Facção. Dos. Perdedores escrita por jonny gat


Capítulo 52
Sessão final.




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Os céus estavam claros e o sol mostrava-se muito bem amarelo no topo do mundo, estava no ponto mais alto do dia e logo se podia deduzir até o que os índios, tão tolos como dizia o colonizador, já sabiam: já era meio dia. As ruas já tinham um cheiro mórbido de carcaça como a ração dos urubus, talvez apenas não fosse rodeado pelas mesmas aves porque a urbanização não deixava. Alguns pombos rodeavam a localidade, mas poucos podiam caminhar normalmente. Não havia espaço para os animais, não para outros. O ser humano já ocupava o espaço mais que deveriam e acabavam esbarrando uns nos outros. Não havia tempo para desculpas ou para alguma forma de educação. Estavam todos na corrida do capitalismo, mas buscavam muito menos do que a ascensão social e econômica. Buscavam todos a sobrevivência mais do que a vivência, afinal se todos tivessem uma quantidade interessante de capital não viveriam ou pelo menos não trabalhariam naquela região. Os que moravam eram de certo pobres que em seus apartamentos viam ratos atravessarem suas cozinhas com algum resto de comida ou mosquitos sobrevoarem em movimento circular em seus tetos. Eles não tinham muita das vezes outra opção de vida. Se eles trabalhavam, eram pobres garis da vida ou ilegais.

No meio desse cenário caótico de urbanização apressada e mal ordenada, um barulho muito peculiar fora ouvido. Era um barulho exótico porque apesar de ser uma área urbana e blá blá blá nunca fora ao ouvido dos trabalhadores, em plena sete horas da manhã, ouvir aquele barulho tão usual em outras regiões – estrondo comum dos portos ou nas mais pobres comunidades, mais pobres até do que a em questão. Era uma rua imensa em calçadas, sem espaço para carros ou ônibus, esses não tinham lugar porque se tivessem, não haveria para as pessoas. Aqueles que se encaminhavam para o local vinham pela ferrovia ou até mesmo a partir de seus próprios pés no movimento mais clássico desenvolvido pelo ser humano – talvez a primeira coisa que o ser aprenda antes de começar a falar e depois de aprender que as coisas caem se soltadas.

O barulho do tiro, identificado pela mentalidade de alguns mais peritos no assunto como uma arma possivelmente letal e não uma simples pistola e pela mente de outros apenas como um sinal de perigo, resoou na cabeça de cada um que ao pensar duas vezes decidiram correr rumo ao seu destino, ou talvez para a direção contrária apenas para se esconderem para aqueles que o objetivo era na mesma direção a que o tiro fora disparado. Provocou imensa algazarra e os que não correram estavam paralisados. Esses eram os homens próximos demais do ato para ignorar – o barulho do disparo vibrava ainda nos seus ouvidos de tão perto que fora ouvido. O homem que disparava talvez já tivesse ido embora ou talvez não, ninguém ali apresentava nada volumoso no bolso a não ser alguns mais bem dotados. Havia um largo círculo ao redor da pessoa que já estava certamente morta. Por que já tinham tanta certeza de que a morte já havia visitado e largado a vítima? A poça ensanguentada estava métrica, ainda crescia pelo piso quadrangular que alguns chamavam como “calçadão”, e após todo esse acontecimento voltaram a simplesmente caminhar.

Nem sequer passou-lhes pela cabeça que alguém provavelmente havia provocado o assassino de uma distância maior, talvez por uma janela de apartamento ou do teto de um mesmo. Essa possibilidade era facilmente colocada de lado porque podiam afirmar para si mesmos e para qualquer outro que perguntasse “de onde veio o tiro?” que o tiro foi quase que um amigo da vítima de tão próximo que estava. No meio da multidão era sim difícil conseguir distinguir, o grande problema foi que confundiram o barulho da arma disparada com o soar da bala ricocheteando no amuleto do próprio homem – um barulho profundo considerando a aceleração gigantesca da bala – e acertando-lhe no pescoço. Analistas, caso algum tivesse se interessado no caso, perceberiam que haveria pequena possibilidade de um tiro tão de raspão de uma arma que todos julgaram ser de cunho militaríssimo ter deixado o rosto do rapaz ainda intacto. O verdadeiro assassino estava no décimo terceiro andar e quando a cena se desfez e as pessoas estavam na direção oposta guardou a arma que estava à mostra na janela e jogou-a debaixo da cama. Usava luvas porque já suspeitava que de uma forma ou de outra a plícia chegaria até ele, não por causa desse crime, mas os outros como esse que já fez e havia deixado mais evidente ainda sua presença.

Alguns sábados atrás reencontrou um velho amigo de emprego que se chamava Karl, hoje um homem pobre e com uma vida sem rumo, que ainda meio embriagado estava dizendo como estava orgulhoso porque seu filho que não via há mais de vinte anos estava realmente se dando bem na vida. O homem pouco disse, nunca fora de muita energia social, apenas escutou Karl que disse sobre os grandes problemas que estavam acompanhando sua vida no dia a dia. Karl disse sobre Billio Joe, um homem que havia roubado a sua mulher e acabado com a sua vida, falou do seu patrão que o havia despedido por vagabundear no trabalho, mas ainda disse para o amigo “Não se preocupe colega, porque o homem aqui já conseguiu um outro emprego lá pelas mesmas bandas. Emprego honesto, também, mas que emprego não é honesto? Julgo até um homem dos crimes como você um homem honesto, mas você sabe que também larguei essa vida. Vou começar dia 8 do mês que vem.“ O homem disse, meus parabéns Karl você merece isso, e voltaram a falar sobre esportes que ele julgava fúteis, mas o embriagado sempre achou o máximo.

A vítima do tiro do homem, no dia 9 do mês que era o que viria após esse encontro no bar, foi um homem chamado Karl e não foi coincidência. A verdade era que Jonatan gostava demais de seu amigo para que deixasse que ele vivesse mais daquela vida imunda e sem gosto. Já havia vido muitos tipos daquele, e não gostava que Karl fosse um homem sem família e sem rumo que por ventura acabaria dando a seu ver apenas a bebida como seu prazer. Normalmente os trabalhos de Jonatan não eram pessoais, esse na realidade não era um trabalho, era apenas algo que havia que fazer para a melhoria da vida de seu amigo. Tinha de cumprir seu trabalho de amigo, ajudando a vida de Jonatan, e assim foi feito. O homem havia morrido sem que menos percebesse que uma arma havia sido mirada em seu peito propositalmente para que ricocheteasse no medalhão que Karl usava desde que se conheciam. Uma mera coincidência? Não, não apenas isso. Jonatan não acreditava em coisas assim, era um homem de fato e que se diziam que um homem morre mais facilmente se for atirado na cabeça, fará o máximo para chegar até ela mesmo que não seja necessário. Se lhe dissessem com argumentos proeminentes da verdade que um homem não merece viver da forma que Karl vivia, o que não era necessário até porque essa já era uma ideia completa e originalmente sua, ele faria isso. E fez, mas por vontade própria em contrário do escrito antes do último ponto final.

O senhor deve estar pensando que Jonatan é tão genial que simplesmente não exist,e mas ele existe e é simplesmente genial porque ele foi feito para isso. Enquanto jovem Jonatan foi um dos protótipos usados compulsivamente em uma espécie de base militar criada inicialmente pelo cachê de Mormada Sparrow para proteger-se da Guerra do Fim do Mundo, com o término da Guerra o local tornou-se quartel general em troca dos segundos melhores militares adeptos às teorias da energia para um projeto que nunca foi revelado porque aquele Mormada Sparrow, que havia dado o futuro quartel general dos experimentos em troca dos membros que formaram mais tarde a ABC Works, simplesmente se foi para sempre pelas eternidades do tempo. Foi substituído em pouco tempo por Shepard, o homem que após a morte do substituto ouviu da boca de seu chefe, um Mormada Sparrow um tanto diferente, que ele – o chefe – se tornaria o novo substituto e então a missão estaria sobre comando de Shepard por completo. Então o homem, que também é conhecido como Hian e tem como agente no universo que o leitor mais conhece o homem de nome Carl, sorriu. Sejamos francos, Shepard nunca seria o nome verdadeiro do desgraçado.

Ele era um homem tão mentiroso que até mesmo Mormada Sparrow começou a desconfiar se Shepard era mesmo o seu nome após perceber que o agora comandante da tão aclamada operação, conhecida mais pelo leitor pelo codinome “O Plano”, havia na verdade roubado o seu filho que, onde quer que esse Mormada agora esteja com certeza nem mais lembrava qual era o nome do seu tão amado filho. Para condizer com a realidade sempre disposta nessa obra e com a dinâmica de nunca abandonar os personagens quando os mesmos parecem por estar completamente findados por um erro que causou a suprema impotência em suas missões, o narrador talvez tenha pensado em citar alguns parágrafos sobre a condição atual de Mormada Sparrow – pasmem, o homem não está morto, assim como Wilson que se encontra em um país que emana o gelo como se cheira a fuligem nas roças. Não só se encontra vivo como o velho observador e herói da Terra, mas está em condições muito parecidas e talvez até que suas histórias se cruzem, senão por um fato importante que é as suas posições nas linhas do universo, tempo, e nas parábolas dimensionais: Wilson está em um universo completamente diferente ao de Wilson. Nunca se encontrarão, não haverá uma forma de se unirem para combater O Plano que parece condizer exatamente com o vilão que o velhote tanto se preocupa, entretanto o banqueiro pouco se preocupa com o planeta Terra.

O banqueiro viveu agonizando como uma rocha ao ser partida levemente pela água, conformada com a correnteza e sem nada fazer com isso a não ser que um dia a água tanto baterá que a rocha simplesmente rolará. Não pesará o mesmo que uma vez pesou, e será levada pela correnteza. Mormada Sparrow não se importava se seu movimento de fazer de uso pessoal a máquina que seus físicos tanto trabalharam e falharam; isso não passou por sua mente por nenhum segundo nos anos em que viveu por ali. Acabou em um lugar que talvez nunca pensasse que chegaria. Primeiramente aconteceu de todas suas moléculas terem sido separadas e Mormada sentia-se como aquilo tudo, depois se separou em átomos e Mormada teve vários olhos. E então pensou: É o fim. Morrerei sem salvar meu filho. Uma morte mórbida, sem esperança e que seus olhos não mais se ergueriam. E de fato não se ergueram, mesmo sobrevivendo Mormada preferia que tudo tivesse acabado. Melhor uma morte que findaria de fato sua esperança do que uma chama que tentava se acender, a cada vez que Mormada via qualquer coisa naquele universo que lembrasse o seu filho.

Primeiramente o velho foi encontrado por um grupo de pessoas que ele julgou ser como indígenas. Esquimós para ser mais exato, mas preferia pensar como indígenas porque assim como eles eram primitivos e de pouco usavam o cérebro. Apesar disso, os esquimós até que eram expertos. Mormada sabia disso porque todos viviam e poucos morriam, apesar de viverem em um deserto congelado e completamente sem alimentos, os pais saíam para caçar todo o santo dia e noite. Foi encontrado desmaiado próximo a uma área que se pode se chamar litorânea, porque a água líquida estava próxima, mas pode também não ser chamado porque ainda estava bem em cima de pedaços de água em estado sólido. Os esquimós, um grupo de aproximadamente quinze, foram ver o que é que estavam acontecendo com aquela parte do relevo glacial.

– Ele é o enviado dos deuses, talvez tenha caído do céu. Como castigo por nós não o termos visto ele está destruindo nossa terra do seu céu – interpretou sabiamente o líder religioso dos esquimós.

– Mas como, mestre, se seu corpo está aqui? – O jovem caçador estava indignado. Pela interpretação do mestre e por causa de tudo o que estava acontecendo. Sempre teve um espírito renascentistas principalmente porque não conseguia pensar que tudo era obra dos deuses, como disse o mestre a seguir a fim de responder a pergunta do caçador.

– É a vontade dos deuses. Ajudem-no. Pode ser um deus ou um semideus, um anjo ou um demônio. Mas de fato temos que o proteger, só assim pouparão a nossa terra.

– Mas e se for um demônio mestre? Não travaremos guerra contra os deuses?

– Nada disso, os deuses sabem que apenas o salvaríamos pela misericórdia pela nossa terra. Sem a nossa terra, que é fraca e pouca, nós pouco temos. Sem ela simplesmente não existiremos – disse o que seria uma espécie de pajé, só que não sabia que essas palavras estariam recordadas para sempre na cultura de seu povo e das próximas gerações, sendo lembrada até dois mil anos mais tarde como um dos melhores versos líricos da etnia Etílica.

Todos, a não ser o chefe religioso, olharam-no diretamente nos olhos com os olhos abertos. Antes que o próprio tivesse que dizer de forma deseducada para buscarem o rapaz e voltarem com foco total para salvar sua terra, os homens viraram e apenas dois foram necessários para levá-lo até terra firme. Era um homem diferente dos nativos esquimós. Tinha face mais enrugada, pela idade foi como interpretaram, mas o que não sabiam era que isso também fazia parte do gene escandinavo vindo de seu pai. Seus olhos eram azuis e isso foi uma forma de que todos entendessem que ele era de fato uma santidade. A primeira vez que abriu os olhos dos homens se espantarem em suas próprias mentes e as mulheres que sempre faziam escândalos aproveitaram a situação para o quê? Fazer escândalo, mas estavam encantadas com os olhos de um santo. Mormada abrira os olhos mas ainda era incapaz de ter consciência de tudo que havia acontecido.

Mormada tinha sentido mais ou menos uma queda de doze andares de um apartamento. Ainda estava vivo, entretanto mal podia sentir seu corpo inteiro. Os médicos, mais conhecidos como feiticeiros pela cultura dos esquimós, fariam de tudo que conheciam sobre anatomia humana para tentarem consertar Mormada. Fechou os olhos e voltou a dormir. Os nativos encararam aquilo como um sinal de que algo estava por vir. Após um tempo que para Mormada pareceu pouco em seu sono profundo, mas não mortífero, ele abriu os olhos e percebeu que o local estava vazio. Conseguia abrir os olhos e mexer os braços levemente, entretanto ainda não sentia suas pernas. Óbvio que para tal percepção ele teria que estar consciente, mas não se considerava consciente porque ainda tentava entender a situação. Quando deu em conta que a máquina tinha falhado apenas aceitou isso. Sendo sua culpa ou a culpa dos físicos estudantes, ele simplesmente conformou-se e voltou a examinar o local. Olhou para o teto e era tudo feito de pedra, olhou para a porta e debaixo dela podia ver uma fúria gelada se encaminhando, como uma chuva de gelo como acontece no deserto em tempos de vento forte. Sinais da presença anterior de outras pessoas existiam e se perguntava onde eles estavam. Lá fora, no frio? Não, não considerava isso. Olhou para os lados e forçou um pouco a coluna, um movimento pagado em dor, mas que custou por saber que estava novamente sozinho. Estava mais magro, não exatamente magro, mas estivera gordo no período pós-guerra e agora via-se como um novo homem.

Sinceramente estava intrigado com o fato de que todos, ele não sabia exatamente quem eram os habitantes dessa mesma caverna, mas estavam lá fora caçando ursos polares para se alimentarem ou pegos de surpresa pela tempestade de neve que repentinamente surgiu. Não sabia o porquê de ter se ferido e isso também o intrigava. Muitas coisas intrigavam-no e isso estava quase deixando maluco na medida do possível que um enfermo consegue ficar maluco. Mas não ficou, até porque isso tudo não o preocupava tanto Mormada quanto preocuparia uma pessoa normal. Sparrow já estava conformado com a situação, com nunca mais ver seu filho e talvez nunca mais se levantar. Morrer ali mesmo por incapacidade física. Não fazia uma diferença sequer para ele. Conformado.

Mas houve um fato nessa mesma noite que havia mudado o destino de Mormada. Por um segundo piscara e no outro segundo encontrou um conhecido que provavelmente o leitor já sacou quem seja. Afinal, toda essa trama de Mormada Sparrow é baseada no relacionamento e nos diálogos, as consequências desses e a finalidade de tudo isso – até então desconhecida pelos leitores e também por grande parte dos personagens –, entre o banqueiro e o homem vulgo Shepard. Como um trovão que houvesse caído, o que não aconteceu, surgiu a figura emblemática do profeta vindo de um diferente universo. Por um momento invejou-o, o homem podia estar onde quisesse no momento em que quisesse e falar com quem quisesse, escolhera a situação perfeita para o que Mormada julgou como “finalizar o trabalho”. Estava claro que aquilo seria o momento da conclusão da história deste Mormada Sparrow: Shepard estava armado nos seus bolsos por alguma espécie de pistola. Fingiu ignorar isso e tudo o que havia acontecido como cumprimentando o velho companheiro.

– Olá.

Shepard dessa vez não aparecera inicialmente fumando. Tirou uma embalagem de cigarros do bolso de seu paletó e, dessa vez, perguntou: Você quer um, compadre?

Como um homem amistoso em uma situação comum, Mormada disse que não pensava nisso como uma possibilidade. Se sua situação já estava ruim, apenas ficaria pior usando drogas.

– Pois não sabe o que está perdendo. – Teve dificuldade de acender o cigarro com seu isqueiro. O frio atrapalhava a manifestação do fogo e demorou pelo menos trinta segundos revirando o isqueiro para que o fogo fosse acesso e Shepard desse uma tragada fenomenal, da mesma maneira que se vê nos filmes. Era o detetive que enquanto recapitulava os acontecimentos tragava um cigarro charmosamente e ao ver a fumaça esvair viria a sua cabeça uma possibilidade: a possibilidade que faria com que concluísse a trama.

– Se você tivesse alguma bebida talvez eu aceitaria, mas nunca fui tão apreciador de cigarro assim...

De repente Shepard interrompeu: Um momento. Não fale enquanto estou fumando.

Essa era uma atitude estranha. Nunca vira Shepard agir assim – é claro, não o conhecia e o pouco que haviam se comunicado Mormada não conseguia julgar o que era mentira ou verdade. Mal sabia se Shepard era mesmo seu nome, merda, quem era esse homem afinal? Existia mesmo um plano? Um Mormada-chefe? Ou isso era apenas uma pegadinha desde o início?

– Agora eu acho que nós podemos conversar. – Apoiou-se em uma parte qualquer da caverna sem dar muita preocupação enquanto fumava repentinamente.

– Vai me contar sobre o plano?

– Plano? Humph. – No momento fumava e pronunciava as palavras e assim a fumaça ia junto. – Você sempre foi o mais espertinho entre os outros, eu notei isso e o meu amigo também.

As palavras de Shepard não eram muito claras e Mormada estava ficando cada vez mais intrigado, dessa vez de verdade. – Eu não estou entendendo muito do que você diz, apesar de pouco ter dito até agora.

– Eu posso dizer o mesmo. Era para você estar me dizendo exatamente tudo agora, entretanto parece que você não está disposto. Mas apenas relaxe, eu vim preparado para isso. – Aproximou lentamente seu braço até o bolso onde estava um objeto um tanto volumoso.

– O que você quer que eu diga?

Shepard parou o movimento e olhou-o com a sobrancelha atônita com a situação. –Apenas cumpra o que prometeu. Diga-me onde está o homem que te colocou nessa situação. Diga-me onde está o homem conhecido vulgarmente como Shepard, o meu velho eu.


O leitor, tendo um senso de um cidadão comum do século vinte um, esteve percebendo a estranha mentalidade de Jonatan nos parágrafos em que esse foi mencionado como o tema abordado. Entretanto talvez muito mais esteja por vir. Era um homem de grandes estranhices, e algumas delas era extrema privacidade. “Jon, você acha que para um homem é melhor viver na merda ou levá-lo para a melhor?”, ele sinceramente opinaria que era melhor levá-lo para a melhor enfaticamente e apresentaria todo seu argumento que deixaria o questionador com uma visão de Jonatan como um homem doentio. Doentio ou não, preferia deixar as suas mais extremas doenças para si mesmo, até porque poucos acreditavam o que fazia. Não fazia isso por dinheiro, diferentemente dos assassinatos que lhe comandavam como no caso de Bluck Burbond. O homem era um chefe temido de uma das gangues da região, a maior, e no dia seguinte que o pedido foi feito todos os membros que se encontravam no quartel general foram vistos com pequenos buracos em suas cabeças. Isso era porque Jonatan era um homem de fatos, e se alguém havia dito – e havia – que duas armas funcionam mais rápido do que uma e provasse com argumentos, Jon ficaria bastante interessado em passar a então usar duas armas de mesmo tipo. Usava normalmente duas pistolas de calibre quarenta e cinco apenas para manter o estilo old times, assim com o sobretudo bege e o chapéu de jornalista dos anos trinta que com seus óculos escuros, mais modernos, davam um ar de uma ameaça letal para não só os alvos, mas toda a humanidade. Como um mistério, como um personagem.

E era de fato um personagem porque o próprio narrador de tanto abordar a vida do assassino acabou por perdendo-se completamente no parágrafo acima e então disse a si mesmo que teria que fazer outro parágrafo apenas para explicar que o homem era uma figura tão espetacular que todos os detalhes seriam poucos e esse foi o sentido desse parágrafo de período único – o que é feio pelas normas culta, mas foda-se a norma culta.

O que acontecia era que Jonatan foi um bioprotótipo especial do projeto que fundou os famosos hitmans – como Robin, que não conheceu Jonatan porque fazia parte de uma divisão de estudos um tanto diferente – e que tinha a função mais como uma sentinela. Não como um grande robô copiador de poderes, mas como um vigilante que consegue ver tudo exatamente do ângulo que necessita para executar a tarefa necessária. Não tinha uma força como a de Robin ou sua velocidade, entretanto ambos tinham o vigor do teletransporte. Habilidades que Robin não teve nem sonho de obter em toda a sua vida Jonata teve por grande parte de sua vida. Jonata era como um sensor teletransportador. O protótipo foi utilizado para tentar descobrir fendas no espaço-tempo para que o meio científico pudesse ter um melhor estudo da viagem pelo tempo e também pelo espaço a partir da localização dela. Jonatan seria um papel importante nesse caso – se o projeto não tivesse falido.

Há respostas que o narrador não pode dar porque é um imbecil acéfalo ou porque não gosta de dar, há também respostas que o universo não pode dar porque o próprio não permite.

Mas uma dessas fendas foi sentida por Jonata enquanto pegava o café que começara a preparar desde que terminara de esconder a sua arma e matar um amigo. Uma fenda interessante. Com uma intensidade que já sentiu antes, mas que não pôde analisá-la porque era uma distância inacessível, o tempo em que uma fenda se fecha é menos que dez segundos e mesmo tendo o poder do teletransporte dez segundos pode ser pouco dependendo da distância. Ou seja, conhecia aquela frequência. Sentiu os elétrons tornando-se prótons por um milionésimo de segundo, o mundo tornando-se um caos, e voltando ao normal e tinha apenas dez segundos para chegar até lá. Apenas. Ainda tinha dez segundos. Porque chegou até a fenda em centésimos de segundo enquanto tomava o seu café. Tinha alguns segundos para analisar e outros dos mesmos para decidir se entrava ou não ali.

Terminou o seu café enquanto que sua visão panorâmica avaliava o local, sentia duas energias fortes, só que apenas uma dela vinha da fenda. A outra vinha surpreendentemente de um ser vivo, cuja aura se demonstrava cada vez mais enfurecida, esse homem era familiar para Jonata. Um Imperador Solar, até porque emanava grande energia amarela.

Era interessante para Jonata. A primeira vez que conseguia enxergar ao vivo e à cores um Imperador Solar. Pensou que seria mais interessante, dessa vez, testar se eles eram realmente tudo isso que suas auras emanavam ou se isso era apenas coisa da mídia. Era isso ou pegar a quarta máquina do tempo que o homem tinha o hobby de colecionar.

Jonata por um segundo decidiu que talvez fosse interessante testar suas habilidades, apenas testar. Contudo vale constar que Jonata foi o protótipo que não foi criado sequer para a utilização de artes marciais em sua defesa, muito menos em conjurar uma aura ofensiva, se lutasse seria a partir da genética física inalterada, suas armas e a utilização do teletransporte como efeito surpresa. Mas aquela aura era algo sobrenatural. Forte de natureza e ainda sendo excitada pelos sentimentos tônicos que o Imperador Solar emanava. Eram sentimentos de tristeza, conseguia perceber Jonata que como um tendo sido desenvolvido a fim de se tornar um sensor humano que as causas do desequilíbrio da aura do Imperador eram extremamente sentimentalistas.

Sentimentos esses que surgiriam repentinamente. É de conhecimento geral que Molly Tenyst Aligator se tornava cada vez desesperado desde que fora impotente na batalha nos Confins do Espaço e que se culpava profundamente pela perda de Wilson na batalha versus o homem que buscava a partícula Vril. Esse sentimento teve tanta ascensão no decorrer dos últimos capítulo que um inteiro foi utilizado apenas para demonstrar os sentimentos que se erguiam como a noite obscura que cai assim que o sol se ausenta parcialmente do céu – ainda deixando parte de seu brilho para a lua –, mas não havia lua para o caso do caolho.

Cada momento sentia que havia perdido seu amigo e que isso era culpa sua. Já não bastava a morte de Krom Hellrock que nunca saiu de sua mente, que também julgava ser parcialmente culpa sua – mas não era idiota o suficiente para assumir por completo a responsabilidade diferentemente do caso de Wilson que tinha e conseguia argumentos concretos vindo de si mesmo que fora sua culpa que seu amigo estava morto, ou seja lá o que tivesse acontecido enquanto o caolho estivera apagado.

Então subitamente a figura inesquecível de Krom ressurgiu ao mundo material bem em frente a Molly, um fato inexplicável que após refutar um significante número de vezes que aquilo não poderia ser verdade, decidiu aceitar e ouviu as palavras do amigo que até então considerou estar morto. Não refletiu nenhuma mais vez sobre o que seria exatamente aquela representação de Krom, não tinha mais humor para si e movia-se automaticamente a partir de suas emoções interessadas apenas em saber o que estava acontecendo. Assim como Wilson não estava presente Ramon também desaparecera talvez até antes da chegada de Hian ao templo nos fins do universo. Pensava que Ramon também tivera ido combater ao mesmo mal que Molly falhou e provavelmente o mesmo aconteceu com Wilson. Preocupava-se com o bem-estar de ambos, e no caso de dois, incluindo Molly tornar-se-iam três, estavam longe da juventude ideal para usar o cem por cento do poder que seus corpos treinados poderiam usufruir. Mais ainda Molly que pouco lembrava como era andar.

Molly de um dia para o outro passou de uma simples partícula subatômica de energia amarela para um inteiro corpo humano. Via o mundo da mesma forma, caminhava dificilmente tentando se acostumar ao corpo que não usava há anos e quando testou suas habilidades marciais pouco teve potencial. A batalha contra o adversário pífio que caso lembrava bem era algo como Goblin ou Ribon – que na verdade era Robin – pouco serviu para readaptar-se às táticas de combate. Robin era um rapaz muito fraco. Longe do oponente que Hian foi e ainda mais longe de Terry – o inimigo que anos atrás serviu para dar um fim para Molly.

Entretanto dessa vez Molly estava completamente distante de seu verdadeiro eu, sua essência mais selvagem estava se manifestando enquanto caminhava puto da vida e não percebia do caos que sua aura estava causando ao redor. Em questão de segundos seus passos revestidos pela energia solar emanada pelas células revestidas de camadas fotoativas estavam destruindo o asfalto segundos após Molly dar seus passos. Ao redor as construções ou a própria vida vegetal – abundante no parque – também não era perdoada pela aura que não as queimava, como o que o leitor talvez houvesse pensado por estarmos tratando do calor do sol, entretanto a aura enquanto crescia fatiava ou esmagava, até mesmo arrastava dependendo da densidade do objeto, o que estava ao redor.

Foi então que Jonatan acovardou-se. Dois segundos a mais após decidir que ficaria foi o necessário para perceber que ficar seria um grande problema. Aquele Imperador Solar estava absolutamente fora do controle e todo aquele cenário tornar-se-ia um grande caos em questão de minutos. Estava longe de ser horas, a imensidão da aura crescia em progressão geométrica e Jonatan duvidava se conseguiria combater no mesmo nível um Imperador Solar. O que tinha certeza era que não sobreviveria à catástrofe que estava por vir. E como era um homem de fatos apenas retirou o seu sobretudo para que pudesse caçar Mario mais à vontade. Após despir-se numa fração de seis segundos retirou do bolso esquerdo de seu paletó uma calibre quarenta e cinco para ir preparado até o outro universo que o esperava por depois daquela fenda enquanto que aquela cidade estava prestes a ser destruída pela ira de um dos reis do sol.

O rei do sol não tinha sequer essa vontade, sua aura se tornou um mal que não conseguia controlar por conta da extremidade negativa que seus sentimentos haviam chegado. Assim como Krom Hellrock que destruiu uma ilha inteira para parar uma guerra, a destruição que Molly causaria acabaria por se tornando menor – é claro – não estava tão louco para que implodisse, mas estava talvez uns quinze degraus para chegar a esse ponto. Apenas caminhava sobriamente de si. Sempre foi um homem que guardava os sentimentos para si mesmo. Só não esperasse que a sua aura preferisse deixá-los a mostra para que o mundo visse e temesse a ira do caolho.

As manchas amarelas tornavam-se maior, as pessoas comuns não conseguiam vê-la, apenas sentir como que algo estivesse pressionando o ar ao qual tentavam respirar. Com a progressão geométrica retratada por Jonatan que era a energia emitida involuntariamente pelo rei do sol, pessoas eram arrastadas contra sua vontade ou empurradas dependendo da direção ao qual caminhavam. E apenas Molly estava intacto. O asfalta era cada vez mais esmagado deixando crateras de tamanho significativo por onde os pés de Molly pisavam, e o caolho pouco percebia – sua mente estava focada demais para ficasse desatento. Molly atualmente estava procurando por respostas, por alguma pista que pudesse levá-lo a saber o que estava acontecido de verdade.

Por um momento percebeu, todos estavam abandonando-o. Óbvio que em seu estado normal do pensar o caolho nunca afirmaria tamanha babaquice, mas no estado já caducava um pouco. Wilson havia partido. Ramon havia partido. Xupa havia se tornado apenas mais um babaca qualquer e Krom... Espera. Krom ainda está por aí.

Molly olhou para os lados tentando ver se o fantasma estava nas proximidades, mas apenas viu a destruição que com a sua atual caduquez era pouco significativa. EU QUERO UMA RESPOSTA. ME DIGA ALGO, KROM. Pensou para si mesmo. Era o clássico caso do homem que sempre guardou seus pensamentos para si mesmo, apesar de parecer completamente OK enquanto caminhava com suas mãos nos bolsos tranquilamente estava com sua mente em total caos. Esse caos podia ser também comparado ao caos que rodeava Molly.

Foi então que Molly ouviu uma voz.

– Pare mestre. – Era sem dúvida a sua discípula, Ino. Estava caminhando na água e foi assim que Molly percebeu que também estava pisoteando o lago poluído que separava a cidade de Black Dog e o Distrito de Berry Shields.

Quando o Imperador Solar ouviu essa voz doce e gentil, que não ordenava mas pedia ao mestre educadamente que cessasse seja lá o que, toda a manifestação caótica de seus pensamentos cessou. Havia funcionado, magicamente, apenas Molly não havia ainda percebido tudo o que aconteceu no tempo de cinco minutos ao qual caminhou e colocou grande parte do bairro em escombros.

– Parar...? – Antes que o caolho completasse com “Com o quê”, a resposta caiu diretamente para os seus olhos. Havia colocado grande parte da cidade para o chão como escombros e isso o assombrava. Primeiramente não associou a destruição quase que completa de Black Dog com seus pensamentos agonizantes – uma coisa difícil uma vez que havia perdido todo o espetáculo enquanto viajava em seus próprios pensamentos. – O... Que aconteceu?

– Você fez isso mestre. Agora precisa vir comigo.

– Para onde? – Molly prosseguiu observando a cidade em pedaços e carros militares blindados estavam deitados no chão como se derrubados por uma força superior. Não fazia sentido. Havia destruído quilômetros de uma cidade e não percebeu por nem sequer um segundo. Ao que parecia outros já haviam tentado com que Molly cessasse com a onda de destruição involuntária, o que explicava os rombos em um dos prédios que haviam caídos – o tiro de canhão havia ricochetado na representação de sua aura e provavelmente os militares haviam ficado de queixo caído.

– Temos que ir até o fim do arco-íris. Pegar Xupa Cabrinha.

– Hmph. Você sabe mesmo animar um velho.

Foi em um instante de distração que por consequência deste pensamento tornou-se um momento de total lucidez que Xupa Cabrinha teve o seguinte pensamento enquanto terminava o seu segundo maço de cigarros: Eu acho que eu deveria estar tentando fazer alguma coisa. Eu não voltei para nada. E realmente havia voltado para alguma coisa, e essa coisa provavelmente se retraria na seguinte menção de um fato já muito bem explicado para o leitor de que o homem estava incrivelmente louco. Xupa Cabrinha desde que voltara ao mundo estava sem companhia alguma a não ser por seu amigo que mal se lembrava, mas que depois de um tempo começou a ter uma relação bem simpática com o espectro. O homem de terno branco não pensava que Krom Hellrock era um fantasma, assim como Molly enquanto fora de si Xupa nem sequer chegava ao ponto de questionar a existência de Krom Hellrock, para ele era como uma pessoa que não havia morrido – continuava em seu coração.

Ouve-se desde criança que as pessoas morrem o papo furado de que elas não morrem de verdade. Podem morrer no plano físico, mas seu papai sempre diz que a alma dela continuará na eternidade em seus corações. Será? Bem, aceitando isso é assim que Xupa Cabrinha reconhecia a existência do amigo que fizera antes de congelar-se no ártico e que refez após renascer. A primeira imagem que Xupa Cabrinha teve foi como uma pequena com uma praia cheia de rochas. Não sabia exatamente de nada do que havia acontecido, mas, apesar de sua amnésia, ainda sabia falar ou andar. Conseguia mover-se muito bem, para alguém que passou anos boiando no mar em uma pedra de gelo, e procurou primeiramente uma forma qualquer de traço de civilização. Não encontrando nada de seu interesse, deparou-se com uma imensa floresta que mais parecia uma grande estufa calorosa típica de uma floresta tropical. Era pequena a presença de animais e de maioria eram insetos pequenos e coloridos que, apesar de venenosos, não se intimidaram com a presença de Xupa Cabrinha. Para os insetos era como se realmente não houvesse nenhum homem de terno branco por ali. Não sentia emoção alguma vinda daquela forma de carne e ossos. Entretanto, havia um sapo. E esse se perguntou: Isso é um humano?

Talvez você pobre humano de mente pequena tenha uma grande mente só que fechada demais para que imagine sapos realmente falando. Posso afirmar com grande certeza que o senhor ou a senhora tenha imaginado animal verde e exótico da forma que você imagina ser um sapo tenha dito: Isso é um humano? Mas ele não disse da forma que os sapos costumam dizer, ele disse abrindo a boca e dizendo em alguma língua identificada pelos seres humanos como uma língua comum de um ser humano – até mesmo uma língua já extinta como o latim –, dando características humanoides a um simples animal. Isso é personificar. Não ocorre isso com o sapo porque ele não se comunicar com os outros animais a partir da fala, um fato tão primitivo que grande parte das formas de vida terrestre nem necessitam utilizar – e, se utilizam, é apenas pelo drama ou pelo estilo. O sapo não precisava disso. Era inteligente demais para que usasse táticas tão primitivas como essa, assim como seu amiguinho Leroy Jenkins que era uma sardinha da praia ali do lado. Mas, nesse caso, todo esse discurso foi desnecessário porque esse sapo atualmente não falou e nem teve uma pequena intenção disso. O que o sapo fez foi simplesmente pensar para si mesmo, como em um monólogo. Ele se chamava Mubram e adorava que seus amigos o chamassem de Mub porque era um apelido bem bonitinho.

Mub então pensou: Isso é mesmo um humano? Foi então que após uma reflexão para as origens de seu cérebro avançado demais para a compreensão humana foi que Mub percebeu: Não, esse homem não é um humano. Fazia sentido afinal Xupa Cabrinha era como um pedaço de carne ambulante. Poderia ser muito bem um caranguejo ou um guaxinim, até porque o que define um ser de ser humano ou humanoide é a pitoresca característica de ter um corpo formado daquela forma clássica que todos nós humanos sabemos como é e, o mais importante de tudo, ter sentimentos. Reagir a cada instante da sua vida como uma nova surpresa e com uma nova mentalidade, encarar os desafios com os hormônios sendo intensamente descarregados nos neurônios e agir como um idiota na maioria das vezes. Até que aquele homem de terno branco tem uma forma humanoide, pensou Mub, mas ele não tem sentimentos. Não consigo farejar o seu medo e nem a sua vontade, seus pensamentos são fúteis e não tem nenhuma relação com o seu desempenho físico. Logo, ele não é idiota. Então ele pode ser muitas coisas, menos um humano – ou um humanoide, concluiu o sapo.

Foi então que um sapo conhecido por ter a maior língua na sociedade dos sapos surgiu repentinamente para dar uma notícia urgente para Mub. Era Hulkrab, que odiava ser chamado de Hulk, apesar das fêmeas o chamarem assim e ele continuava amando-as. Hulk disse: Chefe, nós temos um problema. Mub surpreso com a repentina aparição do aliado bocejou e aproveitou o momento de espantou para pescar com a língua uma mosca que passava por ali, disse:

– Eu não estou entendo você, Hulkrab. Qual seria esse problema? Está tudo tão bem e em harmonia.

– Mas e esse humano? – indagou Hulkrab.

Mub já esperava isso de sapos como Hulkrab. Eram idiotas e brutos demais para entenderem toda a filosofia da definição de humanos e de como diferenciá-los de outras criaturas mundanas. Mas o sábio anfíbio preferia calar-se a que explicar ao ignorante o motivo das coisas, não era sempre assim, mas nesse caso principalmente não tinha a menor vontade de querer dizer ao pobre de mente Hulkrab porque aquela criatura não era um ser humano. Hulkrab percebeu o egoísmo do mestre sapo ao vê-lo bater a patinha duas vezes no pedaço de rocha ao qual estavam apoiados, um ato muito bem conhecido pelos sapos de dizer “eu estou rodeado por babacas” e, por mais que Hulkrab fosse mesmo um babaca, sabia interpretar muito bem o que tudo aquilo dizia.

– Por que me tratas assim, mestre Mub? – indagou Hulkrab, mais triste do que com raiva de Mub.

– É porque tu és muito ignorante, acabas por rotulando com poucos fundamentos tudo o que vê e para você é assim. Se você perguntasse-me, “É um humano, mestre Mub?” eu lhe responderia, mas você veio ignorantemente se dirigindo até mim dizendo que tinha um problema e disse que esse humano era o problema. Esse é o grande problema Hulkrab.

– Mas ele é um humano, não é? Afinal, olhe para sua aparência.

– Vamos lá, Hulkrab, vejo que terei que começar do comecinho com você. Sem querer menosprezar-lhe, mas até um girino saberia que não é um humano, afinal esse humano não sente nada. É como um pedaço oco de carne, poderia ser muito bem ser um urso ou um bicho preguiça, tudo depende do ângulo.

– Por favor, Mestre, não me compare com esses girinos. Eu posso ver. Os girinos não. Logo posso afirmar que isso é um homem exatamente pela aparência.

Ironicamente quem estava com raiva de quem naquele momento era Mub. Estava com muita raiva. Realmente uma raiva sem fim. Afinal, fora o professor de Hulkrab na academia enquanto este cursava a faculdade e filosofia para por fim terminar como um simples segurança. Mub sempre confiou em seus instintos que diziam e que sentiam que Hulk tornar-se-ia um grande filósofo da academia dos sapos da ilha sem habitações humanas do mar do sul, mas o rapaz que na época era um estudante acabou por se perdendo nos caminhos das trevas e das drogas. Toda noite Mub ouvia os barulhos das festas dos universitários embaixo de sua árvore, e toda noite ele rezava para que Hulk não estivesse ali – e estav, ao que resultou no fim da vida acadêmica do rapaz. Hulk acabou repetindo por dois anos e enfim pensou “Foda-se a universidade”.

E era por isso que o mestre estava furioso. Poderia berrar, mas não era um ser tão irracional como os humanos para demonstrar seus sentimentos – afinal, como poderia estar tendo sentimentos se nem humano era? – para os outros, guardou para si. Primeiramente respirou fundo para dar dois saltinhos, Hulk percebeu que o mestre estava furioso só que tentando se acalmar e também respirou fundo. Mub esqueceu tudo que estava anteriormente rodeando seu pequeno cérebro para focar-se na pergunta do seu ex-estudante, digo, seu atual capataz. “Mas nós podemos ver, mestre”, foi basicamente isso que o guerreiro havia dito para o professor.

– E desde quando nós sapos vemos as coisas superficialmente? Não somos humanos. Claro que não somos – afirmou, com certa dúvida.

– Você está certo mestre, eu realmente errei – conformou-se o pobre guerreiro que teve sua vida universitária findada a partir do momento em que ingeriu a primeira frutinha silvestre numa festa debaixo de uma orquídea.

Mub então movimentos que não eram de Hulk e também não seus. Se Mub era chamado de Mestre por Hulkrab, então este teria que se dirigir ao Reitor Papreb a partir das nominações Mestre Dos Mestres ou Grande Mestre do Saber. Entre esses, Hulk sempre preferira Grande Mestre do Saber porque é muito mais épico do que Mestre Dos Mestres. Papreb dificilmente aparecia em público como em ocasiões como essa, para que o Grande Reitor tivesse se ausentado de seus aposentos para pisar nas terras e nas rochas daquele mundo imundo demais para os seus pés, mais inteligentes do que o mais inteligente físico teórico que a humanidade já conheceu, era porque alguma coisa muito grave estava acontecendo. Não a simples aparição de um humano, isso até mesmo Mub que era um singelo e humilde Mestre em relação a Papreb poderia resolver. Primeiramente assim que avistou o reitor decidiu perguntar-lhe o motivo de sua repentina aparição em terras tão sujas, entretanto percebeu que os pequenos olhos do verde sábio dos sábios estavam focados demais para que algum mero plebeu interrompesse. Até mesmo Hulkrab que era um fracassado da vida conseguiu perceber que caso dissesse qualquer palavra, se fizesse qualquer barulho, se fizesse qualquer movimento brusco, receberia a ira do Grande Mestre do Saber até os fins dos tempos. Óbvio que isso Hulkrab não percebeu, mas o humilde mestre conseguiu perceber que toda a concentração do mestre dos mestres visava o ser que até agora Mub não soube certamente definir. É claro, pensou Mub, os olhos do mestre são muito mais experientes e sábios do que o meu, logo é muito certo que ele conseguirá ver coisas que meus olhos não tão bem treinados não conseguem visualizar.

E era mesmo esse o caso. O mestre Papreb via em Xupa Cabrinha um caso alarmante. Via uma mancha negra no meio de todo o vazio sentimental que cobria cada pedaço de carne do homem de terno branco. Mas, na realidade, não era realmente todo o corpo do Imperador Solar que comparecia na cor mais neutra de todas. Havia uma anomalia, um caso que nem mesmo o experiente reitor sabia dizer o que realmente era e para defini-la teve que analisá-la por cerca de um minuto e meio enquanto Xupa estava sentado em uma rocha qualquer bastante próxima dos sapos, mas não o suficiente para que percebesse que um sapo barbudo o observava intensamente enquanto se segurava em um galho de uma goiabeira. E então o sapo, o mais sábio entre eles, havia simplesmente percebido o que é que estava acontecendo.

Ainda focado, Papreb percebeu que havia uma espécie de sentimento transbordando do coração da criatura. Não eram sentimentos, até porque isso contradiria o pensamento completo de Mub, mas era algo como isso, Papreb não conseguiu classificar até porque era a primeira vez que havia visto algo assim. E não era uma amostra que ele poderia dissecar ou fazer testes psicoemocionais, era um ser vivo que andava e logo sairia do seu campo de visão. Essas manchas negras sentimentalistas estavam rodeadas de cores muito mais avermelhadas, como o vinho, em suas borbas. Eram bordas realmente finas e não seria justo dizer ao leitor que eram como bordas de fotografias, até porque não era. O mais condizente a relatar ao leitor é que eram como linhas desordenadas que cobriam o coração de Xupa Cabrinha. Não eram como simples linhas, eram como que uma borda que estivesse sido pressionada por dentro. Era como que a massa pseudosentimental negra estivesse pressionando para que a borda, que o Grande Mestre do Saber interpretou como uma parede celular vegetal que impedia que a massa pseudosentimental saísse ou que ocorresse qualquer influência externa no comportamento dessa mesma massa.

Era isso. Alguma coisa muito ruim estava prestes a ser liberada ali e o grande sábio não queria estar ali para assistir a destruição que aquilo causaria. Sabia que nem mesmo o grande exército de sapos conseguiria lidar com o que aquela criatura se tornaria, mas também percebeu que aquele selo demoraria anos para ser rompido. Mas, a grande pergunta era: O que era aquilo? O que era essa criatura que havia chamado tanto sua atenção?

Sim, era um humano. Apesar de todas as contradições às regras cultas de classificação, ainda havia algo como sentimentos rodeando intensamente e prontos para serem disparados para fora do selo feito por linhas vermelhas, e então era um humano.

Foi então que Xupa após lembrar-se dos primeiros momentos do seu renascimento cerebral percebeu que tinha mesmo que fazer algo. Assim como o leitor perdera consideráveis minutos lendo os parágrafos acima que até agora não tiveram nenhuma importância para o decorrer da história e que poderiam muito bem ser cortados para que o enredo melhor fluísse, o homem de terno branco muito tempo também havia perdido lembrando esses momentos de insegurança e incerteza.

Mas, o que Xupa Cabrinha iria fazer? Não havia mais motivo para contratar outra gama de babacas para que nada fizessem contra seus inimigos, e provavelmente esses inimigos não viriam. Não tinha mais a ideia louca de bater de frente com o sistema, pensamento incrivelmente banal que a essa altura do campeonato pouco sabia dizer como que havia se fissurado tanto nisso para confiar em estranhos para esse trabalho. Talvez seu plano fosse realmente entrar para a presidência, como Krom afirmava e como o misterioso homem vestido de super-herói primeiro sugeriu. Mas certas coisas ainda estavam incompletas na cabeça de Xupa Cabrinha, assim como muitas são deixadas de lado nesse final de temporada.

A figura fantasmagórica de Krom Hellrock, cuja aparição é enigmática e mal explicada até agora, havia dito que viu o Imperador Solar ganhar uma eleição e ao mesmo tempo não ter tomado o poder do país. O que isso significava? Xupa Cabrinha seria obrigado devido às situações futuras a renunciar? Morreria? E quem era o viajante no tempo citado tão dramaticamente pelo fantasma do antigo amigo de guerra e o que ele teria a ver com o decorrer da história a partir dali? O que tudo isso significava? Eram muitas perguntas e poucas respostas. Mas uma frase que sempre marcara a vida do narrador e há de marcar a vida de ainda muitas pessoas que nascerão ou que estão para lê-la ou ouvi-la é que o mundo é movido pelas perguntas e não pelas respostas. Eram muitas as perguntas do homem de terno branco, tantas perguntas que simplesmente não poderiam ser calculadas usando uma matemática casual.

Foi que uma chama ascendeu do peito do homem e queimou o interior do homem como que um foguete partindo para uma missão no espaço. O lançamento da aeronave foi como um surto no coração do rapaz, mas a rápida decolagem decorreu que chegasse com uma velocidade tremenda no seu destino: a mente de Xupa Cabrinha.

E como que sabendo algumas respostas só que mesmo assim tendo muitas a serem respondidas Xupa Cabrinha levantou-se como se não tivesse duvida a quem procurar e nem o que perguntar. As perguntas eram muitas, mas essa chama que ascendeu em seu corpo até chegar a sua mente fê-lo que soubesse qual era mesmo a questão que poderia lhe dar de uma vez só todas as respostas que precisaria no vestibular de sua mente. E com os simples dois passos abriu a porta e desceu as escadas. Ainda se escondia e agora que se sentia outro homem simplesmente achava isso repugnante. Xupa Cabrinha um homem de se esconder? Isso não fazia nenhum sentido, afinal não era um homem que fugisse da luta.

Foi quando pisou novamente na realidade, que anos não via graças às correntes que prendiam sua verdadeira mente a seu corpo, que Xupa Cabrinha sentiu-se o mesmo novamente. Ainda não tinha todas as suas respostas e as que ele tinha ainda não se encaixavam às perguntas. Qual é o primeiro número primo? Urânio. Não fazia sentido, mas o rapaz sabia quem lhe faria saber de tudo que necessitava.

E foi voando que começou mesmo a sua jornada.


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