A Realeza de Ouran escrita por Machene


Capítulo 8
Anjas Requisitam Demônios Pessoais




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Cap. 8

Anjas Requisitam Demônios Pessoais

Já é metade do mês de janeiro e os anfitriões se preparam para encerrar o ano letivo. Suas noivas pelo contrário não parecem estar preocupadas com as provas finais, apenas com o tédio causado pelas aulas. No aviso do sinal, Aika e Aiko entram caminhando calmamente para sentar perto dos gêmeos. Desde o caso da praia, Hikaru não se sente confortável perto da gêmea mais velha, e ela tem certeza disso. Mas, seja do seu gosto ou não, a moça senta atrás dele e ao lado da irmã, que se acomoda alegremente às costas de Kaoru.

Quando o professor entra na sala, após o cumprimento tradicional dos alunos Maiko e Haruhi viram para falar rapidamente com as duas sem dar muito na vista.

– Por que vocês se atrasaram? – a pequena questiona com olhar repreensivo.

– Não chegamos atrasadas. Entramos quando o sinal tocou, então estamos salvas.

– Mas vocês costumam chegar sempre cedo, não é Aiko?! – Haruhi relembra.

– Demoramos um pouco mais pra nos arrumar. – Aika pisca para a irmã e esta retribui sorrindo.

Mesmo desconfiados, os outros não dizem nada e Kaoru logo começa a puxar assunto com Aiko sem dar muita atenção à disciplina. Mais tarde, quando os seis entram na terceira sala de música encontram o grupo de amigos em volta de uma criatura revoltada, claramente o motivo de o clube estar vazio.

– Cruel, é muito cruel! Vocês são muito cruéis! Como puderam não ter me contado nada?

– O que está acontecendo? – Haruhi se aproxima – Ah, é você Renge-chan.

– Quem é essa daí? – mal Aika termina de perguntar, a francesa voa sobre ela e a duplicata.

– São vocês, as gêmeas! AH, NÃO ACREDITO! – as garotas tapam os ouvidos e fazem caretas.

– Claro que somos gêmeas, não deu pra perceber pelas caras idênticas? Vou perguntar de novo, quem é você? Por acaso vocês deixaram essa cliente doida escondida da gente? – Kyoya sorri.

– Não Aika, essa é Houshakuji Renge, nossa gerente. Ela passou algum tempo fora em visita aos pais.

– “Algum tempo fora”? Quanto tempo se nós nunca a vimos por aqui?

– Eu não costumo aparecer muito, mas antes das férias de inverno já tinha ouvido rumores sobre sua chegada. Eu não estava presente no começo do ano, pois passei uma temporada estudando em minha terra natal, contudo, depois de saber que nós tínhamos novas alunas na escola relacionadas ao clube, vim pedir logo ao Kyoya-sama que me passasse as suas fichas de descrição. – ela sorri orgulhosa, batendo a mão no peito – E a minha intuição estava certa novamente! Vocês são mesmo noivas dos anfitriões!

– Ok, primeiro: como ela suspeitou dos casamentos arranjados se não contamos pra ninguém?

– Aika e Aiko chegaram anunciando isso na primeira visita, já esqueceu Suzu? – Linh ri.

– Ah, é verdade. – a mais velha olha repreensivamente para as jovens, que viram os rostos – Eu devia ter imaginado que as pessoas suspeitariam mesmo tendo pedido pras duas desmentirem o anúncio feito na sua apresentação escandalosa daquele dia... Bem, segundo: Houshakuji-san, por que não veio falar conosco assim que melhorou ao invés de pedir informações ao Kyoya?

– Por favor, pode me chamar de Renge. – pausa, colocando as mãos na cintura – Eu tinha certeza de que não me contariam a verdade se tentaram esconder isso de todos.

– Nisso está certa, mas isso faz de você uma pessoa curiosa e atrevida. – Linh franze o cenho.

– Bom, desculpe por isso, mas como gerente do clube é meu dever saber o que se passa...

– Só que este assunto não desrespeito ao clube, é de interesse particular!

– Ok Linh, já chega. – Suzu pede – Eu estou certa de que Renge-san não fez por mal. Mas ainda me sinto intrigada com uma coisa. – ela vira-se ao noivo, abrindo um sorriso sarcástico – Por que disse tudo a ela, “Kyoya-sama”? – ele sorri orgulhoso, tendo mais certeza do desconforto da moça quanto à garota.

– De fato, se as outras moças da escola soubessem nossa relação poderiam parar de frequentar o clube, mas se Renge-kun estiver a par da situação poderá nos ajudar a espairecer as suspeitas de todos.

– Nós estivemos nos virando muito bem até agora. – Linh revida novamente, cruzando os braços.

– Mas eu sei como a mente das garotas em Ouran trabalha. – Renge anuncia erguendo o indicador – Se vocês estiverem de acordo, posso incluí-las no programa e torna-las anfitriãs do clube!

– O QUÊ? – todos questionam incrédulos enquanto a jovem ri.

– O que quer dizer com isso Renge-chan? No que está pensando?

– Ora Haruhi-kun, nós precisamos arranjar uma desculpa para elas frequentarem o clube sem dar na cara que são suas noivas secretas! – os demais se entreolham confusos.

– Em outras palavras, a sua sugestão é agirmos como eles para ninguém suspeitar de nós?

– Isso! – ela sorri para Suzu – Eu dou todas as dicas necessárias para se encaixarem.

– E como vai justificar o fato de termos passado tanto tempo aqui e não agirmos como anfitriãs?

– É elementar, minha cara coelhinha!... – Renge aponta para Maiko, que pende a cabeça para o lado – Nós podemos declarar que vocês estavam em período de experiência.

– Mas nem pensar! – Linh faz uma careta – Deve ter outro jeito de desviar a atenção daquelas doidas Suzu, não pode! – a amiga suspira, ponderando a situação.

– Acho que não temos muita escolha Linh. Não é a ideia mais confortável, mas o ano já está no fim de qualquer forma. Se aceitarmos, não faremos isso por mais de dois meses, considerando que as nossas aulas se encerrarão no começo de março. Mas devo informa-la, Renge-san, nós ficaremos em Ouran até este ano.

– Tudo bem, eu compreendo. Então, todas topam? – ela encara diretamente as duplicatas.

– Pode ser divertido. – entusiasmada, Aiko sorri enquanto Aika suspira com uma mão na cintura.

– Ok, fazer o quê. O que você acha Mai? – a pequena acena em acordo – Linh-chan?

– Eu tremo só de pensar em fazer papel de ridícula, mas não deve ser pior do que usar este uniforme.

– De acordo! – as gêmeas erguem as mãos e alguns riem.

– Bom, então eu vou enquadrá-las com o nosso cenário. Nós vamos abrir o clube daqui a pouco, então primeiro vocês precisam se trocar! O tema de hoje é “conto de fadas moderno”! – anuncia empurrando as moças para o vestiário, então Linh suspira aborrecida.

– Retiro o que eu disse: pode ser pior sim. – resmunga sobre as risadas das amigas.

Logo estão todos fantasiados para abrir o clube. Quando Renge apresenta as donzelas como as novas anfitriãs, um contingente enorme de homens invade o local gradativamente. Com satisfação, ela pega seus binóculos e inicia sua observação diária do palco preparado, ligando para uma ou outra pessoa com alegria convidativa. Os pares começam a trabalhar juntos fazendo casais românticos de histórias antigas. Kyoya e Suzu encenam Romeu e Julieta, mas a pedido dela o vestido não tem tanto babado quanto o convencional.

Linh e Mori são a Bela e a Fera, contudo ele parece mais humano do que fera; ou melhor, a aparência é como a de um poste fantasiado de leão. Para melhorar sua imagem, as gêmeas cortaram parte da juba lhe cercando a cabeça e fizeram munhequeiras felpudas, além de pintar uma cicatriz perto do nariz e outra em seu peito. A sombra preta ao redor dos olhos o faz parecer mais assustador só por uma encarada, o que de fato facilita afastar os homens ao redor da sua bela. Linh passa todo o tempo protegida atrás dele.

Em outro canto da sala, Honey e Maiko conversam com o quarteto gêmeo sobre suas representações.

– Esta roupa que você me arrumou tá pinicando muito Aika! O que nós somos afinal?

– Dom Casmurro e Capitu. – os rapazes a encaram com estranheza.

– Deu um murro em quem? – Kaoru pergunta confuso.

– Talvez na mesma pessoa que captou... Alguma coisa... – Honey responde igualmente atordoado.

– Vocês não entenderam. – Maiko ri – É Dom Casmurro e Capitu. Na verdade o nome dela é Maria Capitolina Santiago, Capitu é só um apelido. Ela é uma personagem do livro Dom Casmurro, de um autor brasileiro chamado Machado de Assis. É tida como uma mulher bonita, casada com Bento Santiago, mais conhecido como Dom Casmurro, um homem muito ciumento. Nesse romance protagonizado pelo casal, o narrador constrói uma narrativa ambígua por natureza, fazendo com que o leitor ora duvide ora acredite na inocência de Capitu, acusada de adultério pelo marido ex-seminarista e advogado.

– O que quer dizer... – Hikaru franze o cenho ao encarar sua noiva – Eu sou um corno?

– A traição de Capitu não foi provada, então ela é inocente até que se prove o contrário.

– O que não é seu caso, minha querida irmã. Sua inocência sumiu depois dos quatro anos. – ela cerra os olhos quando todos riem – Você já poderia ser enforcada logo de cara.

– Ah, e você está bem com seu papel então? O espírito de uma mulher...?

– Muito bonita e amada; sim, estou feliz. – ela balança seu vestido – Não estou bonita Kaoru?

– Ah... Sim. – ele responde corado, chamando a atenção da pequena loira – Mas... Quem nós somos?

– Dante e Beatriz. – Maiko novamente responde – Os dois são personagens de um belo poema de viés épico e teológico da literatura italiana, e da mundial, chamado a Divina Comédia. Ele foi escrito por Dante Alighieri no século 14 e até rendeu uma peça de teatro.

– Estou com medo de perguntar, mas do que se trata? – o gêmeo mais novo indaga.

– A história propõe que a Terra está no meio de uma sucessão de círculos concêntricos que formam a Esfera armilar e o meridiano onde é Jerusalém hoje; seria o lugar atingido por Lúcifer ao cair das esferas mais superiores e que fez da Terra Santa o Portal do Inferno. Um dos personagens principais da trama é o próprio autor, Dante. Beatriz surge como sua amada falecida para guia-lo até o rio Lete no Paraíso. Ela é uma figura inspirada em Beatriz Portinari, jovem muito bonita que vivia em Florença numa casa vizinha a dele, segundo dizem alguns críticos literários.

– Então por isso a Aika disse “o espírito de uma mulher”. – ele compreende.

– É sim. Eu sou perfeita para o papel, sendo tão linda, e você está ótimo como Dante senhor Kaoru! – ela segura o braço esquerdo dele e no começo o rapaz cora, mas depois sorri e entra na onda.

– Oh sim, nós somos um casal perfeito, certo senhorita Aiko?! Vamos impressionar os outros com as nossas belezas! – os dois se afastam rindo, indo em direção a um grupo de adolescentes.

– Essa foi, sem dúvida, a coisa mais bizarra que eu já vi na minha vida! – Aika torce o nariz e Hikaru concorda – Vamos apagar isso da memória... Mai, você está muito fofa!

– Obrigada Aika-chan. Fiquei surpresa por conseguirem uma roupa de Penélope pro meu tamanho.

– Penélope? – Hikaru pausa – Ah, a esposa de Ulisses na mitologia grega! Então Honey-senpai é...

– Eu sou Ulisses. – ele sorri amavelmente e então um grupo de clientes se aproxima dos quatro.

– Honey-senpai está tão fofo! – uma garota grita – Ei, ei, você está fazendo Ulisses?

– Sim. – o pequeno loiro responde, colocando a mão atrás das costas da noiva – Mai-chan é a minha Penélope. – as moças dão gritos finos e os rapazes exclamam extasiados enquanto a pobrezinha enrubesce.

– Ei Honey-senpai...! – antes de ela poder dizer algo, o bando de alunos diminui o cerco.

– Mai-chan, você é tão esperta! – diz um jovem – Conte-nos a história de Ulisses e Penélope!

– Ah bem... Eu tenho certeza de que vocês não precisam ouvir de mim. – mas com as súplicas ela teve de desistir – Ok, eu conto! – rapidamente, todos se sentam no chão formando um círculo ao seu redor.

– Retiro o que eu disse. – Aika ri – Isso é ainda mais estranho.

– É. – Hikaru sussurra de volta – Mas dá pra entender por que o Kyoya-senpai a chama de “san”.

– Então... O tema da Odisseia de Homero é a longa viagem de retorno de Ulisses da Guerra de Troia. Por vinte anos ele esteve fora e Penélope esperou a volta de seu marido fielmente. – vendo a atenção do seu público, Maiko olha de relance para a amiga e esta entende o sinal, discretamente acenando para sua irmã se aproximar com o noivo e sussurrando alguma combinação entre eles – Pessoal... Talvez a história fique melhor se vocês visualizarem. Façamos então uma interpretação!

– O quê? – Honey olha-a surpreso e ela faz um sinal para o quarteto gêmeo, posicionando cadeiras na construção atrás do cenário – Ah, entendi! – ele cochicha, partilhando um sorriso, e vai para sua posição.

– Então pessoal, atenção, nós vamos fazer uma interpretação muda da pequena história de Ulisses e a sua amada Penélope agora! – as gêmeas anunciam alto na frente dos atores mais atrás e logo os presentes estão todos voltados a eles – Prestem atenção na fiel demonstração de amor de um casal apaixonado!

Maiko senta em uma das cadeiras organizadas perto da parede e as irmãs vão até ela, pegando leques de plumas para abaná-la como a uma princesa, enquanto Hikaru fica no lugar onde elas estavam com pose de narrador. Kaoru segura uma pequena espada e espera sorrindo atrás de Honey, em frente à loirinha.

– Ulisses era um bravo guerreiro casado com a bela Penélope. Eles viviam felizes até eclodir a Guerra de Troia, na qual o nobre herói foi obrigado a entrar.

O gêmeo mais velho pausa para Honey por a espada na bainha e beijar a mão de Maiko, recebendo a ajuda do gêmeo mais novo, o seu gentil escudeiro, pra subir em uma mesa dando suporte a frente do barco de madeira pintado e improvisado. A partir daí eles acompanham as cenas conforme Hikaru narra.

– Por vinte anos ele esteve fora e Penélope esperou a volta de seu marido fielmente, mesmo não tendo recebido notícias de Ulisses, nem mesmo se estaria vivo ou morto. Assim, o pai dela sugeriu que se casasse novamente, acreditando ter perdido o genro anterior para um infortúnio marítimo.

Com o canto dos olhos, ele percebe Aika movendo o indicador para propor uma troca, então Hikaru acompanha Kaoru nos papéis de pretendentes de Maiko, que ri ao vê-los fazer reverência enquanto Honey se esconde fora do cenário, por detrás deles. Aiko continua agindo como Dama de Companhia.

– Penélope se recusou a trair seu marido, porém, diante da insistência do pai e para não desagradá-lo, ela resolveu aceitar a corte dos pretendentes à sua mão, estabelecendo a condição de que o novo casamento somente aconteceria depois que terminasse de tecer um sudário para Laerte, pai de Ulisses. Ela esperava se livrar dos pretendentes, usando o estratagema para adiar esse evento o máximo possível. – diante dos seus noivos, Suzu e Linh riem assistindo a peça de pé, por detrás dos alunos, e que os faz pensar se elas de certa forma não estariam fazendo o mesmo – E como Penélope fez isso? Ah, ela era esperta! – Aika rapidamente troca posição com a irmã, fingindo expulsar os gêmeos de perto da moça solteira.

– Durante o dia, aos olhos de todos, Penélope tecia o sudário, e à noite, secretamente, desmanchava os fios de todo o trabalho. E foi assim até ser descoberta por uma de suas servas. – por detrás dela, a irmã se dirige a Tamaki e o puxa para a peça, fazendo o público se agitar – Ela contou o ardil ao pai da jovem e ele tomou satisfações com a filha. – Aika aponta para Maiko, fingindo seriedade, e diante do realístico olhar de medo da garota o rei se empolga, balançando o cabelo e fazendo uma pose severa que provoca gritos no seu corpo de fãs – Penélope então propôs outra condição a seu pai. Conhecendo a dureza do arco de Ulisses, ela afirmou que se casaria com o homem que o conseguisse encordoar. – Aiko dá o lugar de narração ao noivo e segura um arco sem corda perto do cenário, oferecendo a Hikaru junto da irmã.

– Muitos tentaram e nenhum conseguiu. Dentre todos os fortes pretendentes, veio um camponês com o rosto coberto para tentar sua sorte. – Honey de repente surge com um capuz sobre a cabeça, recebendo a corda de Tamaki e tomando posição para encaixá-la no arco – Apenas o humilde rapaz conseguiu realizar a proeza, causando surpresa e receio em Penélope, mas então, imediatamente, o camponês revelou-se como Ulisses, disfarçado após seu retorno! – o pequeno loirinho se mostra e pega as mãos de Maiko – E fim. – as pessoas se preparam para bater palmas até as gêmeas o imprensarem num abraço de sanduíche.

– Como informação adicional, Penélope e Ulisses tiveram um filho chamado Telêmaco. – elas olham o casal sugestivamente, sorrindo com malícia, e eles se afastam corados.

Enquanto a plateia aplaude sobre a reverência dos atores, Tamaki se afasta com o quarteto gêmeo até Haruhi, que já está cercada pelos outros casais de amigos.

– Ora vejam, vocês ficaram muito bem nessas roupas. – Haruhi comenta – Considerando a reputação dos gêmeos, é como dizer que vocês são anjas e eles os demônios.

– Sabendo que o meu personagem é um guerreiro do inferno, eu considero essa comparação.

– Não é você que está vestindo a fantasia do corno, Kaoru! – as gêmeas riem.

– Vocês trabalharam muito bem a peça. Por que não tentamos Victor Hugo e Juliette Drouet depois? Seria interessante ver Tamaki-senpai atuando.

– Nem tanto Linh. – Suzu sorri – Ele é acostumado, já faz seu papel de anfitrião muito bem.

– Na verdade ele age como bobo naturalmente. – Kyoya compartilha do sorriso.

– Vocês dois são irritantes! – o rei faz uma careta – Estão com inveja por que Haruhi e eu formamos um casal muito mais bonito. – ele toma o cuidado de falar baixo para ninguém de fora ouvir.

– Oh claro, o príncipe renegado e a plebeia capturada. – Aika ri.

– Deve ser uma fantasia divertida. – Aiko põe uma mão atrás das costas e o indicador sobre os lábios.

– O jeito como você diz isso parece bem cruel. – Hikaru comenta, entreolhando-se com o irmão que ri de lado – Mas que história é essa? Vocês tinham dito que era um famoso casal francês.

– E é. – as gêmeas respondem juntas, unindo suas mãos e fazendo poses dramáticas.

– A história dos dois é digna de um dos romances do próprio autor! – a mais nova começa levantando o seu indicador – Victor Hugo e Juliette Drouet se conheceram em Paris quando ela era atriz e eles logo se apaixonaram. Juliette largou sua vida artística, a pedido dele, para dedicar-se ao escritor que tanto amava e admirava, acompanhando o amado durante quase meio século até mesmo durante seu amargurado exílio em Guernsey,uma ilha no Canal da Mancha na dependência da Coroa Britânica.

– No entanto, sempre independente, ela recusou-se a casar-se ou dividir a mesma casa com o escritor, para que mantivessem a paixão acesa sempre. – finaliza Aika, também erguendo o indicador – Juliette era a musa inspiradora de Victor Hugo, e assim foi por mais de 50 anos.

– Vocês duas sabem muitas coisas. – Mori comenta casualmente.

– Obrigada. – as duas sorriem – Mai nos ensinou.

– Isso faz mais sentido. – o gêmeo mais velho ri até elas o encararem sombriamente – Brincadeira!

– Mas o que vocês estão fazendo aí parados? – Renge grita do outro lado da sala – Vão trabalhar!

– Ei, nós não tínhamos feito uma aposta de quem conseguia planejar mais brincadeiras? – Aiko sorri para a irmã, sussurrando em seu ouvido – Você não me disse hoje de manhã que quer fazer o Hikaru cair a seus pés? Pois então, ele já está meio fisgado graças a seu ataque de sedução na praia durante o Ano Novo. Só precisamos pensar em um jeito fácil de vocês conversarem, de modo que não dê pra escapar!

– E como nós vamos fazer isso? Não podemos fugir daqui, se não todos vão nos seguir!

– E quem disse pra sair daqui? – a caçula ri – Deixe comigo minha querida irmã. RENGE-CHAN! – a garota se volta e vai até ela – Estaria disposta a ser locutora de uma belíssima cena de amor?

– Mas é claro! Quem é o casal? – mais do que rapidamente, Aiko sussurra alguma coisa no ouvido de Aika e esta sorri maliciosamente, indo sentar-se no sofá disponível na sala seguida da irmã.

– Hika-chan, Kao-chan! – elas gritam e acenam, e quando os dois as encaram as duas os chamam com os indicadores – Nós pedimos por vocês! – cantarolam, cerrando sedutoramente os olhos.

A terceira sala de música de repente fica sem som. Todos silenciam para presenciar a cena cômica dos gêmeos tão barulhentos de Ouran, que repentinamente calaram-se quando se arrepiaram até suas espinhas dorsais. Logo Renge já está pegando um microfone para narrar essa situação enquanto Linh e Mori jogam os dois para frente com empurrões e eles sentam junto a elas. Quase ao fim do dia, a gerente se prepara pra sair junto aos clientes, declarando o sucesso das novas anfitriãs de Ouran.

– Ah, fico tão feliz que o dia tenha sido maravilhoso! – ela sorri já perto da porta – Quando o Tamaki-san declarou o fim do Clube de Anfitriões por causa do seu noivado arranjado no nosso último baile, foi de dar arrepios essa ideia! – as garotas olham com surpresa para a moça.

– É mesmo? – Suzu olha de banda para o loiro – O nome dela seria Éclair Tonnerre?

– Isso! Vocês ouviram falar do incidente pelo visto. Bem, não tem ninguém que não saiba, pois aquela festa era um convite aberto a todos os pais e alunos... Felizmente agora nós já voltamos à ativa como antes. Então, até mais pessoal! Nós nos vemos amanhã!

O grupo que resta acena de volta e as moças não se atrevem a fazer nenhum comentário posterior do assunto citado, reunindo-se aos rapazes na mesa posta no meio da sala enquanto Kyoya calcula com o seu computador o lucro do dia. Suzu senta ao seu lado para ver.

– Nossa... Nunca imaginei que tamanha besteira pudesse atrair tantas pessoas.

– “Besteira”? – Tamaki repete parecendo ofendido e triste, fazendo Haruhi rir baixinho.

– Vamos confessar que este clube não tem um propósito acadêmico, é apenas um passatempo. E o que leva todas aquelas mulheres a requisitarem vocês para conseguir pontos e trocar coisas em um leilão onde podem perfeitamente pagar por qualquer item com seu próprio dinheiro?

– Ora Suzu, de graça vale até injeção na testa! – Linh ri – Não se lembra do que você fazia para...

– Já chega Linh, eu entendi! – ela ergue a mão e o noivo a olha curiosamente, parando de digitar.

– Mas eu não entendi. Quer explicar? – a garota permanece calada – Talvez seja melhor eu fazer um pequeno pedido judicial por um mandato para vasculhar o seu quarto e obter informações?

– Faça isso e eu mando prendê-lo por atentado ao pudor. – a moça devolve, cruzando os braços.

– Mesmo eu tendo permissão do juiz e da sua família, sendo o seu noivo?

– Sim, porque aí seria mais fácil acreditarem que você roubaria uma das minhas calcinhas. – Kyoya é o único a achar graça, voltando a digitar qualquer coisa enquanto os amigos encaram-nos assustados.

– Vocês parecem estar se dando bem desde o Ano Novo, não é?! – Maiko sorri.

– Impressão sua. – eles respondem ao mesmo tempo, ainda observando a tela do computador.

– Ok... Ei, se não se incomodam com a pergunta, como ficaram sabendo do meu... Ham... Noivado?

– Aquele casamento foi arranjado por sua avó, certo Tamaki-senpai?! – Suzu sorri – Nós chegamos a conhecê-la durante a apresentação das famílias no anúncio oficial dos nossos casamentos arranjados. Ela é a favor deles, mas Suou-san, seu pai, deu seu parecer sobre a situação individualmente, longe dos outros.

– Ele parece ser o único que discorda da nossa união. – a pequena loirinha diz – Mas é só porque acha muito rude nos juntar a mercê de um contrato matrimonial. Suou-san é um bom homem. – Tamaki sorri e abaixa levemente a cabeça, concordando mentalmente, mas então pensa em outra coisa.

– Um instante, por que a minha avó estava nessa reunião? Meu pai não disse nada sobre isso.

– Talvez porque ela não devesse mesmo estar nela. – Linh responde desgostosa – Aparentemente esse teatro todo vai render alguma coisa que beneficie ambos os lados, do contrário nossos pais não aceitariam o acordo. Mas conhecendo eles como a gente conhece – ela olha para as amigas -, esse benefício por certo não é dinheiro. O caso é que embora você não esteja incluso nesse acordo – refere-se à Tamaki -, a empresa da sua família tem negócios com as dos outros. De uma forma ou de outra isso interessa.

– Você acha que nossos casamentos vão melhorar o lucro das empresas das nossas famílias Linh-san?

– Estou apenas fazendo suposições Honey-kun. É só isso que podemos fazer por enquanto. Há apenas um único fato agora: todas nós compartilhamos do mesmo sentimento de nojo da sua avó, Tamaki-senpai. – os rapazes olham chocados para ela e as outras, tornando o ambiente tenso por um tempo.

– Mudando de assunto... – Maiko sorri – Renge-chan trabalhou bem nas nossas roupas, não é?!

– Tanto que eu me pergunto se você não teria ajudado ela com a escolha dos personagens, sendo louca por história antiga e mais especificamente por escritores brasileiros, né Mai?!

– Ora Linh, eu não sou “louca” por isso, só... Gosto um pouquinho além da conta. – enrubesce.

– Como foi que a Renge-senpai se tornou gerente do clube de vocês? – Aiko indaga.

– Ah, um dia ela apareceu aqui dizendo que queria casar com o Kyoya-senpai porque ele era parecido com um personagem do seu jogo de videogame favorito, então depois de tentar nos colocar num filme com falsas personalidades e contratar filhos de membros da máfia, o Kyoya-senpai destruiu a câmera e editou a filmagem pra vender às clientes do clube. – ao final da breve explicação de Haruhi, todos estão quietos.

– Então... Quer dizer que ela foi sua noiva? – Suzu ri assustadoramente sem encarar o noivo.

– Ah, quer saber, eu gostei das sugestões dela! – Aika diz pronta para quebrar a tensão – Ser membro desse clube não é tão ruim assim, a gente se diverte bastante!

– Só porque vocês gostam de nos fazer passar vergonha. – a heroína revira os olhos.

– Ei, falando nisso, por que vocês resolveram nos chamar naquela hora heim? – Hikaru questiona e Kaoru apoia-se em seu ombro direito para ouvir a resposta.

– Por nada, só queríamos nos divertir. – a gêmea mais velha joga os cabelos para trás – Mas graças a isso nós arrecadamos uma boa quantia em dinheiro e estamos um ponto à frente na nossa competição.

– A de quem faz mais brincadeiras? – ele pergunta retoricamente e troca um olhar com o seu irmão, sorrindo maliciosamente e pondo uma mão sobre o queixo – Oh, então era só por isso mesmo?

– E que outro motivo haveria? – Aiko dá de ombros fingindo inocência, entreolhando-se com Kaoru e rindo por um motivo compartilhado somente entre os dois enquanto, apenas sobre os olhos bem atenciosos de Mori e Linh, Maiko e Honey fogem dali para sentarem-se na fonte do jardim.

– Parece que nossos amigos estão se dando bem melhor em comparação quando nos conhecemos.

– É verdade. – a garota sorri, começando a balançar os pés – Eu fico muito feliz por elas. – Honey não a observa diretamente, contudo percebe sua estranha expressão de alívio e fica intrigado.

– Você gosta muito delas, não é?! – a menina confirma com a sua cabeça – Mas por que estava tensa antes? Achava que nós faríamos algum mal a vocês?

– Claro que não, longe disso! Eu só estou mais tranquila em ver que elas não estão nervosas como era o costume das outras vezes. Nossos pais fizeram diversas tentativas em nos casar, todavia os pretendentes se mostravam sempre terríveis; eram orgulhosos, mesquinhos, grossos... Linh e Suzu nunca tentaram agir contra a vontade das suas famílias, mas as gêmeas se rebelavam sempre que novas propostas eram feitas.

– O que você fazia? Seus pais não te forçavam a isso, ou forçavam?

– Não. Quer dizer, eles querem um dia me ver casada, porém, sobretudo feliz. Nossa família age mais como apaziguadora de problemas, normalmente causados por Aika e Aiko. Os pais delas não são pacientes, daí sobra para os seus irmãos e as companheiras tentarem acalmá-las. Em uma crise, os Sakurai sorriem e sempre acham que o copo está meio cheio; eles acham a Suzu muito responsável e dão a ela tudo o que pede desde criança, assim não precisam se preocupar. Quanto à família da Linh... Bem...

– Os pais dela se divorciaram depois do nascimento do seu irmãozinho, Sora, não é?!

– Sim. Acho que depois da festa de Natal você consegue entender mais ou menos como ela se sente.

– Sim. – ele responde baixinho – Mai-chan, não tem nada mais que você queira me contar?

– Como o quê? Eu não estou escondendo nada de você.

– Mas as suas amigas parecem sempre misteriosas quando se fala do passado. Aconteceu algo? – com pesar, a garota suspira e fica quieta antes de falar.

– Olha... Algumas pessoas podem achar bom ter pais ricos. Pensam que talvez gente rica não trabalhe tanto quanto os pobres porque já tem bastante dinheiro. Você sabe que não é bem assim. As meninas e eu sempre tivemos dificuldade de nos divertir com nossos pais. Mesmo quando crianças, nós passamos nosso tempo brincando juntas. Até nas festas de aniversário, cercadas de pessoas que diziam gostar de nós, nos sentíamos sozinhas. Eles viajavam muito, e só piorou quando crescemos. Com o tempo nos acostumamos, mas... Agora estamos noivas e a nossa sensação é de que vamos sair das vidas dos nossos pais sem mesmo eles perceberem. Embora vocês vejam a gente sorrindo, não quer dizer que estejamos felizes. Na verdade, estamos muito tristes e solitárias por dentro. – Honey silencia temporariamente diante do sorriso triste da jovem, e depois de digerir tudo ele sorri amavelmente, tocando-lhe a mão.

– Não fique assim Mai-chan. Eu sei que é ruim ter os pais ausentes, e imagino o quanto deve ter sido solitário pra você ficar sozinha nos dias em que não podia falar com suas amigas, sem ninguém pra poder conversar. Também deve ter sido ruim não poder ir ajuda-las quando precisaram de você no tempo em que ficaram distantes umas das outras. Mas agora não precisa mais passar por isso. Eu prometo ficar sempre do seu lado. Quero te fazer sorrir todos os dias, principalmente quando se sentir triste, porque seu sorriso é muito bonito! – a loirinha sente uma lágrima escorrer por seu rosto e um sorriso o toma.

– Obrigada Honey-senpai. – ela limpa os olhos com a manga do sobretudo de lã.

– Pode me chamar pelo meu nome se quiser. – os dois sentem seus rostos tingindo de vermelho.

– Então... Mit-chan. – o coração dele bate mais rapidamente – Não se esqueça, Mit-chan, de que Ono Maiko sempre retribui em dobro aquilo que lhe dão! – o rapaz sorri e o casal passa um tempo se olhando de perto, sem conseguir desviar, até Honey de repente virar o rosto.

– Ah, Reiko-chan! – ele acena para uma garota que passa pelo corredor, e quando Mai ergue os olhos percebe se tratar de uma bela jovem, provavelmente da sua idade, com longos cabelos da cor dos seus olhos escuros e penetrantes, como as asas de uma graúna.

– Quem é? – ela pergunta, tentando parecer não se importar ao vê-la corar enquanto acena de volta.

– É Kanazuki Reiko, a vice-presidente do Clube de Magia Negra. Ela está no primeiro ano.

– Então tem mesmo a minha idade. – a loirinha resmunga para si mesma enquanto a moça se vai.

– Reiko-chan é um pouco tímida, por isso talvez você ainda não tenha visto ela por aí.

– Ela já frequentou o clube? – Maiko persegue com os olhos a aluna, que também continua a olhando.

– Bem, já... Mas nunca passa muito tempo. – ele observa com estranheza a noiva, minutos atrás meio melancólica, franzir a testa aborrecidamente – Mai-chan, tudo bem?

– Claro. – ela sorri de volta, mas Honey não sente sinceridade.

Continua...


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