Safe & Sound II: A Sociedade Secreta escrita por Gistar


Capítulo 11
Celebração


Notas iniciais do capítulo

Mais um capitulo!



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“Anjo cintilante, eu não pude ver

Suas intenções sombrias, seus sentimentos por mim

Anjo caído, me conte o por quê?

Qual a razão da aflição em seus olhos?”

Sara

Eu fui encaminhada a uma sala que aparentava ser uma biblioteca. Todos os outros convocados já estavam lá, tirando suas capas e vestindo novamente suas roupas.

– Graças a Deus, Sara! Achamos que não sobreviveria. – Emerson gritou assim que entrei e deu uma gargalhada. Eu não entendia como ele conseguia fazer piada de tudo...

– Rárá! – disse enquanto pegava minha roupa que por incrível que pareça estava dobrada em um canto.

– Até parece, Emerson! – falou Mandy - Não foi ela quem ficou quinze minutos na sala com o ceifador enquanto ele repetia dez vezes aquela frase em alemão e ainda assim ele teve que traduzi-la pra você entender logo e não atrasar os outros.

Com essa eu tive que rir.

– Não foi só eu! Tem alguém aqui que fala alemão por acaso?

– Tá, mas pela mímica você tinha que entender! – falou Jacson – Foi assim que todo mundo descobriu que tinha que pôr a coroa em um dos crânios...

– Ué! Não era pra eu pôr na minha cabeça? Ele apontou pra mim e depois para os dois crânios...

Houve um silêncio na sala enquanto todos olhavam pasmos pra ele.

E depois todo mundo caiu na gargalhada.

– Ele não apontou pra você, ele apontou para a coroa! E você tinha que colocá-la na cabeça dele e não na sua, imbecil! – Pedro conseguiu dizer em meio ao riso.

– Então porque ele não apontou pra ele? Como eu ia adivinhar?

– Que sorte você deu hoje na biblioteca, não é? – perguntou Tânia enquanto os outros ainda estavam distraídos com a mancada do Emerson.

Não. Eu nunca tinha sorte em encontrar Tânia.

– Como assim?

– Eu estar lá para encontrar a carta antes que alguém mais a encontrasse. Belo truque do Seth...

Eu abri a boca, mas antes que pudesse formular uma resposta, as enormes portas duplas se abriram com um estrondo e os Cavaleiros entraram com a formação de uma pirâmide. Suas fantasias bizarras haviam sido trocadas por uniformes simples com capas e capuzes vermelhos, mas ainda havia traços da maquiagem que alguns tinham usado no Templo Interior ou nos quadros vivos em torno da linha de seus cabelos e em seus maxilares.

Reconheci o Demônio, Otelo e um dos Puritanos. Mais uma dúzia de homens os seguiu, todos portando resquícios similares de suas fantasias.

Luke, no topo da pirâmide, abaixou seu capuz e abriu amplamente os braços.

– Bem-vindos, Classe de Convocados da Skull & Bones Anno Deae 180.

Meu latim estava meio enferrujado — está bem, era completamente deplorável — mas ele tinha dito O Ano da Deusa?

Todo mundo começou a aplaudir.

— Agora que todos foram iniciados na nossa Irmandade — aparentemente, ele não gastara todas as suas letras maiúsculas ainda — iremos passar o resto da noite ensinando a vocês os Segredos da Tumba e os Hábitos da nossa Ordem. Será que nossos novos Iniciados podem, por favor, se aproximar e dar as mãos?

Nós nos aproximamos e demos as mãos, formando um semicírculo diante deles.

Luke abaixou a cabeça, como em reverência.

– Bem-vindos, meus irmãos... e minhas primeiras irmãs. Vocês receberam uma Responsabilidade Sagrada. Os Cavaleiros que se encontram diante de mim serão lendários nos Anais da Ordem, pois são os primeiros a contarem com mulheres em suas fileiras. As sete mulheres diante de nós são as únicas mulheres já iniciadas nos Mistérios da Skull & Bones.

Então, isso explicava tudo. Todos sabiam que a Skull & Bones não convocava mulheres. Então, nós éramos as primeiras, não é? Já era hora deles entrarem para o mundo moderno.

Olhei em volta do círculo para as outras seis. E essas são as mulheres que eles escolheram. Fiquei imaginando se haveria alguma lógica para as escolhas.

Um homem mais velho de terno, deu um passo à frente.

– Gostaria de louvar nossos seniores que se vão por terem a força e a coragem de arrastar esta sociedade para o século XXI. Sei que seu caminho não foi fácil, mas aplaudo sua disposição. Vocês realmente são uma turma de Irmãos para nos orgulharmos - então, ele se afastou dos cavaleiros encapuzados e se aproximou do círculo de convocados. - Como o Patriarca da Cerimônia de Iniciação no comando, sinto-me honrado por lhes dar as boas-vindas à nossa Ordem. Gostaria de aproveitar esta oportunidade para lembrar às damas no grupo que esses rapazes assumiram um grande risco e fizeram um grande ato de fé ao deixá-las entrar aqui. Esperamos que sejam mulheres exemplares... portanto, não estraguem tudo.

Bela recepção, idiota! Do outro lado do círculo, vi Rose revirar os olhos. "Vá se catar", ela esboçou com a boca.

Rá! Grandes mentes pensam parecido.

O que há para se dizer sobre o resto da noite? Que detalhes lascivos e luxuriantes eu posso confessar? Devo revelar como fomos encaminhados para dentro de uma frota de limusines brancas e levados até uma mansão em Connecticut (pertencente a um dos ex-alunos ou "patriarca")? Como bebemos champanhe à meia-noite e enchemos a pança com lagostas grelhada às 2h da manhã? Até eu fiquei chocada por eles terem um chef lá às três da madrugada para caramelizar as cascas do creme brûlée que comemos de sobremesa.

No meio de tudo isso, tivemos um curso intensivo a respeito do funcionamento interno da sociedade e lições suficientes de história para merecer meio crédito. A história da Skull & Bones se estendia há quase dois séculos. Não é particularmente emocionante (e o fato de estarmos exaustos e bêbados não ajudou).

A insígnia da ordem, um crânio sobre dois ossos cruzados acima da inscrição "322", alusiva ao ano de 322 a.C., ano em que a deusa Eulogia apareceu no céu após a morte de um orador grego.

Parece que esse garoto, Russell, ficou irritado por não ter sido convidado para entrar na Phi Bela Kappa, foi para a Alemanha puto da vida, conheceu uns maçons ou templários ou um tipo qualquer de sujeitos de uma irmandade e enfiou na cabeça que — como os fundadores de todas as outras instituições de Yale, inclusive a própria universidade (que foi fundada por um bando de sujeitos insatisfeitos com o modo como as coisas estavam sendo gerenciadas na Harvard do século XVII) — se não iam deixá-lo brincar em seu clube, ele criaria um para si. Então foi o que ele fez e, como vinha de uma família ridiculamente rica que tinha um dedo em todos os esquemas vitorianos de geração de dinheiro que havia — agricultura, importação e exportação, primeiras indústrias - ele foi capaz de dedicar uma grande soma ao seu novo clubinho de meninos e a Skull & Bones nasceu.

A festa terminou logo depois e seguimos os seniores até o átrio, onde havia uma piscina coberta. Segui-os a uma distância segura e observei-os tirarem suas roupas e mergulharem na água aquecida.

Joguei-me em uma espreguiçadeira estofada e me servi de mais uma taça de champanhe da garrafa quase vazia de Veuve Cliquot que estivera carregando para cima e para baixo.

Minha mente não conseguia absorver os acontecimentos daquela noite. A iniciação maluca, a nova classe de convocados, o tour pelo mausoléu, a história, as músicas, o protocolo — era como estudar pesado para uma prova escrita de história e um teste prático de laboratório ao mesmo tempo. Seria impossível me lembrar de todas as fórmulas e eles já haviam proibido as colas. Havia dúzias de senhas secretas e combinações e esconderijos e apertos de mão — é, aprendemos um aperto de mão secreto também, você acredita? É assim:

APERTO DE MÃO SECRETO DA SKULL & BONES

1º PASSO: Quem cumprimenta estende a mão como se fosse dar um aperto de mão normal, mas antes de fazer isso, fecha o dedo indicador e o pressiona contra a palma do outro cara. É assim que você mostra que está dentro.

2º PASSO: Quem recebe o cumprimento bate três vezes, uma e mais duas no dedo anular, médio e indicador do outro, respectivamente. É assim que você garante ter separado um membro da Skull & Bones de outra organização que também use o truque do dedo na palma da mão. Aparentemente, isso é derivado dos templários, ou dos maçons, ou de alguém mais e, portanto muitas outras sociedades secretas fazem a mesma coisa.

– Todo mundo nos copia - Seth havia dito com seu sorriso único.

– Por que não fazer só a parte que é especificamente da Skull & Bones? — eu havia perguntado e me arrependi imediatamente quando vi as cabeças dos outros convocados se erguerem para o céu. Toda vez que eu abria a boca, parecia que me metia em encrenca. Apenas Seth parecia imune ao aborrecimento.

– Porque, Sara, alguns desses caras têm 80 anos e não se pode ensinar truques novos a um cão velho.

– Usamos esse aperto de mão há séculos — outro Cavaleiro explicou. — E não vamos mudar só porque alguns idiotas sacaram e decidiram copiar.

Recostei-me na minha cadeira e pratiquei o aperto de mão secreto comigo mesma, tentando ao máximo ser sutil e discreta, para que espectadores enxeridos não percebessem todo o complicado trabalho com os dedos. Era mais difícil do que parecia, principalmente devido ao fato de uma das minhas mãos estar de cabeça para baixo. Talvez houvesse mais alguém por ali com quem praticar.

Olhei em volta e Jana estava sentada sozinha, observando os nadadores com uma mistura de divertimento e confusão no rosto. Ela era a única que não estivera bebendo naquela noite. Na verdade, de todos os convocados, ela era a que estava agindo de maneira mais distante.

— Você também não gosta de nadar? — perguntei, sentando-me na borda de sua espreguiçadeira. Ela saiu de seu devaneio.

— Eu adoro. Mas não vou tirar a roupa.

Dei uma olhada nos vários nadadores e em suas cuecas. Bom argumento!

— Quer tentar fazer o aperto de mão secreto? Estendi minha mão e ela prosseguiu com o aperto de mão com tanta facilidade e com uma habilidade tão natural que meu queixo caiu.

— Uau, como você fez isso? Você já sabia antes?

Jana deu de ombros.

— Não.

– Você parece um pouco decepcionada. – comentei

– Não, não é decepção. Só que eu não esperava isso. Não que eu esteja reclamando por ter entrado para a maior sociedade secreta do país, é só que eu ainda não me acostumei com a idéia! Eu esperei a vida toda pra entrar em Yale e ser convocada pela Book & Snake que nunca passou pela minha cabeça a possibilidade de eu ser convocada por qualquer outra.

– Bom, eu nunca pensei nessa coisa de sociedade secreta. Há alguns meses atrás eu nem pensava em entrar em Yale. E quando chegou a época de nos inscrevermos, Jess pirou e bateu o pé até fazer eu preencher a minha ficha de admissão pra cá, mas eu nunca pensei que me aceitariam. E logo depois disso, aconteceu o seqüestro...

Eu pausei um instante. Nunca havia comentado sobre o que acontecera com ninguém além do policial que tomou meu depoimento e da minha mãe. Nem Pedro ou os outros gostavam tocar no assunto. Mas eu confiava em Jana e acho que faria bem se eu me abrisse com alguém que não estivera envolvido diretamente. É claro que a bebida também ajudou...

– Foram duas semanas horríveis! Eu tentava viver um dia de cada vez, pra não pensar em quem seria o próximo a morrer pelas mãos do maníaco do Daniel! Eu nunca contei nada a ninguém, mas toda a noite quando eu fecho os olhos antes de dormir, eu ainda ouço os tiros e os gritos de quando Daniel matou Jared.

“A dor foi tanta que eu acabei desmaiando. Pedro cuidou de mim e me ajudou a superar. Ele foi um verdadeiro anjo. Depois Daniel quis matar Ângela, mas eu consegui interferir e se não fosse Pedro novamente, eu teria acabado como Rosane...”

Eu fiz outra pausa e olhei para Rose que estava na piscina, nos ombros de Emerson tentando derrubar Mandy dos ombros de Jacson. Jana seguiu meu olhar.

– Eu não gostava muito da Rose. Nós tínhamos as nossas diferenças, mas ninguém merecia o que ela teve. Apesar de ela ter se recuperado daquilo, eu sei que aquilo deixou marcas. Esse tipo de coisa não marca por fora, mas por dentro. Depois disso, nós decidimos fazer alguma coisa pra escapar.

“Até hoje, eu não sei como conseguimos fazer isso. Acho que meus amigos são as melhores pessoas que alguém pode ter ao seu lado. Mesmo tendo passado por tudo aquilo, acho que Deus foi generoso por ter nos colocado lado a lado, pra que não enfrentássemos tudo sozinhos.”

Eu voltei a olhar para Jana e ela estava com lágrimas nos olhos. Ela me abraçou e então eu percebi que também estava chorando.

– Ah, Sara! Eu sinto muito! – falou. Depois se afastou de mim e limpou as lágrimas dos olhos. – Seus amigos parecem pessoas maravilhosas! Eu fico feliz porque agora fazemos parte da mesma Irmandade. Você acha que é por isso que foram aceitos em Yale e na Irmandade da Morte?

– Não sei...

Abri a boca para lhe perguntar mais sobre essa "Irmandade da Morte" (porque eu certamente nunca ouvira eles serem chamados disso), quando um bando de Cavaleiros encharcados caiu sobre nós tentando nos botar de pé.

— Vamos lá! — eles gritaram, rindo, erguendo Jana no ar.

— Esperem! Esperem! — ela berrou, rindo e eles a jogaram na piscina. Ela voltou à superfície, jogando água em seus captores e sorrindo tão amplamente que era como se eu tivesse conversado com outra garota.

— Você é a próxima! — gritou Emerson, agarrando o meu braço.

— Não, espere! — disse eu, enquanto ele me tirava do chão. — Eu não sei nadar.

Ele me soltou e eu caí de volta na espreguiçadeira.

— Nem um pouco?

— Ah, por favor! — Seth falou, agarrando meu outro braço. — Ela só não quer molhar a roupa. Peguem-na!

Droga!

— Pessoal — disse Pedro. — Esqueçam. Ela não quer!

Seth me soltou e voltou para a piscina enquanto Pedro se aproximava de mim com a boxer preta grudada no corpo.

OMG! Isso é apelação!

– Tem certeza que não quer entrar? A água está ótima!

– Não Pe, pode ir! Eu estou bem aqui.

Ele se abaixou e me deu um beijo. Algumas gotas escorreram de seu cabelo para o meu rosto e pescoço.

– Sai, está me molhando toda!

Ele apenas riu e voltou para a piscina.

Comecei a praticar o aperto de mão comigo mesma de novo. Algumas gotas de água pingaram no meu cotovelo. Olhei para cima, preparada para dar outra reprimenda em Pedro ou num dos meninos quando vi que era alguém que eu não esperava.

Luke estava de pé ao meu lado. Seu cabelo incrivelmente liso estava jogado para longe do rosto e a água escorria de seu abdome de atleta e descia em filetes pelas pernas de sua samba-canção colada ao corpo e ensopada.

Ele obviamente não entrara na brincadeira da piscina, apesar de, pelo que eu podia ver, Jana ainda estava se divertindo na água atrapalhada por suas calças cargo e camiseta branca que, sinto muito, amiga, não estava escondendo nada.

– Você meio que está na frente da minha luz — falei, espremendo os olhos em sua direção.

– Você não sabe nadar mesmo, não é?

Ele era bonito, eu não podia negar! Mas havia algo nele que me dava calafrios. E eu ainda não havia perdoado-o pela brincadeira sem graça do caixão e por ter me impedido de sair correndo da tumba quando queria. Apesar de que eu já havia relevado aqueles acontecimentos e havia bebido demais pra manter meu mau humor em relação a isso.

– Não, eu realmente não sei nadar! – respondi e comecei a me perguntar se ele estava pretendendo mesmo me jogar na piscina.

Então ele se jogou na espreguiçadeira ao lado da minha, parecendo muito a vontade na minha frente, mesmo estando só de samba canção. Eu desviei meus olhos para a piscina, minhas pálpebras já estavam pesando. Eu havia bebido demais...

– Como vai o Steven? – ele perguntou de repente.

– Bem. – respondi automaticamente.

– Faz tempo que não o vejo, ele ainda tem aquela cadela, a Popy?

Eu saí do meu torpor e o olhei sobressaltada. Eu havia conhecido a cadela de Steven quando passara uma semana lá com ele. A cadela já era velha, não corria mais, como os outros cachorros, ficava o tempo todo deitada.

– Cansada! Ela já está velha demais a coitada... Para alguém que sabia o nome de todas as minhas professoras do primário, me admira você não saber sobre a saúde da cachorra do meu pai. - respondi dando um sorriso sarcástico.

– Eu adorava brincar com ela quando eu ia com meu pai visitá-lo. Faz tempo que não vou mais lá.

Ah, então ele conhecia o Steven?

– Desculpe, não sabia que conhecia meu pai! Acho que sabe que faz pouco tempo que descobri quem ele era...

– Sim. Mas sabe Sara, nós não somos seus inimigos. Desculpe se eu a ofendi em algum momento. Nós nunca tivemos mulheres na nossa Ordem, mas estamos tentando tratá-las como igual, pra não se sentirem discriminadas. Faz parte da iniciação tirar a roupa e não é só porque vocês são mulheres que vamos mudar isso.

Tudo bem, eu entendia o ponto de vista deles.

– E quanto ao caixão? Eu quase tive um infarto, achei que tinham me enterrado viva...

– Era um teste. Tínhamos que testar a união de vocês.

– Ah, e você me escolheu por acaso para isso?

Ele sorriu.

– Eu achei que você era a mais preparada para lidar com aquilo, depois de tudo o que passou...

– Tá certo! Desculpe se o julguei errado. – disse pra acabar logo com aquela ladainha.

Eu voltei a olhar para a piscina onde agora o pessoal havia se dividido e jogava uma bola de borracha de um lado a outro.


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Notas finais do capítulo

O que acharam do capitulo? Gostaram da nova capa com o Luke, a Sara e o Pedro?