Lisa estava voltando para sua casa em seu furgão vermelho. Ela estava em mais uma imagem para conferir o andamento de uma de suas lojas em Manhattan. Ela e o irmão gêmeo, Luke, cuidavam de uma rede de livrarias que haviam herdado dos pais.

E por falar em seu irmão, ela tinha discutido com ele mais uma vez. Ela odiava como ele era maldoso com Hazel, sua melhor amiga. Na maior parte do tempo, ele até era simpático com ela, mas às vezes extrapolava demais.

A estrada por onde ela passava era de terra batida, com plantações extensas e mato crescendo pelas laterais, além de ser quase deserta. Era raro passarem carros por aquela região. Na melhor das hipóteses, algum pequeno animal silvestre aparecia para lhe assustar. Estava chovendo bastante, mas ela sempre levava uma capa impermeável no banco traseiro. Ela sempre estava preparada para tudo.

Um estrondo chamou sua atenção. Ela baixou o farol do veículo a tempo de ver um pequeno redemoinho de fumaça verde se desfazendo no ar. Ao ver aquilo, ela parou o carro no meio da estrada e esfregou os olhos algumas vezes, assustada. Depois, pegou o celular na mochila com a qual sempre saía e ligou para Hazel.

– Alô? - a garota atendeu do outro lado da linha telefônica.

– Hazel? É a Lisa.

– Se ligou para saber se seu irmão idiota já veio se desculpar... Não, ele não veio.

Lisa negou e contou rapidamente o que vira na estrada, descrevendo com o máximo de detalhes que pode captar numa pequena fração de segundo. Hazel fez apenas algumas perguntas simples, que foram respondidas quase que imediatamente.

– E então? - perguntou Lisa nervosa – Acha que é...?

– Sim. - respondeu Hazel na mesma hora– É sim. Corra e garanta que ninguém vai vê-los!

Lisa pôs a capa de chuva, desceu do carro ainda com o celular na mão e correu na direção em que vira o estranho redemoinho. Seus tênis novos estavam estragados por causa da lama, mas ela continuava correndo.

Enfim ela parou. Na realidade, ela tropeçou em alguma coisa (lê-se braço do Andrew) e saiu capotando até cair de cara numa poça de lama enorme. Ela se levantou calma e tirou o excesso de lama do rosto. Observou sua blusa favorita completamente estragada. Ela era vermelha e tinha a frase "Eu acredito em contos de fada" estampada.

– Tudo bem aí? - perguntou uma voz feminina. Lisa levantou os olhos e viu uma garota com cabelos negros e a pele branquíssima. Não era preciso fazer esforço para saber quem ela era. Ou, pelo menos, quem ela seria. Ela fez sinal de que não precisava de ajuda e se levantou. Logo depois, caiu de novo ao ser puxada pelos pés por uma ruiva.

– "Eu acredito em contos de fada"... - a ruiva leu o que estava escrito em sua blusa - Adorei! Você parece ser legal! Quer brincar de casinha comigo?

– Hãn... - Lisa não entendeu nada - Ela bateu com a cabeça forte demais?

– Não. - respondeu uma outra garota de cabelos pretos e azuis, que parecia estar limpando uma espécie de faça com o jeans - Ela só é retardada mesmo.

Como se tivesse levado um choque de realidade, Lisa notou a quantidade de adolescentes presentes. Ela conseguiu contar uns dezesseis adolescentes. DEZESSEIS!

– Ai, ai... Isso não é bom... - ela pensou alto - Luke não vai gostar nada disso...

– Quem é Luke? - perguntou uma garota de cabelos loiros platinados.

– É meu irmão. Vamos! Está chovendo e vocês não tem abrigo contra a chuva nem contra frio.

Lisa fez sinal para que os outros a seguissem. Eles pediram alguns minutos para acordarem uma garota que desmaiara com a queda (provavelmente ela estava dormindo mesmo) e depois tomaram o caminho até o furgão de Lisa.

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– Grosso!

– Infantil!

– Insensível!

– Princesinha mimada!

– Ai! Mexeu no sapatinho! Quebrou meu sapatinho de cristal!

Essas foram as primeiras palavras que o grupo de herdeiros ouviu ao entrar na "Grimm's Library", a pequena livraria para onde Lisa os tinha levado. Os livros das prateleiras eram, em grande maioria, de aparência impecável, todos muito bem cuidados. Naquela livraria haviam as versões mais atuais dos livros e também as mais antigas, daquelas com capa de couro ou tecido. Dava para se notar que algumas dessas cópias mais velhas não eram lidas a muito tempo pois estavam cobertos de poeira. Entre eles, tinha um exemplar de "Rumpelstilskin" que chamou a atenção de Cher.

Lisa seguiu para o fundo da loja, onde havia uma porta de madeira com belos desenhos talhados na moldura. Sem bater, ela abriu a porta com jeito e força, revelando um pequeno escritório iluminado pela luz fraca de uma lâmpada. O fogo da lareira aquecia todo o cômodo, porém alguns dos herdeiros correram para se aquecer próximos a ela. Cher ficou com Fanny, garantindo que ela não tentaria ver o que aconteceria se ela colocasse o cabelo no fogo ou algo assim. Um garoto de cabelos castanhos e olhos claros, que inicialmente estava dando voltas irritado pelo pequeno escritório, e uma loira de olhos azuis sentada na escrivaninha encaravam boquiabertos a cena.

– Lisa, - o garoto chamou, esfregando os olhos claramente nervoso - que loucura é essa?

– Er... Luke, irmãozinho lindo... - Lisa mordeu o lábio inferior - Sabe... eu estava voltando de Manhattan, sozinha, no escuro...

– Lisa! - a loira desceu da mesa observando minuciosamente os novos rostos - Quando me disse que tinha visto o portal abrir, não achei que todos esses adolescentes teriam saído dele.

– Nem eu. Achei que seriam um ou dois herdeiros. Três, no máximo.

– Uou, uou, esperem um pouco. - Luke pediu silêncio - Estão me dizendo que TODAS essas pessoas são herdeiros!? Tipo, dos contos de fada?! Hazel, você sabia disso?

Os dezesseis "imigrantes" se entreolharam. Como eles sabiam que eles ERAM herdeiros? Como eles sabiam DA EXISTÊNCIA dos herdeiros? Como eles sabiam que eles FAZIAM PARTE dos contos de fada?

Todos foram tirados dos devaneios pela garota loira.

– Cris! - ela correu na direção da filha da Branca de Neve - Quanto tempo! Eu quase não te reconheci! E Rose... Ai meu Grimm, que saudades de você!

– Er... - Rose parecia sem graça - Desculpe-me, mas... nos conhecemos?

– Claro! - a loira riu - Não lembra de mim? Sou eu! Hazel!

– Hazel...? - Rose pareceu se esforçar para lembrar do nome. Então seus olhos brilharam - Hazel Ella, filha da Cinderella?

– Isso!

As duas amigas se abraçaram fortemente. Ninguém sabia o que falar. Havia uma herdeira no Mundo Real desde sabe-se lá quando é ninguém nunca soube. Tudo bem que Hazel tinha sumido misteriosamente do Mundo dos Contos fazia uns quatro anos, mas quem poderia imaginar que a loira estaria no lugar onde ela é qualquer outro personagem era considerado mito.

– Hum... Desculpem a indelicadeza de modos, mas... - Becky chamou a atenção de todos e apontou para os gêmeos Luke e Lisa - Quem são vocês?

– Quem somos nós? - perguntou Lisa animada abraçando o irmão pelo pescoço. Este revirou os olhos, sufocado - Somos os últimos descendentes de dois grandes escritores. Os mais famosos escritores, se posso assim dizer. Somos os irmãos Grimm.