Metamorfoses Voláteis escrita por Cupcake Says


Capítulo 26
Capítulo 25




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Descendo a encosta da montanha, Morpheu e o pequeno grupo de soldados que havia levado consigo se deslocavam pela encosta seguindo marcas de...

Passos?

O fundo da mente de Morpheu esperava silenciosamente que Klaus tivesse retornado, mas achava improvável, contudo não tinha muitas outras explicações disponíveis.

– Fiquem aqui um instante, eu já volto, não abaixem a guarda.

Não que isso fosse acontecer, os soldados mantinham as armas em mãos, próximas ao peito, tentando manter a respiração estável.

Morpheu continua seu caminho sozinho, caminhando a passos lentos e cautelosos pelo manto branco, desfeito apenas pela fraca trilha de passos, respirando baixo e encarando a nevoa do chão e de sua própria respiração.

O caminho o leva até a margem de um rio, um riacho pequeno que dividia o território do norte daquele que pertencia ao sul.

Congelado sob uma grossa camada de gelo desforme e irregular.

Morpheu levanta os olhos do gelo, olhando vagamente na direção do rio.

Havia alguém lá.

– Um... Nortista?

Tinha uma imensa tatuagem negra que partia num ponto no meio das costas cobertas quase que totalmente pelo cabelo escuro e repicado de forma irregular, não usava uma camisa ou um casaco, e tinha as pontas dos dedos azuladas por conta do frio.

As enormes tatuagens que tinha pelas costas abraçavam seu torço em ondulações e circunferências, tentáculos negros que desciam por seus braços até as primeiras juntas de seus dedos, exceto pelo dedo médio, onde se espalhavam até a altura da unha. Os tentáculos escuros desciam pela borda da calça puída de tecido grosseiro, não era possível determinar até onde iam, apesar dos pés descalços que permaneciam limpos, manchados de neve.

Ele tinha os braços parados ao lado do corpo, no meio do rio congelado, o cabelo longo e escuro era soprado com o vento numa desordem natural.

Ele olhava para cima, com os lábios entreabertos.

Tinha caninos afiados.

Como um grande felino carnívoro.

Na altura do pescoço tinha uma coleira de metal grossa e apertada, que pressionava a pele pálida de modo que parecia dificultar a respiração, mas seu peito não se movia.

Diante da voz de Morpheu ele da meia volta, virando-se na direção, tão rápido que seu rosto permanece encoberto pelo cabelo.

Morpheu tem um rápido vislumbre de olhos predatórios antes de encarar o silêncio novamente.

E então não havia mais ninguém lá.

E então sons de tiros.

Morpheu olha para trás, correndo de volta na direção do som, congelando diante da visão de todos os soldados que havia trazido consigo, caídos no chão, e sangue manchando a neve numa poça vermelha.

Sua respiração para no meio da garganta, mas antes que ele possa desengatilhar a arma, está no chão, e algo está sentado sobre suas costelas, mantendo ambas as suas mãos contra a neve.

Queimando com o frio.

Seus olhos se abrem com o choque.

De onde ele veio?

Como foi que...?

A angustia das mortes de seus homens atingindo seu estômago, mas sua mente permanece inerte, os olhos gelados apenas encarando o brilho predatório acima dele.

Sentindo-se pequeno.

Sentindo-se vulnerável.

Sentindo...

Medo.

Mas ele não faz nada, apenas observa os olhos de Morpheu em silêncio, silêncio claustrofóbico.

Silêncio que antecede o sussurro frio da morte.

Estava manchado de sangue, ainda quente, ainda vivo, por suas mãos e em seus lábios, e encarava o comandante em baixo dele com um olhar de criança, desarmado do olhar predatório de outrora.

O cabelo longo e fino escorrendo por cima dos braços e se espalhando pelo peito do comandante.

Ele entreabre os lábios, que se movem sem som algum, numa frase muda.

Morpheu não consegue discernir as palavras, todas vindas do norte.

– Quem é você...? – ele se escuta perguntar, como um espectador imóvel de suas próprias palavras.

Novamente ele entreabre os lábios, mas nenhum som vem dali, apenas o movimento vagaroso de uma palavra sem voz.

As...ta...roth...

– Astaroth... – ele repete, novamente assistindo as palavras escorrendo de seus lábios, sem seu total controle.

Ele inclina a cabeça para o lado e para baixo, descendo na altura do pescoço do comandante, aspirando o cheiro forte e pulsante de humanidade, soprando uma respiração morna contra os ouvidos de Morpheu, que consegue distinguir o cheiro forte de camomila e erva doce.

O cheiro do veneno do norte.

E segundos depois não a mais nada lá.

Apenas ele, deitado na neve, ao lado de seus homens caídos.

Ele demora a se sentar, observando o tremer constante de suas mãos, sua garganta seca, olhando para a neve por um longo momento.

– As...taroth...

~*~

Klaus desperta sozinho numa casa que não conseguia reconhecer, numa cama que não era sua.

Esperou a onda de dor, mas não sentia nada, em lugar algum.

Se não estivesse tão consciente de quantos anos de servidão tinha a prestar, teria acreditado que estava morto.

Então colocou-se sentado, olhando os arredores com apreensão.

Estava sozinho ali.

E então não estava mais.

Engoliu uma respiração forçosa quando a figura coberta de neve e cheiro de sangue surgiu como uma sombra no meio do cômodo, os olhos predatórios e luminosos o encarando de volta como a um animal a ser abatido.

– Astaroth... – conseguiu expulsar numa respiração baixa e trêmula.

Tinha medo de piscar, mas quando o fez ele estava ali, quase em cima dele, tão perto que conseguia senti-lo respirar, o silêncio esmagador e os olhos violeta luminosos.

Sentia o cheiro forte de sangue humano emanando dele, por mais que ele estivesse limpo, estava quase certo de que ele havia lambido o sangue enquanto voltava.

Só podia esperar que ele não tivesse feito mal a Morpheu, e sentia o peito pesado com seu egoísmo, mas mais pesado ainda com a ideia de que talvez Morpheu estivesse morto.

Ele estende uma das mãos na direção de Klaus, devagar, fazendo com que ele prendesse a respiração, esperando pelo pior.

Mas ao invés disso ele toca um dos lados de seu rosto com cuidado, tinha a pele morna e fina, a pulsação irregular vinda de seu peito.

Klaus encara a coleira de metal apertada ao redor de seu pescoço, sabia que ele não tinha mais a capacidade de falar.

Mas isso não o impedia de querer preencher o silêncio.

– Porque... me salvou?

Astaroth se põe sentado na cama, ambas as mãos sobre os joelhos, os olhos haviam se perdido do lado de fora da janela até que a voz de Klaus o trouxesse de volta ao momento presente.

A palavra escorre devagar entre seus lábios mudos.

Na...ith...

– Me salvou por... eu ser um naith?

Ele olha o doutor nos olhos, com uma intensidade tão gritante que o fazia sentir desconfortável.

Então ele toma uma das mãos de Klaus, abaixando e beijando a palma de sua mão devagar.

Tinha um sorriso de criança.

As palavras todas escapam das mãos de Klaus, e ele se encontra perdido...

Imerso e medo e silêncio.

Imerso em curiosidade e apreensão.

Astaroth... O anjo caído de Silvarum...

Soldado...

Da primeira ordem de soldados adormecidos do norte...

A Legião...

– Você o matou...?

Astaroth encara os olhos de Klaus por um instante.

– Morpheu... você o matou...?

Astaroth nega com a cabeça, um pequeno sorriso brincando em suas feições.

Palavras da língua do norte mimicadas para fora de seus lábios cadenciada, pacientemente.

“Eu não poderia matá-lo… eu o amo…”

– O que...?

Eles se olham por um momento.

E ele desaparece novamente.


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Notas finais do capítulo

Astaroth!
é bem divertido escrever sobre ele!
mas preciso saber se gostaram dele, e do capítulo.
uvu