A última primavera escrita por Valerie


Capítulo 13
Convite




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Lukas não largava do telefone, falava freneticamente sobre algum assunto que eu não conseguia entender. Ele poderia estar falando com algum amigo, mas sua conversa me chamou atenção. Escondia-me a poucos metros dele, imaginando o motivo de toda aquela apelação.

– Mas, amor, vai ser tão legal! O Lorran vai com a Lívia... Faz isso pelo seu gatinho, faz.

Agora pude cair na real, ele está definitivamente falando com Flávia! Mas aquela não era uma simples conversinha de dois namorados melosos, pelo que escutei Lívia e Lorran também estão metidos nisso. Fiquei plantada esperando que acabasse e por mais que ele tivesse tentado me enxotar várias vezes, persisti em ficar ali. O Lukas me conhece o bastante pra saber que o perturbaria o necessário até ele contar o que escondia de mim. Ele fez uma cara feia e falou:

– A pentelha da minha irmã, está plantada feito um poste na minha frente querendo saber o que estamos conversando.

Uns segundos de silencio e ele começou a berrar:

– Chama-la? Eu sabia que você ia querer isso. Deixe-me refrescar sua memória... ELA É MINHA IRMÃ MAIS NOVA! Estou avisando que vai ser um porre.

Comecei a me estressar, bati o pé no chão de braços cruzados como uma menininha mimada. Ele vai ver só uma coisa quando desligar. Imediatamente ele se despediu e terminou a ligação.

– Senta, se acalma e tira essa cara de quem está querendo me comer vivo porque estou ficando assustado.

Dizia ele se encolhendo no sofá, segurando uma almofada como escudo, como se isso fosse adiantar alguma coisa.

– Que história é essa de que eu não posso ser convidada?

Realmente queria desvendar esse mistério.

– É que eu combinei de irmos em grupo de quatro, sabe como é... Casais. Eu e Lorran iremos levar Flávia e Lívia ao parque que vai abrir amanhã no terreno abandonado da rua de baixo, e como você não tem...

Ele parecia medir as palavras para falar comigo e eu odeio quando fazem isso, então completei uma suposta explicação que berrava ser a única e mais coerente:

– Namorado?

Naquele momento minha cara, com certeza, denunciaria como eu me sentia por dentro: decepcionada. Foi assim que me senti quando escutei o que Lorran tinha pensado no meu aniversário, e agora mais essa. Devemos ter uma lista de lugares que podemos ou não ir se tivermos namorado?Pena. Eu não gostava quando sentiam pena de mim, como se eu fosse indefesa e implorasse por uma palavra de consolo a cada hora do dia por ter uma doença incurável. Ridículo.

De nada adiantavam seus berros, eu já tinha me trancado no quarto cheia de raiva. Tomei uma decisão: Eu vou ao parque, seja na companhia deles ou não! A sorte de Lukas é que mamãe não estava em casa, porque ia levar uma bronca por estar gritando. Não vou perder meu tempo precioso pensando nisso. Corro pra minha cama, abraço o Sean, pego o celular e clico pela primeira vez no numero que por muitas vezes me chamou a discar. Não teve mais de dois toques e ele atendeu. Tomei coragem e falei:

– Alô, Paolo?

– Oi, Clara, o que manda?

– Tudo mais ou menos, mas você pode ajudar, tenho uma novidade ótima.

– Então fala, eu não leio pensamentos...

Suspirei, cara como ele me assusta às vezes! Nervosa não sabia que palavras encontrar para convidá-lo, nunca tinha feito isso.

– Você notou um movimento diferente por perto da sua casa?

– Bem... Se você considera barulho, aglomeração e luzes, um movimento. Vi sim, por quê?

– Olha, eu queria saber se você tem alguma coisa pra fazer amanhã.

Disse sem graça. Maluco! Fazer um convite bobo é TÃO difícil.

– Eu? Como sempre não tenho nada, por quê?

Aquele monte de “porquês” dele me fez tomar iniciativa.

– Vamos ao parque, de tardinha?

– Eu? E você? No parque? Que horas passo pra te buscar?

– Ás seis.

Respondi ainda sem consciência da reação que eu teria depois de desligar o celular, mas agora o mais importante era manter a calma e não parecer desesperada.

– Então... Até amanhã, e boa noite. – Falei.

– Boa noite.

Desliguei o celular e saí do quarto pulando de alegria, fui até a cozinha atender a porta. A campainha insistia em dar o ar da graça com seu barulhinho irritante.

– Manhê, deixa vai, deixa, por favorzinho! É a primeira vez que eu te peço. Juro juradinho que vou voltar a hora que você quiser!

– Pra onde quer ir? E com quem?

Sandra já conhecia minhas manhas para conseguir as coisas.

– Eu, sua filhinha estou pedindo cheia de educação pra mamãe mais compreensiva do mundo pra deixar eu sair com o Paolinho amanhã...

Fiz a melhor cara de pidona que pude e vi Sandra abrindo um sorriso enorme.

– A minha filhinha quer sair com o Paolo amanhã? Posso saber pra onde?

– Eu quero ir ao parque de diversões que abriu na rua debaixo.

Eu tinha 17 anos e nunca tinha saído sozinha com nenhum garoto – que não fosse o Lorran - , ela tinha que deixar dessa vez.

– Vamos ver se você merece... Fez suas tarefas?

– Levei Sean pra passear, lavei as louças do almoço, arrumei o quarto...

Contei nos dedos e suspirei ao ver sua satisfação.

– Pretende voltar que horas mocinha?

– Eu queria ir ás seis e voltar por voltar das nove. Pode ser?

– Já escolheu a roupa? Ela respondeu com uma cara estranha.

– Não, por quê?

– Então vamos lá que eu te ajudo.

A abracei agradecida, aquele era seu modo de dizer “sim”. Coloquei meu armário todo pra cima da cama e no fim das contas, escolhi uma calça jeans, uma blusa de manga preta com uns detalhes meio esquisitos (acho que era desenhos abstratos) e meu tênis preferido, uma bolsa e os brincos que ganhei de Flávia de aniversário.

A hora de dormir chegou, mas o sono parecia ter tirado férias novamente. A roupa na cadeira, a casa escura, todos em suas devidas camas (Lukas estragando o silêncio roncando) e eu olhando pro teto com os olhos arregalados. Dormi mal (se é que podemos chamar de “dormir” cochilar a cada meia hora), tudo por conta da ansiedade que me lembrava a cada instante que se passava que eu Clara Sandy iria sair com Paolo.

No dia seguinte estava morta de cansaço, me sentindo moída. “Eu não posso sair assim de casa” repeti a mim mesma na frente do espelho.

– Mãe, olha pra minha cara. Parece que a minha olheira tem vida própria!

Do que me adiantava reclamar? A culpa é minha mesmo.

– Filha, vou te apresentar uma amiga.

– Não me diga que também tem uma bicicleta! - Deixei sair no automático.

– Não! Estou falando de maquiagem.

– Mãe, você é um gênio.

Tomei banho cedo demais e aproveitei para dar os últimos retoques na maquiagem e ler um livro de poesias do Elias José. Li um em voz alta que me fez gargalhar por conta da situação.

– “O inadiável”

Posso deixar pra amanhã:

Os exercícios de Química,

A visita a minha avó,

O banho do meu cachorro,

A troca do cordão do tênis,

A tentativa de um novo penteado,

Até o pedaço da torta de maçã.

Só não posso deixar pra amanha o encontro com o novo amor, que vem num cavalo alado (que é apenas uma bicicleta), o encontro com meu príncipe...

Não terminei de ler, pois minha mãe interrompeu.

– Parece que o seu príncipe do cavalo alado chegou... - Disse ela apontando pra janela.

Levantei da cama, dei a última olhadinha no espelho e para surpresa de Sandra saí pela janela.

– Aí meu Deus, vocês sabiam que existe porta?

Com a ajuda dele fica mais fácil sem duvida. Seus braços envolvendo delicadamente minha cintura e a proximidade de nossos rostos me fizeram ficar vermelha. Subi em sua bicicleta e acenei pra mamãe que olhava sorridente. O parque era perto de casa, chegamos rápido.

Mas o tempo que passou foi preenchido de silencio. Talvez nervosismo, talvez falta de assunto. Uma sensação difícil de explicar. Por mais que ficasse nervosa por conta de toda aquela quietude, relaxei ao curtir a paz que havia naqueles breves minutos.

– Clara você está tão quieta. Está passando mal? - Perguntou preocupado.

– Não quero tirar sua concentração, falando como uma tagarela. Vamos ter bastante tempo pra conversar.

Foi tudo o que me passou pela cabeça. Na verdade estou com um pouco de fome, porque só almocei, mas não queria virar alvo de preocupação, não naquela noite. Chegando lá, pagando as entradas esbarrei num casal que estava no maior beijo. Por um minuto pensei em pedir desculpas, mas quando o garoto virou a cara vi que o conhecia, e como.

– O que está fazendo aqui?

Perguntamos juntos um ao outro, como se a resposta não fosse a coisa mais obvia.

– Eu saí com minha namorada, e você?

– Eu... Vim com meu amigo, onde estão Lukas e Flávia? Sei que eles vieram com vocês dois. Pode falar Lorran.

– Amiga, desculpa o modo como nos encontramos. E... Cadê seu amigo? Perguntou Lívia ficando vermelha.

Procurei e num instante o encontrei. O segurei pela mão (para sua surpresa) e apontei pra Lívia dizendo:

– Paolo, tenho que te apresentar uma amiga. Essa é a Lívia.

– Clara, você nunca me falou que o bofe que ia te buscar na escola era o Paolo.

Disse ela fingindo não saber de nada para não criar problemas com Lorran. Olhamos pro rosto dele e caímos na gargalhada. Pobrezinho não estava acostumado a ser chamado de “bofe”.


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