O Filho do Conto escrita por Matheus Nascimento


Capítulo 7
Os ceifeiros


Notas iniciais do capítulo

Deste capítulo em diante refiro-me aos ceifeiros com "c" minusculo, não mais maiusculo.
ceifeiro e não Ceifeiro.
:)



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OS CEIFEIROS CAIAM aos montes. Milhares deles manchavam o céu como um enxame gigante de vespas.

− O que a gente faz? – perguntou Max, desesperado.

− Eu... – Moz parecia cansado de responder aquela pergunta: − Eu não sei...

Os dois estavam parados, sem mexer um músculo sequer. Max deixara a mochila cair.

Os ceifeiros aproximavam-se cada vez mais numa velocidade incrível. Seria inútil tentar fazer qualquer coisa. Max ficara paralisado com medo por causa de Mo’gul, não saberia o que viria a seguir por causa dos seres que caiam em sua direção. Mas ele teria que fazer algo. Era sua casa, seu lar. Não poderia ficar simplesmente olhando um bando de paus-mandados de Morte destruir tudo que tinha.

De repente, Max lembrou-se de Moz na floresta alguns dias antes. “Tire o anel, é a nossa única chance!”.

− Moz, e se eu... E se eu tirasse o...

− Não! – interrompeu-o, subitamente lembrando-se de coisas de um passado sombrio. – Não será necessário. Apenas fique ai, não faça nada.

A expressão de Moz não era mais de medo. Parecia até ter um leve sorriso no rosto.

Max não compreendeu. Ceifeiros iam destruir tudo, como Camac dissera em seu sonho, e ele ia ficar parado? Não! Não podia fazer isso. Ele tinha medo, muito medo, disso ele sabia, mas já chorara de mais, tivera ataques de mais, dessa vez tinha que fazer algo. Quando estava prestes a retirar o anel, Moz mostrou os dentes para Max, rosnando.

Ele ainda não compreendia. E algo muito estranho aconteceu. As Cercanias tremeram num baque estrondoso e metálico que ecoou por todas as partes. Elas piscaram em azul e eles começaram a invadir. Como numa chuva de meteoros, dezenas, centenas de ceifeiros caiam no chão com um estrondo, levantando poeira e pedras e pedregulhos no ar, rachando o chão. Alguns continuavam flutuando, mas mais próximos ao chão. Outros caiam leves como penas. Uns agarravam-se em árvores próximas e outros se acomodavam nos telhados, vários desses em formas de corujas e corvos gigantes. A maioria continuava voando bem acima da casa, observando Max e Moz do alto. Outros ainda caiam. A aglomeração de ceifeiros escureceu o ambiente, deixando o ar com fedor de morte. Da Morte.

O máximo de destruição que causaram foi buracos no chão. Nenhum deles moveu um dedo em direção a casa, que continuou intacta.

O maior deles, o que caiu primeiro e deixou o maior buraco no chão, caminhou lentamente para Max e Moz. Dois metros de altura, musculoso e pele cor de ébano, tão escura como a noite. Seus olhos brilhavam púrpuros. Max incrivelmente percebeu somente algum tempo depois o mais estranho no ceifeiro; os quatro fortes braços e as pernas de cervo negras, como um sátiro negro. Seu peito nu aumentava ainda mais a lembrança de um sátiro. Só não tinha chifres.

Aproximou-se de Max e colocou uma das quatro mãos em seu ombro. Max pôde sentir a frieza. Tremia feito uma vara-verde e fazia o máximo para controlar a respiração. Um novo ataque? Talvez... O mais estranho era Moz, que estava tão calmo como nunca, até aliviado, diria.

A mão não o apertava e os olhos de púrpura emanavam compaixão. Com uma voz solene e poderosa, o ceifeiro proferiu lentamente:

− Saudamo-nos, Maxmilian Jayrenson Patrick, ó Lorde de Lycaster, Senhor do Sangue, Herdeiro do Trono, o Filho do Conto. Viemos em paz.

...

Max não via sinal de “Camac, o Esquecido”. Será que se esquecera de comparecer a “reunião”? Não se importava, de qualquer forma. Cada vez mais gostava menos do mentiroso Camac.

Max levara um bom tempo pra começar a compreender tudo o que estava acontecendo. Camac avisara-o que Morte havia desaparecido de Palácio Penumbra e, consequentemente, todos os ceifeiros estavam livres e, consequentemente, estava em perigo. Dissera que os serventes de Morte ceifariam ele e sua mãe e que para evitar isso precisava encontrar o seu soberano, o rei de Palácio Penumbra, o deus da 34ª Dimensão. Mas também precisava salvar sua mãe desaparecida, então... De tudo isso, a única verdade que sabia com certeza era sua mãe desaparecida. O que acontecia em sua frente contrariava tudo. Todos os ceifeiros invadiram sim as Cercanias, mas até o momento não tinham sequer quebrado um telhado. E havia aquele ceifeiro em especial, o que parecia um sátiro negro com quatro braços. Ele dava arrepios em Max, mas parecia ser bom.

Outra coisa que o incomodava ainda mais que os milhares de ceifeiros em seu quintal eram os títulos que aquele ceifeiro lhe impusera: Lorde de Lycaster, Senhor do Sangue, Herdeiro do Trono e o Filho do Conto. Eram tão vagos como se tivessem sidos proferidos em língua estranha. Estava disposto a descobrir assim que explicassem a situação atual.

Antes de começar a explicar, o ceifeiro de pernas de bode, olhos de púrpura e quatro braços pedira-lhe com toda educação que entrassem na casa para assim conversarem melhor. Max não via escolha. Olhou para Moz em busca de resposta, mas a raposa limitara-se a sorrir – Max estava mais perdido do que formiga em colmeia de abelha.

Assim que entraram; Max, Moz e o ceifeiro, a grande mesa de mármore bege com detalhes marrom em estilo grego estava pronta para um chá da tarde. Max deixara a mochila no chão, ao seu lado. O ceifeiro sentou na cadeira de uma das pontas e Max e Moz em cada um dos lados. Nenhum deles tocara na comida (o ceifeiro por motivos óbvios).

Max fitava os olhos cor de púrpura do ceifeiro, que pareciam brilhar. Moz estava um pouco baixinho sentado na cadeira normal, enquanto a especial feita proporcionalmente para seu corpo ficava na outra extremidade da mesa. Eles ficaram um bom tempo se encarando quando Moz perdeu a paciência:

− Não temos o dia todo, caro Blauhdaler – disse, secamente. O leve sorriso já se escondia de novo.

− Peço-lhe perdão, Moz, a Metamorfose Laranja. Estava tão fascinado com a mente do nosso querido Max, o Filho do Conto, é tão cheia de pensamentos... – quando Max ia começar a fazer a pergunta, Blauhdaler, assim se chamava, subitamente continuou: − Tenho observado-o firmemente durante anos, Max. Tempo esse que passou voando. Pretendo ser breve, mas receio que terá que aguentar nossas caras feias por um longo tempo. Os tempos são sombrios, e até os ceifeiros estão sentindo isso. Deve estar se perguntando o que está acontecendo, e para isso terei que começar desde o início:

“Tudo começou há alguns anos, quando você era menor... Não, na verdade começou há mais tempo ainda; centenas de anos atrás. Algumas coisas eu não posso dizer, infelizmente, e alguns nomes são proibidos de se pronunciar. Um mero descuido e nossa localização será comprometida e perigos horrendos serão postos Cercanias adentro. Por isso começarei com alguns anos atrás, quando nosso grande Max ainda era tão pequeno quanto Moz” Moz serrou os olhos, como se dissesse Não tão pequeno assim, ceifeiro. Max estava num silencio profundo, concentrado em Blauhdaler, Perguntas depois, pensou. O ceifeiro continuou: “Mesmo antes da situação atual, Eterath presenciava tempos sombrios. E os próprios ceifeiros sentiam isso na 34ª Dimensão dos mortos. Os Mitos, como bem sabe, Max, não são... bem... mitos, se é que me entende. A história deles é um pouco diferente da que Moz lhe contou. Não perderei tempo contando cada detalhe dela. O que importa é que cada um deles estão ressuscitando. Aos poucos cada um está voltando à vida, mais fortes do que nunca. E não é porque são Mitos, guerreiros que derrotaram um mal primordial, que são necessariamente bons.

“O primeiro deles... Ou melhor, a primeira deles já ressurgiu há muitos. E, pra nosso infortúnio, é a pior de todos os Mitos. A que tem a alma mais maligna de todos. Branca de Neve, a Primeira, a Invocadora de Ceifeiros. Ela é a responsável por tudo de ruim que está acontecendo em nossa volta, em volta das Cercanias. Ela que destruiu a barreira que nos protege dos monstros que assolam o Buraco. É graças a ela que eles estão à solta por Eterath.

“Os planos dela são mistério para nós ceifeiros. Pois, como bem sabe, Branca é controladora de nossa raça e pode se esconder muito bem de nossos olhos. Foi ela quem obrigou Camac invadir seus sonhos e te mostrar coisas que não vão acontecer, te dizer mentiras. Tudo isso é plano dela para te capturar, Max, e estamos aqui para lhe prevenir das garras geladas de Branca.”

Um longo tempo se passou pra Max perceber que tinha findado a conversa.

− O quê? – perguntou ele – Como assim? Não entendo. Preciso de mais explicações, Blauhdaler. Ainda não consigo entender.

O ceifeiro olhou para Moz, que respondeu balançando a cabeça.

− Max, o Filho do Conto – começou Blauhdaler com calma −, Branca de Neve quer você em seu plano. Camac inventou a história da missão em busca de Morte pra te levar em uma armadilha. Você ia ser capturado e levar pra ela artefatos de que precisa. O Anjo Misericordioso é uma referência ao livro que lia certa noite. Na verdade trata-se de um aciptris. Resgatar a Espada de Sangue. Ela se encontra na Floresta de Anklar em uma área onde Branca não pode pisar. O dragão é, na verdade, um grande monstro réptil que guarnece uma área perigosa de Anklar, onde uma árvore de pedra brota frutos sagrados, e dentro dessa árvore está o Saingrahl de Branca de Neve, que a deixará mais poderosa do que já é. Desconhece a mim os motivos pelo qual ela mesma não vai lá e por si mesma não o pega, enfim... Por fim, buscar por Morte. Não compreendi muito essa parte, mas a meu ver trata-se de outro plano que põe desvantagem a você. Temos que descobrir.

Max estava perplexo. Desconfiava das informações dadas por Camac, mas isso... Um monte de mentiras em cima de mentiras. Deixou de ir atrás de sua mãe para resolver o que ia fazer com a questão de Morte. Uma súbita fúria cresceu dentro de si. Ainda não conseguia compreender direito os fatos. Não importava.

− Preciso resgatar minha mãe. Dane-se Branca de Neve e seus planos. Dane-se o mundo. Eu vou atrás da minha mãe e Mito nenhum vai parar em minha frente.

Moz sorriu.


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Notas finais do capítulo

Os próximos capítulos se passarão no presente. Não haverá flashbacks tão cedo.



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