Gota D'Água escrita por KuroroLucifer


Capítulo 17
Marcos




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Cheguei no Galeão quatro horas mais tarde. Eu tinha juntado bastante dinheiro no banco e iria conseguir me manter por alguns meses. Eu tinha planos de colocar a minha casa — na outra cidade — para alugar assim que eu tivesse cabeça para pensar na vida.

Eu não estava mais aguentando tanto sofrimento. As coisas, para mim, estavam chegando muito próximas do limite.

Eu tinha dessa aura que só tem no Rio de Janeiro. Uma coisa mais descontraída, um sentimento de poder... Não sei explicar. Eu me sentia em casa nessa cidade, sentia que tudo iria melhorar.

Não tinha coragem de voltar para a casa de meus pais, em Botafogo, mas eu poderia contar com meu irmão, Marcos. Ele morava em um apartamento confortável na Tijuca — tivera sorte na vida. Era um médico de respeito do Copa D’Or, mas gostava de morar na sua rua na Tijuca.

Tomei um táxi do aeroporto até o apartamento de Marcos. Aproveitei que já era noite e, com sorte, ele não estava de plantão. Ele morava no sétimo andar, no apartamento 2, eu lembrava muito bem. Eu escolhera aquele apartamento, afinal de contas.

Eu desci do carro, paguei o taxista e parei na portaria. Pedi para o porteiro ligar para o 702 e Marcos atendeu. Ele autorizou minha subida com um tom surpreso.

Subi de elevador até o andar de Marcos e bati na porta dele.

E ele abriu.

***

Marcos é o tipo de filho que qualquer pai e mãe quer ter. É um cara bonito, autêntico, esforçado, hétero e bem de vida. Ele sim tinha sido um filho que deu certo do casal de Seu Olavo e Dona Cecília. Seu Olavo não tinha sido exatamente um bom pai nem Dona Cecília uma mãe das melhores, mas Marcos era um filho de ouro.

O exato oposto do irmão dele, eu. Eu tinha me dado tão bem na vida quanto meu irmão, mas a questão da bissexualidade sempre foi um tabu na nossa casa. Por causa disso, eu sempre fui deixado à margem, sempre fora esquecido e, depois que eu me assumi, meus pais me deserdaram para sempre.

Aliás, esse tinha sido um dos motivos pelos quais eu decidi ir para uma cidade interiorana longe do gigante Rio de Janeiro.

E lá estava eu, de volta, após quatro anos sem ver ninguém da minha família. Por isso a surpresa de Marcos ao me rever após tanto tempo. Ele ficou me estudando, mas logo me abraçou, dizendo:

— Quanto tempo, maninho.

Eu fiquei até meio sem jeito, sem ter o que dizer. Apenas assenti e recomecei a chorar no ombro dele. Marcos não entendeu nada, mas continuou me abraçando. Ele sabia que eu estava passando por uma barra, senão eu não estaria ali.

— Oh, irmão... Não fique assim. — ele disse, me consolando e veio me trazendo para o sofá.

Marcos não era casado, mas tinha uma namorada fixa desde que eu fora embora. Os dois moravam em apartamentos diferentes e decidiram manter assim, mesmo após tanto tempo de namoro. Mas um costumava dormir no apartamento do outro, fazendo companhia tanto para passar a noite somente quanto para fazer sexo mesmo. Aos dois, essa era a definição de “sexo casual”.

Naquela noite, a namorada dele, uma menina simpática chamada Júlia, estava lá e não entendeu nada quando viu seu namorado agarrado comigo tentando me consolar, sem muito sucesso. Ela passeou pela sala, tentando, por códigos, tentar descobrir quem era eu. Todas as tentativas não obtiveram sucesso e ela teve que aguentar a curiosidade até eu parar de chorar.

Nos sentamos no sofá juntos e eu tentei prender o choro assim que ele procurou meus olhos com aqueles olhos lindos dele.

— Irmão... O que aconteceu?

— Aconteceu tudo. O imaginável, o inimaginável, tudo.

— Você quer se abrir comigo? — ele fez uma pausa e suspirou. — Olha: eu sei que nunca fomos muito íntimos, mas você sempre pode contar comigo. Sempre mesmo.

Eu olhei fixamente para ele e contei tudo o que tinha acontecido comigo.

***

No final do meu monólogo, Marcos parecia que tinha tido um estalo.

— Eu não acredito nisso. — ele disse, com um sorriso de quem tinha acabado de ter uma ideia brilhante.

— Amor... — Júlia disse. — Como você pode rir depois de toda essa história trágica? Quanta insensibilidade, Marcos.

— Oh, não, Bruno, desculpa. Não é nada disso. É que simplesmente você é a resposta, é o que faltava no nosso projeto.

— Como assim? — eu perguntei, até meio ofendido com aquela história toda.

— Agora é a minha vez de falar. — ele iniciou e tossiu com a garganta.


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