Um Reencontro Pode Ser Um Recomeço escrita por fdar86


Capítulo 4
III. Um Flashback Gigante




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* 14 anos atrás *

 

Ouvira-se um barulho vindo de baixo das escadas.

Alguém gritava um sonoro:

"Isa, hora de ir para a escola!"

 

Isa abrira os olhos, já sentindo-se entediada.

Não conseguira dormir, por toda a noite.

Pensara no quanto a mãe se esforçava em vão, coitada, na criação dos filhos. 

Teria mudado de escola no meio do ano,  assistido a dois dias de aula,  e ainda não conhecia ninguém.

Bom, ninguém que lhe parecesse minimamente importante para ser citado.

E era um tédio ir para as aulas.

Todos aqueles rostos chatos de CDF's a encarando o tempo todo.

Professores e alunos interessados em lhe encher de perguntas.

Sentia-se um Et.... um Alien...

Cobrira a cara com o lençol esperando pelo próximo grito.

 

Minutos de gritarias depois, levantara de mais uma noite sem sono, e de péssimo humor, para o seu matinal castigo diário.

Olhara para o espelho e dissera...

"Não falem comigo. Não estou afim de papo.", É assim está bom.

Como de costume, tomara o seu café, e pegara carona com sua mãe até à escola.

Chegara lá atrasada e mal humorada, mas não necessariamente nessa ordem.

 

Fora quando lembrara, que em dois dias ainda não tinha decorado a sala.

 "Será possivel!", pensara considerando-se uma fracassada.

Correra em direção às salas. O colégio era imenso, parecia mais uma universidade.

Isa pensara em Kill Bill, no filme que assistira ontem a noite, esperando o sono chegar. Certa fez a protagonista, em vingar-se de todos aqueles traidores.

Como queria estar em casa naquele momento, vendo séries, filmes, não ter que sair de casa, nem correr atrás de nada.

E muito menos ter que encontrar aquelas caras feias na sala.

Levantara de tão bom humor, pensara Isa... As coisas que insistem em irritá-la.

 

Ao passar pela frente de um banheiro feminino, uma garota de vestes pretas, cabelos loiros ondulados, com batom e unhas vermelhas, saíra correndo de lá, e as duas se encontraram violentamente. 

Isa foi jogada a 2 metros de distância, e a menina apenas dera uma leve inclinada para trás. Embora as duas fossem magras, a garota loira era malhada, portanto, mais forte.

Além disso, Isa estivera tão "empolgada" para chegar à sala, que passara pelo banheiro correndo bem mais devagar, do que a outra que saíra de lá.

"Merda! Pra que eu fui sair de casa hoje?!", levantou do chão, resmugando, e com a ajuda da menina, logicamente sem agradecer o auxílo.

A menina pedira desculpas desconsoladas.

Parecera mais preocupada do que Isa, na verdade.

A morena apenas conseguia pensar no quanto ela poderia estar ganhando se estivesse na cama assistindo TV. A mãe estaria tão iludida com a ideia de fornecer a filha uma boa qualidade de estudo, que só ignorava o lado bom da vida. Era frustrante, suspirava Isa em seus devaneios.

"Eu estava atrasada, não sei o que deu em mim. Me desculpe. Realmente não tive... Quero dizer que... Bom, eu não sabia... Claro que não... eu queria dizer que sinto muito. Sério..."

"Tudo bem...", dissera Isa brevemente irritada, pensando que se ouvisse mais uma desculpa daria um murro na cara daquela garota.

Isa na adolescência era um ser incrivelmente mal humorado, como pode-se perceber.

Geralmente ela acordara assim, mas fora dessa forma até esse dia, quando conhecera Raíssa. Quando finalmente alguém lhe inspirara a ser diferente.

A garota finalmente se acalmara. Parara de pedir desculpas, para o alívio de Isa. 

Esticara então seu braço esquerdo, apresentando-se, encontrando uma Isa muito bem disposta para continuar aquela conversa evidentemente desnecessária, em sua opinião:

"Raíssa. Raíssa Fernandes."

Isa respirara fundo... Se apresentaria, mas apenas por educação.

"Isabela Moreto"

A morena fora se dirigindo a sua possível sala, já que simplesmente esquecera qual era, enquanto Raíssa se dirigira a algum outro lugar.

 

No outro dia, quando Isa estava indo em direção à quadra do colégio para mais uma aula de Educação Física, ouvira alguém lhe chamando, afoitamente.

"ISA! ISA!"

Olhara para trás, incrédula. Só conhecera uma pessoa na escola, até então.

Uma pessoa chata e irritante, que definitivamente não gostaria de rever.

Raíssa correra até perto da garota, com um sorriso de orelha à orelha, enquanto a outra a olhava irritada, fingindo um sorriso:

"Oi, lembra-se de mim?"

"Como eu poderia esquecer", disse sem disfarçar a ironia.

"Ah... desculpa... de novo"

"Pedindo desculpa de novo. Essa menina é retardada, não é possível", pensara Isa.

 

"Tudo bem... Sinta-se honrada, eu não costumo ficar de quatro por ninguém"

Raíssa sorrira.

Não percebera o tom debochado e irônico que Isa usara.

Ou talvez tivesse percebido, mas ainda assim gostasse do temperamento da jovem.

"Cada maluco com sua mania", pensara Isa.

 

"Isa... Posso te chamar de Isa?"

"À vontade", Isa falara forçadamente.

 

"Que menina mais chata! Será possível que ela não se toca que não estou a fim de papo?", pensara contrariada.

Enquanto isso, Raíssa continuava puxando assunto. 

"Você estuda em que turma?"

"1º ano"

"Sério? Como eu nunca te vi por aqui?"

"Entrei agora, no meio do ano. Faz três dias que eu e minha família mudamos de cidade"

"Nossa. Então você não conhece ninguém aqui ainda?"

"Obviamente, não", tentara disfarçar, sem sucesso, a grosseria. Fizera sem pensar. Fora rude. Arrependera-se, por mais estranho que possa parecer.

"Se precisar de qualquer coisa, pode me falar."


         "E você é de que turma?"

"A mesma que você"

"Estranho... Não te vi nos meus primeiros dois dias"

"Hum... Eu não lembro de ter vindo...

Raissa olhara para o lado, como se quisesse saber se alguém as escutavam. Confiante que não, continuara:

"Tipo, eu tenho uma forma de escape, quando estou de saco cheio com o mundo, não venho para a aula. Minha mãe me traz aqui, eu finjo que entro, e depois fujo quando às aulas se iniciam. Na verdade quando eu saí correndo do banheiro, estava aproveitando o silêncio para sair daqui."

Isa se interessara. Raíssa não era tão entediante, afinal...

Olhara a garota de cima a baixo.

Observara o look, muito peculiar, e finalmente sorrira.

"Que legal. E como é que você foge?"

"Quer sair comigo agora?"

O rosto de Isa se transformou.

Nem de longe lembrara mais aquela garota que acordara jogando suas havaianas pela janela.

Raíssa esticou a mão para Isa, que parecera fisicamente renovada, só de se imaginar saindo dali.

Segurara a mão de Raíssa, e deixara a loira conduzi-la para a saída.

A má impressão que tinha tido de Raíssa passara rapidamente.

As duas saíram, sorrateiramente, do colégio, e pularam um muro, dando de cara a uma pequena praça.

 

Raíssa tivera uma idéia.

"Você conhece alguma coisa da cidade?"

"Na verdade ainda não. Minha mãe anda muito ocupada. Acabou de ser transferida, e está cheia de coisa para resolver no..."

Sem que Isa terminasse de falar, Raíssa pegou em sua mão e saiu correndo, puxando-a.

Fez um pequeno guia turístico a pé para que Isa conhecesse a cidade, tiraram fotos com o celular de Raíssa, e deram muitas risadas.

Isa passara um ótimo dia! Voltara para casa com um outro humor, e adorando Raíssa.

**************

 

A partir desse dia, a amizade crescera rapidamente, e quando elas se deram conta, já eram melhores amigas.

Isa aprendera a gostar daquele estilo radical de Raíssa em se vestir e se maquiar, embora não a imitasse, passara a apreciar.

As duas passaram a se sentar juntas na sala, a fugir juntas sempre que tinham vontade, e a fazer trabalhos juntas... Saiam juntas depois das aulas. Enfim... tudo juntas.

 

Três meses depois, Isa percebera que tinha se apaixonado por Raíssa.

Tudo começara quando Raíssa começou a dormir na casa de Isa.

As duas tinham altos papos até de madrugada e assistiam vários filmes.

Na maioria das vezes quem os escolhia era Isa, porém nesse dia, quem escolhera fora Raíssa.

Elas assistiram a um filme de romance, em que passava uma pequena parte, onde duas mulheres se beijavam na boca.

Isa se surpreendera, nunca tinha visto isso antes. Vinha do interior, e lá o preconceito era ainda maior, de modo que os homossexuais se escondiam, por medo de sofrer algum tipo de discriminação. Assim, eram pouco conhecidos, e portanto lembrados. 

Isa contara isso para Raíssa, que dera risada, dizendo que na cidade grande isso é bastante normal.

Embora Isa nunca tivesse gostado de nenhuma mulher, e não se considerasse gay, achara muito sexy ver as duas mulheres juntas, e lutando contra o preconceito de cabeça erguida.

Isa sentira-se fascinada à nova realidade apresentada.

E esse assunto rendeu, por um bom tempo.

 

Um dia, Raíssa e Isa conversavam online, escondidas é claro, durante uma aula de informática, e Isa perguntara:

"Raíssa, você já ficou com alguma garota?"

Raíssa se surpreendera ao ler aquilo.

Sorrira e olhara para Isa, gesticulando, e falando baixinho um "Você é muito gay".

Isa tivera que fazer uma leitura labial para conseguir entender, mas conseguira, e gargalhara, disfarçando com algumas tosses, para que o professor não percebesse.

Demoraram-se alguns segundos, e finalmente chegara a resposta.

"Já"

Isa enlouquecera. Quisera saber todas as informações possíveis, imaginárias, cabíveis e não cabíveis àquela situação.

 

**************

Nesse mesmo dia, Isa fora dormir na casa de Raíssa, pela primeira vez. Tinham um trabalho de literatura para fazer.

Conhecera a família Fernandes, eram simpáticos e agradáveis, como a filha.

Em seguida, foram para o quarto, e se divertiram no computador por algum tempo, antes de começarem uma guerra de travesseiros, seguidas de uma guerra de cócegas.

Raíssa, por ser muito mais forte, conseguira facilmente manter-se por cima de Isa, que se debatia freneticamente, tentando escapar.

Após várias risadas, com Raíssa provocando-a dizendo que ela era muito fraca, as duas se entreolharam, pela primeira vez, sérias.

Raíssa pegara no rosto de Isa, de uma maneira diferente, e Isa imediatamente percebera.

A loira sempre sentira uma grande atração pela garota, mas nunca tinha tido oportunidade para demonstrar.

E coragem também, diga-se de passagem.

Porém, nesse dia, ela não se acovardou, e continuou acariciando seu rosto.

Isa sentira-se confusa, ao perceber o que aquele singelo toque fazia com ela.

Raíssa fora se aproximando, como se fosse beijá-la.

"Rai..."

"Hm...", disse bem baixinho, mantendo-se na mesma posição. Só sairia dali se Isa pedisse.

O som da voz rouca de Raíssa, perto de seu rosto, ressoou sexy em seu ouvido, o que fez com que Isa fechasse os olhos e suspirasse profundamente.

E ela não conseguira continuar, não mais impediria Raíssa de beijá-la.

Raíssa procurara os lábios de Isa, roçando devagar a língua na sua boca, se intensificando gradualmente com o tempo.

Isa nunca tinha tido atração por uma garota, até conhecê-la.

Mas não tinha medo, sentira que podia confiar em Raíssa.

Sabia que ela não a faria mal.

Nesse dia, elas começaram a namorar, no final do primeiro ano colegial.

 

**************

Por três anos, as duas permaneceram unha e carne, totalmente apaixonadas uma pela outra.

Por todo esse tempo, foram muito felizes, tiveram uma relação amorosa intensa, de muitas descobertas, porém com altos e baixos. 

Um bom tempo de relacionamento escondido depois, a mãe de Isa finalmente descobrira sobre a garota, e passara a enfernizar a garota para terminar com Raíssa.

"Não quero você vendo essa garota, Isa. É má influência para você"

"Como o meu pai foi má influência para você?"

"Não meta seu pai nessa história"

"Ah, sim? Me desculpe, mas ele já está metido desde que eu nasci"

"Vá pro seu quarto, Isa."

"Não vou não. Quer saber, não vou terminar com a minha namorada, por que eu a amo. Você sabe o que é isso, mãe? Você amava o meu pai ou apenas quis destruir o casamento dele?"

Ouvira-se um ruído na sala de estar.

Isa levara um forte tapa, que deixara seu rosto vermelho.

Ela começara a chorar, enquanto a mãe se desperara por ter batido, pela primeira vez, na filha.

Isa subira para o quarto, totalmente descontrolada, e aos berros:

"Eu te odeio!! Não sei porque eu tenho que morar com você!! Eu juro, mãe, eu juro que se você botar um dedo para me afastar de Raíssa, eu saio daqui. Vou embora dessa casa. Já tenho 18 anos, vou fazer 19, já posso fazer o que quiser. Não tenho culpa de você ter descoberto muito tarde. Você não pode me prender aqui!! "

 

A partir desse dia, Isa começara a ter infinitos problemas em casa, principalmente para sair com Raíssa.

Elas se viam mais na colégio, onde já estavam finalizando o 3º ano, mas Raíssa vivia cobrando mais atenção.

A falta de tempo delas se verem, e a constante presença da mãe da garota na escola para deixá-la e pegá-la, forçavam um distanciamento entre as namoradas.

As coisas só pioraram no outro ano, quando Isa, ao final dos 19 anos, descontrolara-se em uma discussão com a mãe, e saíra de casa, para morar na casa de Raíssa.

Lá permanecera por alguns meses, contra a vontade de sua mãe, que por várias vezes foi visitá-la, pedindo que a filha voltasse para casa, e abandonasse aquela vida.

 

**************

Ao completar 3 anos de namoro, aos 20 anos, Isa começara a faculdade de Jornalismo.

 

Continuava morando com Raíssa, que nesse momento estaria tomando banho.

Isa entrara no computador da garota para pesquisar algum trabalho proposto na faculdade, no qual haveria um semináro para apresentá-lo no outro dia.

A morena não percebera que o email de Raíssa estava aberto, até que chegara uma mensagem com o título "meu amor lindo", de uma colega de sala da loira - do colégio, e agora da faculdade - chamada Valéria, várias vezes motivos de discussão entre Isa e Raíssa por ciúme. 

A garota dera em cima de Raíssa na sua frente por muitas vezes, e Raíssa nada fazia para parar a situação, apenas declarando que elas eram amigas há muito tempo, até mesmo antes de conhecê-la. Que não podia, agora, simplesmente cortar a amizade.

Abrira a mensagem, suando frio. 

"Oi princesa tudo bem? Saudade de você... desde o domingo passado que não nos vemos, apropriadamente... Só na faculdade, mas com aquele carrapato do lado. Você sumiu da net... aconteceu alguma coisa?

Te amo.

Val"

Isa permanecera chocada, em frente à tela do computador.

Não conseguira acreditar no que estava lendo, e relera várias vezes a mesma parte.

"Desde o domingo passado que não nos vemos, apropriadamente..."

Isa lembrara que passara o domingo na casa de sua mãe.

E a palavra apropriadamente, dava a entender algo muito ruim.

Algo que ela não queria saber, mas que por razão do destino, acabara sabendo.

Ela respondera, jogando verde para a menina, ao vê-la online:

"Oi meu amor. Estou bem sim, é meu carrapato que não me larga. Também estou cheia de assunto para estudar, você sabe, da faculdade. Por isso ando meio sumida... mas senti saudade... Adorei passar o domingo com você.

Te amo.

Rai"

Lágrimas começaram a surgir do seu rosto, enquanto esperara pela resposta.

Tinha medo do que poderia ler.

Diante do que ela lesse, e do que Raíssa falasse, tudo estaria terminado.

Todos os anos de sonhos, planos e luta para ficar com ela, todo aquele amor que sentia, teria ido tudo por água abaixo.

 

Raíssa finalmente saíra do banho.

Tentando parecer controlada, e evitando olhá-la para não parecer que estava chorando, Isa disse que a mãe da morena tinha ligado e pedido que ela lhe comprasse o pão, que tinha terminado. Realmente isso teria acontecido, mas fora antes de tudo desmoronar em sua vida.

Disse também que ela só não podia ir, pois tinha que terminar uma pesquisa até amanhã, que o professor da faculdade havia pedido.

Como Raíssa quase nunca se ligava nos trabalhos que os professores de Isa passavam, pouco deu importância, e saiu de ombros do quarto.

Apenas disse:

"Já volto, amor... E depois você me conta que pesquisa é essa"

Nem lhe dera um beijo, como de costume desde o início do namoro.

Percebera o quanto Raíssa estava diferente, que por ilusão da sua cabeça, não teria percebido, ou teria se recusado a perceber.

 

Passara mais 1 minuto, e o monitor apitou.

Isa levantara-se correndo da cama onde chorava muito, e correra até ele, quando vira piscando uma luz verde, com a seguinte informação:

"Nova Mensagem Recebida"

Abriu, trêmula.

 

"Também adorei passar o domingo com você, amor. Sabia que você não iria ficar presa àquela menina pra sempre. Esperei, e consegui ganhar minha recompensa, que foi ficar com você naquele dia só para mim. Mas sinto saudades, você não me liga quando o traste está aí. Por que? Eu sei que você disse que não tinha certeza sobre nós, que ainda a ama, mas.. Se você realmente a amasse não a trairia não é mesmo? Enfim... Pense nisso... Vou sair agora, preciso fazer meu cabelo.

Beijo meu amor lindo"

 

Isa imprimira o diálogo desde o princípio, e se sentara na cama, aos prantos, esperando Raíssa voltar.

Quando Raíssa entrara pela porta, vira Isa chorando e se aproximara, legitimamente preocupada:

"O que foi, meu amor? O que aconteceu?"

O carinho que Raíssa "representava" bem, fez Isa se descontrolar mais, e mais... e o choro só amplificou, em profundo desespero.

"Meu deus. Isa, o que aconteceu? Fala comigo"

Não conseguira esconder o choro, fingir que não se importava.

Raíssa sempre foi tudo pra ela, e de repente se vira sem chão.

Totalmente perdida.

"Por que você fez isso comigo?", dizia entre as lágrimas, e quase sem voz, de tanto soluçar. Fora suas primeiras palavras.

 

"Eu? Como assim, o que eu fiz? Acabei de chegar"disse Raíssa, sem nem imaginar o que poderia ter acontecido.

Isa simplesmente jogara o papel nas pernas de Raíssa, e se levantara, caminhando até o banheiro. Precisava se recompor.

Sentira uma raiva tão intensa de repente, que conseguira até fazê-la parar de chorar.

Precisava limpar aquele rosto, e dar a volta por cima ou, pelo menos fingir, na frente dela.

Já bastava o que ela estava sentindo por saber que tinha sido traída de maneira tão cruel. 

Pela pessoa que nunca pensou que fosse trai-la na vida.

A pessoa que mais recebeu dela um amor, e devoção pura, infinita.

 

Raíssa, ao ler apenas algumas palavras da conversa, empalideceu, e imediatamente deixou cair uma lágrima.

Levantara, imediatamente, e tentara sem sucesso abraçar Isa, que gritara:

"Me largue! Me largue! Fique longe de mim"

"Me perdoe... Me perdoe... Por favor, me perdoe... Eu não quis, eu... Eu bebi... Eu não sei o que me deu... No outro dia eu nem lembrei o que tinha acontecido, ela que me contou! Eu fiquei chocada, e me afastei dela! Por favor, acredita em mim!!! Você sabe que eu não sinto nada por ela... Eu amo você..."

Raíssa se jogou no chão, nos pés de Isa, que afastara-se sem querer encostar nem mais um milímetro na loira, que agora chorava muito.

"Ah, agora você me ama? E se não foi nada demais por que não me contou quando ela te disse?"

"Eu... tive medo... eu sei o que você pensa sobre traição, e eu tive medo de te perder... por favor, amor... não me deixa... eu sou louca por você. Ela é maluca, fica me chamando dessas coisas, mas eu nunca disse isso a ela... Ela quer separar a gente, você sabe disso! Sempre soube...."

Isa olhara para a loira jogada no chão, chorando coisas aleatórias e aos prantos, com uma expressão de nojo no rosto.

Sentira-se envergonhada por ter passado tanto tempo com uma pessoa assim, que não sabia o que queria, que fora capaz de fazer algo assim. 

"Ah... Agora você sabe! Agora! Agora que ela conseguiu? Essa não é a pessoa que eu me apaixonei... Simplesmente..."

Isa fora até o guarda-roupa e tirara peça por peça sua, jogando-as na mala, enquanto Raíssa tentava, sem sucesso, devolver as peças de roupas da mão da morena, chorando descontrolada.

"Não, não, ela não conseguiu, não, não... Eu não quis, eu não quis, por favor, não faz isso comigo..."

"EU NÃO FAZER ISSO COM VOCÊ? E VOCÊ? O QUE FEZ COMIGO?", gritara desmedidamente, até que suspirou pesadamente, forçando uma calma: "Ah, sim! Mas é claro! Desculpe, esqueci que sou um carrapato na sua vida!"

"Eu nunca diria isso"  - disse a loira aos prantos

Não acreditaria em mais uma palavra daquela mulher, especialmente depois de tudo o que lera, e da forma que aquele ser nojento que a morena teria ficado sabe-se-lá quantas vezes, se referia a ela nos emails.

Raíssa se encolhera na cama, chorando em silêncio. 

Os únicos ruídos que se ouvira, eram os soluços, entre as lágrimas, e o barulho das roupas caindo na mala aberta.

"Eu vou embora daqui", disse finalmente fechando a mala. 

"Não, você não vai", implorou a loira, puxando a mala da garota sem sucesso. Não conseguiria ter força no estado de soluços em que se encontrava.

"Você nem me queria aqui em primeiro lugar. Não foi?"

Isa lembrara Raíssa da briga que elas tiveram quando a morena saíra da casa de sua mãe:

###### flashback ######

Isa chegara na casa de Raíssa de malas prontas, e pediu para a mãe dela passar uma temporada, alegando ter apanhado da mãe.

A mãe de Raíssa, aceitara, bastante prestativa com a garota. Ela não se importara quando soube que a filha era gay, e também nem se importara de receber a namorada da filha em um momento de dificuldade.

Mas Raíssa não...

Ficara estranha por uma semana até assumir a Isa, que não se sentia segura por ter o relacionamento tão sério assim.

Ela não se considerara preparada.

##### fim do flashback #####

 

"Eu fui tão burra, Raíssa. Devia ter desconfiado, quando você me disse aquilo!... Quem, quando está apaixonada, não quer que a namorada more com ela, ainda mais se a mãe, que poderia ser um impedimento aceita numa boa???? QUEM? Me diga...

"Eu tenho problema com relacionamento sério"

"Nós tivemos um relacionamento sério de 3 anos, Raíssa. Você quer me dizer que me traiu durante todo esse tempo?"

"Não, claro que não!... eu nunca... ! Eu só a traí dessa vez... eu juro... Não sei o que me deu, mas eu não quis, eu... Eu nem lembro, meu deus! Fui saber por ela. Por favor, Isa"  - a voz de Raíssa saíra falha no fim, transparecendo uma intensidade emocional que a morena jamais teria notado em briga nenhuma com Raissa até hoje. 

"Chega dessas mentiras, Raíssa... Não vale a pena falar mais nada... Está bem? Me deixa ir embora."  - Disse, afastando-se com a mala na direção da porta. Raíssa a perseguiu segurando a mala, impedindo-a de sair, sussurrando baixinho palavras como "por favor", "não" e "meu amor". 

Isa continuava:  

"Depois de tudo o que você fez por mim, se você ainda acha que me ama, então aja com amor, e solidariedade, e me deixe sair daqui. Estar aqui e olhar para você, depois de tudo o que eu li, está sendo uma tortura para mim!!"

Raíssa perdera o chão com aquelas palavras e se afastara, jogando-se contra a parede assim que a porta se fechara.

Deixara Isa sair, mas sentira como se seu coração tivesse se partido.

E o pior, era a culpada de tudo.

Tinha destruído o único verdadeiro amor de sua vida.

Enquanto a outra fazia de tudo para estar ao seu lado, e não se deixara vencer pelo preconceito da mãe... era assim que retribuíra.

Raíssa desejara morrer...

 

 Isa saíra do quarto, sem dizer mais uma palavra. Sem dar aquele abraço carinhoso. Sem dar um beijo de até logo. Não havia mais espaço para despedidas. Nunca mais haveria.

Apenas deixara um bilhete para a mãe de Raíssa, agradecendo por todo o carinho, e atenção, e também pela hospedagem.

De todo o namoro, a gentileza daquela senhora em acolhe-la e em tratá-la como uma segunda filha, era a única coisa de bom que lhe restara.

 

 

Sem rumo, Isa voltara para a casa de sua mãe, e prometera nunca mais procurar Raíssa em toda sua vida.

Nada mais foi dito.

Raíssa a procurara várias vezes depois, mas Isa não queria ouví-la.

E como elas não estavam mais no colégio, não estudavam o mesmo curso, e faziam faculdades diferentes, Isa não podia ser forçada a encontrá-la.

E assim se arruinou uma linda história de amor,  que teve o seu fim tão cedo sentenciado.


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Notas finais do capítulo

Bom, para que vocês não se percam e possam se situar na história temporalmente falando, segue o cronograma da relação das duas:

16 - se conheceram (1º ano)

início dos 17 - começam a namorar (2º ano)

18 - continuam o namoro (3º ano)

final dos 18, - a mãe descobre que elas são namoradas (Concluindo o terceiro ano)

final dos 18-19 - problemas em casa, dificuldades no relacionamento

final dos 19-20 anos - moram juntas/ termino.



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