– Mas o que está acontecendo aqui? – gritou.

Fiquei estática.

– A pomba lesa da Kriss tinha razão. Você era muito suspeita, mas é claro! Uma rebelde! Uma rebelde no palácio! Vivendo aqui debaixo do nariz de Maxon, aquele palerma! Ah, mas você vai se ver comigo garota! E como entrou? Pela janela? Que coragem! Soldado, você não ouviu nada? ESTÚPIDO! SERÁ DEMITIDO! Mas antes, levem-nas para serem interrogadas. Ela e essa outra rebelde. Vamos, o que está esperando?

Clarkson olhava para Caio. Ele segurava um cassetete e uma arma, como todo guarda do palácio. O rapaz entrou na sala e passou pelo ex-rei, porém, em um súbito movimento, ele tacou o cassetete na cabeça de Clarkson, que caiu no chão, desmaiado.

– Ainda bem que ele veio sozinho. Era pra Família Real chegar de manhã às dez. – falou Caio.

– Mas acabaram chegando antes, bem o que faremos agora? Não podemos perambular por aí carregando ele. – argumentei. O medo tinha passado, mas agora, o que faríamos?

– Vamos pintar uma monocelha nele. – opinou Louise.

– Não é hora para brincadeiras, Lô! Já sei! Podemos colocá-lo sentado na cadeira dele, com a cabeça apoiada na mesa, assim, quando acordar, pensará que acabou dormindo. E podemos por uns papéis debaixo dele e ao lado, um copo com um pouco de uísque e uma garrafa da bebida quase seca, assim, ele achará que chegou de viagem e veio ver alguns documentos e acabou bebendo e dormiu. A dor de cabeça será da ressaca e não de um golpe de cassetete. O que ele viu não passará de “um sonho”.

– Brilhante Caio! Tem uma mesinha ali no canto cheio de garrafas, deve ter um uísque bem forte! Se estiver cheio, eu vou no banheiro aqui perto do corredor e jogo parte do conteúdo fora! – falei.

Nós arrumamos tudo, eu peguei as transferências bancárias e fechei o cofre. Depois que Clarkson estava ajeitado na cadeira, eu e Louise saímos. Caio iria continuar no posto e chamou um soldado que estava andando pelos corredores, um rapaz que reconheci ser o guarda na guarita no dia em que fui ver tio Aspen, para que ficasse no turno junto com ele. O rebelde nos viu e sacou a ideia, era parte de um plano. Dessa forma, se Clarkson reconhecesse Caio do “sonho”, perceberia que ele estava cumprindo turno junto com outro guarda, o que reforçaria a ideia de “sonho”. E qualquer coisa, o outro soldado diria que o ex-rei chegou de viagem e disse que iria ver alguns documentos antes de ir para o quarto descansar.

Louise perguntou se teria problema se fosse para seus aposentos tomar um banho, falei que poderia ir e que faria o mesmo quando chegasse no meu quarto. Nos separamos, passei sorrateiramente pelos corredores e vi da escadaria, um grupo de guardas carregando as malas da Família Real, fui correndo para meu quarto e me certifiquei de que não fora vista. Ao entrar, comecei a tirar minha roupa de rebelde e pus o amontoado aos pés da cama, eu estava usando uma touca preta, tirei de meus cabelos e joguei para um canto qualquer do aposento. Depois, fui para o banheiro e liguei as torneiras para uns minutos mais tarde, me afundar na banheira. Quando saí, pus a camisola de seda e me deitei. Adormeci rapidamente.

Acordei com batidas na porta, levantei-me e tentei arrumar meus cabelos em um coque para aparecer um pouco mais apresentável.

– Entre.

Olhei o quarto e vi as roupas da noite anterior no chão, chutei o amontoado para debaixo da cama enquanto Logan entrava.

– Te acordei? – assenti – Nossa! Você é muito dorminhoca! O café da manhã sai daqui a vinte minutos, é melhor se apressar!

– Bom dia pra você também – sorri – daqui a pouco eu chamo minhas criadas, mas, diga-me, o que o traz aqui? Veio só me acordar?

– Eu vim te avisar que pretendo anunciar minha escolha no próximo Jornal Oficial, que vai ser na semana depois da apresentação do projeto de filantropia. Bem, é isso.

Fiquei surpresa. O quarto ficou em silêncio, perguntei então para quebrar o clima.

– Você não ia chegar mais tarde?

– Depois do velório, iríamos ficar hospedados no palácio junto com os outros convidados estrangeiros, mas a família real irlandesa pediu privacidade, então todos os governantes meio que foram expulsos de lá. – nós rimos – meu avô ficou furioso, mas tivemos que voltar, afinal, a Irlanda é a maior potência do mundo agora, atrás somente da Itália, ninguém reclamaria uma ordem vinda dos irlandeses.

Eu sabia bastante sobre isso, aprendi na base que Illéa, que antes se chamava Estados Unidos, fora a maior potência do mundo, mas depois que todos os países tiveram que se reerguer após as guerras e o sistema de castas foi criado, isso mudou. O país estava agora na 28ª posição, atrás de países como Itália, Irlanda, Costa Rica, China, Japão, Brasil e Índia.

– Bem, tenho que ir, me contaram que a cozinheira fez algumas tortas que você adora para o café! Nos vemos daqui a pouco. – Logan deu um beijo na minha testa e foi andando em direção à porta. Antes de sair, ele virou e levantou a mão para acenar, mas seu olhar ficou parado em um ponto qualquer do quarto, olhei para onde ele olhava e vi...

A touca.

Não entendi o porquê a surpresa, era apenas uma touca. O príncipe andou até lá e juntou.

– Olívia deve ter deixado cair quando trouxe algumas roupas. O inverno está chegando e se eu for fazer uma visita ao jardim, será bom estar “empacotada”, como ela diz. Deixa que eu guardo.

Me aproximei dele, que olhava da touca para mim. Antes que pudesse pegar a peça da mão dele, ele a coloca em minha cabeça.

– Com uma roupa preta você iria ficar idêntica a ela... – sussurrou – idêntica...

Seus olhos aderiram um tom mais escuro, ele parecia surpreso e com uma pontada de... medo?

– Idêntica. – repetiu baixinho – Oh meu Deus!

Eu não estava entendendo nada.

– Aline, você é uma rebelde! Agora tudo faz sentido! Eu lembro de você e quando te vi te achei familiar!

Agora percebi. No dia da iniciação rebelde, eu vira Logan. Não fazia ideia que ele lembrava daquele dia!

– Eu tenho como explicar! – falei.

– Então é verdade. Explique então como conseguiu ser tão falsa todo esse tempo? Você foi mandada para me conquistar e garantir o trono para os rebeldes? Vamos! Explique-se! Não, melhor, saia da minha frente! Saia da minha casa!

Seu tom de voz era frio e duro. Meus olhos estavam marejando, nunca o vi agir dessa forma. Ele sempre foi calmo e tranquilo.

– Logan, eu...

– Pra você é Alteza. Você tem que agradecer por não te entregar! Prepare suas coisas, você parte hoje. E lembre-se da minha bondade! Segundo a lei, você seria chicoteada em praça pública e depois, presa, mas eu não farei isso. Você parte antes do almoço senhorita Castrien, irei chamar suas criadas para lhe arrumarem.

– Mas...

– Eu não quero escutar nada. – antes que ele virasse o rosto, pude ver uma lágrima solitária escorrer pelo canto do olho.