Take Back the Night escrita por Camyarsie


Capítulo 21
Declaração


Notas iniciais do capítulo

"POR QUE QUER SABER TANTO? – Rick de repente explodiu"



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Rick acordou pela manhã. Sentou-se na cama e massageou as têmporas.

Os pesadelos ainda o assustavam; porém já sabia como lidar com eles após anos de prática. Respirou fundo e simplesmente pensou em qualquer outra coisa.

Como o hábito, sacou sua espada de ferro e saiu do quarto silenciosamente. Pegou um pedaço de pão na dispensa e o devorou rapidamente. Abriu a porta e olhou para os lados – precaução – e procurou o lago.

Era muito mais prático tomar banho pela manhã. Ao nascer do sol até os monstros já não ficavam às espreitas. Tirou as roupas e pulou na água gelada. Nunca se sentia à vontade naquele lago; constantemente olhava para os lados para se certificar que estava sozinho.

Mudou bastante nesse tempo... Seu rosto estava mais fino e maduro; o cabelo louro quase chegava aos ombros; conquistara bastante força e músculos para mostrar e alcançara a altura do Mestre Eddard.

Assim que saiu, sacudiu-se todo para se secar e já colocou a roupa. A secagem mal feita não lhe incomodava – afinal, morava em um deserto com um calor escaldante.

Abotoou a calça, calçou as botas, ajustou a bainha, vestiu o colete e, por último, encaixou as pulseiras de Jean.

Três anos se passara desde aquele dia. Rick fazia de tudo para cumprir a promessa que fez diante do corpo do amigo falecido – todas as manhãs, acordava assim que o sol aparecesse no horizonte e treinava golpes e táticas de luta com a espada, esperando o Mestre levantar. Assim que o adulto estivesse pronto, saíam para o treino de fora habitual e só voltavam praticamente à noite.

Dormindo mal nelas, por conta dos sonhos, Rick nunca se sentia descansado. Contudo também já estava acostumado com esse fato.

Mas nem isso o impedia de sacar a espada de ferro e treinar dedicadamente. Qualquer um que visse os golpes que Rick começara a dar em um cacto sentiria pena da planta.

* * *

Eddard terminou o pão e saiu da casa. Devia ser sete e meia da manhã.

Não precisou se esforçar para encontrar seu aprendiz. Era só ouvir os baques surdos em algum lugar perto do lago.

– Daqui a um tempo não sobrará nenhum cacto nesse deserto – Eddard comentou, revelando-se.

Rick somente parou de atacar a pobre planta e colocou a espada na sua nova bainha de couro pendurada na cintura. Após pegar a mochila, já começou a seguir o caminho diário.

Durante todo o percurso, Eddard analisava o adolescente. Antes, o garoto era uma pessoa fria; ninguém podia negar, porém pelo menos tinha o Jean para amaciá-lo.

Agora, a palavra que mais o definia era ser um gelo. Duro como pedra. Quase não falava mais, somente quando necessário e ainda de mau gosto; sorrir não fazia parte de seu cotidiano; e nunca parava de lutar. O ar conseguia ficar mais pesado se o encarasse.

Para o avanço das artes marciais, isso não era ruim. Certamente progredia cada vez mais nas habilidades e faltava pouco para vencer o Mestre em uma luta. Mas no lado psicológico... Essa amargura o destruía aos poucos.

E para as outras pessoas... Ele até chegava a amedronta-las. Todo mundo o evitava. Talvez por bom senso; depois daquele incidente com o Henry, sabiam do que Rick era capaz.

Chegando ao campo de treinamento já prepararam as coisas para o uso. Eddard apanhou sua espada na mochila, encostada em uma árvore próxima, enquanto Rick já se aprontava para o combate.

Após cumprimentarem-se – uma questão de respeito entre mestre e discípulo – travaram as armas entre si.

Antigamente, ao mesmo tempo em que Mestre Eddard lutava, avaliava os movimentos e forças dos golpes. Contudo essa época se fora. Mal dava conta de se desviar e se defender dos ataques.

Rick driblava, rolava entre as suas pernas, o fazia tropeçar, fintava e partia ao ataque com fúria nos olhos – como se simulasse estar batalhando com um monstro.

Nas vezes que errava algo paravam tudo e Eddard o corrigia. Ele prestava atenção na explicação e tentava fazer corretamente o que era necessário.

Depois de algumas horas pararam brevemente para respirar calmamente. Rick, vendo que ainda não comeriam nada, em vez de descansar continuou repetindo e corrigindo o que havia errado no dia – quase nada.

– Você vai desmaiar de exaustão desse jeito. Pare e descanse um momento – Eddard recomendou.

Ele não respondeu; o adulto não sabia se sequer tinha prestado atenção.

– Rick, por que faz isso consigo mesmo?

Dessa vez parou de manobrar a espada, mas mesmo assim não respondeu.

– Poderia me explicar do por que não para nenhum segundo de treinar? E também do motivo que simplesmente se calou?

Ele olhou o cabo da sua arma e fechou os olhos.

– Me responda. – Eddard disse mais severamente.

– POR QUE QUER SABER TANTO? – Rick de repente explodiu, o encarando – Eu só sou um mero aprendiz seu que servirá como proteção da aldeia no futuro! O grande guerreiro contra o homem das trevas que nem sequer sabemos o nome verdadeiro! Você nunca se importou com o que eu penso sobre isso, somente quer que eu me torne uma arma mortífera contra os monstros! Não se preocupou com as minhas emoções, e agora vem querer me ajudar? ME DEIXA EM PAZ!

Dando um golpe no ar com a espada, deu-lhe as costas e ficou olhando para o lago. Mestre Eddard ficou paralisado um instante pela raiva repentina. Pensou em simplesmente encerrar o assunto, mas o seu coração o impedia de fazer tal coisa.

Então é assim que ele se sente? Usado? Que eu não me importo com nada mais do que a segurança da aldeia? – Eddard supôs.

O Mestre suspirou. Estava na hora de explicar algumas coisas que nunca colocara em palavras.

– Alguns anos antes de você aparecer na porta de minha casa, arrasado e detonado por conta de Altos Terrenos, eu conheci uma mulher. Seu nome era Amy, uma viajante vinda de Gargoyles, um reino a meio mundo de onde estamos. Assim como você, chegou muito fraca na minha casa, pois se perdeu e foi atacada por vários monstros, mas conseguiu escapar por pouco da morte.

“Não sei do motivo por qual ela saiu de seu reino, mas cuidei dela. Fiz os procedimentos necessários contra os ferimentos e lhe dei comida e água. Ela, agradecida com a minha ajuda, decidiu permanecer na aldeia me ajudando em diversas tarefas.“

“Antes que eu percebesse, fiquei completamente encantado por ela. Uma mulher incrível e linda, educada e encantadora. Depois de certo tempo, nos unimos e pretendíamos cuidar de uma criança. Minha vida ficou perfeita. Com Amy ao meu lado, nada poderia me derrubar.“

“Eis um dia que eu fui à ferraria projetar minha espada de diamante, que ainda a possuo. Faltava pouco para o sol desaparecer de vez do horizonte e a noite chegar. Minha mulher estava lavando algumas roupas no lago um pouco atrás de casa e já terminava o serviço.”

“Então, ouvi a explosão. Agilizando, imaginando o pior, me dirigi para a origem do barulho, e vi uma enorme cratera no chão perto da margem, com uma figura imóvel em seu interior.“

Eddard deixou escapar mais um suspiro.

“Meu filho e esposa morreram em um simples ataque de um monstro. Perdi o meu sentido de viver em uma única noite.”

Percebeu que Rick relaxou os ombros. Provavelmente ele entendia muito bem do que o seu Mestre dizia.

– Você é o filho que nunca tive. – Eddard revelou com o tom de voz mais baixo.

Rick virou-se rapidamente para ele novamente. O Mestre conseguiu ver emoção em seus olhos, mas o garoto abaixou a cabeça e permaneceu em silêncio.

– Não sou muito bom nessas coisas de sentimentos... Mas me preocupo com você. E te ver desse jeito... Sendo destruído lentamente... Me entristece.

Rick o fitava de um jeito estranho. O Mestre chegou à conclusão que esse olhar seria o máximo que poderia esperar dele – por hora.

– Descanse um pouco. É uma ordem. Vamos fazer um lanche mais cedo e depois continuamos.

Então ele foi em direção à mochila. Eddard não havia percebido, mas ao soltar aquelas palavras, sentiu-se mais leve. Menos angustiado. E aliviado.


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