irmã termina, tenho outras duas irmãs para cuidar. Lena e Zoya começam a bocejar ao mesmo tempo que escurece lá fora. Eu tenho que ligar para os meus pais, minha mente não me deixa esquecer. Se a situação está melhor agora, não quero estragar tudo. Mas primeiro, tenho que colocar as duas meninas na cama. Yasha diz que a viagem de trem é cansativa para elas, por isso ficam com sono tão cedo. Pergunto para ele em qual quarto elas podem ficar, porque sinto como se estivesse invadindo a privacidade de Ian agora.

—Elas geralmente dormem no quarto que era da Vivian, com a minha mãe. —E então ele se levanta (Yuri protesta) e me guia até lá. Eu engulo seco, e olho para dentro do quarto. Me sinto meio idiota agora. Nunca pensei sobre onde Vivian dormia. A casa sempre pareceu um cômodo só. Nada indica que ela esteve aqui. O papel de parede é florida como o resto da casa, e a cama é diferente da de Ian, é alta e chique, cheia de travesseiros. Sem muitos móveis. Estantes vazias. Me pergunto como era quando ela estava viva, mas me distraio porque Zoya boceja novamente. Yasha dá um beijo nelas e me deixa sozinha para fazer o resto do trabalho. Elas trocam de roupa, colocando seus pijamas iguais, e entram na cama enorme. Sobra espaço para mais umas duas pessoas aqui, pelo jeito como elas são pequenas. Lena me encara.

—A mamãe vai demorar? —faço que não.

—Ela já vem. —ela faz que sim. —Para baixo das cobertas. —instruo a elas, e as duas fazem o que eu peço. Quando estão prontas, não consigo resistir e dou um beijo na testa de cada uma, me perguntando se o modo como estou me sentindo é igual ao que Gwen sente com Claire. Protetora. Me sento na cama.

—Você vai casar com o Ian? —Zoya me pergunta.

—Eu não sei. —respondo honestamente. —Espero que sim. —deixo escapar, e elas sorriem para mim de tal forma que não consigo evitar e sorrio de volta.

—Se você casar com ele, vai ser legal porque ele não viaja muito como o meu pai então vocês vão se ver o tempo todo. —É uma lógica estranha, mas meu coração aperta.

—Ei, viajando ou não, o pai de vocês ama cada uma bastante.

—Como é que você sabe? —Lena pergunta, a voz fina.

—É —concorda Zoya. —você nunca conheceu ele.

Então eu respondo a única coisa no meu coração.

—Porque vocês são a família dele. —elas ficam em silêncio. —Agora, durmam. Boa noite.

—Boa noite, Diana. —replicam elas, em uníssono. —Nós também esperamos que você case com o Ian! —uma delas sussurra, mas como apaguei a luz, na escuridão não consigo distinguir quem é quem. —Mas não conte para ninguém! —Um risinho bobo me escapa e eu fecho a porta, voltando para sala. Os três irmãos estão super energéticos, mas quando escuto um carro chegando na garagem, algum tempo depois, eles também estão cansados demais para fazem qualquer coisa.

Mas eu não. E assim que Ian aparece na porta, eu estou na frente dele, com uma urgência repentina. Só consigo lembrar das palavras de Becker: ele chorou. E ele sente a urgência também, porque me abraça tão forte que não consigo respirar direito, uma mão no meu cabelo, a outra nas minhas costas. Não dizemos uma palavra. Eu nem vejo as tias dele chegarem, porque eu fecho os olhos. Um segundo de silêncio passa. Eu relaxo em seus braços. Isso é estar apaixonada. É tudo tão calmo. Beijo o ombro dele, por cima da sua blusa, e a sua bochecha e lábios. Não aprofundo o beijo, porque sei que Victoria e Visia estão ali, mas é um gesto delicado. De coração. Abro os olhos e ele continua ali, Ian, me encarando como se eu soubesse algo que ele não sabe, ou como ele soubesse de algo que eu não sei, como se eu fosse extraordinária. Seus olhos ainda estão meio vermelhos, e ele os fecha quando meus dedos entram em contato com a sua pele.

Ouvimos um barulho do nosso lado.

Visia.

Mas justo quando ela vai fazer um comentário, Victoria aparece, parecendo surpresa. Como se estivesse na casa errada. Nem presta atenção na nossa posição.

—O que aconteceu com os meus filhos? Porque estão todos tão... calmos? —Ela está com Yuri nos braços, e acho que ele já está dormindo.

—Eu vou para o meu quarto com a Diana. Não vou engravidá-la. —Victoria só balança a mão livre, nem nem ligar para o que Ian disse. Ela está conversando com Yasha. Visia já abre a geladeira. Ian segura a minha mão e voa comigo até seu quarto, fechando a porta atrás de mim e quando nossos olhos se cruzam, tudo que eu pretendia dizer morre e meu coração acelera. Ele tira o pedaço de papel do bolso da calça e joga na sua cama.

—Você sabia? —pergunta ele, a voz tão frágil e baixa. Faço que sim.

—Uma parte de mim sempre soube.

—Por que você nunca me disse nada?

—Porque eu poderia estar errada. E eu queria ter certeza. Me desculpe, Ian. —Ele balança a cabeça, num gesto de que diz que já estou perdoada, e eu me aproximo. Pego o papel, leio o seu nome e a mesma sensação de clareza e leveza que senti hoje de manhã vem outra vez, tirando qualquer vestígio de dor que eu senti hoje com Helen. Águas passadas. —Sabe o que isso significa? Que você foi o começo. Pelo menos no meu ponto de vista. Você começou e terminou isso.

—Ela não me deu um poema. Ela escreveu uma carta. —diz ele, e então se afasta e começa a remexer suas gavetas, do lado da cama. O quarto de Ian não parece o quarto de um garoto. É arrumado e simples. Organizado. Ele volta para mim e me estende outro pedaço de papel, mas eu recuso. Isso é pessoal. Pessoal demais. Entretanto, ele se mantém firme, até que eu segure a carta, com o coração acelerando. Estou prestes a descobrir um pouco mais de Vivian, mais algumas palavras que ela nunca disse em voz alta. Mais dela. Olho mais uma vez para Ian, e ele assente, me dando segurança. Então leio.

Ian,

Você pode me odiar. Eu te dou permissão, mesmo que não queira. Sempre que alguém morre na minha vida, eu fico com raiva. Então tudo bem. Você não tem que me amar. Eu sei que eu fui uma mãe de merda e assumo a total culpa. Sem desculpas. É meio tarde pra mudar alguma coisa agora, não é? Me desculpe. Sei que você quer respostas que nunca vou dar, e mesmo se continuasse vivendo, não sei como as responderia. Você me odeia? você pode perguntar. Eu não te odeio. Eu te amo. Mães de merda fazem o melhor que elas podem, e eu fiz o que achei que seria melhor para você. E acabou dando certo e tudo errado. Por que ela fez isso? você vai se questionar. Não posso responder isso. É grande demais. Sei que se você vai se culpar, porque temos o mesmo coração. Não é a sua culpa. Você foi o meu milagre. E agora eu peço desculpas por tudo. Porque eu sou a razão de você beber tanto, ou dormir com aquelas garotas que nem convertidas a freiras iriam te merecer. E você merece alguém incrível. Desculpe por ter te mandado para a casa do seu pai, e desculpe por ser uma dor de cabeça. E também obrigada. Você poderia ter escolhido me tratar de uma maneira bem diferente do que me trata, e escolheu o caminho certo. Ou tentou. Obrigada por tentar me perdoar. Espero que algum dia você consiga. Obrigada pelas nossas conversas e pelos poemas. Posso não ter te tratado como um filho deveria ser tratado, mas você é um bom amigo. E eu quero que você saiba que está tudo bem se você não me amar, realmente. Mas nunca se esqueça que eu te amo.

Agora preciso de um favor. Pode me chamar de filha da puta mas eu prefiro que me xingue e depois faça o que eu vou pedir. Tem essa menina, eu sei que você sabe, a Diana. Há um envelope para ela na minha mesa, e eu preciso que você entregue. Aquela minha aluna. Faça quando estiver pronto. Fale com ela, também. Tenho uma sensação que você ia gostar dela. O sobrenome dela é Novak. Está escrito no envelope. Preciso que entregue pessoalmente. Procure por ela na escola, e veja se está bem por mim. Uma última coisa. Cuide das suas tias e dos seus primos e seja um bom marido e um bom pai e por aí vai. Sei que você vai ser, eu falando alguma coisa ou não. Mas só relembrando, não seja babaca. Lembre-se de mim. Desculpe por não ter as palavras certas. Mas você vai ficar bem, e eu também. Essa é a carta menos desesperadora que consegui escrever, então talvez deva parar por aqui antes que não consiga mais pensar no que estou escrevendo. Estou calma, agora. Não tenho medo de morrer. Eu quero estar livre. O mundo é pequeno demais para mim.

Mas só está começando para você. Seja muito, muito, muito feliz e não tenha medo de crescer ou de ser criança. Eu te apoio em tudo que decidir fazer (menos ficar bêbado e fazer alguma coisa idiota). Você me entendeu. Sempre entende, e eu não preciso dizer nada.

Sua mãe, Vivian.

Olho para cima. Conto minhas respirações e meus olhos se conectam com os de Ian e o mundo fica em silêncio, e nós estamos em uma bolha que não consigo romper nem que eu queira.

—Você sabe o porquê de ela te chamar de milagre? —ele franze o cenho, confuso. —Ela não podia ter filhos. —sussurro. —Você foi o milagre porque ela não conseguia ter filhos, mas ela teve você e aconteceu tanta merda na sua vida que Vivian não sabia se podia te amar do jeito certo, como você merece. —eu vou chorar e nem me importo. —Ela te afastou porque na cabeça dela, ela não conseguia cuidar de ninguém. Ela não era boa para ninguém, mas eu acredito completamente quando ela diz que te ama nisso aqui. E eu também te amo, não como uma mãe ama o filho porque seria bem esquisito, mesmo que eu ame Vivian e ela tenha sido como uma mãe para mim. Eu te amo porque eu te vejo como você é. E você merece ser amado. Eu não sei se o que eu estou falando está fazendo sentido, mas é verdade. Você acredita nisso agora? —Eu pergunto, com desespero na voz. —Você acredita em mim?

Ele me beija no instante seguinte, com tanta intensidade que puxa minhas pernas para a sua cintura, como naqueles filmes, mas parece tão natural mesmo que seja novo. E eu estou contra a parede, também. Parece um beijo sem fim. Com os olhos fechados, a sensação é mágica. Suas mãos tocam meu rosto e quando ele vai se afastar e dizer alguma coisa, o aproximo novamente. Ele não protesta. Uma das suas mãos passa para debaixo da minha blusa e parece que estou pegando fogo ao mesmo tempo que sua mãe parece gelo, me deixando arrepiada. Quando ele se afasta novamente, eu não reclamo porque estou sem ar. A mão dele vai para o meu quadril e fica lá, enquanto recobramos o fôlego.

—Obrigado. —diz ele. Não sei pelo que agradece, e não tem importância. A resposta é a mesma.

—O prazer foi meu. —seus lábios voltam para os meus e ele me distancia da parede, e então eu caio na cama, arfando de surpresa. Ele cai na risada —um riso jovial e bobinho, feliz. —é impossível eu ficar com raiva, mas mesmo assim pego seu travesseiro e bato nele com a maior força que consigo. Ele nem para de rir. Entramos num joguinho, uma luta sem objetivo, e ele tenta me fazer cócegas enquanto tento o afastar, usando o travesseiro. Ele acaba mobilizando meus braços com suas mãos e com os joelhos o apoiando em cada lado da minha cintura, seus olhos me observando de cima. Paro de lutar contra suas mãos e ele não se mexe.

—Ei, Diana? —arqueio as sobrancelhas. —Você é incrível. —diz ele, e demora alguns segundos até eu entender o que ele está falando. A carta de Vivian. Coro, querendo me esconder por causa disso quando ele percebe e sorri, e Ian me dá mais um beijo, antes de se afastar e deitar do meu lado. Ele joga as pernas em cima das minhas e me viro para encará-lo.

—A Becker não quis vir?

—Ela disse algo sobre Nova York e ter que arrumar coisas.

—Ah é, eu vou com ela para Nova York esse final de semana.

—Posso ir junto?

—...na próxima vez, sim. —eu digo. Ele olha para cima.

—Valeu.

—Eu quero que você vá, mas agora é minha primeira oportunidade de ver como vai ser sabe, viver lá. Sozinha. Como uma pessoa de verdade. Eu quero fazer isso sozinha. E com Becker, porque ela vai morar lá também. Mas depois, você pode ir junto. —Ele me olha sem dizer nada, porém sorri e assente. Conversamos sobre a faculdade e as férias, e ele conta que os seus primos querem ficar ali com ele durante algumas semanas e depois ele ia para a casa deles e ficava por lá até a faculdade começar. Fazemos planos. Até escutarmos Victoria gritando o nome de Ian, e eu me levanto alarmada.

—Relaxe. Ela grita por tudo, lembra? —agora sei de onde Yuri puxou essa característica. Descemos as escadas e o cheiro de comida me atinge. Não estou com fome, porque dividi a caixa de cereal com Yoshi, mas Ian parece faminto. Victoria põe pratos na mesa. Não vejo Visia. Victoria explica que ela foi buscar o noivo e vai ficar com Vincent hoje, porque amanhã ele é liberado.

—Sente-se, Ian. Você quer, Diana?

—Não estou com fome. Yoshi e eu comemos uma caixa de cereal inteira hoje a tarde. —confesso, e Ian ri.

—Ela tem alma de criança, também. —dou um tapa nele.

—Olha quem fala. Ian e Yasha comem uma caixa por dia lá em casa. Você deve estar cansada. Vai dormir aqui? —ela pergunta casualmente. Meus olhos caem em Ian, e ele aquiesce sem parar de comer. Faço que sim. —Tudo bem, então. Eu vou terminar de comer e ir para a cama, porque estou morta de cansaço. Não fiquem acordados até tarde. —Ian revira os olhos.

—A casa é de quem mesmo?

—Do meu sobrinho de dezenove anos, que tem juízo mas às vezes esquece disso. —eu caio na risada. Lembro da minha mãe.

—Vou tomar um banho. —aviso e os dois aquiescem. No caminho até o quarto de Ian, pego o telefone. Disco o número de casa, e sinto como se estivesse jogando na loteria, brincando com a minha sorte. Felizmente, minha mãe atende.

—Uh, oi mãe. —Fico vermelha e agradeço por ela não poder ver. —Eu vou dormir na casa do Ian hoje. Só liguei para avisar.

—Ian? O garoto?

—É. —Silêncio. —Amanhã eu vou para casa, porque tenho que pegar minhas coisas para ir para Nova York. Só estou avisando. —repito, porque deixando ou não, minha decisão não ia mudar. Só liguei por consideração aos seus sentimentos. —Avise o papai, também. —E novamente ela não diz nada. Hora de desligar. —Então, é isso.

—...tenha cuidado. —é o que ela responde. —E... ligue se... você precisar de alguma coisa. —Ela sabe que eu não vou precisar de nada, mas as palavras significam muito mais que isso. É preocupação. O cuidado que ela não consegue demostrar.

—Tudo bem, é claro. Até amanhã, mãe.

—Até amanhã. —ela desliga primeiro. Respiro fundo, recompondo minhas forças e em meia hora, estou debaixo das cobertas de Ian. Peguei uma camiseta emprestada. Não achei uma calça de moletom que servisse em mim, mas é por isso que me escondo nas cobertas. A luz está apagada quando ele entra. Acho que fica parado na porta, se acostumando com a escuridão.

—Diana? —ele sussurra.

—Oi. —sussurro também.

—Eu vou tomar um banho, tudo bem?

—Sim. —sinto ele atravessar o quarto. Pegar roupas e acender a luz do banheiro dele. Seu quarto é uma suíte. Por causa da claridade, ele consegue ver meu rosto. Ficamos nos encarando.

—O que você está vestindo? —pergunta ele, a voz baixa.

—Uma camiseta. —respondo simplesmente. Ian não diz mais nada e fecha a porta. Não sei por quanto tempo ele fica lá, porque eu caio no sono, mas sinto quando ele se deita do meu lado. Não encosta o corpo no meu (porque isso já é demais para mim e Ian deve saber) mas sinto a sua respiração, ouço-o se mexer, e uma de suas mãos encosta na minha cintura. E as pernas encostam nas minhas. Só isso. E eu percebo que se solidão fosse uma pessoa, nesse exato momento ela teria feito as malas e ido embora da minha vida.

Acordo com o sol no rosto, de cortinas abertas. Os pássaros lá fora cantam, e não está frio nem quente, mas uma mistura perfeita. Olho para o lado e ali está Ian. Não consigo evitar e estudo seu rosto, as feições, as linhas de expressão. Escuto a sua respiração, e o modo como seu peito sobe e desce nesse ritmo. A paz e a calma dos seus movimentos. É tão tranquilo que mesmo com a claridade, me escondo no travesseiro e volto a dormir.

O resto da manhã não é nem um pouco relaxante como esses primeiros minutos. A segunda vez que acordo é por causa de gritos do Yuri e Yoshi, que invadem o quarto de Ian e fazem ele acordar também.

—FÉÉÉÉÉÉRIAAAAASSSSSSSS! —Eles cantam, vão até o lado de Ian e gritam mais um pouco, depois até onde eu estou e correm para fora do quarto. Nós caímos nos travesseiros sem dizer nada, mas já prevendo como o dia vai ser. Logo depois, eu visto as mesmas roupas que usei no dia anterior e me despeço da família de Ian, explicando o que vou fazer. Demora mais me despedir de Ian, porque não conseguimos parar de nos beijar. Mas finalmente Victoria me expulsa e eu vou para casa. Sou feita de agitação, sem conseguir ficar parada, ou parar de sorrir lembrando de Ian ou pensando sobre Nova York. Entro em casa e sou acolhida por ninguém, mas quando estou esperando Becker chegar, com meus documentos guardados numa bolsa e uma pequena mala do lado, meu pai aparece. Estou sentada na entrada de casa, a porta aberta, observando a movimentação lá fora. Não me levanto. Ele para.

—Estou indo para Nova York. —Ele assente, indo para a cozinha. Não falamos mais nada, mas depois do seu café ficar pronto e ele estar a caminho do escritório, murmura um "bom sorte" neutro. E eu murmuro um "adeus" de coração. Imagino se minha mãe vai aparecer. Fico esperando. Só que o carro de Robbie aparece na frente da minha casa e não vejo sinal dela, e meu coração aperta. Faço um sinal para que Robbie e Becker esperem e corro até o quarto dos meus pais, mas a porta está aberta e não tem ninguém lá, então corro para o escritório dela e boom, acho minha mãe. Ela lê alguns documentos e eu bato na porta. Nossos olhos se cruzam.

—Eu vou para Nova York. Volto amanhã, talvez. —digo em uma respiração só. Ela parece mais calma, e assente. Acho que ela está pensando em algo para dizer.

—Tenha... uma boa viagem. —minha mãe responde, honesta. Tento sorrir, um sorriso de missão cumprida. Então pego minhas coisas e vou até o carro de Robbie. Olho para Becker.

—Achei que os seus pais iam levar a gente.

—O Robbie queria me levar, então...

—Sem problemas. Oi, Robbie.

—E aí, Diana. —Ele começa a dirigir. A viagem até a estação de trem é rápida e quando ele estaciona, Becker abre um sorriso enorme na minha direção.

—Eu tenho uma surpresa. —revela ela. Robbie vai até o porta malas e tira as coisas dela, e eles se beijam, demorando quase tanto quanto Ian e eu. Desvio o olhar, sorrindo internamente. Quando ele vai embora, levamos nossas coisas para dentro da estação, e eu pergunto qual é a surpresa. —Você já vai ver. —diz ela, escaneando as pessoas que estão ali. Então eu vejo. O cabelo azul.

Ariel.

Ela vem correndo ao nosso encontro ao mesmo tempo que corremos ao encontro dela. Nos abraça simultaneamente, forte.

—Meninas, meninas, meninas!

—O que você está fazendo aqui? —eu exclamo. —Você vai para Nova York também?! —ela sorri.

—Alguém me disse que precisava arranjar um emprego e precisava de ajuda. —ela toca meu nariz com um dedo e meu coração incendeia. Ela veio para me ajudar. Porque eu pedi. —E eu vou, mas não só eu. —Ela aponta para uma direção e eu vejo Bobby e Harry, comprando chocolate. Rio, me sentindo tão leve de felicidade que poderia voar. Eles se aproximam e nos abraçamos, fazendo piada com Harry e conversando com Ariel, enquanto ela mexe no cabelo do filho. Ninguém consegue parar de sorrir. Quando nosso trem chega, nós entramos. Becker e eu ficamos em uma fileira de assentos, e os outros ficam na nossa frente. Harry brinca no celular de Ariel, e ela me conta, virando-se para trás, sobre os lugares que temos que visitar. E contamos para ela sobre Vincent e Helen, e ela está cheia de argumentos e exclamações. Ela até fica brava, pelo perigo que nós corremos, mas depois se acalma. Quando o trem começa a se movimentar, Ariel se vira para frente e Becker puxa os seus fones de ouvido, me estendendo um deles.

—Escuta essa música, é tão legal. —ela coloca para tocar. The Vaccines. Eu fecho os olhos e descanso a cabeça no ombro de Becker, enquanto ela olha para fora. Penso em Ian e em coisas felizes, e penso em Helen e Richard e Vincent e todo o mal em suas vidas, e como elas continuam mesmo quando coisas horríveis aconteçam. Imagino como deve estar St. Mara num verão tão bonito quanto esse, e que quero ir com Ian e Becker para lá outra vez. Mas Becker aumenta o volume da música, e quando presto atenção em The Vaccines tocando, eu lembro de Vivian. E toda a sua vida. Tudo que eu sei e tudo que ela me ensinou e me fez descobrir por conta própria. Relembro os melhores detalhes. Relembro ela. Sorrio.

O espírito livre cujo espírito está livre.


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Notas finais do capítulo

*lágrimas* *rios de lágrimas* o que acharam?????????? eu espero tanto que tenham gostado porque essa história ficou diferente das outras que eu escrevi e eu queria provar para mim mesma que conseguiria evoluir tanto nas histórias quanto na escrita e foi a fic mais difícil que eu já escrevi. Não sei quantas vezes eu achei que seria impossível estar escrevendo as notas do último capítulo. Mas agora eu estou aqui quase chorando de emoção porque eu fiquei mais de SEIS meses escrevendo sobre a Diana e não estou psicologicamente preparada pra dizer adeus. Enfim, obrigada por ler! E obrigada Ana Clara porque acho que sem você eu não teria terminado. E a Julia, pelas MPs discutindo a história. E pra todo mundo que leu e tirou tendo para comentar ou mandar MPs ou até ler outro capítulo. Obrigada, obrigada, obrigada.



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