The Legend of Anorle escrita por Guskey


Capítulo 9
• Fire •


Notas iniciais do capítulo

♦ Boa leitura!



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   Anorle estava acordado, mas se recusava a abrir os olhos. O lugar em que estava era tão bem aquecido que o fazia mergulhar nos pensamentos e adormecer a cada instante. Vislumbrou em sua cabeça as cenas mais recentes, os ataques que enfrentaram, a suposta morte de seu companheiro e a fuga do outro. Leek aparecia também em seus breves sonhos, balançando seus cabelos rosa e sorrindo do jeito que Anorle gostava. O anãozinho também estava lá, com seus óculos, proferindo contos e curiosidades sobre o mundo que Anorle nunca soube. Tudo não passava de um sonho, estava harmonioso até demais diante de tantos conflitos em um curto período de tempo, mal tinham deixado Drohat.

   - Sei que está acordado, elfo – Uma voz calma e fria lhe disse muito próximo, parecia que estava sussurrando no ouvido de Anorle. – Fingirá que está morto até quando?

   E então Anorle abriu os olhos. O dono da voz era um jovem rapaz moreno que estava sentado ao lado da cama do elfo. Tinha os cabelos compridos e negros, combinando com os olhos que pareciam dois carvões cintilando sob a luz de uma vela. Ambos estavam eu um quarto espaçoso, Anorle viu carpetes vermelhos surrados cobrindo o chão, pequenas janelas em forma de losango e vários armários recheados de frascos e garrafas.

   - Finalmente, pensei que estava cuidando de um defunto, cara – O jovem sorriu e continuou a manusear a perna do elfo. – Aquela flecha envenenada fez um grande estrago na sua perna, mas acho que o máximo que vai acontecer é ter de amputá-la.

   Quando Anorle teve consciência das palavras proferidas imediatamente olhou sua perna, estava enfaixada e a faixa era apertada pelo jovem rapaz. Este derramou um pouco de um líquido negro no ferimento e olhou para o paciente.

   - É brincadeira, ficará tão bem quanto um bebê – Deu mais um sorriso. – A propósito, sou Kon.

   - Onde está Laak e Pofotta? – Anorle quis saber, ameaçou se levantar da cama, porém Kon o deteve.

   - Calminha aí, cara – Voltou a apertar a faixa que estava folgada. – Olha o que você fez. A de cabelos rosa perdeu o braço e o baixinho morreu. Brincadeirinha de novo. Eles estão bem, virão te visitar em breve. Você é diferente, sabe? A maioria dos estrangeiros que acorda aqui pergunta onde estão, não se preocupam com os “amigos”.

   - Essa seria minha próxima pergunta. – Anorle suspirou sentindo uma dor na perna que o incomodava.

   - Mesmo assim você é diferente – Kon sorriu e levantou-se.

   Anorle o viu de corpo inteiro. Trajava uma roupa longa que arrastava no chão quando caminhava e era toda decorada de chamas e pedrinhas. A manga do traje prolongava além dos dedos da mão e formava uma ponta pontiaguda, parecia uma faca.

   Quando Kon saiu Anorle sentiu-se sozinho, quando menos esperou ele novamente adormeceu na cama. Os sonhos vieram rapidamente: primeiro aves com agulhas no lugar de bico, uma grande cratera e depois duas estátuas que choravam sangue. Estas se locomoveram até Anorle insinuando matá-lo com lanças pontiagudas. Após se transformarem em Laak e seus cabelos rosa virarem sangue, percebeu que tudo era surreal.

   - Acorde – Uma voz feminina sussurrou para dentro da cabeça do elfo. – Anorle?

   - Você está bem? – Disse antes de abrir os olhos e se sentou na cama ainda sonolento. A perna estava melhor, não sentia mais dor e a faixa já havia sido retirada.

   - Estamos bem, mas e você? – Laak sentou ao lado dele e Pofotta logo entrou no quarto.

   - Você vai adorar aqui, Anorle. Que vila maravilhosa, estou encantando com tudo isso. Laak, você sabia que o Tritux tem uma aliança com Drohat? Isso significa que não somos qualquer um, nem mesmo estrangeiros ou coisa do tipo. – O anão perambulou pelo quarto e então parou, olhou Anorle seriamente e sentou-se em uma poltrona próxima. – Eu pensei que você morreria, Anorle.

   - Entre para a fila, companheiro. O primeiro dela sou eu. Imaginei que já estava morto muito antes de acordar. – Esforçou para sorrir, mas o máximo que conseguiu foi uma boca torta.

   - Não brinque com isso. Você morreria se Kon não estivesse aqui. Deve sua vida para ele, está certo? O único da vila que conhecia as propriedades dos mais variados venenos. – Laak fez uma expressão séria e passou suas mãos pelo braço esquerdo.

   - Você foi ferida? O que aconteceu realmente? – Anorle estava inquieto.

   - Foi apenas um osso quebrado, mas já está tudo bem. – Laak se explicou.

   - E eu fui o único que sai ileso daquele campo de batalha. Os esqueletos não paravam de chegar até que a ajuda daqui chegou. Aqueles montes de ossos foram todos torrados, ah eu ri muito, mas quando os vi feridos me apavorei. Não podemos nos dar ao luxo de perder mais um do grupo. – Pofotta ajustou o óculos novo que havia ganhado e olhou pensativo para um quadro feito de carvão na parede.

   - Kon por acaso usa magia? Como ele curou seu braço tão rápido?

   - Rápido? – Laak disse se esquecendo de um detalhe que não havia dito ao elfo.

   - Ele não sabe, não é? – Pofotta suspirou. – Anorle, o ataque na floresta já faz vinte dias.

   - Como? Vinte dias? Isso não pode ser verdade.

   - Pofotta fala a verdade. Você não acordava, só dormia. Viemos aqui todos os dias, manhã, tarde e noite te ver. Kon disse que o veneno no seu corpo demoraria a sair, mas não tínhamos ideia que seria vinte dias. Novamente eu te digo, Anorle, Kon fez muita coisa por você, nem mesmo te conhecendo. – Quando a elfa finalizou deixou a cama e se pôs a observar por uma das janelas do aposento.

   - Pelos espíritos de Drohat. Mas e Tanzta? A cidade dos dragões não era nosso próximo objetivo? – Anorle ficou em pé, sentiu uma dor na perna, mas conseguiu andar.

   - O mapa daquela vidente estava errado. Tanzta está muito além daqui, talvez alguns dez dias de caminhada – Pofotta também se levantou preocupado que Anorle pudesse cair pela fraqueza. – Mas aqui não é muito diferente.

   Anorle foi até próximo de Laak. Quando olhou pela janela em forma de losango viu uma estrada pacata do lado de fora. Havia algumas casas próximas e além viu uma torre com um sino reluzindo a luz solar. Desviou o olhar para o fim da rua e viu alguns humanos, vestidos como Kon, caminhando por outra estreita rua horizontal.

   - Tritux pediu que fosse até ele quando acordasse – Laak deixou a janela e foi até a porta abrindo-a. – Não se demore.

   - Chamarei Kon para te ajudar a vestir uma roupa mais adequada. – Pofotta deixou o quarto com a elfa.

    Foi então que o elfo percebeu. Os dois companheiros usavam trajes do vilarejo, em tons de vermelho e preto e botas do mesmo estilo.

   Quando Kon chegou o elfo já estava sentado na cama.

   - Aqui está sua roupa nova, cara – Entrou com elas em mãos e depositou ao lado do elfo. – Vamos, tire essa imundice do seu corpo. – E deu uma pequena gargalhada.

   O vilarejo era mais interessante que Anorle pensava, conseguia ver todos os detalhes possíveis, principalmente por caminhar com o uso de uma muleta e isso acabar deixando-o vagaroso. Via todos os tipos de aldeões, desde recém-nascidos até os mais idosos, sempre felizes e com as roupas “em chamas”. Não sabia ainda, mas jurava que o vilarejo tinha alguma ligação com Tanzta, parecida tudo muito fogo e carvão. Mas a água ausente lhe chamava atenção, lhe fazia pensar em Drohat e na mãe. Nenhum rio ou lago, nada. Em Drohat a água reinava, eram riachos, córregos que cortavam toda a cidade, cachoeiras lindas e lagos salpicados de peixes dourados. Mas a vila era muito quente e abafada, fumaça por todo lugar e conversas que emanavam de todos os cantos.

   Kon vinha logo atrás e de vez em quando parava para conversar com algum conhecido, mas não atrapalhava muito Anorle, já que estava bastante lento. Demoraram quase uma hora para cruzar o vilarejo e chegarem à entrada do Palácio Ametista. O que mais admirava Anorle naquele edifício é que era totalmente ordenado por pedras que pareciam brasas vivas, além de diversas estátuas de dragões colocadas em todo lugar.

   “Disse que tinha um toque de Tanzta aqui”, pensou mesmo nunca vendo a cidade dos dragões pessoalmente. Kon tomou a dianteira para dialogar com dois guardas que estavam pertos no grande portão de ferro.

   - Tritux nos mandou até aqui, com licença. – Insinuou avançar e foi detido por lanças pontiagudas dos guardas.

   - Tritux não quer falar com um curandeiro qualquer feito você, Kon. Dê meia volta.

   - Vamos, Kon. – Anorle virou para trás enquanto Kon xingava os guardas em uma voz baixa.

   - Você não, elfo. Você entra, ele fica. – O guarda afastou sua lança e deu passagem para Anorle.

   - Te vejo na enfermaria – Kon se despediu e tomou seu caminho.

   Se a visão exterior do palácio era exuberante, o interior era de fato uma porcaria. Quando Anorle entrou no primeiro aposento do edifício sentiu que seu corpo estivesse queimando. O calor era tão intenso que o suor começou a brotar de seu rosto e quase despencou ao chão quando foi limpar. Incrivelmente o elfo foi se acostumando e depois de atravessar o aposento já não sentia tanto calor, apenas seguiu uma reta até um par de escadas que se uniam no topo. Subiu com esforço para o segundo piso, onde mais guardas estavam em pé, alguns conversavam sobre a noite anterior enquanto a maioria cochilava.

   “Dormindo no serviço, que lástima”, pensou tentando não sorrir, mesmo que fosse difícil. A perna latejava desde que saiu da enfermaria e Kon havia deixado claro que ele sofreria por mais algumas horas e sua perna se repararia da flechada levada vinte dias atrás. Ainda não acreditava que ficou tanto tempo dormindo em uma cama, enquanto tantas coisas aconteciam ao seu redor.

   - Por aqui, elfo – Um dos guardas o indicou o destino.

   A lança apontava para uma grande porta de madeira. Anorle se aproximou e abriu-a, ao ver o tal Tritux sentiu um frio na barriga. Ignorou até mesmo a situação precária do local, parecia que o aposento cairia em pedaços a qualquer momento. Mas ali, bem diante dos olhos dele, algo incrível e surreal.

   - Seja bem vindo a Trema, jovem elfo. Me chamo Tritux, é um prazer conhecê-lo. – A voz quente e estrondosa de Tritux fez até mesmo o chão abalar.

   Anorle imaginava que Tritux fosse qualquer coisa, menos um dragão. A criatura era o dobro da altura de Anorle, toda rajada com vermelho e amarelo, a cauda recheada de espinhos e os olhos, ah os olhos, eram puramente negros. O frio na barriga continuava enquanto o elfo encarava Tritux, jamais pensou que veria um dragão na vida antes de chegar a Tanzta, se isso realmente aconteceria algum dia.

   - Sou Anorle, de Drohat, um dos Cinco Expedidores atuais – O elfo sentiu um formigamento nas mãos e nos pés. – Não imaginava que seria...

   - Um dragão? – Quando a criatura disse todos os guardas ao redor riram, alguns até forçadamente, mas riram. – Você verá na vida coisas que não espera jovem elfo.

   - Me disseram que queria conversar com minha pessoa.

   - Vinte dias atrás encontramos você e seus dois companheiros em uma floresta perto de Trema. Estavam sendo atacados por aqueles sanguinários esqueletos, se recorda? – Tritux baforou um ar quente.

   - Sim.

   - Um de nossos curandeiros fez um grande trabalho em seu trio, principalmente em você, elfo. Está sabendo?

   - Sim.

   - Gostaríamos que nos recompensassem de alguma forma por termos salvado suas vidas, compreende?

   - Depende. – Anorle ficou inquieto.

   - Não é muita coisa, apenas que me fale um pouco sobre Drohat, me entende?

   - Você tem uma aliança com nossa cidade, não é mesmo? Acredito que saiba mais dela do que eu.

   - Aliança que foi rompida cinco dias atrás. De alguma forma souberam que vocês estavam aqui e infelizmente mandaram alguns de seus tão adoráveis cidadãos habilidosos para nos espiar. Pensam que vocês são nossos prisioneiros, apenas pelo motivo de Drohat e Trema terem tido um conflito vários anos atrás. Não era uma aliança amigável, mas uma aliança de paz. – O dragão soltou algumas chamas pela boca em direção ao chão.

   - O que está querendo dizer? – Anorle quis saber.

   - A partir do momento que vocês e aqueles recentes intrusos adentraram no território de Trema uma guerra foi instaurada.

   - Não tínhamos a intenção de invadir território algum, estávamos a caminho para Tanzta. Você simplesmente não pode nos culpar por isso e guerrear contra nossa cidade.

   - Não só posso como também já fiz. A mensagem já deve estar na metade do caminho e em breve aqueles quatro espíritos idiotas pagaram por terem quebrado nossa aliança. Era sagrado, entende? Como um pacto. Drohat será destruída e a culpa é de vocês. Mas sou um dragão muito simpático, pequeno elfo. Preciso de informações de Drohat, de seus muros e defesas, para que tenhamos êxito na batalha.

    - E se eu recusar? – Anorle estava desarmado, a pergunta soou como um desafio.

    - Se recusar vão acabar mortos como aqueles idiotas que Drohat mandou cinco dias atrás. Caso me fale tudo que sabe vocês três estarão livres. E mais uma coisa. Abra a porta. – Ordenou para um guarda.

   Quando ele abriu uma porta camuflada na parede, Anorle não acreditou no que via. Vanetac estava vivo. Estava nu e algemado, pendurado por uma corrente de ferro e a boca tapada com palha.

   - E se recusar ele também morre. O curandeiro fez muito esforço para deixá-lo vivo, é melhor não nos decepcionar, elfo.

   - Solte-o! – Anorle foi correr para o lado do amigo humano, mas desabou no chão. A perna estava latejando. – Não queríamos vir para cá, não queríamos. Apenas seguimos o mapa.

   E então Anorle se lembrou. O mapa. Justo o que a vidente havia entregado para Pofotta.


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Notas finais do capítulo

♦ Acredito que muitas perguntas estão aparecendo. Para ver suas respostas é melhor que leia os próximos capítulos.

♦ Comentem o que vocês acharam desse "pequeno" antagonista. ^^



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